sábado, 28 de junho de 2014

Liberou Geral, pois "Quem tá preso tem pressa" Por Luiz Holanda

Liberou Geral, pois “Quem tá preso tem pressa”. Luiz Holanda A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal-STF, por unanimidade, decidiu pela devolução dos processos relativos à Operação Lava Jato (que apura a corrupção institucionalizada na Petrobrás), à Justiça do Paraná. Com essa decisão, todos os atos relacionados às investigações feitas pela Polícia Federal-PF, assim como os praticados pelo ínclito juiz Sérgio Moro, foram validados. A partir de agora, somente as investigações envolvendo parlamentares federais ficarão sob a tutela do STF. Não havia necessidade dessa formalidade, a não ser para justificar a decisão tomada pelo ministro Teori Zavascki de libertar apenas o ex-diretor da Petrobrás, Paulo Roberto Costa. Ao julgarem a questão de ordem apresentada perlo próprio Zavascki, os demais ministros tentaram consertar o erro do relator, que não tinha como justificar a decisão de levar para o Supremo um processo em que, até aquele momento, nenhum parlamentar federal estava sendo investigado. Mesmo assim, sua excelência encontrou um jeito de paralisar as investigações aplicando a regra constitucional do foro privilegiado, que tantos favores vem prestando aos ladrões da coisa pública. Agora a vez é do seu colega, Luís Roberto Barroso, o novo relator dos processos do mensalão. Esse ministro, mesmo não tendo participado do julgamento naquela ocasião, sempre considerou excessivamente rigorosas as penas aplicadas aos réus. Segundo ele, as decisões do Supremo foram tomadas “fora da curva”. Logo após sua nomeação veio a público que o seu antigo escritório recebeu R$ dois milhões por uma consultoria jurídica na celebração do compromisso arbitral com relação aos pleitos do CETUC no âmbito do contrato SUP2. 0.5.2000. Mesmo não se fazendo acusações levianas (não há prova de prática de ato ilícito) não deixam de existir na mente popular estranhas dúvidas pela coincidência. Tão logo foi sorteado relator, Barroso afirmou que os processos do mensalão entrarão em pauta de julgamento ainda nesta semana, pois “Quem tá preso tem pressa”. Para ele, ser escolhido relator foi um “prêmio”, pois agora terá a oportunidade de colocar o STF dentro da curva. Mesmo que não tenha tido qualquer intenção contrária ao histórico julgamento comandado pelo ministro Joaquim Barbosa, suas opiniões dão a entender que pessoas até então consideradas acima da lei não podem deixar de ser beneficiadas pelo Supremo, considerado pelo povo o principal ancoradouro dos marginais no exercício das funções públicas. A erudição empregada pelo ministro, assim como seus argumentos jurídicos farão o STF retornar à sua tradição de assegurar que os nobres permaneçam inatingíveis pela justiça da plebe, que somente pune os pobres, pois esses não têm pressa na libertação. Juntamente com os colegas que integram a maioria absoluta que o PT tem hoje no colegiado, Barroso deverá determinar que os presos do mensalão trabalhem durante o dia, fora das grades. O Brasil conta, atualmente, com 512 mil presos. Depois dos Estados Unidos e da China, é a terceira maior população carcerária do mundo, sendo que, desse total, 225 mil são presos provisórios, sem nenhuma pressa para serem libertados. De acordo com a Lei de Execução Penal, a concessão do trabalho externo deve seguir requisitos objetivos e subjetivos. A parte objetiva exige que o condenado cumpra um sexto da pena para ter direito ao benefício. A subjetiva exige apenas bom comportamento e aptidão para o trabalho. O Superior Tribunal de Justiça-STJ, flexibilizando a interpretação literal da lei, entende que os juízes das Varas de Execução Penal podem autorizar o trabalho externo aos presos que não cumpram um sexto da pena. Como é o próprio tribunal que desrespeita a lei, certamente prevalecerá a interpretação libertadora. Mesmo assim, a infelicidade do ministro ao parafrasear o sociólogo Herbert José de Souza, o Betinho - autor da frase “Quem tem fome tem pressa”, foi total. A analogia feita pelo “novato” apenas confirma a tradicional impunidade dos poderosos na mais alta corte de justiça do país. Sua excelência esquece que milhares de encarcerados, famintos e sem esperança, também esperam pela agilidade da justiça, que, em relação a eles, não tem nenhuma pressa.


