Kant, Immanuel (1724-1804)
Immanuel Kant
(Königsberg, 22 de abril de 1724 — Königsberg, 12 de fevereiro de 1804)
foi um filósofo prussiano, geralmente considerado como o último grande
filósofo dos princípios da era moderna, indiscutivelmente um dos
pensadores mais influentes.
Depois
de um longo período como professor secundário de geografia, começou em
1755 a carreira universitária ensinandoCiências Naturais. Em 1770 foi
nomeado professor catedrático da Universidade de Königsberg, cidade da
qual nunca saiu, levando uma vida monotonamente pontual e só dedicada
aos estudos filosóficos. Realizou numerosos trabalhos sobre ciência,
física, matemática, etc.
Kant
operou, na epistemologia, uma síntese entre o Racionalismo continental
(de René Descartes e Gottfried Leibniz, onde impera a forma de
raciocínio dedutivo), e a tradição empírica inglesa (de David Hume, John
Locke, ou George Berkeley, que valoriza a indução).
Kant é famoso sobretudo pela elaboração do denominado idealismo transcendental: todos nós trazemos formas e conceitos a priori
(aqueles que não vêm da experiência) para a experiência concreta do
mundo, os quais seriam de outra forma impossíveis de determinar. A
filosofia da natureza e da natureza humana de Kant é historicamente uma
das mais determinantes fontes dorelativismo conceptual que dominou a
vida intelectual do século XX. No entanto, é muito provável que Kant
rejeitasse o relativismo nas formas contemporâneas, como por exemplo o
Pós-modernismo.
Kant
é também conhecido pela filosofia moral e pela proposta, a primeira
moderna, de uma teoria da formação do sistema solar, conhecida como a
hipótese Kant-Laplace.
A menoridade humana
Kant
define a palavra esclarecimento como a saída do homem de sua
menoridade. Segundo esse pensador, o homem é responsável por sua saída
da menoridade. Kant define essa menoridade como a incapacidade do homem
de fazer uso do seu próprio entendimento.
A
permanência do homem na menoridade se deve ao fato de ele não ousar
pensar. A covardia e a preguiça são as causas que levam os homens a
permanecerem na menoridade. Um outro motivo é o comodismo. É bastante
cômodo permanecer na área de conforto. É cômodo que existam pessoas e
objetos que pensem e façam tudo e tomem decisões em nosso lugar. É mais
fácil que alguém o faça, do que fazer determinado esforço, pois já
existem outros que podem fazer por mim. Os homens quando permanecem na
menoridade, são incapazes de fazer uso das próprias pernas,são incapazes
de tomar suas próprias decisões e fazer suas próprias escolhas.
Em seu texto O que é o Iluminismo?, Kant sintetiza seu otimismo iluminista [1]
em relação à possibilidade de o homem seguir por sua própria razão, sem
deixar enganar pelas crenças, tradições e opiniões alheias. Nele,
descreve o processo de ilustração como sendo "a saída do homem de sua
menoridade", ou seja, um momento em que o ser humano, como uma criança
que cresce e amadurece, se torna consciente da força e inteligência para
fundamentar a sua própria maneira de agir, sem a doutrina ou tutela de
outrem.
Kant
afirma que é difícil para o homem sozinho livrar-se dessa menoridade,
pois ela se apossou dele como uma segunda natureza. Aquele que tentar
sozinho terá inúmeros impedimentos, pois seus tutores sempre tentarão
impedir que ele experimente tal liberdade. Para Kant, são poucos aqueles
que conseguem pelo exercício do próprio espírito libertar-se da
menoridade.
Vida
Túmulo de Immanuel Kant em Kaliningrado (antigo Königsberg)
Kant
nasceu, viveu e morreu em Königsberg (atual Kaliningrado), na altura
pertencente à Prússia. Foi o quarto dos nove filhos de Johann Georg
Kant, um artesão fabricante de correias (componente das carroças de
então) e da mulher Regina. Nascido numa família protestante (Luterana),
teve uma educação austera numa escola pietista, que frequentou graças à
intervenção de um pastor. Ele próprio foi um cristão devoto por toda a
sua vida.
Passou
grande parte da juventude como estudante, sólido mas não espetacular,
preferindo o bilhar ao estudo. Tinha a convicção curiosa de que uma
pessoa não podia ter uma direcção firme na vida enquanto não atingisse
os 39 anos. Com essa idade, era apenas um metafísico menor numa
universidade prussiana, mas foi então que uma breve crise existencial o
assomou. Pode argumentar-se que teve influência na posterior direcção.
