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RESPONSABILIDADE DO ENTE FEDERATIVO POR OMISSÃO NA RECUPERAÇÃO DE VIA PÚBLICA REALIZADA POR PARTICULAR
RESPONSABILIDADE DO ENTE FEDERATIVO POR OMISSÃO NA RECUPERAÇÃO DE VIA PÚBLICA REALIZADA POR PARTICULAR | Índice |
04.06.2012 - Direito Constitucional |
HÉLIO APOLIANO CARDOSO |
Tema que começa a despontar no Judiciário brasileiro diz respeito a recuperação e reparação de via pública por particular frente a omissão do Poder Público e o dever e a obrigação de ressarcimento por parte deste. z Referido assunto irá gerar ainda várias controvérsias, especialmente no que diz respeito a postulação de indenização de valores despendidos por particulares com o conserto de estrada pública, Federal, Estadual ou Municipal, quando referida estrada encontra-se sem as condições necessárias de tráfego. O ordenamento jurídico pátrio adota a teoria do risco administrativo, devendo o ente federativo suportar o ônus de sua atividade, sem que se cogite da culpa de seus agentes, donde se conclui que para o dever estatal de indenizar não se exige comportamento culposo de seus funcionários; basta a existência do dano, causado por agente público em exercício das suas funções. Como estabelece o art. 37, § 6º, da CF/88: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. O debate toma corpo em razão da inexistência de previsão legal da responsabilidade objetiva em razão da omissão, estando previsto no referido dispositivo apenas a hipótese de conduta comissiva. Com algumas ressalvas bem fundamentadas, a jurisprudência e doutrina consolidaram entendimento no sentido da responsabilidade do Estado, quando da ocorrência de omissão, ser subjetiva, necessitando a comprovação da culpa, conforme ensina Celso Antônio Bandeira de Mello: [...] a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por ato ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo) (Curso de direito administrativo. 26 ed. São Paulo:Malheiros, 2009, p. 1003). Todavia, em sentindo diverso, Sérgio Cavalieri Filho dispõe não se tratar sempre de responsabilidade subjetiva quando ocorrer omissão por parte do Estado, sendo necessário verificar se a conduta omissiva é de natureza específica ou genérica, vejamos sua lição: Haverá omissão específica quando o Estado, por omissão sua, crie a situação propícia para a ocorrência do evento em situação em que tinha o dever de agir para impedí-lo. Assim, por exemplo, se o motorista embriagado atropela e mate pedestre que estava na beira da estrada, a Administração (entidade de trânsito) não poderá ser responsabilizado pelo fato de estar esse motorista ao volante sem condições. Isso seria responsabilizar a administração por omissão genérica. Mas se esse motorista, momentos antes, passou por uma patrulha rodoviária, teve seu veículo parado mas os policiais, por alguma razão, deixaram-no prosseguir viagem, aí já haverá omissão específica que se erige em causa adequada do não-impedimento do resultado. Nesse segundo caso, haverá responsabilidade objetiva do Estado (Programa de Responsabilidade Civil. 7 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 231). Guilherme Couto de Castro é enfático no mesmo sentido: Sendo caso de conduta administrativa específica, omissiva ou comissiva, basta aferir o nexo de causalidade e o dano e, inexistindo fortuito ou culpa exclusiva da vítima, a indenização será devida (A responsabilidade civil objetiva no direito brasileiro: o papel de culpa em seu contexto. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 57). No caso específico em debate, a responsabilidade está caracterizada na conduta omissiva e específica do ente federativo ao não efetuar obras que visem a sanar a precariedade da estrada. Neste sentido, reza entendimento da Terceira Câmara de Direito Público do TJSC: RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. QUEDA DE VEÍCULO EM BURACO EXISTENTE EM VIA PÚBLICA. FALTA DE SINALIZAÇÃO ADEQUADA. OMISSÃO ESPECÍFICA DO ENTE PÚBLICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA 1 A pessoa jurídica de direito público responde objetivamente pelos danos decorrentes de evento lesivo originado por omissão específica sua, ou seja, por omissão a um dever legal de agir concreta e individualizadamentede modo a impedir o resultado danoso. 