(Luiz Holanda)

terça-feira, 24 de junho de 2014

Beethoven - Für Elise (60 Minutes Version)

Sequestro de animais domésticos


É cada vez mais frequente a divulgação de notícias envolvendo o "sequestro" de animais domésticos em diversas localidades do Brasil. Após uma rápida consulta na internet foi possível confirmar a proliferação desse tipo de crime em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Goiânia. Até o jornal Folha de São Paulo chegou a informar que um programa de televisão discutiria o sequestro de cães na região dos Jardins em São Paulo.
As notícias confirmam essa nova prática criminosa envolvendo o "sequestro" de cachorros e gatos, em que os donos desses animais são surpreendidos com exigências de altos valores como preço do resgate e não mais simples pedidos de recompensa. Essa mudança no alvo dos criminosos talvez reflita o status que os bichos ganharam nas famílias, sendo considerados por muitos como um membro da família.
No entanto, esses fatos noticiados se referem ao crime de sequestro? Para fins meramente didáticos, o seguinte exemplo será utilizado: um cão é subtraído de uma residência à noite e horas depois os donos do animal recebem uma ligação em que é exigido o pagamento de um valor em dinheiro como condição do resgate.
No presente caso, trata-se de um crime de sequestro?
Por óbvio que NÃO.
O crime tipificado no art. 159 do Código Penal define como extorsão mediante sequestro o fato de "sequestrar pessoacom o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem como condição ou preço do resgate".
Portanto, o sujeito passivo deste delito pode ser qualquer pessoa, mas nunca um animal. O exemplo utilizado pode configurar um crime de furto majorado pelo repouso noturno (art. 155, §1° do CP), pois o animal pode ser considerado como uma coisa alheia móvel, conforme ensina Damásio:
"Podem também ser furtados os minerais do solo e os semoventes".
Até aqui nenhuma dificuldade, pois basta lembrar que existe o crime de abigeato (furto de gado), o que facilita essa conclusão.
Em que pese o erro cometido pelos jornais, a notícia é interessante do ponto de vista acadêmico, então vamos aproveitar o exemplo já utilizado e dificultar as coisas. Levando-se em consideração o exemplo anterior, o que aconteceria se os meliantes utilizassem grave ameaça ou violência?
Nessa hipótese, a grave ameaça pode causar um constrangimento ao dono do animal, levando-o a fazer, tolerar ou omitir alguma coisa. Assim sendo, resta configurado, em tese, o crime de extorsão:
"Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa".
Cumpre salientar que a perda de um animal que é considerado como um filho por alguns será um sacrifício muito superior do que o prejuízo patrimonial correspondente à vantagem exigida pelo extorsionário, podendo afetar a tranquilidade pessoal e familiar, bem como a integridade física da vítima (não é incomum relatos de grande sofrimento pela perda de um animal, inclusive depressão e outras doenças).
Por esse motivo, concluímos que o exemplo citado narra, em tese, um crime de extorsão, na medida em que o dono do animal é constrangido a fazer algo (prestar uma vantagem econômica indevida), mediante a grave ameaça de perder o seu animal de estimação.Ademais, o crime de extorsão se concretiza no constrangimento físico (violência) ou psíquico (ameaça) da pessoa, qualquer que tenha sido o meio empregado.
Por este motivo, pouco importa a qualidade do meio, bastando que seja suficiente para constranger a vítima a ponto desta prestar uma vantagem econômica indevida a outrem.
Em outras palavras, se o meio empregado é irrelevante, pode ser feita com a utilização de um animal doméstico. Nas palavras de Cezar Roberto Bittencourt, "os bens ou interesses que constituem objeto da ameaça ou da violência praticadas pelo agente são aqueles cujo sacrifício implique, para seu titular, um mal maior que o prejuízo patrimonial decorrente da indevida exigida, como a vida, a integridade física, a honra, a reputação, o renome profissional ou artístico, o crédito comercial, o equilíbrio financeiro, a tranquilidade pessoal ou familiar, a paz domiciliar, a propriedade de uma empresa, entre outros".
Portanto, as notícias que estão sendo veiculadas como sequestro de animais domésticos são inverídicas, pois não é possível a prática de tal crime contra um animal, conforme aduzido acima.
No entanto, foi demonstrado mediante a utilização de um exemplo hipotético que é possível a configuração do crime de extorsão, na medida em que o dono do animal é constrangido a fazer algo (prestar a outrem uma indevida vantagem econômica), mediante a grave ameaça de perder o seu animal de estimação.
Assim sendo, cuide bem de seu animal de estimação para não ser vítima de um extorsinonário.