Kant
foi um respeitado e competente professor universitário durante quase
toda a vida, mas nada do que fez antes dos 50 anos lhe garantiria
qualquer reputação histórica. Viveu uma vida extremamente regulada: o
passeio que fazia às 15:30 todas as tardes era tão pontual que as
mulheres domésticas das redondezas podiam acertar os relógios por ele.
Kant
nunca deixou a Prússia e raramente saiu da cidade natal. Apesar da
reputação que ganhou, era considerado uma pessoa muito sociável: recebia
convidados para jantar com regularidade, insistindo que a companhia era
boa para a constituição física.
Por
volta de 1770, com 46 anos, Kant leu a obra do filósofo escocês David
Hume. Hume é por muitos considerados um empirista ou um cético, muitos
autores o consideram um naturalista.
Kant
sentiu-se profundamente inquietado. Achava o argumento de Hume
irrefutável, mas as conclusões inaceitáveis. Durante 10 anos não
publicou nada e, então, em 1781 publicou o massivo "Crítica da Razão
Pura", um dos livros mais importantes e influentes da moderna filosofia.
Neste
livro, ele desenvolveu a noção de um argumento transcendental para
mostrar que, em suma, apesar de não podermos saber necessariamente
verdades sobre o mundo "como ele é em si", estamos forçados a
percepcionar e a pensar acerca do mundo de certas formas: podemos saber
com certeza um grande número de coisas sobre "o mundo como ele nos
aparece". Por exemplo, que cada evento estará causalmente conectado com
outros, que aparições no espaço e no tempo obedecem a leis da geometria,
da aritmética, da física, etc.
Inscrições ao longo da tumba de Kant, dentre elas (...)"O céu estrelado por sobre mim e a lei moral dentro de mim" (…)
Nos
cerca de vinte anos seguintes, até a morte em 1804, a produção de Kant
foi incessante. O seu edifício da filosofia crítica foi completado com
aCrítica da Razão Prática, que lidava com a moralidade de forma similar
ao modo como a primeira crítica lidava com o conhecimento; e a Crítica do Julgamento,
que lidava com os vários usos dos nossos poderes mentais, que não
conferem conhecimento factual e nem nos obrigam a agir: o julgamento
estético (do Belo e Sublime) e julgamento teleológico (Construção de
Coisas Como Tendo "Fins"). Como Kant os entendeu, o julgamento estético e
teleológico conectam os nossos julgamentos morais e empíricos um ao
outro, unificando o seu sistema.
Uma das obras, em particular, atinge hoje em dia grande destaque entre os estudiosos da filosofia moral. A Fundamentação da Metafísica dos Costumes
é considerada por muitos filósofos a mais importante obra já escrita
sobre a moral. É nesta obra que o filósofo delimita as funções da ação
moralmente fundamentada e apresenta conceitos como o "Imperativo
categórico" e a "Boa vontade".
Os
trabalhos de Kant são a sustentação e ponto de início da moderna
filosofia alemã; como diz Hegel, frutificou com força e riqueza só
comparáveis à do socratismo na história da filosofia grega. Fichte,
Hegel, Schelling, Schopenhauer, para indicar apenas os maiores,
inscrevem-se na linhagem desse pensamento que representa um etapa
decisiva na história da filosofia e está longe de ter esgotado a sua
fecundidade.[2]
Kant
escreveu alguns ensaios medianamente populares sobre história, política
e a aplicação da filosofia à vida. Quando morreu, estava a trabalhar
numa projetada "quarta crítica", por ter chegado à conclusão de que seu
sistema estava incompleto; este manuscrito foi então publicado como Opus Postumum. Morrera em 12 de fevereiro de 1804 na mesma cidade que nascera e permanecera durante toda sua vida. Encontra-se sepultado noCemitério do Caliningrado, Caliningrado, Kaliningradskaya Oblast' na Rússia.[3]
Filosofia, o "Criticismo"
"Heróis da Paz" Kant esculpido na Estátua equestre.
O "criticismo" kantiano [4]
parte na confluência do racionalismo, do empirismo inglês (David Hume) e
a ciênciafísica-matemática de Isaac Newton. Seu caminho histórico está
assinalado pelo governo de Frederico II, a independência americana e a
Revolução Francesa.
As
questões de partida do Kantismo são o problema do conhecimento, e a
ciência, tal como existe. A ciência se arranja de juízos que podem ser
analíticos e sintéticos. Nos primeiros (o quadrado tem quatro lados e
quatro ângulos internos), fundados no princípio de identidade, o
predicado aponta um atributo contido no sujeito. Tais juízos independem
da experiência, são universais e necessários. Os sintéticos, a
posteriori resultam da experiência e sobrepõem ao sujeito no predicado
um atributo que nele não se acha previamente contido (o calor dilata os
corpos ), sendo, por isso, privados e incertos.
