quarta-feira, 16 de abril de 2014

Sexo anal: especialistas tiram dúvidas sobre a prática sexual

Sexo anal: especialistas tiram dúvidas sobre a prática sexual

Esclareça questões sobre hemorroidas, DSTs, sangramento e dor durante o sexo

Sexo anal causa hemorroidas? Sexo anal engravida? Qual o risco de contrair o vírus HIV? Essas e outras questões estão entre as maiores dúvidas de quem já pratica ou pensa em praticar a relação anal. Além dessas, também entram os cuidados com a higiene, há também o risco de doenças, a maneira adequada de fazê-lo e os mitos que rondam essa prática. Pensando nisso, conversamos com especialistas e tiramos as principais dúvidas sobre o sexo anal para que possa ser praticado com saúde. Confira: 

O sexo anal vai sempre doer?

Sexo anal aumenta o risco de transmissão da Aids, por isso a importância da camisinha
Não deveria. Se ocorrer dor em todas as relações, é sinal de que algo está errado. A especialista afirma que tomar certos cuidados evita a dor, como o uso de lubrificantes e estar com o corpo relaxado, sem tensões. "O casal deve estar em sintonia e confortável com a situação, garantindo o prazer do ato para as duas partes", afirma a ginecologista Sueli Raposo, do Laboratório Exame, em Brasília. "No caso das mulheres, a relação anal tende a ser mais dolorosa porque a região não tem a mesma elasticidade da vagina".

É necessário usar lubrificante?

Sim, pois a região anal não tem lubrificação própria. "O ideal é usar lubrificantes específicos para a prática, preferindo os mais neutros", aconselha a ginecologista Sueli. "Evite uso de produtos com anestésicos que prometem tirar a dor, pois anestesiando o local o risco de traumas é maior, já que a sensação de incômodo será diminuída no momento da prática." Os lubrificantes a base de água são os mais recomendados, pois não aumentam o risco de reações alérgicas. 

É normal ocorrer sangramento durante a relação anal?

A chance de gravidez é nula no sexo anal, pois o intestino não tem nenhuma comunicação com os órgãos reprodutores femininos
"Pode ocorrer sangramento quando houver algum trauma que ocasione fissuras ou microfissuras", afirma Sueli Raposo. Se ocorrerem sangramentos em todas as relações ou na maioria das relações, é importante procurar um especialista. Para evitar esse transtorno, é fundamental o uso de lubrificantes próprios para esse tipo de relação. 

O risco de contrair o vírus HIV é maior?

Sim. O sexo anal é considerado como um dos modos mais frequentes de se contrair o vírus HIV, causador da Aids. "O líquido seminal de uma pessoa soropositivo carrega grande quantidade de carga viral (HIV), e durante o ato podem ocorrer microfissuras na região do ânus e reto, facilitando a contaminação", diz o urologista Augusto Cunha Campos Gonçalves, diretor-presidente do Hospital Belo Horizonte. Além disso, na relação anal é possível contrair qualquer tipo de DST, como HPVgonorreiaclamídiaherpes hepatite C. "Por isso, mesmo na relação anal o mais importante é usar camisinha", completa a ginecologista Sueli. 

O sexo anal provoca hemorroidas?

A relação anal violenta ou sem lubrificação adequada pode causar lesões na região anorretal, mas não provoca hemorroida. "No entanto, se o sexo anal for praticado por pessoas que já tem hemorroidas, esse quadro poderá se agravar", afirma o ginecologista José Carlos Riechelmann, presidente do Comitê Multidisciplinar de Sexualidade Humana da Associação Paulista de Medicina. Hemorroidas são veias inchadas e dolorosas na parte inferior do reto ou do ânus. Elas resultam do aumento da pressão nas veias do ânus. A pressão faz com que as veias inchem, tornando-as doloridas, especialmente quando a pessoa está sentada. Entre as principais causas de hemorroidas estão o esforço excessivo durante a evacuação, constipação, permanecer sentado por longos períodos e infecções anais. 

O orgasmo com sexo anal é igual ao com sexo vaginal?

