"Puta, Puta..." gritam os alunos da
Uniban, universidade de uma das cidades mais importantes e modernas do
Brasil. Lugar de luta de um movimento social que busca igualdade de
direitos entre homens e mulheres: o feminismo. As ruas de São Paulo
foram palco nos últimos 40 anos de passeatas e marchas que reivindicaram
o fim da violência contra a mulher e os direitos a igualdade de gênero.
Discussão antiga e debate necessário na sociedade
atual, a violência doméstica é um assunto de difícil enfrentamento: vide
a situação das políticas públicas para as mulheres em nosso município. O
centro de referência da cidade de Americana, para onde encaminharíamos
um caso deste porte, lugar de acolhimento de mulheres vitimadas pela
violência física, psicológica e sexual, está com atendimento precário há
alguns meses.
Hoje além da igualdade de diretos que seria o oposto à
desigualdade, lutamos por nosso direito à diferença e reivindicamos
políticas públicas com um recorte de gênero, ou seja, "espaços" de
atendimento para as mulheres que são vítimas desta violência social e
cultural (delegacias de mulheres, centros de referências, casa abrigo e
outros). Lutamos também por cotas para aumentar a participação nos
espaços de decisão, para minimizar a desigualdade construída por séculos
de patriarcado.
Patriarcado esse que justifica episódios como o da
Uniban, e nos mostra que há ainda muito por fazer. As mulheres são
julgadas pelo estilo de vida, pelas roupas que vestem, pela forma como
articulam sua sexualidade, "por desejar". E também por suas escolhas,
quando essas vão de encontro com o que tradicionalmente convencionamos,
enquanto sociedade, ao ideal do que é ser mulher.
Não precisamos ir muito longe para ouvir argumentos
desprovidos de força racional. A mulher, quando toma posse de suas
atribuições no mundo do trabalho, enfrenta no seu dia-a-dia queixas
veladas ou não, sobre a deficiência de suas posturas quanto ao seu papel
de mãe, esposa e dona de casa. Logo a mulher é julgada por não mais
vincular-se a uma postura história ligada ao gênero feminino. Cabe
lembrar que gênero é um conceito sociológico que tenta entender em
várias culturas quais os padrões de comportamentos sociais ligados ao
sexo.
Voltemos a nossa pergunta inicial: O que é ser puta?
Neste caso não estamos falando da prostituição: o que é levado em
consideração são os símbolos que passam longe do recato exigido pela
sociedade à mulher. A mulher que "deseja" é puta. É o contrário da idéia
do adjetivo "honesta" empregado para definir mulher nos nossos códigos
de lei (não podemos esquecer que há 30 anos essa palavra foi retirada da
lei, conquista do movimento feminista). Mas ainda hoje somos julgadas
por isso. Então proponho: "Sejamos todas putas"! O nosso coro será
maior, e os 700 rapazes da Uniban terão que repensar seu papel masculino
na sociedade atual.
Helena Ribeiro da Silva, Presidenta do SEAAC de Americana
e Região e Diretora de Assuntos da Mulher, Criança e Adolescente da
FEAAC
A História da música é muito antiga, visto que desde os primórdios os homens produziam diversas formas de sonoridade.
Lembre-se, portanto, que a música é um tipo de arte que trabalha com a harmonia entre os sons, o ritmo, a melodia, a voz. Todos esses elementos são importantes e podem nos transportar para outro tempo e espaço, resgatar memórias e reacender emoções.
Veremos
como essa linguagem artística caminhou durante os séculos até os nossos
dias para adquirir as características que possui hoje no Ocidente.
Música na Pré-História
A humanidade possui uma relação longa com a música, sendo essa umas das formas de manifestação cultural mais antigas.
Ainda na pré-história,
há mais de 50 mil anos, os seres humanos começaram a desenvolver ações
sonoras baseadas na observação dos fenômenos da natureza.