Uma
indagação eminente que o levara à sintetização do pensar: Que juízos
constituem a ciência físico matemática? Caso fossem analíticos, a
ciência sempre diria o mesmo (e não é assim), e, se fossem sintéticos um
hábito sem fundamento (o calor dilata os corpos porque costuma
dilatá-los). Os juízos da ciência devem ser, ao mesmo tempo, a priori,
quer dizer, universais e necessários, e sintéticos objetivos, fundados
na experiência. Trata-se pois, de saber como são possíveis os juízos
sintéticos a priori na matemática e na física, ("Estética
transcendental" e "Analítica transcendental"), e se são possíveis na
metafísica ("Dialética transcendental", partes da Crítica da razão
pura).
Para
os juízos sintéticos a priori são admissíveis na matemática porque essa
ciência se fundamenta no espaço e no tempo, formas a priori da
sensibilidade, intuições puras e não conceitos de coisas como objetos. O
espaço é a priori, não deriva da experiência, mas é sua condição de
possibilidade. Podemos pensar o espaço sem coisas, mas não coisa sem
espaço. O espaço é o objeto de intuição e não conceito, pois não podemos
ter intuição do objeto de um conceito (pedra, carro, cavalo, etc.),
gênero ou espécie. Ora, o espaço não é nem uma coisa nem outra, e só há
um espaço (o nada, referindo ao espaço).
Na
apresentação "transcendental" do espaço, Kant determina as condições
subjetivas ou transcendentais da objetividade. Se o conhecimento é
relação, ou relacionamento (do sujeito com o objeto), não, pode conhecer
as coisas "em si", mas "para nós".
A
geometria pura, quando aplicada, coincide totalmente com a experiência,
porque o espaço é a forma a priori da sensibilidade externa. O tempo é,
também, a priori. Podemos concebê-lo sem acontecimentos, internos ou
externos, mas não podemos conceber os acontecimentos fora do tempo.
Objeto de intuição, não pode ser conceito. Forma vazia, intuição pura,
torna possíveis por exemplo os juízos sintéticos a priori na aritmética,
cujas operações (soma, subtração, etc.), ocorrendo sucessivamente, o
pressupõem. O tempo é, pois, a forma a priori da sensibilidade interna e
externa.
Esse
privilégio explica a compenetração da geometria e da aritmética. A
geometria analítica (Descartes) permite reduzir as figuras a equações e
vice-versa. O cálculo infinitesimal (Leibniz) arremata essa
compenetração definindo a lei de desenvolvimento de um ponto em qualquer
direção do espaço. A matemática é pois, um conjunto de leis a priori,
que coincidem com a experiência e a tornam cognoscível.
As
condições de possibilidade do conhecimento sensível são, portanto, as
formas a priori da sensibilidade. Não existe a "coisa em si". Se
existisse não se poderia a conhecer enquanto tal, e nada se poderia
dizer a seu respeito. Só é possível conhecer coisas extensas no espaço e
sucessivas no tempo, enquanto se manifestam, ou aparecem, ou seja,
"fenômenos,
Na
"analítica transcendental", Kant analisa a possibilidade dos juízos
sintéticos a priori na física. Compreendemos que a natureza é regida por
leis matemáticas que ordenam com rigor o comportamento das coisas (o
que permite ciências como engenharia, etc., serem possíveis o
determinismo com certa regularidade). Não há como saber das coisas com
apenas percepções sensíveis, impressões. Há um conhecimento a priori da
natureza. A função principal dos juízos da natureza. Ora, a função
principal dos juízos é pôr, colocar a realidade e, em seguida,
determiná-la. As diversas formas do juízo deverão, portanto, conter as
diversas formas da realidade.
Essa
formas estão estudadas desde Aristóteles, que as classifica de acordo
com a quantidade, a qualidade, a relação e a modalidade. Na "Dedução
transcendental" das categorias, Kant volta a classificação aristotélica,
dando-lhe novo sentido. Assim, à quantidade, correspondem a unidade, a
pluralidade e a totalidade; à qualidade a essência, a negação e a
limitação; a relação a substância, a causalidade e a ação recíproca; à
modalidade, a possibilidade, a existência e a necessidade.
Tais
categorias são as condições de possibilidade dos juízos sintéticos a
priori em física. As condições do conhecimento são, enfim, como se acabe
de ver, as condições prévias da objetividade. A ciência da natureza
postula a existência de objetos, sua consistência e as relações de causa
e efeito. Se as categorias universais, particulares e contingentes,
devem proceder de nós mesmos, de nosso entendimento.
Em
tal descoberta consiste a "inversão copernicana", realizada por Kant.