2 A existência de buraco em via municipal, desprovido de sinalização adequada, configura omissão específica do ente público, em razão da inobservância de sua obrigação de agir para a conservação do local e a segurança dos munícipes (ACV n. 2009.046487-8, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. em 16.9.09). APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS C/C ALIMENTOS E PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA - ACIDENTE DE TRÂNSITO - BURACO E DESNÍVEL NA VIA PÚBLICA - RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO - OMISSÃO - APLICAÇÃO DA TEORIA SUBJETIVA - CULPA DO ENTE PÚBLICO CARACTERIZADA - DANO MORAL CONFIGURADO - PRETENDIDA REDUÇÃO DA VERBA INDENIZATÓRIA - IMPOSSIBILIDADE - CRITÉRIOS OBSERVADOS - PENSÃO ALIMENTÍCIA MANTIDA - SENTENÇA INALTERADA - RECURSO NÃO PROVIDO. A responsabilidade subjetiva do Município está na atitude omissiva do mesmo ao não efetuar obras que viessem a sanar a precariedade da rua onde ocorreu o acidente, tendo sido negligente quanto as suas responsabilidades. O direito ao recebimento de indenização, de natureza material ou moral, tem seu alicerce na prática de ato ilícito pelo lesante, e na configuração dos requisitos caracterizadores da responsabilidade civil, qual sejam: dano, nexo causal e dolo ou culpa (ACV n. 2007.049418-1, j. em 14/12/2009). "TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA Apelação Cível n. 2010.010624-8, de Lages Relator: Des. Wilson Augusto do Nascimento Data: 09/11/2010 APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ESTRADA MUNICIPAL SEM AS CONDIÇÕES NECESSÁRIAS DE TRÁFEGO. OMISSÃO ESPECÍFICA DO MUNICÍPIO. RESPONSABILIDADE CIVIL CARACTERIZADA. RECUPERAÇÃO E REPARAÇÃO DA VIA PÚBLICA REALIZADAS POR PARTICULAR - RESSARCIMENTO DOS VALORES DISPENDIDOS NO CONSERTO - SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. É responsabilidade do Município manter as vias públicas em bom estado de conservação e com a devida sinalização, não o fazendo, assume os riscos de arcar com as consequências advindas de sua conduta omissiva." A responsabilidade do ente federativo, em tais casos, parece-me indiscutível, mormente quando a estrada não possuía as condições necessárias de tráfego, impondo-se o ressarcimento do valor efetivamente despendido com o conserto da via pública. Mostra-se evidente o dever de indenizar do ente federativo em casos de omissão específica no dever legal de restaurar as estradas, devendo o cidadão, no uso de suas prerrogativas de cidadania, acionar o Judiciário para ver ressarcido o valor efetivamente gasto na obra, cujo responsável é o ente federativo (União, Estado e Município). * Advogado em Fortaleza-CE, Parecerista e Escritor Jurídico. Sobre o autor Advogado com mais de vinte e cinco anos de experiência, tendo mais de uma centena de artigos científicos e doutrinárias publicados em revistas especializadas, como colaborador, particularmente no Repertório IOB de Jurisprudência, in Consulex, Revista da OAB-Ceará, Revista da Associação Cearense de Magistrados, Revista do IMC, Revista do Instituto dos Magistrados do Ceará, IOB Comenta, Adcoas, Revista Jurídica Consulex, Revista Bonijuris, Insigne, e Revista Cearense Independente do Ministério Público, onde integrou o Conselho Editorial, em Saites Jurídicos tem publicações, como participante, na Revista Jurídica Júris síntese, Tributário.Expresso Jurídico, NET, Jus Vigilantibus, Revista Internauta de Pratica Jurídica, volume 13, Data veni@, O Neófito, Espaço Vital, TexPro, SaraivaJur, Revista Forense, Revista Forense Eletrônica, volumes 358 e 361, Suplemento da Revista Forense Eletrônica, Fórum online, Mundo Jurídico, Advogado.adv.Br, Jornal Jurídico Digital, Brasil Jurídico, mct, Loveira, Prolegis, Thêmis e trabalhos divulgados em CD-ROM Doutrina Jurídica Brasileira, da Editora Plenum, além de diversos trabalhos publicados nos Jornais Diário do Nordeste, O Povo, Tribuna do Ceará e Estado, de Fortaleza, Jornal da Fenacon, Jornal da ASMETO (Associação dos Magistrados do Estado do Tocantins) e outros periódicos.Colaborador da Rádio Justiça. Membro do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-Ceará