Os
ruídos das ondas quebrando na praia, os trovões, a comunicação entre os
animais, o barulho do vento balançando as árvores, as batidas do
coração; tudo isso influenciou as pessoas a também explorarem os sons
que seus próprios corpos produziam. Como por exemplo os sons das palmas,
dos pés batendo no chão, da própria voz, entre outros.
Nessa
época, tais experimentações não eram consideradas arte propriamente e
estavam relacionadas à comunicação, aos ritos sagrados e à dança.
A Evolução da Música
Música no Egito
No Egito Antigo,
ainda no século 4.000 a.C., a música era muito presente, configurando
um importante elemento religioso. Os egípcios consideravam que essa
forma de arte era uma invenção do deus Thoth e que outro deus, Osíris, a utilizou como uma maneira para civilizar o mundo.
A
música era empregada de forma a complementar os rituais sagrados em
torno da agricultura, que era farta na região e os instrumentos
utilizados eram harpas, flautas, instrumentos de percussão e cítara -
que é um instrumento de cordas derivado da lira.
Música na Mesopotâmia
Na região da Mesopotâmia,
localizada entre os rios Tigre e Eufrates, habitavam os povos sumérios,
assírios e babilônios. Foram encontradas harpas de 3 a 20 cordas na
região onde os sumérios viviam e estima-se que sejam objetos com mais de
5 mil anos. Também foram descobertas cítaras que pertenceram ao povo
assírio.
Música na China e na Índia
Na
Ásia - em torno de 3.000 a.C. - a atividade musical prosperou na Índia e
China. Nessas regiões, ela também estava fortemente relacionada à
espiritualidade.
O instrumento mais popular entre os chineses era a cítara e o sistema musical utilizado era a escala de cinco tons - pentatônica.
Já na Índia, em 800 a.C., o método musical era o de "ragas", que não utilizava notas musicais e era composto de tons e semitons.
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Podemos observar que a cultura musical na Grécia Antiga funcionava como uma espécie de elo entre os homens e as divindades. Tanto que a palavra "música" provém do termo grego mousikē, que significa "a arte das musas". As musas eram as deusas que guiavam e inspiravam as ciências e as artes.
É importante ressaltar que Pitágoras,
grande filósofo grego, foi o responsável por estabelecer relações entre
a matemática e a música, descobrindo as notas e os intervalos musicais.
Sabe-se que na Roma Antiga,
muitas manifestações artísticas foram herança da cultura grega, como a
pintura e a escultura. Supõe-se, dessa forma, que o mesmo ocorreu com a
música. Entretanto, diferente dos gregos, os romanos usufruíam dessa
arte de maneira mais ampla e cotidiana.
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Durante a Idade Média a Igreja Católica esteve bastante presente na sociedade europeia e ditava a conduta moral, social, política e artística.
Naquela
época, a música teve uma presença marcante nos cultos católicos. O Papa
Gregório I - século VI - classificou e compilou as regras para o canto
que deveria ser entoado nas cerimônias da Igreja e intitulou-o como canto gregoriano.
Outra expressão musical do período que merece destaque são as chamadas Cantigas de Santa Maria, que agregam 427 composições produzidas em galego-português e divididas em quatro manuscritos.
Uma importante compositora medieval foi Hidelgard Von Bingen, também conhecida como Sibila do Reino.
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Já
na época renascentista - que compreende o século XIV até o século XVI -
a cultura sofreu transformações e os interesses estavam voltados para a
razão, a ciência e o conhecimento do próprio ser humano.
Tais
preocupações se refletiram também na música, que apresentava
características mais universais e buscava se distanciar dos costumes da
Igreja.
Uma característica significativa da música nesse período foi a polifonia, que compreende a combinação simultânea de quatro ou mais sons.
Podemos citar como um grande compositor da Renascença Thomas Weelkes.
Leia mais sobre o período:
A partir do século XVII, o movimento barroco promove mudanças marcantes no cenário musical.