Não é o objeto que determina o sujeito, mas o sujeito que determina o
objeto. As categorias são conceitos, todavia, puros, a priori,
anteriores à experiência e que, por isso, a tornam possível. Em suma, o
objeto só se torna cognoscível na medida em que o sujeito que determina o
objeto. Em suma, o objeto só se torna cognoscível na medida em que o
sujeito cognoscente o reveste das condições de cognoscibilidade.[5]
Na
"dialética transcendental", finalmente Kant examina a possibilidade dos
juízos sintéticos a priori na metafísica. A "coisa em si" (alma, Deus,
essência do cosmos, etc.), não nos é dada em experiência alguma. Ora,
como chega a razão a formar esses objetos? Sintetizando além da
experiência, fazendo a síntese das sínteses, porque aspira ao infinito,
ao incondicionado, ao absoluto. Nas célebres, "antinomias", Kant mostra
que a razão pura demonstra, "indiferentemente", a finitude e a
infinitude do universo, a liberdade e o determinismo, a existência e a
inexistência de Deus. Ultrapassando os limites da experiência, aplica
arbitrariamente as categorias e pretende conhecer o incognoscível. A
metafísica é impossível como ciência, pois não se pode chegar mais, além
disso.
Juízo Estético de Kant
Retrato de Immanuel Kant.
O juízo estético é abordado no livro Crítica da Faculdade do Juízo.
De acordo com Kant para se ter uma investigação crítica a respeito do
belo, devemos estar orientados pelo poder de julgar. E a indagação
básica que move essa investigação crítica a respeito do belo é: existe
algum valor universal que conceitue o belo e que reivindique que outras
pessoas, a partir da minha apreciação de uma forma bela da natureza ou
da arte, confirmem essa posição? Ou então somos obrigados a admitir que
todo objeto que julgamos como sendo belo é uma valoração subjetiva?
O
poder de julgar, pertencendo a todo sujeito, é universal e congraça o
julgamento estético, especulativo e prático. Portanto a investigação
crítica que Kant se refere diz respeito às possibilidades e limitações
das faculdades subjetivas que agem sob princípios formulados e que
pertencem à essência do pensamento.
Como
podemos desnudar o fenômeno que explica o nosso gosto? Se fizermos uma
experiência com vários indivíduos e o defrontarmos com um objeto de
arte, observaremos que as impressões causadas serão as mais diversas.
Então chegaremos à conclusão de que a observação atenta e valorativa
daquele objeto, somada as diferentes opiniões que foram apresentadas
pelos indivíduos, nos dá respaldo para afirmar que o gosto tem que ser
discutido. Para Kant apenas sobre gosto se discute, ao passo que,
representa uma reivindicação para tornar universal um juízo subjetivo.
A
universalidade do juízo estético é detectada por envolver um exercício
persuasivo de convencimento de outro sujeito que aquela determinada
forma da natureza ou da arte é bela. E, dessa forma, torna aquele valor
universal. Os sujeitos têm em comum um princípio de avaliação moral
livre que determina a avaliação estética e, portanto, julga o belo como
universal.
O
juízo estético está relacionado ao prazer ou desprazer que o objeto
analisado nos imprime e, como se refere Kant, o belo "é o que agrada
universalmente, sem relação com qualquer conceito". Essa situação fica
bem evidente quando visitamos um museu. Digamos que essa experiência
fosse realizada no Museu do Louvre, em Paris, com o quadro Monalisa. Se
nos colocarmos como observador, perceberemos que os mais diversos
comentários serão tecidos a cerca dessa obra tão famosa.
Detendo-nos
na análise dos comentários favoráveis notaremos que, ratificando Kant, o
belo não está arraigado em nenhum conceito. Pois, dos vários indivíduos
que vão apreciar a obra de Leonardo da Vinci, encontraremos desde
pessoas especializadas em arte até leigos, como eu ou você, que vão
empregar cada qual um conceito, de acordo com a percepção, após a
contemplação da Monalisa. Então isso comprova que não existe uma
definição exata a cerca do belo, mas sim um sentimento que é universal e
necessário.
A paz perpétua
A
paz perpétua trata que o direito cosmopolítico deve circunscrever-se às
condições de uma hospitalidade universal. Dessa forma, Kant traz no
terceiro artigo definitivo de um tratado de paz perpetua, o fato de que
existe um direito cosmopolitano relacionado com os diferentes modos do
conflito dos indivíduos intervirem nas relações com outros indivíduos. A
pessoa que está em seu território, no seu domínio, pode repelir o
visitante se este interfere em seu domínio.
No
entanto, cas0 o visitante mantenha-se pacifico, não seria possível
hostiliza-lo. Também, não se trata de um direito que obrigatoriamente o
visitante poderia exigir daquele que o tem assim, mas sim, de um direito
que persiste em todos os homens, o do direito de apresentar-se na
sociedade.