Orgasmo com sexo anal depende de fatores como lubrificação e conforto
Isso vai depender de uma série de fatores. "Em geral, a pessoa que está penetrando vai sentir mais prazer, pois o canal anal é mais estreito", explica a ginecologista Sueli. "Mas tudo vai depender da lubrificação da região anal, das preliminares, do grau de excitação da pessoa que está sendo penetrada, da sintonia do casal para aprimorar a prática sexual, tudo isso pode fazer a mulher sentir tanto prazer quanto uma relação vaginal". 

A higiene é necessária antes e depois do sexo anal?

Sim, os cuidados com a higiene e o uso de camisinhaevitam que as bactérias normais no intestino entrem em contato com a uretra, provocando infecções uretrais ou urinárias. Os riscos de uma relação sem higiene adequada envolvem desde contaminações bacterianas até a transmissão de doenças, como as hepatites A e B, já que a transmissão é facilitada por conta das microfissuras que podem ocorrer no ânus durante o ato. "É importante lembrar que nunca se deve ter uma relação anal e em seguida a vaginal, não sem antes trocar o preservativo e limpar bem a região para evitar contaminação", alerta a ginecologista Sueli. Entre os cuidados com a higiene estão evacuar antes da relação, evitando que as fezes surjam durante a prática; higienizar bem o local com água e sabonete antes e após o sexo anal; a pessoa que penetrou deve urinar após a transa, para limpar a uretra, e lavar o pênis. 

A mulher corre o risco de engravidar?

Caso haja problemas como sangramentos ou infecções, procure um médico
Não. A penetração no sexo anal vai abranger parte do canal anal e do reto (a porção final do intestino), que são duas regiões que fazem ligação com o intestino grosso (cólon) no corpo humano. No caso do sexo vaginal, a penetração ocorre pela vagina que é o canal diretamente ligado aos órgãos reprodutores femininos, como útero, trompas de falópio e ovários - local onde o pênis deposita os espermatozoides na relação sexual. "A chance de gravidez é nula no sexo anal, pois o intestino não tem nenhuma comunicação com os órgãos reprodutores femininos, que é onde ocorre a fecundação do óvulo e espermatozoide", diz a ginecologista Sueli. 

O sexo anal possui alguma contraindicação?

Pessoas que possuem hemorroidas em estágio de inflamação ou estão com fissuras na região anal devem evitar esse tipo de relação. "Além disso, ambos os parceiros devem estar à vontade com a situação, diminuindo a chance de problemas", afirma Sueli Raposo. 

A relação anal pode fazer mal se for feita com frequência?

"Não, desde que a higiene e os outros cuidados, como a lubrificação, estejam sendo feitos de forma adequada", explica o urologista José Carlos Riechelmann. 

Quais sinais indicam que a região anorretal está com problemas?

Se a pessoa estiver sofrendo com dores e sangramentos persistentes por mais de dois dias é importante procurar um médico, pois pode haver uma fissura mais grave. Os sintomas podem acontecer após a evacuação ou então de forma mais constante - em todos os casos, é necessário procurar ajuda de um especialista. 

Quarto de motel esconde perigos para a saúde

Quarto de motel esconde perigos para a saúde

Lençol, toalhas e até a banheira são focos para o contágio de DSTs

Você já pensou nos riscos que um quarto de motel pode representar para sua saúde? Quando a temperatura esquenta, pouca gente pensa nisso. Mas o risco de contrair, principalmente, uma doença sexualmente transmissível DST existe. Para se ter ideia, alguns vírus, como o HPV, por exemplo, podem sobreviver por até sete dias em uma superfície. ?Se os cuidados com a higiene não estiverem totalmente alinhados, as chances de contaminação são enormes. Banheiras e lençóis podem guardar uma grande quantidade de vírus, que podem gerar desde problemas mais simples como a candidíase até os mais sérios como o HPV ?, explica o médico mastologista do Hospital A.C.Camargo, Levon Badiglian Filho.

