quarta-feira, 30 de maio de 2018

Bello!...

                                                                                                        
Foto de Everson Dias.

Interposição de embargos de declaração interrompe recursos de todas as partes

Opinião

Interposição de embargos de declaração interrompe recursos de todas as partes

 



Nos termos do artigo 1.022 do CPC, cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material. Seu parágrafo único considera omissa a decisão que: I - deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento; II - incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º. Esses dois enquadramentos legais do parágrafo único sobre o que seria omissão dão-se em linha de coerência com o novo regime de fundamentação exauriente (superando o anterior regime da fundamentação suficiente, do CPC de 1973)[1].
São uma forma de integração de julgado, verificados os vícios acima, não se constituindo, é certo, em meio de impugnação recursal que possa, à míngua desses mesmos vícios, modificar o resultado da conclusão judicial[2]. Excepcionalmente, em casos de decisões teratológicas ou absurdas, a jurisprudência aceita os embargos declaratórios com caráter manifestamente infringente[3]. Nessas circunstâncias, demanda-se a oitiva da parte adversa, em obséquio à cláusula constitucional do contraditório (parágrafo 2º, artigo 1.023 do CPC), conforme já defendia jurisprudência e doutrina[4][5].
Os embargos declaratórios são dos chamados recursos de fundamentação vinculada, ou seja, só podem ser interpostos dentro das hipóteses taxativamente previstas em lei (diferente, por exemplo, da apelação, onde toda e qualquer matéria de direito e fato pode ser alegada), de sorte que seu conhecimento depende, exclusivamente, da adequada alegação da obscuridade, da contradição, da omissão ou do erro material[6][7]. A existência efetiva desses vícios do julgado, portanto, é matéria de mérito recursal, etapa que sucede, por óbvio, à admissibilidade. Daí assentar-se que para “(...) que o órgão jurisdicional conheça dos embargos basta a afirmação do recorrente (...)”[8] da presença dos vícios.
Justamente por isso, a peça recursal deve apontar, precisamente, os pontos da decisão nos quais a parte embargante entende que devam ser integrados (a obscuridade, a contradição, a omissão, o erro material). Sem que haja o preenchimento desse específico requisito — e desde que previamente oportunizada correção do defeito do recurso (artigo 932, parágrafo único do CPC) —, faltará “(...) regularidade formal aos embargos que não se revestem dessas características, não podendo, pois, ser conhecidos”[9].
Apresentados os embargos, dá-se a interrupção (reinício) do prazo para interposição de outros recursos (artigo 1.026, caput do CPC). Isto é, “(...) fica interrompida a fluência de prazo para o eventual recurso de revisão”[10], o que se estende a todas as partes e eventuais terceiros do processo[11]. Interpostos embargos e eventualmente acolhidos, há uma nova e integrada decisão, contra a qual caberão os recursos cabíveis, inclusive embargos de declaração. Não caberão, porém, embargos de declaração para discutir a decisão originária, dando-se a preclusão e, eventualmente, a res iudicata. A interrupção, bom salientar, não implica suspensão da eficácia da decisão, ora a depender de expressa avaliação pelo juiz ou relator, quando presentes (i) a probabilidade de provimento do recurso ou (ii) sendo relevante a fundamentação, se houver risco de dano grave ou de difícil reparação (parágrafo 1º do artigo 1.026 do CPC). Assim, não confundir interrupção do prazo com suspensão da decisão, realidades que podem coexistir.
Devem estar presentes os pressupostos[12] intrínsecos (cabimento, legitimidade recursal e interesse recursal) e extrínsecos gerais dos recursos (inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, tempestividade, regularidade formal), à exceção do preparo (descabido nesta espécie), a serem aferidos em juízo de admissibilidade[13]. Não ultrapassada essa fase preliminar, não há falar julgamento do mérito recursal — e consequente interrupção do prazo. A sucumbência, porém, requisito recursal clássico, há de ser entendida de forma ampla. Isso porque mesmo a parte vencedora pode demandar integração do julgado para bem delimitar o bem da vida obtido. Basta imaginar, por exemplo, um juízo de procedência sem enfrentar, porém, a liquidez discutida na causa (artigo 491 do CPC).
Entendimento anterior ao CPC assentava haver "(...) efeito interruptivo mesmo que os embargos de declaração não sejam conhecidos, a exceção dos casos marcados pela intempestividade" (STJ, AgRg no AG 908.561/SP, 4ª T, rel. min. João Otávio Noronha, j. 8/4/2008, DJe 28/4/2008). Ou seja, os embargos declaratórios intempestivos não teriam efeito interruptivo. Acerca do assunto, há convergência da jurisprudência do STJ[14] e da doutrina[15] atuais.
Porém, a análise mais detida aponta linhas mais inflexíveis tanto do STF quanto do STJ, que assentam que a interposição de embargos de declaração incabíveis, por si só, mesmo que tempestivamente, também não gozam de efeito interruptivo[16]. Outra linha decisória aponta para o não conhecimento dos declaratórios também na segunda interposição protelatória[17].
O não conhecimento dos embargos declaratórios gera a drástica repercussão de não se ver interrompido o prazo de outros recursos. É, portanto, medida de índole excepcional, a ser aplicada pelo Judiciário cum grano salis.
A rejeição ou a inadmissão não gera idêntico raciocínio, ao menos no caso dos embargos para fins de prequestionamento da matéria constitucional ou infraconstitucional, consoante expresso no artigo 1.025 (consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade). Dito preceito, inovação do CPC em vigor, visa garantir que o não enfrentamento dos normativos prequestionados pelo órgão a quo não mais impeça a admissibilidade dos recursos excepcionais (especial e extraordinário). Parecem, superadas, assim, as súmulas 282 ("É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada") e 356 do STF ("O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento"), bem como a 211 ("Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo") e a 320 do STJ ("A questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamento").
A sistemática de punição ao embargante protelador deve se dar, como regra, na forma do artigo 1.026 do CPC, mediante decisão fundamentada. Assim, na primeira interposição protelatória, cabível fixação de multa em valor não excedente a 2% do valor da causa (parágrafo 2º do artigo 1.026 do CPC). Na reiteração, o valor da multa será elevado para até 10% do valor da causa, sendo que a interposição de qualquer recurso ficará condicionada ao depósito prévio do valor da multa, à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da Justiça, que a recolherão ao final (parágrafo 2º do artigo 1.026 do CPC). Não serão admitidos novos embargos de declaração se os dois anteriores houverem sido considerados protelatórios (parágrafo 2º do artigo 1.026 do CPC). Essa técnica de repressão aos embargos protelatório, evidentemente, deve preceder ao simples não conhecimento do recurso — medida excepcional. Primeiro, pela previsão legal clara. Segundo, porque não acarreta a drástica ausência de interrupção dos prazos. A eventual ausência de cumprimento do requisito da alegação do vício da decisão há de ser reparada à luz do parágrafo único do artigo 932 do CPC, sem o que não poderá deixar de ser conhecido o recurso — ainda que, no mérito, seja-lhe negado provimento.
Daí porque permite-se concluir: a) os embargos de declaração têm fundamentação vinculada; b) para seu conhecimento, basta a alegação dos vícios previstos no artigo 1.022 do CPC; c) a interposição interrompe o recurso para todas as partes — e mesmo terceiros — do processo; d) o regime de repressão aos embargos protelatórios é preferencial ao simples não conhecimento dos embargos de declaração; e) aos embargos deficientes na alegação dos vícios do artigo 1.022 do CPC deve ser oportunizada a correção (parágrafo único do artigo 932), antes do não conhecimento; f) em hipóteses excepcionais, porém, como intempestividade, claro descabimento dos embargos declaratórios e segunda interposição protelatória, tem a jurisprudência superior desde logo aplicado juízo negativo de conhecimento.