período 2001 a 2003 e com aperfeiçoamento em Direitos Humanos e Direitos dos Cidadãos pela PUC/MINAS. Parecerista e Escritor Jurídico com várias obras publicadas, dentre elas, "Os Embargos à Execução Fiscal e a Jurisprudência" , "O Mandado de Segurança nos Tribunais", "Da União Estável. Teoria e Jurisprudência", "O Advogado em Movimento - Coletânea de petições, contestações, recursos e defesas administrativas - II Volumes e "Sociedades Comerciais nos Tribunais breve doutrina" - IGLU Editora.. Pela LED Editora de Direito tem publicado "Manual das Controvérsias Trabalhistas Frente à Jurisprudência", "Dos Embargos do Devedor. Teoria, Prática e Jurisprudência" - II Volumes, "Direito Doutrinário Atual" e "Renegociação de dívidas e Novação". Na Editora Booksseler tem publicado "Controvérsias Jurisprudenciais Trabalhistas" - Volumes I, II e III, "Petições Trabalhistas e Jurisprudência", "Das CPIS. Doutrina e Jurisprudência" ,"Do Sigilo. Doutrina e Jurisprudência" e "História Dinâmica da Responsabilidade Civil", Publicou pela Servanda Editora o compêndio "Do Meio Ambiente. Breve Doutrina, Jurisprudência e Legislação pertinente".Na ME Editora e Distribuidora publicou a segunda Edição do livro "Execução. Renegociação e Novação de Dividas" e "Responsabilidade Civil no novo Código Civil. Doutrina, Jurisprudência e Pratica". Pela Editora JH Mizuno publicou "Dos Embargos de Terceiro na Jurisprudência e na Pratica." e O Novo Agravo. Teoria e Pratica, 1ª edição e 2ª tiragem. Devotado à atividade postulatória, mais precisamente com destacada atuação profissional na advocacia empresarial, especialmente em responsabilidade civil, direito de empresas, contratos (revisão e rescisão), advocacia preventiva e notadamente em defesas de empresas em dificuldades financeiras, embargos do executado, exceção de pré-executividade e direito do entretenimento. Apresentou junto a OAB-CE vários Projetos de Lei para alteração de artigos do Código de Processo Civil, Código de Processo Penal e Código de Defesa do Consumidor, todos aprovados pelo Conselho Seccional e enviados ao Conselho Federal. Proferiu várias palestras em diversos seminários e ciclos de debates promovidos pelo (a) Academia de Letras Municipais do Estado do Ceará-ALMECE e conferências no curso de pós-graduação da Universidade de Fortaleza-UNIFOR. |
Trinta anos: limite de pena no Brasil - 04.06.2012 - Direito Penal
Trinta anos: limite de pena no Brasil | Índice |
04.06.2012 - Direito Penal |
DANIELLE RINALDI BARBOSA |
Tenho visto e ouvido muita gente indignada com a sentença de Lindemberg, sob o argumento de que ele foi condenado a mais de 90 anos pela morte de Eloá e "só vai cumprir 30"... O Direito existe para garantir ordem e paz social. Condutas contrárias a essa ordem merecem punição, mas essa punição deve ser proporcional ao mal causado e atender às garantias constitucionais. Não fosse assim, o Estado, ao exercer seu poder de punir, se rebaixaria à mesma condição de criminoso, condição essa que é repudiada pela sociedade e também deve ser repudiada pelo Direito Penal. Não pode o Estado, ao punir alguém, querer vingança. Por isso que quem julga não é a vítima, mas sim um juiz imparcial. As punições não são perpétuas, porque a perpetuidade da prisão, bem como a pena capital, é incompatível com um dos objetivos da pena, que é a ressocialização. O limite de 30 anos, dessa forma, permite que a pessoa reflita sobre sua conduta, reveja seus valores e busque razões para, ao deixar o cárcere, mudar seu comportamento. Se o condenado fosse preso perpetuamente ou sofresse pena de morte, a punição não permitiria essa mudança comportamental no indivíduo. Aliás, Eugenio Raúl Zaffaroni ensina que pena de morte não é pena, pois, salvo na visão do espiritismo, não permite ao indivíduo refletir sobre o que fez depois da imposição desse castigo. Aos que pensam que não é possível que o criminoso se arrependa do seu comportamento e mude de vida, meus pêsames: para vocês, o mundo está perdido. Todos merecem uma segunda chance - e a ressocialização é possível! Mas, para que ela aconteça, faz-se necessária uma mudança de postura da própria sociedade, além da revisão do sistema de execução penal. Na pior das hipóteses, o