Foi
um período bastante fértil e importante para a música ocidental e
apresentava novos contornos tonais, com a utilização do modo jônico
(modo “maior”) e modo eólio (modo “menor”).
O
surgimento das óperas e das orquestras de câmaras também acontece nessa
fase, assim como o virtuosismo dos músicos ao tocar os instrumentos. Os
maiores representantes da música barroca foram Antonio Vivaldi, Johann
Sebastian Bach, Domenico Scarlatti, entre outros.
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No Classicismo,
que corresponde ao período em torno de 1750 e 1830, a música adquire
objectividade, equilíbrio e clareza formal, conceitos já utilizados na
Grécia Antiga.
Nessa época, a música instrumental e as orquestras
ganham ainda mais destaque. O piano toma o lugar do cravo e novas
estruturas musicais são criadas, como a sonata, a sinfonia, o concerto e
o quarteto de cordas.
Os artistas que se sobressaíram são Haydn, Mozart e Beethoven.
Música no Romantismo
No
século XIX, o movimento cultural que surgiu na Europa foi o Romantismo.
A música predominante tinha como qualidades a liberdade e a fluidez, e
primava também pela intensidade e vigor emocional.
Esse período musical é inaugurado pelo compositor alemão Beethoven - com a Sinfonia nº3 - e passa por nomes como Chopin, Schumann e sua esposa Clara Shumann, Wagner, Verdi, Tchaikovsky, R. Strauss, entre outros.
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No século XX, a música ganha nova roupagem e uma grande transformação ocorre com o surgimento do rádio.
Novas
tecnologias e suportes para a gravação e divulgação musical ajudam a
popularizar essa linguagem artística e projetar cantores e compositores,
já que eles não dependiam somente dos concertos musicais.
Com uma cartela de opções mais variadas, o público começa a ter contato com outros tipos de música.
É importante também destacar a presença da música atonal - ou seja, que não possui um centro tonal nem uma tonalidade preponderante. Há também a dodecafônica, que trata as doze notas da escala cromática como equivalentes.
Alguns
artistas também passam a incorporar novos elementos em sua produções,
como instrumentos até então pouco explorados e objetos sonoros.
Um
exemplo é o multi-instrumentista brasileiro Hermeto Pascoal, que tira
sons tanto de flautas e pianos como de objetos do cotidiano como
chaleiras, pentes, copos d'água e brocas de dentistas. A compositora
Adriana Calcanhoto também possui um projeto de música infantil que faz
uso de diversos brinquedos para produzir suas composições.
Podemos citar como grandes nomes da música do século XX o brasileiro Heitor Villa-Lobos, o russo Igor Stravinsky, o nigeriano Fela Kuti, a pianista carioca Chiquinha Gonzaga, o norte-americano Louis Armstrong, a francesa Lili Boulanger, o argentino Astor Piazzolla, e muitos outros.
Leia mais sobre música e arte nos textos:
Licenciada
em Educação Artística pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) em
2007. Formada em Fotografia pela Escola Panamericana de Arte e Design de
São Paulo (2010).
A filosofia existe para que as pessoas possam viver melhor. Sofrer
menos. Lidar melhor com as adversidades. Enfrentar serenamente o perpétuo vai-e-vem de elevações e quedas,
para citar uma grande frase de um filósofo da Antiguidade. A missão
essencial da filosofia é tornar viável a busca da felicidade.
Todos os grandes pensadores sublinharam esse ponto. A
filosofia que não é útil na vida prática pode ser jogada no lixo. Alguém
definiu os filósofos como os amigos eternos da humanidade. Nas noites
frias e escuras que enfrentamos no correr dos longos dias, eles podem
iluminar e aquecer. A filosofia apoia e consola.
Um aristocrata romano chamado Boécio (480-524) era rico, influente,
poderoso. Era dono de uma
inteligência colossal: traduziu para o latim
toda a obra de Aristóteles e Platão. Tudo ia bem. Até o dia em que foi
acusado de traição pelo imperador e condenado à morte. Foi torturado.