[1] Em outros momentos, já nos dedicamos ao regime de fundamentação instituído pelo novo CPC: a) ALVES, Francisco Glauber Pessoa. Fundamentação exauriente do novo CPC não se aplica a juizados especiais. Disponível em: «http://www.conjur.com.br/2017-mai-14/francisco-glauber-fundamentacao-exauriente-nao-aplica-juizados». Acesso em 12/6/2017; b) ALVES, Francisco Glauber Pessoa. Fundamentação judicial no novo Código de Processo Civil. Revista CEJ. Brasília: Conselho da Justiça Federal, v. XIX, p. 58-77, 2015.
[2] MARINONI, Luiz GUILHERME et al. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: RT, 2015, p. 953.
[3] STF, 2ª. T., ARE 949000 AgR-ED-ED/MS, rel. min. Ricardo Lewandowski, DJe-210 18/9/2017; STJ, 3ª. T., EDcl no AgRg nos EDcl no AREsp 508182/SC, rel. min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 1º/9/2017.
[4] STF, 2ª. T., MS 31744 AgR/DF, rel. min. Gilmar Mendes, DJe-170 3/8/2017.
[5] AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC. São Paulo: RT, 2015, p. 1.040.
[6] STF, 2ª. T., RE 1032624 AgR-ED/RS, rel. min. Ricardo Lewandowski, DJe-193 30/8/2017.
[7] “Numa resenha bem apertada, o juízo de admissibilidade dos embargos de declaração se fixa no preenchimento dos pressupostos extrínsecos e intrínsecos do recurso, levando-se em consideração, ainda, as suas peculiaridades: (a) análise da sucumbência, apenas de natureza formal; (b) verificação se na peça recursal houve a necessária indicação do(s) defeito(s) do ato judicial, em confronto com as previsões positivadas de cabimento dos embargos de declaração – arts. 1.022 e 1.023 do CPC). Satisfeitas tais exigências, os embargos de declaração deverão ser conhecidos” (TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER et al. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 2268). Outros recursos de fundamentação vinculada mais conhecidos são o extraordinário e o especial, somente cabíveis, respectivamente, nas hipóteses dos artigos 102, III, e 105, III, ambos da Constituição Federal.
[8] MARINONI, Luiz GUILHERME et al. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: RT, 2015, p. 958.
[9] MARINONI, Luiz GUILHERME et al. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: RT, 2015, p. 955.
[10] TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER et al. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 2.285.
[11] ARRUDA ALVIM, Angélica et al. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 1.190; TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER et al. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 2.285.
[12] WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. São Paulo: RT, 2016, p. 474-485.
[13] TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER et al. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 2.269.
[14] STJ, 4ª. T., EDcl no AgInt nos EDcl no REsp 1449488/GO, rel. min. Luis Felipe Salomão, DJe 4/9/2017.
[15] NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 2.139; TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER et al. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 2285.
[16] STF, 1ª. T., ARE 964742 AgR/SP, rel. min. Roberto Barroso, DJe-231 28/10/2016.
STJ, 3ª. T., AgInt no AREsp 1075172/RS, rel. min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 15/8/2017.
[17] STJ, 3ª. T., EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp 881843/GO, rel. min. Moura Ribeiro, DJe 22/8/2017.

terça-feira, 29 de maio de 2018

Um Absurdo!!!

DataCodDescriçãoComplemento
28/05/2018 14:00:00 172155A TURMA, À UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO À APELAÇÃOdo Autor
17/05/2018 12:31:00 210501PAUTA DE JULGAMENTO PUBLICADA NO e-DJF1DO DIA 17/05/2018 - DISPONIBILIZADA EM 16/05/2018 (PÁG 2868/2920)
15/05/2018 15:05:29 190100INCLUIDO NA PAUTA DE JULGAMENTO DO DIA28/05/2018
07/05/2018 16:34:00 70901CONCLUSÃO PARA RELATÓRIO E VOTO
07/05/2018 16:32:00 221100PROCESSO RECEBIDONO(A) GAB. DF NOVÉLY VILANOVA
04/05/2018 17:37:06 220350PROCESSO REMETIDOPARA GAB. DF NOVÉLY VILANOVA
04/05/2018 12:33:24 180200PETIÇÃO JUNTADAnr. 4466970 PETIÇÃO
27/04/2018 11:39:00 221100PROCESSO RECEBIDONO(A) OITAVA TURMA ARM 08/E
27/04/2018 10:48:00 220350PROCESSO REMETIDOPARA OITAVA TURMA - REQUISITADO PARA JUNTAR PETIÇÃO
25/04/2018 18:55:00 240200PROCESSO REQUISITADOPARA JUNTAR PETIÇÃO
06/11/2017 14:08:00 70901CONCLUSÃO PARA RELATÓRIO E VOTO
06/11/2017 14:06:00 221100PROCESSO RECEBIDONO(A) GAB. DF NOVÉLY VILANOVA
31/10/2017 18:43:06 220350PROCESSO REMETIDOPARA GAB. DF NOVÉLY VILANOVA
31/10/2017 18:00:00 10100DISTRIBUIÇÃO AUTOMÁTICAAo DESEMBARGADOR FEDERAL NOVÉLY VILANOVA