O administrador de empresas Renato conta que pode comprovar como a má higienização de um estabelecimento é capaz de provocar danos ao organismo. "Um dia depois de passar a noite em um quarto de motel comecei a sentir coceiras na região genital. Fiquei quase uma semana sofrendo com o problema, sem saber o que estava acontecendo. Depois de uma consulta com o urologista, descobri que havia contraído chato (uma espécie de piolho que se fixa nos pelos pubianos)".  
Motel
De acordo com o professor Antonio Carlos Morilha, especialista do Guia de Motéis e colaborador da revista Moteleiro, os cuidados com o quarto do motel devem ser colocados em primeiro plano. "As toalhas devem ser esterilizadas e todo o quarto deve ser desinfetado, como banheiras, sauna e cadeiras. Assim, os riscos de contaminação são nulos e os adeptos podem ficar tranquilos", explica. "O cliente que perceber algo errado deve informar imediatamente a recepção, além de se informar sobre todos os cuidados com a higiene do motel".

Raio-X do quarto

De acordo com o médico do A.C. Camargo, a primeira atitude é prestar atenção nos pequenos detalhes do lugar que você frequenta. "Fazem parte das medidas de segurança procurar estabelecimentos que apresentem o mínimo exigido de condições higiênicas, observar a aparência da fachada externa (que pode dizer muito sobre o ambiente interno), além de desconfiar de preços muito baixos", explica Levon. Outros sinais podem estar invisíveis aos olhos, por isso que os cuidados devem ser redobrados. "Devemos analisar todos os objetos que entrem em contato com a mucosa e principalmente com os órgãos genitais. Principalmente, aqueles que sejam de difícil esterilização, como banheiras e bancos, já que muitos vírus e bactérias causadores de doenças são bastante resistentes", diz o mastologista. "Alguns micro-organismos sobrevivem em superfícies inertes e secas por um longo período de tempo, como o gonococo (causador da gonorreia), que permanece ativo de 1 a 3 dias e o HPV, até 7 dias" .

Há quem prefira levar para o motel um pouco de álcool para desinfetar o local como forma de se precaver. Mas será que essa é a solução mais indicada? "O álcool em gel a 70% é ótimo para eliminar qualquer vestígio de vírus. Mas, vale lembrar que essa é obrigação dos estabelecimentos, e se a pessoa faz isso é por que não confia no padrão de limpeza do motel", explica o mastologista.

Os campeões de contaminação

Quarto de motel
Banheira: marcas de ferrugem ou de manchas são sinais de má higiene. A melhor opção é não usar e desistir do estabelecimento.

Assento sanitário: existem motéis que apresentam um lacre de higienização; esses são os mais confiáveis. Mesmo assim, observe se houve a limpeza, caso contrário, avise a recepção e procure outro lugar.

Toalhas: 
as toalhas devem ser brancas e não podem apresentar nenhum indício de manchas. Prefira os estabelecimentos que usem o processo de esterilização e mande as toalhas ensacadas individualmente.

Lençol: mesmo uma manchinha pequena indica que a limpeza não foi realizada da maneira correta. Se a sujeira ainda está lá, os vírus também podem estar.

Piscina: antes de mergulhar, preste atenção na cor e no cheiro da água. Qualquer fator incomum precisa ser levado em consideração.

Cadeiras: os bancos e cadeiras precisam estar limpos e secos, e mesmo se tudo estiver em ordem prefira colocar a toalha antes de sentar-se.

Pequenos sintomas podem sinalizar uma DST

Corrimento frequente e verrugas na região genital pedem visita ao ginecologista

Os números são alarmantes. Uma pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde sugere que mais de 10,3 milhões de brasileiros já tiveram algum sinal ou sintoma de uma doença sexualmente transmissível (DST). Desse total, cerca de 18% dos homens e 11,4% das mulheres não buscaram atendimento médico. "É importante ressaltar que os problemas causados pelas DSTs podem aumentar em até 18 vezes as chances de contrair o vírus da Aids (HIV)", diz a ginecologista Rosa Maria Leme. "Existem diversas doenças, como a herpes, por exemplo, que apresentam sintomas que logo desaparecem, mas o vírus continua presente. Por isso é importante ficar sempre atento."