Leia mais: http://jus.com.br/artigos/14328/sequestro-de-animais-domesticos#ixzz35ZPoNAU0

segunda-feira, 23 de junho de 2014

As cuequinhas da menina



Só vemos o que queremos ver. Desviar o olhar é fácil
A Natureza, quando nos deu os cinco sentidos, mostrou uma generosidade quase plena. De uma forma ou de outra, conseguimos cheirar, olhar, tocar e provar apenas o que queremos. Só a audição ficou de fora do nosso controlo: é impossível fechar os ouvidos ou ignorar um som estridente. A solução de espalmar as mãos nas orelhas tem as suas limitações.
Como nunca é demais recordar o que se sabe (porque o que não se sabe não se recorda, aprende-se), aqui ficam alguns exemplos de como controlar os nossos sentidos face a algo indesejável:
. Sente tonturas por causa do forte odor corporal da pessoa ao seu lado no elevador? Feche as narinas apertando o nariz entre o indicador e o polegar. Não é muito subtil, mas a prazo, acredite, está a fazer um favor ao sujeito que mostra graves problemas de higiene pessoal.
. O sabor agoniante dessa primeira garfada dá-lhe vómitos? Pare imediatamente de comer. É provável que a razão para o bife estar esverdeado não tenha nada a ver com molho de pimentos. Espreite lá a ementa e confirme que a única coisa verde é o gelado de menta.
. Acaba de descobrir urtigas na beira da estrada? Parabéns, mas não lhes faça festas. Por baixo da sua amigável aparência de hortelã fresquinha dorme um pequeno monstro. Repare: não precisa de fugir. As urtigas não correm atrás de si. Basta não lhes tocar.
. Apercebe-se (e aqui vou atirar particularmente ao calhas) que uma menina de 12 anos, vestida com uma minissaia, tem as cuequinhas à mostra na aula? Não se incomode, acontece. Desvie o olhar e continue a dar a matéria.
Este exemplo é complexo e precisa de mais atenção. Digamos que a visão das cuequinhas da menina de 12 anos não lhe sai da cabeça e o incomoda ao ponto de se desconcentrar irrevogavelmente. Ou não consegue parar de olhar. Neste caso, tem duas opções:
. Ir a correr avisar a directora da escola que aquele pedaço de tecido impede o normal funcionamento das aulas e pedir-lhe para mudar os regulamentos da escola, de maneira a não tornar a passar por tal provação.
. Abrir as Páginas Amarelas, procurar em Clínicas de Psiquiatria e ligar o primeiro número que encontra.
As duas hipóteses não são mutuamente exclusivas.
Bem, está na hora de mudar de assunto. Parece que um professor de uma Escola Básica do 2º e 3º Ciclo do Pinhal Novo se foi queixar de uma situação desagradável à dirigente do Conselho Executivo. "Sentiu-se incomodado por conseguir ver as cuequinhas de uma menina, devido à minissaia muito curta que ela trazia vestida", descreveu a presidente, Natividade Azeredo. Depois disto, os regulamentos sofreram uma emenda para proibir decotes demasiado grandes e saias demasiado pequenas. "Enquanto cá estiver, irei transmitir aos meus alunos valores e princípios", justificou.
Entre as suas transmissões aos alunos, terá transmitido alguma coisa ao pobre professor que, coitado, se sentiu tão incomodado por ver as cuequinhas de uma menina que não viu outra saída senão pedir ajuda à presidente?
A directora que dirige professores paralisáveis pelas simples cuequinhas de uma menina de minissaia tem mais com que se preocupar do que a indumentária dos alunos. O problema de muita gente que, como a directora, gosta de transmitir valores e princípios não são as intenções. O problema é a cegueira parcial. É ver só o que se quer ver.
Essa dádiva da Natureza que nos permite olhar para o outro lado é um pau de dois bicos.