quinta-feira, 24 de maio de 2018

A Assepsia Social em Face das Violações Constitucionais

       A Assepsia Social em Face das Violações Constitucionais




INTRODUÇÃO

Este trabalho de conclusão de curso versa acerca da temática: A Assepsia Social em Face das Violações Constitucionais; tem como objetivo geral, analisar as usurpações que acometem a norma constitucional e os reflexos dos atos inconstitucionais na sociedade brasileira. Não obstante, questiona-se as falácias de um sistema capitalista inumano, de visão neoliberal. De acordo com Queiroz (2005), “é a Constituição que delineia o perfil do Estado, assinalando os fundamentos, objetivos e princípios basilares (particularmente, arts. ao da CF) que vão governar a sua atuação”. A luz dos princípios constitucionais, a sociedade chama atenção para a gravidade e exacerbação das prisões, sobretudo das classes menos favorecidas - composta por negros e pobres – que pagam pela ausência de políticas públicas, (o mínimo constitucional de garantia de subsistência).
Desta forma, a maior gravidade que circunda essa problemática é a participação do Estado que reproduz o nefasto modelo norte-americano, face ao crescimento vertiginoso da violência criminal, caracterizado como sendo o maior problema das grandes cidades, diante do agigantamento da pobreza e as desigualdades sociais. A política de criminalização da miséria dá-se por meio de um processo brutal de marginalização. Por um lado, nada se faz para acabar com a miséria; de outro, faz-se de tudo para acabar com o miserável.
Com isso, a desumanização leva à delinquência. Daí chega-se a conclusão de que a reincidência criminal se justifica diante do fato de que, desumanizado, só resta ao indivíduo perder-se na contramão da sociedade. O Estado, mais uma vez, mostra-se ineficiente e omisso, visto que, não cria políticas de ressocialização que possibilite a reintegração desses sujeitos. Neste contexto, entende-se que as prisões além de não ressocializar, desumaniza. Na prática, o Estado reprime – via de regra os marginalizados - que são empilhados em presídios e penitenciárias, - verdadeiros campos de concentração. Ali, miséria, sangue e mortes, onde não há luz, ar, acomodação adequada e até mesmo alimentação e assistência médica; como se não bastasse, ainda há mais violação dos direitos humanos – tratamento hostil e violento dos agentes penitenciários.
Assim sendo, o tema aborda questões sociais de alta magnitude que ferem princípios constitucionais de forma gritante, e urge por parte do “Estado Democrático de Direito”, posicionar-se quanto a uma política criminal que, antes de tudo seja garantista, obedecendo a nossa tão festejada Constituição da Republica Federativa do Brasil. Conforme Queiroz (2005) o garantismo: “[...] constitui uma técnica de tutela capaz de minimizar a violência e de maximizar a liberdade, como instrumento de defesa dos direitos fundamentais”.
Para chegar-se às conclusões aqui elencadas, foram realizados estudos de obras diversas ao longo do curso e de outras específicas para a complementação do conhecimento acerca da temática.
Este artigo será desenvolvido em partes, onde cada uma versará a respeito de determinado tópico referente ao assunto principal. No primeiro momento abarcar-se-á a despeito da tolerância zero e dos fenômenos neoliberais, e das violações aos direitos humanos. A seguir, uma breve colocação sobre os Princípios Constitucionais, quando se versará a respeito das disposições constitucionais. Por conseguinte, serão apresentados os demais aspectos inerentes ao contexto.
MODELO U.S.A. DE TOLERÂNCIA ZERO.
Sem entender o neoliberalismo ou a política econômica neoliberal, importada dos Estados Unidos, é impossível encontrar-se explicações para tanta violência e assassinatos. Neste Brasil, onde cresce a violência criminal, as disparidades sociais são tamanhas que não se consegue, diante da pobreza de massa, conter a fúria por parte daqueles que lhes são negados acesso aos bens de consumo, tendo por causa a falta de políticas públicas eficazes que proporcionem ao cidadão condições existenciais.
Enfim, o modelo neoliberal ganhou espaço no cenário político internacional. Introduzido nos Estados Unidos por Ronald Reagan; Reno unido, Margaret Thatcher; na Alemanha, Helmut Kohl. Aplicado, no Brasil, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, e que se alastra até os dias atuais.
Segundo Wacquant (2001):
Na ausência de qualquer rede de proteção social, é certo que a juventude dos bairros populares esmagados pelos pés do desemprego e do subemprego crônicos continuará a buscar no “capitalismo de pilhagem” da rua (como dirá Max Weber) os meios de sobreviver e realizar os valores do código de honra masculino, já que não consegue escapar da miséria no cotidiano.
Se não bastassem todas as formas de crueldade causadas pelo neoliberalismo econômico, de abandono e negação do ser humano, diante de políticas sociais desastrosas, esse sistema genocida consegue desumanizar, torturar e matar todos aqueles que não se submetem ao silêncio e ou responsabilização de suas desgraças por uma vida de miséria e sofrimento causados por um Estado ditatorial que retorna aos idos de 1964 à prática de todas as mazelas humanas para defender interesses das elites.
A violência estatal é tão gigante que não cabe neste texto sequer analisar as funções do direito Penal, visto que o pânico causado pelas polícias é tamanho que não se pode falar em teorias legitimadoras do Direito penal, diante de um Estado que abandona e mata, rasgando os Princípios Constitucionais.
Conforme Wacquant (2001):
Em suma, a adoção das medidas norte-americanas de limpeza policial das ruas e de aprisionamento maciço dos pobres, dos inúteis e dos insubmissos à ditadura do mercado desregulamentado só irá agravar os males de que já sofre a sociedade brasileira em seu difícil caminho rumo ao estabelecimento de uma democracia que não seja de fachada, quais sejam, "a deslegitimação das instituições legais e judiciárias, a escalada da criminalidade violenta e dos abusos policiais, a criminalização dos pobres, o crescimento significativo da defesa das práticas ilegais de repressão, a obstrução generalizada e o princípio da legalidade e a distribuição desigual e não equitativa dos direitos do cidadão". A despeito dos zeladores do Novo Éden neoliberal, a urgência, no Brasil como na maioria dos países do planeta, é lutar em todas as direções não contra os criminosos, mas contra a pobreza e a desigualdade, isto é, contra a insegurança social que, em todo lugar, impele ao crime e normatiza a economia informal de predação que alimenta a violência.