Recebeu a marca dos condenados à morte de então: a letra grega Theta
queimada na carne.
Boécio recorreu à filosofia, em que era mestre, para enfrentar o
suplício. Entre a sentença e a morte, escreveu em condições precárias um
livro que se tornaria um clássico da literatura ocidental: A Consolação
da Filosofia. Tudo de que ele dispunha, para escrevê-lo, eram pequenas
tábuas e estiletes. Isso lhe foi passado, para dentro da cela, por
amigos. “A felicidade pode entrar em toda parte se suportarmos tudo sem
queixas”, escreveu ele.
A filosofia consola, mostrou em situação extrema Boécio. E ensina. E
inspira. Sim, os filósofos são os eternos amigos da humanidade.
Considere Demócrito, pensador grego do século 5 a.C. Ele escreveu um
livro chamado Sobre o Prazer. Primeira frase do livro: “Ocupe-se de pouco para ser feliz”. Gênio. Gênio total. A palavra grega para tranqüilidade da alma é euthymia.
A recomendação básica de Demócrito, sob diferentes enunciados, é
encontrada em muitos outros filósofos. Sobrecarregar a agenda equivale a
sobrecarregar o espírito, e traz inevitavelmente angústia. Ninguém que
tenha muitas tarefas pode ser feliz.
Um sábio da Antiguidade não abria nenhuma correspondência depois das
quatro horas da tarde. Era uma forma de não encontrar mais nenhum motivo
de inquietação no resto do dia, que ele dedicava a recuperar a calma
que perdera ao entregar-se ao seu trabalho. Olhemos para nós, e nos
veremos com freqüência abrindo mensagens no computador alta noite, e não
raro nos perturbando por seu conteúdo. O único resultado disso é uma
noite mal dormida.
Fazemos muitas coisas desnecessárias. Coloque num papel as
atividades de um dia. Depois veja o que realmente era preciso fazer e o
que não era. A lista das inutilidades suplanta quase sempre a das ações
imperiosas. O imperador filósofo romano Marco Aurélio, do começo da Era
Cristã, louvou a frase de Demócrito em suas clássicas Meditações. Acrescentou que devemos evitar não apenas os gestos inúteis, mas também os pensamentos desnecessário.
Marco Aurélio recomendava o formidável exercício de conduzir a mente,
quando agitada, para pensamentos aquietadores. Isso conseguido,
controlamos a mente, esse cavalo selvagem, em vez de sermos controlados
por ela.
Sêneca escreveu sobre o assunto com imensa graça e espírito. Sêneca
usou as expressões “agitação estéril” e “preguiça agitada” ao tratar dos
atos que nos trazem apenas desassossego. “É preciso livrar-se da
agitação desregrada, à qual se entrega a maioria dos homens”, escreveu
Sêneca. “Eles vagam ao acaso, mendigando ocupações. Suas saídas absurdas
e inúteis lembram as idas e vindas das formigas ao longo das árvores,
quando elas sobem até o alto do tronco e tornam a descer até embaixo,
para nada. Quantas pessoas levam uma existência semelhante, que se
chamaria com justiça de preguiça agitada?”
Agimos como formigas quase sempre, subindo e descendo sem razão o
tronco das árvores, e pagamos um preço alto por isso: ansiedade,
aflição, fadiga física e mental. Nossa agenda costuma estar repleta. É
uma forma de fugir de nós mesmos, como escreveu sublimemente um poeta
romano. Eliminar ao menos algumas das tantas tarefas inúteis que nos
impomos a cada dia é vital para a euthymia da qual falavam os sábios gregos.
Outro ponto essencial recomendado pelos filósofos para a vida feliz é
aceitar os tropeços. É o principal ensinamento do filósofo Zenão e seus
discípulos. Nascido em 333 a.C. na ilha de Chipre, filho de pais ricos,
Zenão fundou em Atenas uma escola de filosofia que dominou o mundo
culto por séculos e cujos fundamentos influenciaram a doutrina cristã: o
estoicismo.