condenado sairá o cárcere e praticará novo crime. Nesse caso, será novamente processado e a ele será imposta nova pena, considerada a agravante da reincidência. De todo modo, não somos Deuses para restringir o livre arbítrio. Por fim, uma coisa eu posso garantir: trinta anos de prisão em regime fechado representam, definitivamente, um montante de pena bastante significativo, inclusive diante da prática de crimes hediondos. E não é preciso acrescentar aos fatos um colchão ruim ou uma comida gosmenta para concordar com o que digo. Estamos falando de três décadas de vida (pouco menos da metade de uma existência humana mediana). Três décadas sem liberdade. Consegue imaginar a dimensão dessa punição?Tente ficar uma semana sem sair de casa (não vale sequer ir à padaria) e multiplique mentalmente essa experiência por mais de mil vezes - na verdade, por 1440 vezes. Sem amigos, sem festas, sem passeios, sem tantas outras coisas comuns de qualquer dia-a-dia... Haja castigo. |
A Lei Complementar nº 135/10 e o político “ficha suja”
A Lei Complementar nº 135/10 e o político “ficha suja” | Índice |
05.06.2012 - Direito Constitucional |
RENATA MARQUES FERREIRA |
No Estado Brasileiro a democracia se exercita de maneira direta e indireta. No exercício indireto, o titular do poder escolhe por meio do voto - direto, secreto, universal e periódico - seus legítimos representantes, deputados estaduais, federais e vereadores para em seu nome exercitar o poder. Já no exercício direto a democracia se manifesta por meio das consultas populares plebiscitárias e refendatárias e também pela apresentação de projetos de lei por meio da chamada iniciativa popular. O Direito Eleitoral brasileiro, como ramo autônomo da ciência jurídica se ocupa prioritariamente, nas palavras de Joel Jair Cândido em sua obra Direito Eleitoral Brasileiro, dos institutos relacionados com os direitos políticos e das eleições, em todas as suas fases, como forma de escolha dos titulares dos mandatos eletivos e das instituições do Estado. No centro do estudo deste importante ramo do direito estão situados os chamados direitos políticos, e estes nada mais são do que prerrogativas conferidas pela Constituição Federal aos cidadãos para interferirem na condução dos destinos do Estado Democrático Brasileiro, de forma direta ou indireta. Os direitos políticos, por sua vez, comportam dois núcleos distintos de atuação, a saber, (1) direitos políticos positivos onde se estuda e se analisa temas como o direito de sufrágio (votar e ser votado), o procedimento eleitoral e os sistemas eleitorais (proporcionais e majoritários) e os (2) direitos políticos negativos que compreendem o tema das inelegibilidades e ainda a possibilidade de privação do exercício do próprio direito político por parte de seu titular. Para compreensão do tema amparado pela LC 135/10 nos interessa, preliminarmente, o estudo das inelegibilidades. Pois bem, vamos a ele. As inelegibilidades pela regra do direito positivo brasileiro são vedações estabelecidas na Constituição Federal ou na Lei (complementar - única espécie normativa apta a dispor sobre o tema de acordo com a determinação categórica da própria Constituição Federal em seu art. 14, parágrafo 9) ao exercício de cargos políticos. Proíbe-se, desta forma, por meio de regras constitucionais ou legais a possibilidade de determinados cidadãos virem a ser eleitos (possibilidade concreta dos chamados direitos políticos passivos, ou seja, ser eleito para o exercício de mandato eletivo). As inelegibilidades por assim dizer, restringem a própria elegibilidade do cidadão. Como Estado Democrático de Direito que somos desde 05 de outubro de 1988, só podemos validamente ser obrigados a fazer ou a deixar de fazer algo que esteja previamente amparado por texto legal. Para o aperfeiçoamento desta regra constitucional descrita no art.5º, II da CF/88 e, visando preencher o conteúdo das inelegibilidades, foi promulgada e publicada em 1990 a Lei Complementar 64 que de maneira clara apresentava, dentre outros temas, hipóteses de inelegibilidades, ou seja, situações que uma vez preenchidas pelos cidadãos, os impediria de concorrerem a cargos eletivos ou a própria diplomação. Com o passar do tempo e a cultura