Diante desse modelo “econômico neoliberal” onde o Estado é eminentemente “policial e penitenciário”, se opõe a sua verdadeira atribuição que é a de ser um “Estado econômico e social”. O que se observa é a causa da escalada generalizada da insegurança direta e indireta em todo o país. Daí a presença de um Estado penal para conter as desordens motivadas por uma economia desastrosa, pela falta de alcance social do trabalho assalariado, e pela miséria relativa e absoluta de um contingente do proletariado urbano que faz aumentar, desta forma, a intervenção do aparelho policial e judiciário estritamente seletivos.
Diante do exposto, pode-se defender que o modelo “made in U.S.A.” é em sua essência contrário ao estabelecimento de uma sociedade pacífica e democrática, onde as garantias sociais devem ser a base de toda sociedade, e o princípio da igualdade respeitado e cumprido para que seja preservada a paz social.
O Estado policial e o excesso de punir.
O estado policial surge da necessidade de o neoliberalismo econômico conter a fúria dos oprimidos. Logo, fugindo o Estado da sua responsabilidade social, que é a de respeitar os princípios constitucionais e promover os Direitos e Garantias Sociais à nação, cria uma classe social denominada miseráveis, tornando-a substrato da raça humana. Sendo assim, o Estado que deve sociabilizar impele ao povo uma condição espúria de miséria. Violando assim, o Princípio do Excesso que está vinculado à limitação do poder.
Explicita Queiroz (2005) que:
Nas sociedades contemporâneas, em que, como regra, o papel do Estado e de suas instituições estão previamente definidos pelas Constituições promulgadas, as quais, por sua vez, estabelecem os pressupostos de criação, vigência, e execução do resto do ordenamento jurídico, convertendo-se assim, em elemento de unidade, e em cujos textos já se acham constitucionalizados os direito e garantias fundamentais,(entre nós, CF, art..), o papel do direito, e em particular, do direito penal, está, por consequência, e em linhas gerais, já constitucionalmente definido, Saber quais as funções que se devem creditar ao direito penal implica, assim, saber previamente, as funções constitucionalmente assinaladas ao Estado. O perfil do direito penal, - autoritário ou democrático – depende, portanto, da conformação político- constitucional que se lhe dá (ao Estado). Afinal, as funções do direito e do Estado são, em última análise, uma só e mesma função: possibilitar a convivência social, proporcionar o exercício da liberdade, condicionar e controlar a violência. Enfim, definir, ou redefinir, os fins e os limites do próprio Estado. E o faz a Constituição Federal, explicita ou implicitamente, fixando as bases e os limites do direito penal, que é o braço armado da Constituição nacional. Os limites do direito penal são limites do Estado.
O emprego de um meio desnecessário para se atingir determinado objetivo, como por exemplo, a violência policial, prisões ilegais, torturas para confessar crimes, exacerbação das prisões, e toda forma de violência policial caracteriza em abuso de autoridade, ou abuso de poder.
Segundo (1985 apud PINHEIRO):
Cujos estudos ultimamente tem se concentrado nos problemas da violência institucionalizada contra classes populares, diz que no Brasil a polícia, a lei e a justiça se pautam pela opção preferencial pelos pobres: as classes trabalhadoras e desempregadas compõem as populações das prisões. Ao mesmo tempo adverte para as políticas públicas de recessão postas em prática pelo governo, que só fazem aumentar a criminalidade. A resposta que a sociedade brasileira tem dado ao problema é deixar mofar os condenados, submetidos ao brutal arbítrio dos funcionários penitenciários que consideram o preso como objeto e não como pessoa.
Está bem claro que no Direito penal brasileiro há proibição do excesso, pois o agente que excede a sua conduta e comete ato ilícito, termina por ir além do proibido; tais atos praticados caracterizam-se em tortura, prisões desnecessárias, humilhações e outras formas de degradação humana.
Consoante Beccaria, no livro Dos Delitos e das Penas, chama-se a atenção quanto ao excesso de punir, e o mesmo assevera que: “é uma barbárie consagrada pelo uso da maioria dos governos aplicarem a tortura a um acusado enquanto se faz o processo, quer para arrancar dele a confissão dos crimes...”
É de se observar que na atualidade é comum em delegacias de polícias usarem sacos plásticos para asfixiar o acusado ou mergulhar a cabeça do suspeito em túnel de água que na maioria das vezes desmaiam e até morrem, no intuito de fazer com que confessem crimes, ou até mesmo assumam a autoria de crimes não praticados.
Beccaria afirma ainda que: “Direi ainda que seja monstruoso e absurdo exigir que um homem seja acusador de si mesmo, e procurar fazer nascer à verdade pelos tormentos, como se essa verdade residisse nos músculos e nas fibras do infeliz.” Sabe-se que o Ordenamento Jurídico Pátrio não autoriza a tortura, entretanto, na prática o comportamento medieval de policiais que maculam a instituição, Estado Brasileiro.
O Código Penal brasileiro, art. 23, parágrafo único, dispõe que o agente responderá pelo excesso culposo ou doloso nos estados de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do direito.
Por excesso entende-se os meios empregados desnecessariamente para se atingir um objetivo. Pior ainda, quando o suposto objetivo é inexistente, e o abuso e a violência para se extrair confissões de culpa caracterizam, sim, abuso de poder.
Se a conduta é digna de punição, gera para o Estado a obrigação, ou seja, o dever de punir, de impor a sanção penal. Se a conduta não é punível dar vazão a violência e exacerbação da conduta do agente responsável pela ordem estatal. Desta forma, respondendo o agente público, administrativa, civil e penalmente.
As penas aplicadas devem obedecer ao Princípio da Proporcionalidade, respeitando o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Comenta Celso Antonio Bandeira de Melo (2007) que: “A administração pública não deve atuar jamais servindo-se de meios mais enérgicos que os necessários à obtenção dos resultados pretendidos pela lei, sob pena de vício jurídico que acarretará responsabilidade da administração.”