O
direito de cada um na superfície terrestre pode ser limitada no sentido
da superfície. Já o indivíduo deve tolerar a presença do outro, sem
interferir nele, visto que tal direito persiste a toda espécie humana.
Então, o direito da posse comunitária da superfície terrestre pertence a
todos aqueles que gozam da condição humana, existindo uma tolerância de
todos a fim de que se alcance uma convivência plena.
Veja
que o ato de hostilidade está presente no ato do direito de
hospitalidade. Mesmo que o espaço seja limitado, os indivíduos devem se
comportar pacificamente com o intuito de se alcançar a paz de convívio
mútuo. O relacionamento entre as pessoas está na construção dos direitos
de cada um, sendo indispensável para a compreensão do direito
cosmopolítico de modo a garantir as condições necessárias para termos
uma hospitalidade universal.
Por
fim, a não violação do direito cosmopolitano e o direito público da
humanidade criará condições para o favorecimento da paz perpetua,
proporcionando a esperança de uma possível aproximação do estado
pacífico.
Crítica e sistema
"Só a crítica pode cortar pela raiz o materialismo, ofatalismo, o ateísmo, a incredulidade dos espíritos fortes, o fanatismo e a superstição, que se podem tornar nocivos a todos e, por último, também oidealismo e o cepticismo, que são sobretudo perigosos para as escolas e dificilmente se propagam no público." | Kant,Crítica da razão pura, B XXXIV.[6] |
Apesar
de ter adaptado a ideia de uma filosofia crítica, cujo objectivo
primário era "criticar" as limitações das nossas capacidades
intelectuais, Kant foi um dos grandes construtores de sistemas, levando a
cabo a ideia de crítica nos seus estudos da metafísica, ética e
estética.
Uma
citação famosa - "o céu estrelado por sobre mim e a lei moral dentro de
mim" - é um resumo dos seus esforços: ele pretendia explicar, numa
teoria sistemática, aquelas duas áreas. Isaac Newton tinha desenvolvido a
teoria da física sob a qual Kant queria edificar a filosofia. Esta
teoria envolvia a assunção de forças naturais de que os homens não se
apercebem, mas que são usadas para explicar o movimento de corpos
físicos.
O
seu interesse na ciência também o levou a propor em 1755 que o sistema
solar fora criado a partir de uma nuvem de gás na qual os objectos se
condensaram devido à gravidade. Esta Hipótese Nebular é amplamente
reconhecida como a primeira teoria moderna da formação do sistema solar e
é precursora das actuais teorias da formação estelar.
Metafísica e epistemologia de Kant
Capa da obra Crítica da Razão Pura,1781.
O livro mais lido e mais influente de Kant é a Crítica da Razão Pura
(1781). De acordo com o próprio autor, a obra, também conhecida como
"primeira crítica", é resultado da leitura de Hume e do seu despertar do
sono dogmático, a saber: Kant se perguntou como são possíveis juízos sintéticos a priori? Para responder a essa pergunta, Kant escreveu esse livro portentoso, de mais de 800 páginas.
Na
primeira crítica, Kant vai mostrar que tempo e espaço são formas
fundamentais de percepção (formas da sensibilidade) que existem como
ferramentas da mente, mas que só podem ser usadas na experiência.
Tente imaginar alguma coisa que existe fora do tempo e que não tem extensão no espaço.[5]
A mente humana não pode produzir tal ideia. Nada pode ser percebido
excepto através destas formas, e os limites da física são os limites da
estrutura fundamental da mente. Assim, já vemos que não podemos conhecer
fora do espaço e do tempo.
Mas
além das formas da sensibilidade, Kant vai nos dizer que há também o
entendimento, que seria uma faculdade da razão. O entendimento nos
fornece as categorias com as quais podemos operar as sínteses do diverso
da experiência.
Assim, como são possíveis juízos sintéticos a priori? São possíveis porque há uma faculdade da razão - o entendimento - que nos fornece categorias a priori - como causa e efeito - que nos permitem emitir juízos sobre o mundo.
Contudo,
diz Kant, as categorias são próprias do conhecimento da experiência.
Elas não podem ser empregadas fora do campo da experiência. Daí porque,
na filosofia crítica de Kant, não nos é possível conhecer a coisa em si, ou aquilo que não está no campofenomenológico da experiência.
Na perspectiva de Kant, há, por isso, o conhecimento a priori
de algumas coisas, uma vez que a mente tem que ter estas categorias, de
forma a poder compreender a massa sussurrante de experiência crua,
não-interpretada que se apresenta às nossas consciências. Em segundo
lugar, ela remove o mundo real (a que Kant chamou o mundo numenal ou
númeno) da arena da percepção humana.