de corrupção e de desrespeito à ética e a lisura na condução da coisa pública se alastrando notoriamente no âmbito do Congresso Nacional, tem início em abril de 2008 um grande movimento de engajamento de parte da população que propugnava por mudanças profundas nessa cultura tão antiga na história brasileira de se confundir, reiterada e acintosamente, o universo público com o privado (sobre o assunto, vide a magistral obra do jurista Raimundo Faoro, "Os donos do poder", publicada pela primeira vez em 1958). A campanha lançada em abril passa a se chamar "Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral" - MCCE e rapidamente começa a fazer parte das conversas diárias dos brasileiros, esgotados com os mais variados desvios de grande parte da classe política brasileira. Projetos de iniciativa popular, como antes já destacado, representam exercício de atuação democrática direta por parte do titular do poder no País; como exercício de soberania que é tem suas regras previamente traçadas na Constituição Federal, notadamente em seu artigo 14, III analisado em conjunto com o art. 61§1º do mesmo importante documento. Assim é que dispõe a Constituição Federal em seu artigo 61, §2º que: a iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles. Como se percebe pela leitura do texto acima indicado o caminho a se percorrer não é nada simples. Em primeiro lugar, há a necessidade de se colherem assinaturas de no mínimo um por cento dos eleitores brasileiros - daí a indicação de que no momento da assinatura do projeto se deva obrigatoriamente indicar o numero do título de eleitor do signatário, a Constituição requer a participação dos eleitores e esta condição no Brasil só se assegura por meio do prévio alistamento eleitoral. Além desta primeira determinação, este um por centos do eleitorado nacional antes referido deverá ainda estar distribuído em no mínimo cinco dos 26 Estados Brasileiros e do Distrito Federal (27 unidades, portanto) e mais, em cada uma das cinco unidades escolhidas o número de signatários deverá corresponder a no mínimo 0,3% dos eleitores cadastrados naquela localidade e por via de conseqüência aptos a votar nos termos da legislação eleitoral pátria. O interesse da população na aprovação do projeto foi tamanho que já em junho de 2010 a Lei Complementar 135 foi sancionada (04/06/10) e, logo em seguida publicada (07/06/10) trazendo para o mundo jurídico novas hipóteses de inelegibilidades e indicando ainda em seu art. 5º sua imediata aplicação a partir da data de sua publicação. Com a entrada em vigor da nova regra legal vários questionamentos começaram a surgir: Quais as principais inovações amparadas pela nova lei? O que ela especificamente, objetiva tutelar? O que é um político ficha suja? Quando ela pode começar a ser aplicada? Já nestas eleições de 2010? (lembrando que a lei foi publicada em junho de 2010 e teríamos como de fato tivemos, eleições gerais em outubro de 2010 onde votamos e escolhemos Presidente da República, Governadores, Senadores, Deputados Federais e Estaduais -as chamadas grades eleições). Não distante das novidades trazidas pela Lei vários políticos brasileiros, no exercício de mandatos eletivos e na busca de novos mandatos eletivos também começaram a se movimentar. Consultas das mais variadas possíveis foram apresentadas ao Tribunal Superior Eleitoral, tal como a formulada pelo então Senador Artur Virgílio do PSDB do Amazonas que questionou a corte especializada nos seguintes termos: "lei eleitoral que disponha sobre inelegibilidades e que tenha sua entrada em vigor antes do prazo de 05 de julho poderá ser efetivamente aplicada para as eleições gerais de 2010?" O então Senador da República se reportava de maneira específica ao prazo indicado na Lei Geral das Eleições, Lei 9504/97, que em seu artigo 11 indicava que a solicitação de registros de candidaturas por parte dos partidos políticos e das coligações só poderia ser feita até às dezenove horas do dia 05 de julho do ano em que se realizariam as eleições. A opinião pública de maneira concertada e com o forte apoio oriundo dos mais diferentes meios de comunicação começou a se agitar...a lei corria o perigo de não ser aplicada para as eleições de 2010. Na