Logo, o Estado Policial que, indiscriminadamente, prende o cidadão, tortura e mata, foge as prerrogativas constitucionais de direitos e garantias inerentes aos cidadãos que são marginalizados, ferindo frontalmente ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, e de todos os demais princípios que regem à Constituição Federal.
Ensina Beccaria que é outorgado àqueles que lhe são encarregados de fazer a lei, um direito totalmente inverso à finalidade a que se destina a sociedade, que é a proteção (segurança) pessoal. Repudia o filósofo as prisões ilegais, retirando dos cidadãos a sua liberdade sobre pretextos frívolos. Para que se posso apreender alguém a autoridade policial não pode impor ou valer-se de práticas delituosas, sob pena de responsabilização criminal.
É a lei, do ponto de vista processual, que determina quais são os meios e porque indícios delituosos o acusado pode ser preso e submetido a interrogatório; e não delegados de polícias e seus malgrado inquéritos policiais, mancomunados com seus subordinados e (x9), em cometimento de abuso de poder, praticam grandes absurdos deixando as classes desfavorecidas humilhadas. Sob as suas vontades, praticam abusos, prisões ilegais, torturas, homicídios e crimes inesquecíveis para aqueles que sofrem com a violência do poder em nome do Estado.
Grupos de extermínio.
Entende-se por grupos de extermínios aqueles que integram organizações criminosas. São ainda chamados de matadores de aluguel que atuam nas periferias das médias e grandes cidades brasileiras e que certamente tem ligações com as polícias. A ação desses grupos consiste em um dos principais fatores de violação dos direitos humanos e de grande ameaça ao Estado Democrático de Direito.
Uma das principais fontes que violam os direitos humanos, e de grande ameaça ao Estado Democrático de Direito, é a ação dos Grupos de Extermínio. Como é sabido, essa espécie de banditismo age nas periferias dos grandes centros urbanos. Usam como estratégia a ocultação de cadáveres para escapar da ação da justiça. Os mais audaciosos exibem de público sua perversidade como forma de ufanismo e poder. Eles nascem em consequência da falta e perda de crédito na justiça e segurança pública. Que é pior, na certeza da impunidade, em consequência da incapacidade estatal através dos seus órgãos gestores em dar respostas imediatas ao equacionamento dos conflitos.
O conluio entre policiais civis e militares para “limpar” os bairros onde mora a miséria é uma ação desastrosa comandada por bandidos sem que o Estado se posicione em relação a tal comportamento teratológico e assustador que ameaça todos aqueles que, por ventura, venham a denunciá-los; quando denunciados, também matam suas vítimas e ainda por cima são ignorados pelas autoridades competentes pelos crimes praticados.
E assim, em estado de pânico vive-se no Brasil, onde o maior bem jurídico inerente ao ser humano encontra-se a mercê a vontade desses grupos que, ao cismar com o cidadão, atira e mata alegando resistência. Alegam que estão a serviço da “ordem”, que onde o Estado não chega, eles chegam, passando-se por grupos de “assepsia social”, ora recebendo de comerciantes para eliminar os filhos da miséria, ora alegando que tem ordem para matar.
Segundo o Deputado Federal Miranda: “A ação dos Grupos de Extermínios no Brasil o Congresso Nacional passou a dar uma devida atenção à ação dos grupos a partir do ano de 1993 após instalar CPI destinada a investigar o extermínio de crianças e de adolescentes, quando o problema fora denunciado. Aquela época, vários projetos foram desenvolvidos, entre os quais se destacou o projeto do Deputado Helio Bicudo que visava findar a impunidade de policiais que integravam os grupos de extermínio, aprovado pela Câmara dos Deputados e com expressiva modificação no Senado.
Em síntese, a lei transfere o julgamento de crimes cometidos por policiais militares, da justiça militar para a alçada da justiça comum. A comissão de direitos humanos da Câmara Federal foi instalada em 1995, de lá até os dias atuais tem chegado várias denúncias sobre os grupos de extermínio a comissão enviou os dossiês ao Ministro Íris Resende, e ao Conselho de Defesa dos Direitos Humanos – CDDH. Tais dossiês contendo informações sobre violência praticadas por grupos de extermínio nos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Ceará, Bahia e Mato Grosso do Sul.
Os crimes predominantes são: homicídios, torturas, ameaças, mal tratos e desaparecimento de pessoas. Os casos eram conhecidos das autoridades estaduais. O estado da Bahia é destaque. Os grupos de extermínio parecem estar disseminados por todo o país. Os casos que foram objetos de denúncias perante à CDH e que constam das providências são oriundas da Bahia, Rio Grande do Norte, mato Grosso, mato grosso do Sul, Amazonas, Pará, Paraíba, ceará e Espírito Santo.
Os grupos de extermínio se formam a partir da conveniência de empresários e comerciantes que se unem com o objetivo de recrutar assassinos de aluguel, quase sempre entre policiais civis e militares, com a finalidade de fazer “limpeza urbana”, ou assepsia social. Este fator se agrava a partir do momento em que estes sujeitos passam a ter apoio populacional devido à descrença nas entidades oficiais. Em tese, a sociedade descrente somado ao Estado opressor acarreta em barreiras com proporções alarmantes e os resultados, por sua vez, não poderia ser outro: violência. Desta forma, nutrem a prática de justiça com as próprias mãos.
A assepsia social, sociologicamente estudada por cientistas políticos e sociais, é tudo aquilo que “eles” chamam de “limpeza urbana”, “limpeza étnica” ou “limpeza social”. Este processo genocida se alarga por toas as unidades da federação. Em alguns estados tem-se conhecimento de que há conivência das Secretarias de Segurança Pública e dos respectivos governantes. Na “cidade maravilhosa”, conforme narra Rodrigo Pimentel2: “A milícia é bem pior que o tráfico”.
Gonçalves Filho (2010)