As doenças sexualmente transmissíveis são causadas por vários tipos de agentes. São transmitidas, principalmente, por contato sexual, por meio do sexo sem proteção - sem o uso decamisinha - com uma pessoa que esteja infectada. Geralmente, se manifestam por meio de feridas, corrimentos, bolhas ou verrugas. As mulheres, em especial, devem ser bastante cuidadosas, uma vez que, em diversos casos de DST, não é fácil distinguir os sintomas das doenças das reações orgânicas comuns de seu organismo. Isso exige da mulher consultas periódicas ao médico. Algumas DST, quando não diagnosticadas e tratadas a tempo, podem evoluir para complicações graves, como a incapacidade de engravidar e até mesmo a morte. Entre as doenças classificas como DSTs estão a Aids, gonorreia, clamídia, HPV, sífilis, entre outras.

Mas será que todos os sinais do corpo podem sinalizar uma DST? Para você entender mais sobre o assunto, o MinhaVida destacou abaixo as principais características que acendem o sinal vermelho e pedem uma consulta de emergência com o seu ginecologista .

Secreção vaginal ou corrimento

Corrimento
A especialista explica que pequenas secreções claras e sem cheiro, até uma semana antes da menstruação, são normais. O problema é quando o sintoma persiste. "Qualquer secreção vaginal mais amarelada, verde, pink ou até mesmo a branca, quando em grande quantidade, pode sinalizar algum problema de infecção ou até alguma DST, como a gonorreia. A mulher precisa ficar atenta, principalmente quando ela nunca apresentou nenhum sinal de corrimento", explica a especialista.  

Verrugas genitais

Elas funcionam como um alerta do corpo e precisam de exames específicos para serem analisadas. "O aparecimento de pequenas verrugas (externas ou internas) serve como um sinal vermelho para algumas doenças, como o HPV, que na mulher aumenta muito as chances de câncer de colo de útero", explica a ginecologista. 

Cheiro forte

Ao perceber um cheiro forte não característico, na região da vagina, busque um especialista. "O odor ruim pode estar totalmente ligado a uma bactéria e a uma infecção. O quadro pode gerar pus, que altera o odor normal da região e, em alguns casos, pode causar ardência e irritação", diz Rosa Maria Leme. 

Coceira

Normalmente a coceira não está relacionada a nenhuma DST, mas precisa de atenção especial. "Em geral, esse problema está ligado à infecção por um fungo chamado cândida, que além da coceira, vem acompanhado de corrimento. Mas vale lembrar que a coceira também pode estar relacionada a outras infecções genitais menos frequentes ou até mesmo ao chato (uma espécie de piolho, que se instala na região pubiana)". 

Dor durante a relação sexual

Dores durante o sexo também podem sinalizar que algo não anda bem. "Principalmente nas mulheres que apresentam feridas internas na maioria dos casos de DST, a dor durante a penetração pode ser preocupante. Sinais como forte ardência e incômodo indicam que algo não vai bem e uma visita ao médico precisa ser agendada ", explica a especialista. 

Grupo de risco

Preservativo -DST
As mulheres que estão no grupo de risco das DSTs precisam de cuidados ainda maiores. "Mulheres com muitos parceiros sexuais ou que não usam métodos contraceptivos de barreira, como a camisinha, precisam de uma consulta urgente com um especialista, pois além de estarem colocando a saúde em risco, estão ameaçando a de seus parceiros", alerta Rosa Maria Leme. 

Visite o ginecologista

Para afastar o risco de doenças, a consulta com o especialista e a realização de exames preventivos é essencial. "Toda mulher que já tiver tido relação sexual, deve obrigatoriamente passar por uma consulta ginecológica anual para realização de exames de rotina ginecológica e para prevenção de câncer de colo uterino, como exames hormonais e ultrassom para checar útero e ovários".  