justiça especializada, Tribunal Superior Eleitoral, o tema foi logo discutido por meio da Consulta de nº1120-26.2010.6.00.0000 e na relatoria do Ministro Hamilton Carvalhido se decidiu que:...aplicam-se as eleições de 2010 as inelegibilidades introduzidas pela Lei Complementar nº 135/2010, porque não alteram o processo eleitoral, de acordo com o entendimento deste Tribunal." O Ministro continuou: as inelegibilidades da Lei Complementar nº 135/2010 incidem de imediato sobre todas as hipóteses nela contempladas, ainda que o respectivo fato seja anterior à sua entrada em vigor, pois as causas de inelegibilidades devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, não havendo, portanto, que se falar em retroatividade da lei." Estava desta forma definido o centro das discussões: a Constituição Federal ao dispor sobre o tema dos Direitos Políticos estabeleceu no artigo 16 o chamado princípio da anterioridade em matéria eleitoral. Referido princípio indica que "a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência". No TSE o tema já havia sido pacificado tendo como base o resultado da Consulta relatada pelo Min. Hamilton Carvalhido (acima mencionada). Porém, no Supremo Tribunal Federal a celeuma estava apenas no começo.... Como o tema envolvia a análise e a compreensão de matéria disposta na Constituição Federal e ainda matéria de repercussão geral (de interesse de toda a coletividade), o Tribunal Superior, por expressa determinação do Texto Maior, era e é o órgão encarregado de dar uma resposta definitiva à sociedade, e lá as discussões, longe de encontrar uma solução definitiva, estavam bastante acirradas. Rapidamente duas correntes distintas apareceram na busca da pacificação social e toda a discussão se voltou para a ideia do início do processo eleitoral. O texto constitucional brasileiro estabelecia que nova lei que tivesse por objetivo alterar o processo eleitoral só poderia ser aplicada após um ano de sua entrada em vigor e, dessa forma, as novas hipóteses de inelegibilidades não alcançariam políticos que pretendessem concorrer a cargos eletivos para a eleição de 2010. Pois bem. Como se sabe a Lei Complementar 135/10 entrou em vigor em 07 de junho de 2010 - data de sua publicação. Um antigo precedente do STF firmado no ano de 1992 e tendo como alicerce as novas hipóteses de inelegibilidades indicadas na LC 64, sancionada em 13/05/90, indicava que estas novas hipóteses poderiam ser imediatamente aplicadas, uma vez que não alteravam o processo eleitoral. O Tribunal levou em consideração para fixar o início do processo eleitoral a data de 05 de julho, amparada pelo art. 11 da Lei Geral das Eleições, data esta para o registro final das candidaturas por parte dos partidos e de suas eventuais coligações. Ocorre que a composição dos Ministros do STF havia se modificado substancialmente de 1992 para 2010 e esta modificação logicamente, transpareceu nos julgamentos que se seguiram. Chegou ao STF recurso do ex-secretário municipal de Uberlândia, Leonídio Bouças do PMDB de Minas Gerais; ele havia sido condenado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais por improbidade administrativa. Nesse julgamento cujo relator foi o Ministro Gilmar Mendes, o STF decidiu por maioria de votos que a LC 135/10 não poderia ser aplicada às eleições de 2010. O Supremo baseou-se no princípio da anterioridade em matéria eleitoral, amparado pelo art. 16 do texto constitucional. As divergências na maior corte do País giravam em torno da data em que se considera, de fato, iniciado o processo eleitoral. Com base nesse entendimento, se definiriam então, se as novas hipóteses de inelegibilidades poderiam ou não ser aplicadas e exigidas já para as eleições que ocorreriam em outubro de 2010. O STF como se sabe é formado por 11 Ministros e os temas que ali chegam são decididos, em grande parte, por sua composição Plenária. Dos 11 Ministros, cinco decidiram pela aplicação imediata da lei indicando como fundamento de sua convicção o fato de que o processo eleitoral apenas se iniciaria com: (1) as convenções partidárias que pela Lei Geral das Eleições se realizariam entre 10 e 30 de junho e (2) com o registro das candidaturas que deveriam ser efetivados até às