Tão forte é a filosofia estóica que “estóico” virou sinônimo de
bravura na adversidade. Segundo o mais admirado dicionário de inglês, o
Oxford, estóico é quem se porta com serenidade diante do revés ou do
triunfo. Nem vibra na vitória e nem se deprime na derrota.
Zenão perdeu todo o seu patrimônio num naufrágio. Seu comentário ao
receber a informação: “O destino queria que eu filosofasse mais
desembaraçadamente”. O nome da escola deriva da palavra grega “stoa”,
pórtico. Zenão, alto, magro, o pescoço ligeiramente inclinado, pregava
suas idéias num pórtico erguido pelos atenienses para celebrar a vitória
na guerra sobre os persas.
Esse pórtico era colorido com imagens de gregos derrotando os
bárbaros. Na Atenas de então, era comum discutir filosofia em locais
públicos, mas a escolha do pórtico por Zenão parece carregada de
simbolismo: o triunfo da sabedoria sobre a brutalidade.
O estoicismo defendia uma vida de acordo com a natureza. Simplicidade
no vestuário, na comida, nas palavras, no estilo de vida. E a aceitação
de tudo que possa ocorrer de ruim. Agastar-se contra as circunstâncias
apenas piora o estado de espírito da pessoa: essa a lógica da aceitação,
ou resignação, que viria a ser um dos pilares do cristianismo.
O lema estóico: abstenha-se e aceite. O apreço pela vida de acordo
com a natureza Zenão a-prendeu com seu mestre em filosofia, Crates.
Crates era da escola cínica. Os cínicos defendiam a simplicidade tanto
quanto os estóicos, e não é difícil entender por que a posteridade
ignorante lhes atribuiu um sentido pejorativo: é que eles eram
extraordinariamente irreverentes. O mais notável filósofo cínico,
Diógenes, certa vez se masturbou em público. Explicou aos que o
interpelavam: “Gostaria de saciar minha fome esfregando o estômago”.
Não sobrou livro nenhum de Zenão. Atribuem-se a ele frases, das quais
uma das melhores diz: “A natureza nos deu dois ouvidos e apenas uma
boca para que ouvíssemos mais e falássemos menos”. Zenão se matou aos 72
anos.
Para os estóicos, o suicídio – sem lamúrias, sem queixas – era uma
retirada digna e honrosa quando a pessoa já não encontrasse razões para
viver. Sabe-se de sua morte pelo biógrafo Diógenes Laércio, autor de Vida dos Filósofos.
Zenão tropeçou e se machucou, segundo Diógenes Laércio. Em seguida
citou um verso de um autor grego chamado Timóteo: “Eis-me aqui: por que
me chamas?”
Nascido escravo e só liberto depois de adulto, Epitecto foi uma das
vozes mais influentes da filosofia da Antiguidade. Ele viveu nos
primórdios da Era Cristã, de 40 a 125. Não escreveu um único livro. Seu
pensamento é conhecido graças a um discípulo, o historiador Arriamo.
Arriamo teve o cuidado de anotar as idéias de seu mestre, e depois transformá-las em dois livros, Entretenimentos e Manual.
Seu tamanho intelectual é tal que o imperador filósofo Marco Aurélio
escreveu que um dos acontecimentos capitais de sua vida foi ter tido
acesso às obras de Epitecto.
Para ele, o passo básico da vida feliz é aceitar as coisas como elas
são. Revoltar-se contra os fatos não altera os fatos, e ainda traz uma
dose de tormento desnecessária. “Não se deve pedir que os acontecimentos
ocorram como você quer, mas deve-se querê-los como ocorrem: assim sua
vida será feliz”, disse Epitecto. (Séculos depois, o pensador francês
Descartes escreveu uma frase que é como um tributo à escola de Epitecto:
“É mais fácil mudar seus desejos do que mudar a ordem do mundo”.)