Adolescentes no grupo de risco

Um outro estudo realizado pelo National Health and Nutrition Examination Survey sugere que uma em cada quatro adolescentes americanas sofrem de alguma doença sexualmente transmissível. O problema mais comum entre as jovens era o vírus do HPV ( 18,3% das adolescentes) e a clamídia (3,9% das meninas). O estudo contou com a participação de 838 adolescentes americanas, com idade entre 14 e 19 anos. As meninas eram entrevistadas e examinadas para detectar doenças como: gonorreia, clamídia, tricomoníase, herpes e HPV.

Outro dado que também chamou a atenção dos pesquisadores foi o tempo em que as participantes levaram para serem infectadas. Um ano depois de iniciar a vida sexual, 19,2% já possuíam alguma DST. Os cientistas alertam que as doenças podem levar à complicações a longo prazo, tais como a doença inflamatória pélvica, a infertilidade e o câncer cervical ou até mesmo aumentar o risco de infecção pelo HIV. Depois de analisar os resultados da pesquisa, os cientistas reforçam a importância da orientação sexual dentro das salas de aula. Tudo para informar as jovens e aumentar o nível de proteção contra as doenças sexualmente transmissíveis

terça-feira, 15 de abril de 2014

Doçura!!!

Galeano: “Eu não seria capaz de ler de novo ‘As Veias Abertas…’, cairia desmaiado”

Galeano: “Eu não seria capaz de ler de novo ‘As Veias Abertas…’, cairia desmaiado”