dezenove horas do dia 05 de julho. Nesse sentido votaram os Ministros Carmem Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Ayres Britto e Ellen Gracie. Com a aplicação imediata da lei vários políticos que almejam a reeleição ou a eleição seriam barrados pela Justiça Eleitoral. Grande parte da população brasileira, desconhecendo o texto constitucional se inclinava para aceitar esta posição. A mídia alardeou o voto destes Ministros aos quatro cantos da imensidão territorial do Brasil, enfim a moralização da classe política seria uma realidade paupável. Do outro lado, os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso se posicionaram no sentido de que o processo eleitoral começaria, de fato, um ano das eleições, com o fim do prazo legal para as filiações partidárias (regra amparada pelo art. 9 da Lei Geral que determina que "para concorrer as eleições, o candidato deverá possuir domicilio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de, pelo menos, um ano antes do pleito e estar com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo". Ora, se para concorrer a cargos eletivos o candidato deve estar previamente filiado a partido político um ano antes das eleições, é nesta data que de fato começa o processo rumo ao próximo pleito. Decidiram desta forma os Ministros acima referidos. O placar agora estava 5 a 5. Faltava um voto. A sociedade de maneira geral estava também, nesse momento bastante dividida. O Ministro Eros Grau havia de aposentado recentemente e o então Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva ainda não havia indicado o seu sucessor. O tema ficaria em aberto até março de 2010, quando então após assumir seu lugar na corte o novo Ministro Luiz Fux assim se posicionou: "a iniciativa popular é mais do que salutar, mas sempre em consonância com a garantia constitucional. Um país onde a Carta Federal não é respeitada é um país que não tem constituição. A justiça não pode se balizar pela opinião pública." O Tribunal decidiu desta forma que e lei não poderia ser aplicada para as eleições que ocorreriam em 2010, deveria respeitar o princípio da anterioridade em matéria eleitoral, aguardar um ano da data de sua publicação para surtir efeitos concretos e reais. Pacificado o tema para os casos específicos faltava ainda analisar o mesmo à luz do chamado controle abstrato ou concentrado de constitucionalidade, expediente que decide de maneira definitiva se referida lei pode ou não ser aplicada no Brasil, se ela está ou não em acordo com as disposições da Lei Maior do País, e em fevereiro de 2011 o tema relacionado a aplicação das novas inelegibilidades amparadas pela LC135/10, finalmente chegou ao fim. O Supremo Tribunal Federal decidiu em 16/02/11 que a Lei da chamada Ficha Limpa era de fato constitucional. Com a decisão final os dois principais temas trazidos pela nova lei seriam considerados válidos para as próximas eleições (outubro de 2012): (1) candidatos condenados por órgãos colegiados teriam seus registros indeferidos pela Justiça Eleitoral (não se exigiria mais que referida condenação transitasse em julgado para que a candidatura se considerasse barrada) e (2) a lei valeria para condenações e renúncias apresentadas antes de 10 de junho de 2010 (data da sanção das novas regras pelo então Presidente Lula). Apesar da validade das novas regras a população ainda estava na dúvida sobre a possibilidade da eleição de alguns políticos "conhecidos", nesse sentido o site "Congresso em Foco" divulgou em fevereiro de 2011 uma lista extremamente interessante sobre alguns destes personagens. Vejamos. Severino Cavalcanti do PP de Pernambuco, o conhecido ex-presidente da Câmara dos Deputados que cobrava, segundo a fonte acima mencionada, o "mensalinho das quentinhas" está inelegível. Pelas regras da Lei da Ficha Limpa (LC135/10) quem renuncia ao mandato para escapar à cassação fica inelegível por um período de oito anos após o exercício final do mandato que não completou. As informações do site destacam que o mandato do ex-deputado Federal terminaria em 2007 logo ele está inelegível até o ano de 2015. Cássio Cunha Lima, PSDB da Paraíba, é um caso curioso e peculiar. Foi condenado segundo a fonte já aludida, pelo TSE por