Kant
denominou a filosofia crítica de "idealismo transcendental". Apesar da
interpretação exacta desta frase ser contenciosa, uma maneira de a
compreender é através da comparação de Kant, no segundo prefácio à
"Crítica da Razão Pura", da filosofia crítica com a revolução copernicana na astronomia.
Tal como Copérnico revolucionou a astronomia ao mudar o ponto de vista, a filosofia crítica de Kant pergunta quais as condições a priori para que o nosso conhecimento do mundo se possa concretizar.
O
idealismo transcendental descreve este método de procurar as condições
da possibilidade do nosso conhecimento do mundo. Mas esse idealismo
transcendental de Kant deverá ser distinguido de sistemas idealistas,
como os de Berkeley. Enquanto Kant acha que os fenómenos dependem das
condições da sensibilidade, espaço e tempo, esta tese não é equivalente à
dependência-mental no sentido do idealismo de Berkeley.
Para
Berkeley, uma coisa é um objecto apenas se puder ser percepcionada.
Para Kant, a percepção não é o critério da existência dos objectos.
Antes, as condições de sensibilidade - espaço e tempo - oferecem as
"condições epistémicas", para usar a frase de Henry Allison, requeridas
para que conheçamos objectos no mundo dos fenómenos. Kant tinha querido
discutir os sistemas metafísicos mas descobriu "o escândalo da
filosofia": não se pode definir os termos correctos para um sistema
metafísico até que se defina o campo, e não se pode definir o campo até
que se tenha definido o limite do campo da física - física, no sentido
de discussão do mundo perceptível.
Kant
afirma, em síntese, que não somos capazes de conhecer inteiramente os
objetivos reais e que o nosso conhecimento sobre os objetos reais é
apenas fruto do que somos capazes de pensar sobre eles.
Filosofia Moral
Estátua de Immanuel Kant em Kaliningrado
Immanuel
Kant desenvolve a filosofia moral em três obras: Fundamentação da
Metafísica dos Costumes (1785), Crítica da Razão Prática (1788) e
Crítica do Julgamento (1790).
Nesta
área, Kant é provavelmente mais bem conhecido pela teoria sobre uma
obrigação moral única e geral, que explica todas as outras obrigações
morais que temos: o imperativo categórico.
Age de tal modo que a máxima da tua ação se possa tornar princípio de uma legislação universal. |
O
imperativo categórico, em termos gerais, é uma obrigação incondicional,
ou uma obrigação que temos independentemente da nossa vontade ou
desejos (em contraste com o imperativo hipotético).
As
nossas obrigações morais podem ser resultantes do imperativo
categórico. O imperativo categórico pode ser formulado em três formas,
que ele acreditava serem mais ou menos equivalentes (apesar de opinião
contrária de muitos comentadores):
§
A primeira formulação (a fórmula da lei universal) diz: "Age somente em
concordância com aquela máxima através da qual tu possas ao mesmo tempo
querer que ela venha a se tornar uma lei universal".
§
A segunda fórmula (a fórmula da humanidade) diz: "Age por forma a que
uses a humanidade, quer na tua pessoa como de qualquer outra, sempre ao
mesmo tempo como fim, nunca meramente como meio".
§
A terceira fórmula (a fórmula da autonomia) é uma síntese das duas
prévias. Diz que deveremos agir por forma a que possamos pensar de nós
próprios como leis universais legislativas através das nossas máximas.
Podemos pensar em nós como tais legisladores autônomos apenas se
seguirmos as nossas próprias leis..
Kant e a Revolução Francesa
Estátua de Immanuel Kant na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG.
Em
1784, no seu ensaio "Uma resposta à questão: o que é o Iluminismo?",
Kant visava vários grupos que tinham levado o racionalismo longe de
mais: os metafísicos que pretendiam tudo compreender acerca de Deus e da
imortalidade; os cientistas que presumiam nos seus resultados a mais
profunda e exacta descrição da natureza; os cépticos que diziam que a
crença em Deus, na liberdade, e na imortalidade, eram irracionais.
Kant mantinha-se no entanto optimista [7],
começando por ver na Revolução Francesa uma tentativa de instaurar o
domínio da razão e da liberdade. Toda a Europa do Iluminismo contemplava
então fascinada os acontecimentos revolucionários em França.
A
Revolução francesa vai no entanto ser um marco de viragem, também na
filosofia de Kant. Observando a evolução e as realizações práticas, Kant
volta a reflectir sobre a prometida razão e liberdade.