(Galeano em Brasília. Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Em 1998, entrevistei a escritora Rachel de Queiroz (1910-2003) e ela me confessou sentir “antipatia mortal” por O Quinze, o clássico da literatura brasileira que publicou aos 20 anos, em 1930, e que, desde então, seria sua “obra mais importante e mais popular” (tudo quanto é enciclopédia se refere assim ao livro). O mesmo acontece com As Veias Abertas da América Latina e o escritor uruguaio Eduardo Galeano.  Publicado em 1971, quando Galeano tinha 30 anos, a obra até hoje o persegue. É sempre nomeado como “o autor de As Veias Abertas…“, o que, pelo visto, o incomoda mesmo porque tem mais de 30 livros além dele.
Na entrevista coletiva que deu na sexta-feira 11 em Brasília, onde veio para ser o escritor homenageado da 2ª Bienal do Livro e da Leitura, Galeano ouviu provavelmente a milionésima pergunta sobre Veias Abertas. “Faz 40 anos que você escreveu As Veias Abertas da América Latina. Quais são as veias abertas hoje em dia?” E ele, em um português bastante razoável: “Seria para mim impossível responder a uma pergunta assim, especialmente porque, depois de tantos anos, não me sinto tão ligado a esse livro como quando o escrevi. O tempo passou, comecei a tentar outras coisas, a me aproximar mais à realidade humana em geral e em especial à economia política porque As Veias Abertas tentou ser um livro de economia política, só que eu ainda não tinha a formação necessária. Não estou arrependido de tê-lo escrito, mas é uma etapa superada. Eu não seria capaz de ler de novo esse livro, cairia desmaiado. Para mim essa prosa de esquerda tradicional é chatíssima. O meu físico não aguentaria. Seria internado no pronto-socorro… ‘Tem alguma cama livre?’, perguntaria.” Risadas.
Aproveito e emendo: mas o que você achou de Chávez dar o livro para o Obama? Obama entenderia As Veias Abertas…? “Nem Obama nem Chávez”, responde Galeano para gargalhada geral. “Claro, porque ele entregou a Obama com a melhor intenção do mundo Chávez era um santo, cara mais bondoso que esse eu não conheci, mas deu de presente a Obama um livro em uma língua que ele não conhece. Então, foi um gesto generoso, mas um pouco cruel.”
Eu nunca tinha visto o grande escritor uruguaio de perto. É mais baixo do que imaginava, cerca de 1m70. Bastante frágil, aparenta ter mais do que seus 73 anos. Ele mesmo comenta que a maioria dos escritores é de esquerda e, como tal, chegados a uma boemia e isso não faz bem à saúde… Uma menina pergunta: “A idade não é boa para os jogadores de futebol. E para os escritores?” Galeano discorda. “Depende. Tem velhos muito mais jovens que os velhos velhíssimos e tem velhos que você acha que estão esperando a morte e surpreendentemente acabam ganhando uma partida por 8 a zero. Não depende da biologia nem do prognóstico dos profetas. Não depende de ninguém. O melhor que o futebol tem como esporte a festa que o futebol é, a festa das pernas que jogam, a festa dos olhos é a capacidade de surpresa, de assombro. Na verdade ninguém sabe o que vai acontecer. E menos ainda os especialistas. Aqueles doutores do futebol são seres temíveis, perigosíssimos para a sociedade e o mundo em geral.”
Outro jornalista espeta: “Por que a esquerda não deu certo na América Latina?” Galeano não se faz de rogado: “Algumas vezes deu certo, algumas vezes, não. A realidade é mutável, a realidade política e todas as outras por sorte. Senão seríamos estátuas, estaríamos congelados no tempo. Não é verdade que a esquerda não deu certo. Deu certo e muitas vezes foi demolida por ter dado certo, por ter tido razão, porque o que a esquerda predicou, em certo momento na América Latina, resultou ser a verdade, então foi punida. Punida pelos golpes de Estado, ditaduras militares, períodos prolongadíssimos de terror de Estado, crimes horrorosos cometidos em nome da paz social, do progresso. Da convivência democrática, imaginem! Que democracia e que convivência são essas? Tinham que perguntar: ‘do que está falando, senhor?’ As coisas são muito mais complexas do que parecem. Em alguns períodos, também, a esquerda comete erros gravíssimos e em outros, não, faz o que deve ser feito da melhor maneira, até além do que o próprio movimento de massas estava esperando. A realidade sempre tem esse poder de surpresa. Te surpreende com a resposta que dá a perguntas nunca formuladas. E que são as mais tentadoras. O grande estímulo para a vida está aí, na capacidade de adivinhar possíveis perguntas não formuladas.”
Galeano está cansado, foram muitas horas de viagem para chegar à capital federal, e quer encerrar a entrevista. Eu protesto: “Mas e Mujica? Você não vai falar de Mujica?” Ele não resiste e se senta de novo. “Estou meio cansado, estou fatigado de falar de Mujica, porque todo mundo fala dele! Até em outros planetas se fala de Mujica. Em Marte, Júpiter… É incrível a capacidade de ressonância que Mujica tem. E ele é muito meu amigo, já faz muitos anos. A única coisa que posso fazer para incorporar um grão de areia a esta praia imensa de Mujica caminhando pelo mundo seria contar uma piccola história que dá ideia da qualidade humana do personagem.”
E começou a narrar, saborosamente, como é de seu feitio:
“Faz uns quatro anos não tenho interesse em lembrar direito a data fui operado de câncer. Foi um câncer sério, agudo. Tomei uma anestesia muito forte, dessas que não desaparecem rápido. E estava sozinho na cama do hospital, esperando que passasse o efeito da anestesia. Ou seja, mais dormido do que acordado. Sem saber muito o que acontecia, onde estava, delirando. E neste período, estando sozinho em uma cama sozinho, não, acompanhado pelo câncer, mas o câncer não é um amigo confiável. Não te recomendo. Bem, estava eu ali e volta e meia delirava. Como sou muito futeboleiro, um religioso da bola, tinha delírios futebolistas que me levaram aos anos de infância, quando jogava na rua, com bolas improvisadas, feitas com trapos velhos. E em uma dessas fugas, comecei a bater bola. Como se fosse uma múmia egípcia que tinha errado de domicílio, jogando futebol contra ninguém e sem bola nenhuma, só na imaginação. Chutava a bola e ela voltava, chutava e ela voltava. Tudo debaixo do lençol. E nada, a bola continuava, como se estivesse morta de riso da minha estupidez de achar que podia com ela. ‘Não, você não pode comigo’. Numa dessas, senti um peso em cima dos meus joelhos. Aí começo a recobrar a realidade e vejo alguém que conheço, uma voz que reconheço, de um amigo. E pergunto:
O que você está fazendo aqui?
E ele:
Isso é maneira de receber um amigo?
Não importa, quero saber o que você faz aqui. Está doente também?
Que é isso, estou saudabilíssimo. O enfermo é você.
Estou sabendo. Obrigado pela notícia, mas já estou sabendo.
O doente é você, está fodido, irmão. Eu vim te visitar. Agora, não sabia que se recebia um amigo assim, chutando-o, chutando-o e chutando-o. Não é muito educado.
Continuamos nessa até que eu falei:
Olhe, chega. Sua função não é estar aqui brincando comigo. Você é o presidente da Repoública e sua função é governar. Mujica, você é o presidente! Vai governar este país já! Estamos precisando de sua participação ativa, desinteressada, importantíssima para o nosso povo. Não perca mais tempo comigo.
Ah, bela maneira de ser amigo, hein?
Será bela ou será feia, mas é a única maneira para você. Você é o presidente! Além disso, para piorar, todo mundo gosta de você e quer que continue sendo presidente por uns 300 anos mais. Se você não gosta, foda-se.
E aí acabou.”
Na saída, consigo falar a Eduardo Galeano do enorme prazer que sinto em conhecê-lo pessoalmente e lhe conto que adoro O Livro dos Abraços. Ele olha para mim e diz: “Eu também”.
Ufa.
Publicado em 14 de abril de 2014