Ler mais: http://visao.sapo.pt/idiotsincrasias=s25087#ixzz35Ubhvvgq

Desde que rime, é poesia



"O vento sopra doido e o que foido" e outras letras de canções
A música é um eficaz disfarce de limitações poéticas. Quando vamos no carro a cantarolar uma música que passa na rádio, raramente pensamos no significado das letras. Apenas repetimos as palavras que ouvimos sem dar grande atenção à mensagem que o artista tenta transmitir. Talvez porque estamos extasiados com a voz melodiosa do cantor. Ou com a nossa. Mas, sem música, o crime perfeito deixa de ser perfeito: de repente, a letra da canção perde o aparente bom gosto. E o sentido. Aqui ficam alguns exemplos de candidatos a Camões-com-guitarra-e-bateria-de-fundo:
E se partires de manhã
Deixa a sombra e o chão
Esta noite eu e tu
Somos a palma e a mão
(A Palma e a Mão, João Pedro Pais)
Repare-se na mestria métrica (artisticamente ignorada, coisa que exige coragem por parte do autor), mas, sobretudo, tente-se descortinar o que o João Pedro quer dizer com isto. Um é a palma e o outro é a mão? Mas a mão inclui a palma... E os dedos também, já agora... Quer isto dizer que um dos protagonistas é mais do que o outro? Ou significa que são indissociáveis, de uma forma que deve fazer todo o sentido na cabeça do João Pedro? Mas neste caso levanta-se outra questão, bem mais interessante: será que uma mão que perde os dedos ainda pode ser chamada de mão ou passará a ser apenas uma palma? 
Deixemos o Poeta João Pedro e passemos ao Poeta André.
Gosto de ti desde aqui até à lua
Gosto de ti desde a lua até aqui
Gosto de ti simplesmente porque gosto
E é tão bom viver assim
(Adivinha o Quanto Gosto de Ti, André Sardet)
Fico extasiado com a implícita sinceridade do André a admitir, sem vergonhas, a sua óbvia falta de ideias, ao dizer "gosto de ti simplesmente porque gosto". Imagino-o sentado no sofá da sala de estar, de guitarra ao colo, a cantar para a filha "Gosto de ti desde aqui até à lua, gosto de ti desde a lua até aqui...". Entretanto hesita; pára de tocar e começa a puxar pela cabeça: "Mas gosto de ti porquê, filha? Eu sei lá... Estas coisas não se explicam."; "Então não expliques, papá."; "Boa ideia! É mesmo isso! Porque é que me hei-de dar ao trabalho? Gosto de ti simplesmente porque gosto, e é tão bom viver assim. Rima? Rima! Siga para bingo." 
Um advérbio de modo, seja ele qual for, fica sempre bem numa canção. Antes que a cabeça comece a doer, passemos ao último exemplo.
Mas nisto o vento sopra doido
E o que foido
Corpo num turbilhão
(O Sopro do Coração, Clã)
Podem tentar convencer-me de que a Manuela Azevedo quer dizer "e o que foi do corpo num turbilhão". Mas macacos me mordam se ela não diz "foido". 
É preciso é rimar. A poesia que se foida.


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Um apelo ao ateísmo



Pelo sim pelo não, é melhor não acreditar em deus
As cinco pessoas que morreram abalroadas por um comboio em Baião iam a Fátima. Mas ai de quem apontar a incongruência entre a bondade de um suposto deus e o sangrento destino provocado pela tentativa de lhe prestar vassalagem. Não, esta é só mais uma provação, um teste à fé, dirão os fanáticos do costume. Afinal, se a fé não tivesse minas no caminho, qualquer um podia ser religioso, que não custava nada.
(Na verdade, não vejo que seja incoerente morrer-se durante uma viagem religiosa. Ninguém morre por causa disso, da mesma forma que ninguém é salvo por causa disso. Morre-se numa passagem de nível a caminho de Fátima pelo mesmo motivo que se morre numa passagem de nível a caminho do Algarve: porque um comboio vai a passar naquele momento.)
É nestas alturas que volto a lembrar-me do que devia ser claro para toda a gente: objectivamente, há tantas razões para acreditar em deus como no pai-natal, em unicórnios ou na fada-dos-dentinhos (em todos os casos, alguém se lembrou de inventar umas personagens e de escrever uma história à volta delas). Aliás, até é mais seguro acreditar-se nestas personagens - injustamente desacreditadas - do que ser-se religioso. Pelo menos nunca ouvi falar de ninguém assassinado por um fanático crente no pai-natal. Ou de alguém morto num atentado terrorista perpetrado em nome de um unicórnio. Ou esmagado por um comboio a meio da viagem para ver umas imagens em porcelana da fada-dos-dentinhos.
 