No plano religioso, em 1792, Kant, ao escrever a obra Der Sieg des guten Prinzips über das böse und die Gründung eines Reichs Gottes auf Erden
(A vitória do princípio bom sobre o princípio mau e a constituição de
um reino de Deus sobre a terra), afirma ainda cheio de optimismo: "A
passagem gradual da fé eclesiástica ao domínio exclusivo da pura fé
religiosa constitui a aproximação do reino de Deus".[8]
Nessa
obra, o "reino de Deus" anunciado nos Evangelhos recebia como que uma
nova definição e uma nova presença: a Revolução podia apressar a
passagem da fé eclesiástica à fé racional; onde chegasse a Revolução a
"fé eclesiástica" seria superada e substituída pela "fé religiosa", ou
seja, pela "mera fé racional."
Em 1795, no livro Das Ende aller Dinge
("O fim de todas as coisas"), a perspectiva é já completamente
diferente. Kant toma agora em consideração a possibilidade de que, a par
do fim natural de todas as coisas, se verifique também um fim contrário
à natureza, perverso:
Se
acontecesse um dia chegar o cristianismo a não ser mais digno de amor,
então o pensamento dominante dos homens deveria tomar a forma de
rejeição e de oposição contra ele; e o anticristo [...] inauguraria o
seu regime, mesmo que breve, (baseado presumivelmente sobre o medo e o
egoísmo). Em seguida, porém, visto que o cristianismo, embora destinado a
ser a religião universal, de facto não teria sido ajudado pelo destino a
sê-lo, poderia verificar-se, sob o aspecto moral, o fim (perverso) de
todas as coisas.[9]
Face
à violência inaudita da Revolução Francesa, e ao novo tipo de
autoritarismo que se firmava nas "Luzes" da razão, Kant vai também
reflectir acerca dos seus conceitos políticos.[10]
Marcos na vida de Kant
1724 - Kant nasce a 22 de abril.
1740
- Neste ano, Frederico II torna-se Rei da Prússia. Foi um rei que
trouxe sinais de tolerância à Prússia, que era uma nação célebre pela
disciplina militar. Trouxe iluministas (Voltaire, o mais famoso) para a
corte e continuou a política de encorajamento à imigração que o pai
tinha seguido.
1746 - Falecimento do pai de Kant. Kant deixou de ter sustento. Teria de encontrar trabalho como professor particular.
1748 - 1754 - Kant dá aulas a crianças em pequenas vilas das redondezas.
1755
- Publicação do Livro "História natural genérica e teoria dos céus".
Kant consegue o título de Mestre e o direito a dar aulas na Universidade
Alberto. Daria aulas como docente privado. Não pago pela Universidade
mas pelos próprios alunos. Nesse ano, Kant foi influenciado pelo
desastre que foi o Terramoto de 1755, em Lisboa/Portugal, em parte pelo
resultado de tentar entender a enormidade do sismo e as consequências,
publicou três textos distintos sobre o assunto.
1762
- Kant lê as recentes publicações de Rousseau, "Emile" (uma obra
filosófica sobre a educação do indivíduo) e o ensaio "Contrato social".
1770
- Kant torna-se professor de Lógica e Metafísica na Universidade, após
14 anos como docente (pago pelos alunos). Kant lê por volta desta altura
a obra de David Hume, que o terá despertado do seu "sono dogmático",
como ele próprio disse.
1773 - Ironicamente, Frederico II, um protestante, concede refúgio à Ordem dos Jesuítas, banidos pelo Papa.
1774
- Auge do movimento romântico chamado "Sturm-und-Drang". Herder publica
"Também uma filosofia da História para educação da Humanidade".
1781
- Kant publica em Maio "Crítica da Razão Pura". A reacção é pouco
encorajadora. Moses Mendelssohn e Johann Georg Hamann pronunciam-se com
indecisão.
Selo de 250 anos de nascimento de Immanuel Kant (1724-1804).
1783
- Kant escreve um artigo intitulado "O que é o Iluminismo?" para a
revista "Berlinischen Monatsschrift", como resposta a uma discussão na
mesma. Um anónimo tinha escrito que a cerimónia do casamento já não se
conformava ao espírito dos tempos do iluminismo. Um pastor perguntou na
resposta, que era então o iluminismo. Kant respondeu com o seu artigo.
1788 - Publicação de "Crítica da Razão Prática". Morte do amigo Johann Georg Hamann.
1789
- Início da Revolução Francesa. Kant pronuncia-se inicialmente de forma
favorável à Revolução, e sobretudo à secularização resultante, após o
qual o Rei da Prússia Friedrich Wilhelm II proíbe Kant de se pronunciar
sobre quaisquer temas religiosos.
1795 - Publicação do tratado "Para a paz eterna", na qual surge a perspectiva de um cidadão do mundo esclarecido.