sexta-feira, 11 de abril de 2014

'Brincadeira do desmaio' alarma pais e escolas no Rio

Brincadeira do desmaio’ alarma pais e escolas no Rio

  • Aluno do colégio Liceu Franco-Brasileiro, em Laranjeiras, bateu a cabeça e sofreu escoriações após perder consciência
  • No YouTube, proliferam vídeos em que crianças e adolescentes usam métodos diferentes para desmaiar
MARINA COHEN (EMAIL)
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A fachada do Liceu Franco-Brasileiro, que registrou um caso de desmaio em que um aluno bateu com a cabeça e sofreu escoriações
Foto: Marcelo Piu
A fachada do Liceu Franco-Brasileiro, que registrou um caso de desmaio em que um aluno bateu com a cabeça e sofreu escoriações Marcelo Piu
RIO - Um jogo perigoso está ganhando popularidade nas escolas do Rio com a divulgação de vídeos na internet. A “brincadeira (ou jogo) do desmaio” consiste em provocar a perda da consciência por meio de asfixia, o que pode ser feito com estrangulamento ou pressão no peito — “método” mais utilizado nos colégios —, sempre com a ajuda de outros colegas. No Rio, um episódio ocorrido no Liceu Franco-Brasileiro fez o colégio distribuir, esta semana, um folheto que alerta os alunos sobre o perigo da prática. Entre as possíveis consequências, segundo médicos, estão hematomas, parada cardíaca, lesões cerebrais, coma e até a morte.
Mês passado, na escola do bairro carioca das Laranjeiras, um aluno do 1º ano do ensino médio desmaiou em pleno pátio, na hora do recreio, durante a o jogo. Ainda tonto, ao tentar se levantar ele bateu com a cabeça num banco, sofrendo escoriações. O estudante de 14 anos foi encaminhado para casa, e seus pais foram chamados à coordenação. Ele e mais três alunos que participavam da “brincadeira” foram suspensos por um dia.
— Eu não sabia o que estava fazendo. Como outros meninos estavam brincando, resolvi tentar. Mas, quando fiquei tonto e percebi que ia apagar, me dei conta de que foi uma péssima ideia — afirma o garoto.
Alguns alunos relataram ter visto “sangue e convulsões”, mas, segundo o estudante, o desmaio durou poucos segundos:
— Acordei sem me lembrar de nada. Detestei a sensação. Sei que poderia ter acontecido algo grave. Pelo menos eu aprendi.
De acordo com ele, outros alunos já haviam tentado desmaiar antes no colégio, sem sucesso.
— É uma brincadeira estúpida, e, depois do que aconteceu, ninguém quis fazer mais — comentou uma das alunas do primeiro ano que testemunharam o incidente.
A decisão de suspender os alunos, segundo o coordenador pedagógico do Liceu Franco-Brasileiro, foi tomada como uma forma de reprimir o comportamento de risco.
— Não podemos de forma alguma estimular brincadeiras que comprometam a integridade física e psicológica dos alunos — ressaltou Luciano Moraes, coordenador pedagógico no Liceu. — Também nos reunimos com os pais e professores para alertá-los. Eles devem ficar atentos.
Psicólogos relatam ‘muitos casos’
O colégio ainda promoverá, na segunda-feira, uma palestra para os alunos sobre os benefícios e os riscos do conteúdo disponível na internet. A ideia de tentar o “jogo” surgiu depois que alguns deles assistiram a demonstrações em sites de compartilhamento de vídeos.
— Nem sempre os adolescentes sabem avaliar o perigo do que veem. Por isso é importante que os pais monitorem a navegação deles pela web, por mais que não gostem, e também conversem sobre os riscos — alertou Moraes.
Cardiologista do hospital Pró-Cardíaco, no Rio, Claudio Tinoco explica que as consequências da “brincadeira” podem ser graves, principalmente se o aluno tiver um problema cardíaco desconhecido.
— A brincadeira causa queda de pressão, falta de oxigenação no sangue e a síncope, conhecida como desmaio. A falta de oxigenação pode levar a uma parada cardíaca ou a uma lesão no cérebro, com sequelas permanentes. A área da memória é a primeira a ser danificada, mas o adolescente pode ainda ter parte da visão afetada. Em casos mais sérios, pode haver coma e morte cerebral — explica Tinoco. — É uma prática muito arriscada que eu não recomendo de forma alguma.
Muitos jovens têm relatado experiências com a brincadeira mortal em seu consultório, afirma o psiquiatra Fábio Barbirato, especialista em transtornos na infância e adolescência da Santa Casa da Misericórdia do Rio.
— Um menino precisou ir para o hospital recentemente porque perdeu a consciência. Os colegas não conseguiram acordá-lo — relata Barbirato, que atribui a brincadeira a duas razões. — É uma espécie de demonstração de força típica dessa fase de formação de grupo, quando os jovens fazem de tudo para serem aceitos pelos outros, expondo-se a consequências graves. Por outro lado, há relatos de que a asfixia dá uma sensação de euforia e prazer, mas não existe nenhuma comprovação médica disso.
A psicóloga Fernanda Reis, especialista no tratamento de crianças e adolescentes, é outra a ter ouvido relatos da prática no seu consultório.
— Os adolescentes buscam se destacar por meio desses desafios. Mas há riscos com os quais eles não têm capacidade para lidar. O que você vai fazer se o seu amigo tiver uma parada cardíaca ou entrar em coma? — questiona.
Mortes nos EUA e na França
Fora do Brasil, o “jogo do desmaio” já deu origem a manchetes trágicas. Na França, as terríveis consequências da prática levaram à criação de uma associação de pais de vítimas desse jogo de estrangulamento, a Apeas. Segundo a organização, dez mortes são registradas anualmente, em média, no país europeu desde 2000 devido à perigosa prática.
De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC), pelo menos 82 crianças e adolescentes com idades entre 9 e 16 anos morreram no país por causa da brincadeira, entre 1995 e 2007. Como as mortes geralmente são registradas como suicídio, pois acontecem mais comumente quando os adolescentes se arriscam sozinhos, é difícil computar números. Mas um caso famoso deu mais visibilidade ao problema. Em 2006, o campeão mundial de surfe Shaun Tomson perdeu o filho, Matthew, enquanto o menino de 15 anos brincava do “jogo do desmaio”. O surfista sul-africano escreveu um livro, “The code” (O código), direcionado a adolescentes, em que pede aos jovens para pensarem duas vezes antes de correr esse risco. A esperança é que relatos com o seu consigam influenciar mais os jovens do que os muitos vídeos com cenas de simulação de estrangulamento espalhadas pela internet. sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/brincadeira-do-desmaio-alarma-pais-escolas-no-rio-12161827#ixzz2ycbr032g 
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