abuso de poder econômico e político. A LC 135/10 prevê oito anos de inelegibilidade para condenações da Justiça Eleitora baseadas nesse fundamento. Ocorre que Cunha Lima permanece no exercício do mandato de Senador ao qual concorreu e venceu em 2012 (maior votação ao Senado da Paraíba) uma vez que a lei não pôde ser aplicada para as eleições de 2010. Dessa forma após o final de seu mandato de oito anos como Senador da República, na tentativa de uma nova reeleição ao mesmo cargo ou de eleição para cargo distinto, as regras serão a ele aplicadas e não será possível o registro de sua candidatura e consequentemente sua eleição. Aliás, temos vários casos semelhantes ao do Senador Cunha Lima, Deputados e Senadores que estão atualmente no exercício de mandatos eletivos, mas que em razão do enquadramento em algumas das hipóteses amparadas pela nova Lei restarão inelegíveis assim que deixaram o cargo que atualmente ocupam. Por outro lado alguns políticos acabaram escapando das novas regras, como por exemplo, o conhecidíssimo Senador Jader Barbalho, do PMDB da Paraíba. Após uma série de denúncias por parte do então Senador Antônio Carlos Magalhães, Jader Barbalho renunciou ao mandato que terminaria em 2003 já no ano de 2001. As regras de aplicação da Lei da Ficha Limpa, de acordo com as diretrizes do STF, se aplicariam (e de fato se aplicam) para condenações e renúncias ocorridas antes de 2011 (data do julgamento definitivo junto ao STF) e o prazo de inelegibilidade é de oito anos. Como visto, o político renunciou em 2001 ao mandato que só terminaria em 2003, o prazo de oito anos se esgotaria em 2011. Ele não é mais inelegível, escapou das regras legais pela aplicação da própria regra. Situação semelhante é a de José Roberto Arruda, atualmente sem partido e ex Governador do Distrito Federal, renunciou ao mandato que findaria em 2003 em 2001 ficou inelegível até dezembro de 2011. Como se pode perceber as alterações trazidas pela Lei Complementar 135/10 que recebeu o apelido de Lei da "Ficha Limpa" ou Lei do "Político Ficha Suja" nasceram do profundo desejo da população brasileira de dar um "basta" aos desmazelos e aos "malfeitos", como diria nossa atual Presidente da República, provenientes da classe política brasileira, francamente desacreditada em face de inúmeros privilégios insustentáveis e, a bem da verdade inexplicáveis. Há muito tempo não se observava tão curiosa movimentação da sociedade no sentido de demonstrar tamanho grau de insatisfação com a classe política brasileira e até, por que não dizer, no sentido de lembrar aos representantes que exercem seu ofício junto ao Congresso Nacional que eles, na realidade, são apenas representantes dos legítimos detentores do Poder nesse País Democrático. Não se pode deixar de destacar também o importantíssimo papel de uma imprensa verdadeiramente responsável nesse sentido, fato este que fez com que a Lei encontrasse clara e rápida aderência em parte relevante da sociedade brasileira. Apesar da insatisfação de parcela da população brasileira por conta da não aplicação imediata da lei na data de sua publicação, somos como no início destacamos um País pautado por regras democráticas disciplinadas por uma Constituição Federal. Nossa Lei Maior, conquistada "a duras penas" após mais de 20 anos de ditadura, não pode de maneira nenhuma, se curvar aos desejos da sociedade, por mais legítimos que estes parecem ser. Existe um caminho democrático a ser percorrido para alteração das regras previstas no texto maior da Nação Brasileira, caminho este que garante legitimidade e respeito às instituições por nós mesmo estabelecidas nos idos de 1988; as regras do jogo democrático devem, portanto, ser respeitadas é com base no respeito a estas regras que encontramos a tão aclamada e desejada segurança jurídica. Termino com as palavras do Ministro Luiz Fux que em seu voto resume de maneira magistral a ideia acima ventilada: "a Lei da Ficha Limpa é a lei do futuro. É a aspiração legítima da nação brasileira, mas não pode ser um desejo saciado no presente, em homenagem à Constituição, que garante a liberdade para respirarmos o ar que respiramos, e que protege a nossa família". |
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