Narra o ex-militar que surgiu no cenário midiático em 1999, ao aceitar ser um dos personagens no documentário noticias de uma guerra particular, de João Moreira Salles e Kátia Lund, que tentava dar uma visão panorâmica do crime no Rio, mostrando as diversas pontas do problema. Autor da frase que dá titulo ao documentário, Pimentel era aponta final da policia, responsável pelo “contato direto” como o tráfico. A entrevista em questão foi concedida sem a autorização do comando da PM. Não há sequer um esgar de esperança nas falas do ainda então policial em todo o filme. Pelo contrário, ali só parece enxergar a falta de sentido para a função cotidiana do sobe e desce da favela. Continuando a reportagem o ex-capitão do BOPE, Rodrigo Pimentel afirma: “vou ter todo o cuidado ao me expressar, porque eu tenho absoluta certeza de que a milícia é algo bem pior que o tráfico. Pelo motivo um: de estabelecer a ditadura territorial armada. Motivo dois: de ter simbiose com o poder do Estado. Então, isso torna a milícia insuportavelmente pior que o narcotráfico. Porque traficante não tem cordão umbilical com policia, não. Têm a parada de dinheiro, de acerto, essas coisas todas. Mas o miliciano, não. O miliciano, ele tem lá um amigo dele, que às vezes é comandante de batalhão, subcomandante de batalhão...”
*Ex-capitão do BOPE – batalhão de operações especiais da polícia do Rio de Janeiro.Em entrevista concedida ao jornalista Jaime Gonçalves Filho, Revista Brasileiros.
Após conhecer-se às atrocidades que perpassam os bastidores da segurança pública do país, através de uma autoridade que vivenciou e participou do processo de assepsia social, invadindo favelas no meio da noite, deixando corpos de bandidos e inocentes no chão. Pode-se observar a triste realidade em que se encontram as classes desprivilegiadas deste país. Vivem em pânico, sofrendo constantes ameaças, esmagadas pelo terror. De um lado, pelas milícias que cobram serviços básicos, como venda de gás e a maldita “taxa de proteção”, que persegue e mata. De outro lado, o narcotráfico que destrói famílias e provoca a delinquência. Quando não matam, roubam e praticam as piores atrocidades. E, é neste contexto que vive o povo brasileiro mergulhado em insegurança. O Estado, por sua vez, descumpre os Princípios Constitucionais que deveriam nortear e garantir um convívio social justo e igualitário. Vive-se a pior das fases de insegurança no Brasil. A paz e a tranquilidade transformaram-se em contos de fadas.
Qual remédio jurídico a ser aplicado, já não se sabe. Diante da impunidade, fica o cidadão órfão sem direitos e garantias em um Estado que perde as rédeas do poder. A população, no geral, segue um destino incerto, visto que o problema é de tamanha envergadura que se alarga ao passo que o Estado mergulha em desordens.
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS A ASSEPSIA SOCIAL
Seguindo o norte dos princípios constitucionais e ou fundamento da norma jurídica que são verdades jurídicas universais, esses princípios constitucionais vislumbrados em nossa Magna Carta e adiante explícitos pode-se entender a forma de como estão conduzindo a nação brasileira. A tendência irreversível é de chegar-se a uma convulsão social, caso o Estado não faça prevalecer à ordem. Desta forma, diante do que reverbera os princípios constitucionais é de nota-se a gravidade do problema tanto do ponto de vista jurídico quanto a omissão do Estado em relação ao direito e dever de punir. Indo mais além, urge a necessidade de se rever o modelo econômico neoliberal instituído no Estado brasileiro a fim de que possa a nação viver sob a égide de m Estado Democrático de Direito.
Princípio da legalidade
“Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei”, preceitua o art. , II da Constituição Federal de 1988. Por este princípio, entende-se que somente por meio normativo, devidamente elaborado, de acordo com as regras do processo legislativo constitucional, é possível criar-se obrigações. Não obstante, que esse princípio visa controlar o poder arbitrário do Estado. Parafraseando Bastos, o princípio da legalidade está mais próximo de uma garantia constitucional do que de um direito individual, uma vez que ele não tutela, de forma específica, um bem da vida; mas garante ao particular a prerrogativa de afastar as obrigações que lhe sejam impostas por outro meio que não seja a lei.
As leis constitucionais têm supremacia absoluta sobre as ordinárias. Conforme lições de Azambuja: O princípio da constitucionalidade das leis é, em síntese, o de que, sendo a Constituição a lei básica e fundamental, todas as outras leis devem ser conformes aos seus preceitos e ao seu espírito. Toda a lei ordinária que, no todo ou em parte, contrarie ou transgrida um preceito da Constituição, no todo ou em parte, diz-se inconstitucional, tem um vício que a anula e deve ser declarada tal pelo poder competente, que é o Judiciário.
Para Batista: “é a base estrutural do próprio estado de direito, e também a pedra angular de todo direito penal que aspira à segurança jurídica.” Importa ressaltar que o princípio da legalidade além de excluir as penas ilegais, determina penas legais, ou seja, é a função de garantia de constituição desse princípio que é a expressividade maior do Estado Democrático de Direito.
Princípio da dignidade da pessoa humana
A Constituição brasileira estatui, expressamente, em seu art. , inciso III, que o princípio da dignidade da pessoa humana é postulado fundamental do Estado Social e Democrático. Conforme ensinamento de Regis Prado, o princípio da dignidade da pessoa humana, por seu caráter deverá ser plasmado em todo ordenamento jurídico positivo.
Como preleciona Oliveira (2004):
É a partir da Revolução Francesa (1789) e da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, no mesmo ano, que os direitos humanos, entendidos como o mínimo ético necessário para a realização do homem, na sua dignidade humana, reassumem posição de destaque nos estados ocidentais, passando também a ocupar a preâmbulo de diversas ordens constitucionais, como é o caso, por exemplo, das Constituições da Alemanha (arts. 1º e 19) da Austrália (art. 9º que recebe as disposições o Direito Internacional), da Espanha (art. 1º, e arts. 15 ao 29), da de Portugal (art. 2º) sem falar na Constituição da França, que incorpora a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
O princípio da dignidade da pessoa humana veda as penas que lesionam o ser humano, tais como: pena de morte, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis (art. , XLVII da CF/88). Esse princípio garante que o Estado não aplique sansões que possam atingir a dignidade da pessoa humana ou que lesionem a sua constituição física e psíquica.