PS: A ambulância que transportava dois dos sobreviventes teve um acidente a caminho do hospital, a menos de 500 metros do destino. Se fosse crente, diria que alguém lá em cima não gosta destas pessoas.


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A Bíblia é um livro chato


A Bíblia é um livro chato

E tem mais sangue que um filme do Tarantino
A liberdade de expressão há-de ter sempre um limite: a religião. É assim quando alguém diz umas verdades sobre o Corão e é assim quando alguém diz umas verdades sobre a Bíblia. Claro que Saramago não foi alvo de uma fatwa e, em princípio, não precisará de um batalhão de guarda-costas, como Rushdie. Mas a História prova-nos que a Igreja Católica evoluiu à força. Não deixou de queimar gente na fogueira por vontade própria ou por ser moralmente superior ao Islão, mas sim porque foi posta no seu lugar, quando perdeu poder com o (re)nascimento dos Estados laicos - coisa que ainda não aconteceu no mundo muçulmano. Não, não me convencem. Se a Igreja ainda tivesse uma fracção do poder que tinha há 200 anos, Saramago não se safava apenas com umas bocas imbecis a sugerirem que entregue o passaporte português.
(Sabiam que a inquisição espanhola durou até 1834? Já rolavam comboios em Inglaterra e nos EUA nessa altura...)
Vamos então à Bíblia: Saramago disse que estava cheio de episódios cruéis e cenas de carnificina. Factualmente, não mentiu e só quem não leu pode dizer o contrário. Eu li.
(Aliás, ter lido a Bíblia foi um dos mais importantes passos que dei na direcção do meu ateísmo. E estou convencido de que muitos dos que se intitulam orgulhosamente católicos só o fazem porque nunca se deram ao trabalho de a ler. Os inquéritos mostram que nove em cada dez portugueses nunca o fizeram, o que para um país com - supostamente - mais de 90% de católicos me parece pouco.)
O Velho Testamento apresenta-nos um deus odioso, macabro, que exige sacrifícios de animais a torto e a direito, que chacina multidões e primogénitos com um estalar de dedos, que se impõe pelo medo e pelo terror. E não me venham com a eterna desculpa das parábolas e das metáforas. Tretas. Com argumentos desses, é possível ver bondade até nos discursos do Hitler.
A Bíblia não é sagrada, é mundana. Uma boa parte (precisamente a parte de que os padres evitam falar) não passa de um chatíssimo manual de costumes, com descrições detalhadas sobre o modo de degolar cabras no altar e de como verter o sangue em ânforas. E não há mal nenhum nisso. Tudo foi escrito com propósitos políticos e sociais fundamentais para a época, com a religião em pano de fundo. Nada de estranhar, num tempo anterior à eclosão da ciência. De estranhar é gente inteligente e do século XXI continuar a socorrer-se desses textos para nortear a sua vida.
Mais interessante é a fé cega de tanta gente em algo escrito por homens comuns. Sim, a Bíblia foi escrita por homens como os outros, com a diferença de espalharem aos quatro ventos que deus falava com eles.
Mas alguém me explica, por favor, porque é que os que acreditam de olhos fechados nesses tipos são os mesmos que gozam com a Alexandra Solnado, quando a mulher publica um livro a relatar os seus diálogos com Jesus? Que justificação há para crer que uns falam com deus e que outros são esquizofrénicos?
A fé não é motivo para orgulhos. Ter fé no que está na Bíblia e chamar malucos aos que hoje dizem ouvir a voz de deus é ter dois pesos e duas medidas sobre assuntos exactamente iguais. E, se querem que vos diga, até preferia que acreditassem mais nas palavras da Alexandra Solnado. Pelo menos o deus dela não faz mal a ninguém.


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