Não adianta se agastar contra as circunstâncias: elas não se
importam. Isso se vê nas pequenas coisas da vida. Você está no meio de
um congestionamento? Exasperar-se não vai dissolver os carros à sua
frente. Caiu uma chuva na hora em que você ia jogar tênis com seu amigo?
Amaldiçoar as nuvens não vai secar o piso. Que tal uma seção de cinema
em vez do tênis?
Outro ensinamento seu crucial é que só devemos nos ocupar
efetivamente daquilo que está sob nosso controle. Você cruza uma manhã
com seu chefe no elevador e ele é efusivo. Você ganha o dia. Você o
encontra de novo e ele é frio. Você fica arrasado. Daquela vez ele
estava bem-humorado, daí o cumprimento caloroso, agora não. O estado de
espírito de seu chefe não está sob seu controle. Você não deve nem se
entusiasmar com tapas amáveis que ele dê em suas costas e nem se
deprimir com um gesto de frieza. Você não pode entregar aos outros o
comando de seu estado de espírito.
“Não é aquele que lhe diz injúrias quem ultraja você, mas sim a
opinião que você tem dele”, disse Epitecto. Se você ignora quem o
insulta, você lhe tira o poder de chateá-lo, seja no trânsito, na
arquibancada de um estádio de futebol ou numa reunião corporativa.
Não são exatamente os fatos que moldam nosso estado de espírito,
pregou Epitecto, mas sim a maneira como os encaramos. Um dos desafios
perenes da humanidade, e as palavras de Epitecto são uma lembrança
eterna disso, é evitar que nossa opinião sobre as coisas seja tão ruim
como costuma ser. A mente humana parece sempre optar pela infelicidade.
Outra lição essencial dos filósofos é não se inquietar com o futuro. O
sábio vive apenas o dia de hoje. Não planeja nada. Não se atormenta com
o que pode acontecer amanhã. É, numa palavra, um imprevidente. Eis um
conceito comum a quase todas as escolas filosóficas: o descaso pelo dia
seguinte. Mesmo em situações extremas. Um filósofo da Antiguidade, ao
ver o pânico das pessoas com as quais estava num navio que chacoalhava
sob uma tempestade, apontou para um porco impassível. E disse: “Não é
possível que aquele animal seja mais sábio que todos nós”.
O futuro é fonte de inquietação permanente para a humanidade. Tememos
perder o emprego. Tememos não ter dinheiro para pagar as contas.
Tememos ficar doentes. Tememos morrer. O medo do dia de amanhã impede
que se desfrute o dia de hoje. “A imprevidência é uma das maiores marcas
da sabedoria”, escreveu Epicuro. Nascido em Atenas em 341 AC, Epicuro,
como os filósofos cínicos, foi uma vítima da posteridade ignorante.
Pregava e praticava a simplicidade, e no entanto seu nome ficou
vinculado à busca frívola do prazer.
Somos tanto mais serenos quanto menos pensamos no futuro. Vivemos sob
o império dos planos, quer na vida pessoal, quer na vida profissional, e
isso traz muito mais desassossego que realizações. O mundo neurótico em
que arrastamos nossas pernas trêmulas de receios múltiplos deriva, em
grande parte, do foco obsessivo no futuro. Há um sofrimento por
antecipação cuja única função é tornar a vida mais áspera do que já é.
Epicuro, numa sentença frequentemente citada, disse que nunca é tarde
demais e nem cedo demais para filosofar. Para refletir sobre a arte de
viver bem, ele queria dizer. Para buscar a tranqüilidade da alma, sem a
qual mesmo tendo tudo nada temos a não ser medo. Também nunca é tarde
demais e nem cedo demais para lutar contra a presença descomunal e
apavorante do futuro em nossa vida.
O homem sábio cuida do dia de hoje. E basta.