Zaffaroni e Pierangeli (2004) advertem: “[...] o princípio da humanidade é o que dita a inconstitucionalidade de qualquer pena ou consequência do delito que crie um impedimento físico permanente, como também qualquer consequência jurídica indelével do delito”. O princípio da dignidade da pessoa humana precisa ser analisado para a ressocialização do indivíduo, ou seja, como ensina Bittencourt, (2002): “o princípio da humanidade recomenda que seja reinterpretado o que se pretende com reeducação e ‘reinserção social’, uma vez que se forem determinados coativamente emplacarão atentado contra a pessoa como ser social”.
O Brasil é um Estado Democrático de Direito, nesse sentido, Capez (2009, p.06), explicita:
Verifica-se o Estado Democrático de Direito não apenas pela proclamação formal da igualdade entre todos os homens, mas pela imposição de metas e deveres quanto à construção de uma sociedade livre, justa e solidária; pela garantia do desenvolvimento nacional; pela erradicação da pobreza e da marginalização; pela redução das desigualdades sociais e regionais; pela promoção do bem comum; pelo combate ao preconceito de raça, cor, origem, sexo, idade e quaisquer outras formas de discriminação (CF, art. , I a IV); pelo pluralismo político e liberdade de expressão das ideias; pelo resgate da cidadania, pela afirmação do povo como fonte única do poder e pelo respeito inarredável da dignidade humana.
Entende-se que a dignidade da pessoa humana é o valor personalíssimo, que não cabe a ninguém, é o valor que se encerra no próprio homem. Nem mesmo o Estado pode ultrapassar as barreiras de sua integridade moral, física, e espiritual tão ameaçada em nosso país por grupos de extermínio e esquadrões da morte. Ao homem cabe o respeito pela sua identidade e pela integridade através da libertação de sua capacidade humana, ou personalidade. Para tanto, cabe ao Estado fazer prevalecer tais prerrogativas Constitucionais permitindo-lhes oportunidades de trabalho e garantia de condição de sobrevivência mínima. Depreende-se que há uma autonomia vital da pessoa humana que vai além do Estado. Assim, a Constituição Federal dispõe que “ninguém será submetido a tortura nem ao tratamento desumano e degradante”, conforme expõe o art. , III.
A dignidade da pessoa humana é a marca que define o ser, assim sendo, cabe ao homem à titularidade de direitos que devem, acima de tudo, ser respeitados pelo Estado e por todos os seus pares. Visto que é um predicativo que pertence a todos os seres humanos é indiscutível cuidar-se de uma fração da sociedade em detrimento do seu todo. Visto deste ângulo, estar-se-ia ferindo o princípio da isonomia, uma vez que todos são iguais perante a lei.
Segundo Leonardo Boff, quando do ultraje da dignidade: Nada mais violento que impedir o ser humano de se relacionar com a natureza, com seus semelhantes, com os mais próximos e queridos, consigo mesmo e com Deus. Significa reduzi-lo a um objeto inanimado e morto. Pela participação, ele se torna responsável pelo outro e concria continuamente o mundo, como um jogo de relações, como permanente dialogação.
O homem, quando falta dignidade, passa a ser coisificado, violando a sua própria característica de pessoa humana. Assim todo ato que promova a violação da dignidade da pessoa, atinge o cerne da sua condição de ser humano, promovendo-lhe a desrealização. Desta forma, fere também o princípio da dignidade.
Princípio da cidadania.
Nos termos do art. , inciso II da Constituição Federal de 1988, a cidadania é um dos fundamentos do Estado brasileiro. Portanto, o governo tem o dever de estabelecer mecanismo de isonomia entre cidadãos. Contudo, quando se trata de abuso de poder, percebe-se que a classe menos favorecida sofre constantes violações e ameaças por parte da Polícia Estado. Fica evidente tal violação do Princípio da Cidadania quando a polícia bate e depois pede informações.
Assevera Wacquant (2001) que:
O deslocamento selvagem da vídeovigilância nos locais e nos transportes públicos e a popularidade de que desfruta a piore a vigilância eletrônica, ao passo que tudo indica que ela tende a se sobrepor ao encarceramento, e não a substituí-lo, torna-se claro que esse desenvolvimento não deriva unicamente de uma “negação histórica” de uma potência patente perante a delinquência , que as autoridades admitem, alias, de bom grado através de suas estratégias de responsabilização dos cidadãos e de delegação de fato do controle do espaço público, como sugere o penalista David Garland. Elas exprimem uma tendência de fundo à expansão do tratamento penal da miséria, que, paradoxalmente, decorre, precisamente do enfraquecimento da capacidade de intervenção social do Estado e do abandono de suas prerrogativas diante da figura supostamente onipotente do “mercado”, isto é, a extensão da lei econômica do mais forte. E há razões judiciárias e carcerária da pobreza é tanto mais que provável e pronunciada quanto mais intensamente a política econômica e social implantada pelo governo do país considerado inspire-se em teorias neoliberais que levam a “mercantilização” das relações sociais, e quanto menos protetor desde o início seja o Estadoprovidência em questão.
O princípio da cidadania é essencial ao exercício do direito, ao acesso à justiça. Por isso, deve ser respeitado pelo Estado. Acredita-se que a sociedade para ser justa deve fincar-se sobre a égide deste princípio.
Princípio do juiz natural.
Na Constituição da Republica Federativa do Brasil, o princípio extraído da interpretação do inciso XXXVII, art. 5º, que preceitua “não haverá juízo ou tribunal de exceção”, e também da exegese do inciso LIII, que reza: “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente.”
Costuma-se dizer que, considerando o texto dado pela Carta magna, que juiz natural é somente aquele integrado de forma legítima ao poder Judiciário e com todas as garantias constitucionais e pessoais previstas na Constituição Federal.
O juiz natural é aquele previamente encarregado e competente para julgar determinadas demandas previstas abstratamente. Logo, somente são Juízos e Tribunais, aqueles que na Constituição nacional estão previstos como tal.
Assim, afirma José Celso Melo Filho, que somente os juízes, tribunais e órgãos jurisdicionais previstos pela CF se identificam ao juiz natural, princípio que se estende ao poder de julgar, também previstos em outros órgãos, como Senado, nos casos de impedimento de agentes do Poder Executivo.