1804
- Com 80 anos de idade, Kant faleceu em Königsberg, após prolongada
doença que apresentava sintomas semelhantes à Doença de Alzheimer. Já
não reconhecia sequer os seus amigos íntimos.
Obras
§ Dissertação sobre a forma e os princípios do mundo sensível e inteligível (1770);
§ Crítica da Razão Pura (1781);
§ Prolegômenos para toda metafísica futura que se apresente como ciência (1783);
§ Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785);
§ Fundamentos da metafísica da moral (1785);
§ Primeiros princípios metafísicos da ciência natural (1786);
§ Crítica da Razão Prática (1788);
§ Crítica do Julgamento (1790);
§ A Religião dentro dos limites da mera razão (1793);
§ A Paz Perpétua (1795);
§ Doutrina do Direito (1796);
§ A Metafísica da Moral (1797);
§ Antropologia do ponto de vista pragmático (1798).
§ Prolegómenos a Toda a Metafísica Futura;
Referências
1. ↑ "O Iluminismo frente ao Romantismo no marco da subjetividade moderna" de G. Mayos (traduzido por Karine Salgado).
2. ↑ Vanni Rovighi, Sofia, Introduzione allo studio di Kant, Roma, 1945, Core, Mori
3. ↑ Immanuel Kant no Find a Grave
4.
↑ "O criticismo kantiano" de G. Mayos. Tradução de Ricardo Henrique
Carvalho Salgado e João Paulo Medeiros Araújo. Barcelona: EducaciOnline,
2008.
5. ↑ a b Crítica da razão pura, Martin Claret/Cassier, Ernst, Kants Leben und lehre, Berlin, 1921.
6. ↑ KANT, I. Crítica da razão pura.
4ª ed. Prefácio à tradução portuguesa, introdução e notas: Alexandre
Fradique MOURUJÃO. Tradução: Manuela Pinto dos SANTOS e Alexandre
Fradique MOURUJÃO. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 30.
7.
↑ "Teoria política de Kant e Herder: Despotismo Esclarecido e
Legitimidade da Revolução" de Gonçal Mayos (trad. Gustavo Silveira
Siqueira).
8. ↑ Emmanuel Kant in Werke IV, coordenado por W. Weischedel, 1956, p. 777.
9. ↑ Emmanuel Kant, Das Ende aller Dinge, cit. em Werke VI, coordenado por W. Weischedel, 1964, p. 190.
10. ↑ Sidney Axinn, "Authority, and the French Revolution", Journal of the History of Ideas, Vol. 32, No. 3 (Jul. - Sep., 1971), pp. 423-432.
Bibliografia
§ ALMEIDA, Aires (org.). Dicionário Escolar de Filosofia. [s.l.]: Plátano Editora, 2003.
§ HEIDEGGER, Martin. Kant und das Problem der Metaphysik. Bonn, 1929.
§ KANT, Immanuel. Crítica da faculdade do juízo. Tradução de Valério Rohden e António Marques. Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária, 1993.
§
MAYOS, Gonçal. "O criticismo kantiano". Tradução de Ricardo Henrique
Carvalho Salgado e João Paulo Medeiros Araújo. Barcelona: EducaciOnline,
2008.
§ Revista de Filosofia, Curitiba, v. 18 n. 21, p. 11-25, jul./dez. 2005.
§ Revista Lindaraja, Madrid, Anuario de la Sociedad Española de Literatura General y Comparada, n. 8, 1990, pags. 25-29, 1990.
§ PEREZ, D. O. Kant e o problema da significação. Curitiba: Editora Champagnat, 2008.
§
PEREZ, D. O. . Religión, Política y Medicina en Kant: El Conflicto de
las Proposiciones. Cinta de Moebio. Revista de Epistemologia de Ciencias
Sociales., v. 28, p. 91-103, 2007.
§ Politics, Religion and Medicine in Kant
§
PEREZ, D. O. . Os significados dos conceitos de hospitalidade em Kant e
a problemática do estrangeiro. Revista Philosophica (Chile), v. 31, p.
43-53, 2007. Também em Konvergencias, 2007, nro. 15.
http://www.philosophica.ucv.cl/n31.htm http://www.konvergencias.net/danieloperez132.pdf
§
PEREZ, D. O. A LOUCURA COMO QUESTÃO SEMÂNTICA:UMA INTERPRETAÇÃO
KANTIANA. Trans/Form/Ação, São Paulo, 32(1): 95-117,
2009.http://www.scielo.br/pdf/trans/v32n1/07.pdf
§ TERUEL, P. J. Mente, cerebro y antropología en Kant. Madrid: Tecnos, 2008.