O referido princípio deve ser interpretado em sua plenitude, de forma a não criação de Tribunais ou juízos de exceção, exigindo-se absoluto respeito Às normas que determinam competência do órgão julgador. Depreende-se de tudo quanto fora exposto que os grupos de extermínio além de desrespeitarem a Constituição no seu todo, há que observar que no Brasil não existe pena de morte, assim como devem respeitar a princípio do juiz Natural cumprindo o que está referenciado na Magna Carta.
Logo, ninguém tem o direito de julgar-se o senhor da razão. Em uma pátria socialmente organizada, onde os direitos e garantias constitucionais há que prevalecer diante o desrespeito e descumprimento de normas legais, grupos organizados na prática de atos terroristas agigantaram a criminalidade e, desta forma, desobedecem todos os princípios morais contidos na Constituição da República Federativa do Brasil, praticando atos abomináveis à margem da lei.
Há que responder os mesmos com rigor, e no mais, à medida de sua culpabilidade. Desta forma, repreendendo o banditismo à proporção da sua violência. É o único meio eficaz para se fazer barrar tantos atos delitivos que causam afronta à sociedade na tentativa de desmoralizar o Estado. Os grupos de extermínio, as organizações criminosas, violando todos os direitos constitucionais, cinicamente praticam barbáries furtando a tranquilidade pública. Julga e sentencia à sociedade em estado de guerra declarado. Julgando à margem da lei segue o banditismo praticando todos os tipos de atrocidades, desta forma, cabe ao Estado responder a todos àqueles que atentam prematuramente contra si; dar respostas efetivas à proporção da criminalidade.
Erradicação das desigualdades sociais.
O maior desafio para o Estado brasileiro é erradicar a pobreza e a marginalização social. Passo importante para o desenvolvimento dos direitos humanos. Eis que é imperioso conciliar o desenvolvimento com justiça social a fim de erradicar a pobreza e a marginalização; e reduzir as desigualdades sociais e regionais, conforme art. , III da Constituição Federal.
Entende-se que há necessidade de criar estratégias que venham a solucionar as desigualdades sociais e assim constituir uma sociedade mais justa e equitativa. Para isso, é preciso aumentar a capacidade de se gerar emprego e renda que possibilite aos cidadãos condições de subsistência.
O processo para se erradicar a pobreza, a marginalização e reduzir sistematicamente as desigualdades sociais e regionais têm uma ligação estreita com a realidade interna, com o país em relação a ele mesmo. Resumindo, tudo isso leva a crer que a República Federativa do Brasil deve erradicar, ou seja, desfazer, anular, destruir a pobreza do seu povo.
No entanto, qualquer sociedade organizada tem a convicção de que para sanar problemas como a violência crescente é preciso combater as suas raízes que, via de regra, têm relação estrita com a pobreza, muito embora esta não justifique aquela. Portanto, compete ao Brasil, como Estado organizado sobre os três pilares: Legislativo, Executivo e judiciário, desenvolver mecanismos de erradicação às desigualdades sociais e por conseguinte, haverá uma redução significante da violência e da criminalidade.
De nada adianta se impor regras de convivência social sendo que a população não dispõe de condições mínimas de sobrevivência. É preciso ter cuidado para não condicionar ao Direito Penal a função de correção social, quando na verdade não se consegue sequer controle social dada à gravidade das mazelas que empurram muitos sujeitos para a marginalidade.
Consoante Queiroz, (2005):
A norma penal, pois, não é o começo da socialização, mas a sua culminação. Não é todo o controle social, nem sequer é sua parte mais importante; é propriamente, como diz Muñoz Conde, a parte visível de um iceberg [...] o subsistema penal como um todo ocupa e há de ocupar, dentro do sistema social, um papel menor, secundário [...].
Não há como se negar a necessidade de uma reforma político-social em toda estrutura do país a fim de extirpar os agentes causadores da assepsia social implantada pelo próprio sistema estatal em decorrência das sua omissão ou ineficácia. Como se vê, não há outro meio de combater a violência senão findando a pobreza que assola a sociedade civil em massa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, conclui-se que a Assepsia Social em Face das Violações Constitucionais é um fenômeno enraizado nas entranhas do Brasil e que requer muitos esforços por parte das autoridades dos três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, se, se quer por fim a esta mazela que assola a sociedade civil deste país.
Conforme se vê, as violações aos Direitos Constitucionais Fundamentais geram uma série de outros problemas que afundam a população na miséria e na violência. Sobretudo, porque esta violação parte, antes de tudo, do próprio Estado que deveria ser o assegurador dos direitos individuais e coletivos. Em nome do Estado mata-se, oprime-se e tolhe-se o direito à vida ou a dignidade da pessoa humana. Em nome do Estado, sim, pois a omissão ou a falta de combate aos desmandos policiais configuram-no como agente direto, quando não, cúmplice do terror que atinge as esferas sociais menos favorecidas onde imperam a tirania e a crueldade.
No tocante aos problemas e as mazelas sociais que não justificam, mas explicam a violência no país, urge que o Estado desenvolva políticas públicas que gerem emprego e renda, afastando, assim, os seus cidadãos da marginalização. Isto é, desenvolver políticas internas que viabilizem o crescimento socioeconômico do país e, por conseguinte, combater as problemáticas concernentes à violação dos Direitos Humanos que assolam aos civis. Pois, somente um Estado justo e igualitário, em matéria financeira e moral, pode-se constituir dignidade e paz ao seu povo.
Por fim, é preciso que o Estado brasileiro encontre meios exequíveis e solucionáveis para a questão de ordem pública e segurança do cidadão. Em síntese, é necessário, tão somente que, respeitando a Constituição Federativa do Brasil, ponham em prática a ordem e o progresso.

Raimundo José Evangelista da Silva

Bacharel em Direito, FABAC – Faculdade Baiana de Direito – Lauro de Freitas, 2011.
Trabalho de conclusão de curso de pós-graduação apresentado a Uniasselvi, como requisito parcial para obtenção de Especialização em Advocacia Criminal, obtendo nota 8.50.
E-mail: evangelista.evangelistadasilva@gmail.com
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