sábado, 7 de julho de 2012

Sistema prisional: maior Universidade do Brasil

06/07/2012 - 10:00 406 views - 1 comentário
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LUIZ FLÁVIO GOMES ⃰ (@professorLFG)

A mídia vem afirmando que as duas maiores Universidades do País são a Anhanguera e a Kroton (ambas com cerca de 400 mil alunos cada uma). Na verdade, a maior Universidade que temos é o sistema prisional brasileiro, que fechou o ano de 2011 com 514 mil “alunos-prisioneiros”, distribuídos por quase 2 mil “campus” (cadeias e presídios) de aprendizagem intensiva do crime, do ódio e da violência.

Trata-se de uma Universidade que não discute a questão das cotas raciais ou sociais. A sua quase absoluta totalidade é composta de jovens negros, pardos ou brancos miseráveis, que nela ingressam entre 18 e 24 anos, ostentando grande amadorismo criminal. É na Universidade do crime que eles fazem contato com as organizações criminosas, que dominam os presídios, enfileirando-se como seus “soldados”, depois de introjetarem a cultura do crime, do desprezo e do ódio, transformando em realidade a profecia das suas carreiras criminais.
A Universidade do crime no Brasil tem recebido bastante investimento. De 500 unidades em 1990 passou para quase duas mil em 2011. Nesse mesmo período os governos municipais, estaduais e federal fecharam 19% das escolas públicas. Estamos derrubando escolas para abrir “campus” prisionais, daí nossa ridícula colocação (uma das últimas) no “ranking” educacional mundial.
A Universidade do crime tem grande futuro no nosso País porque, para além do amplo apoio da sociedade, ela vem desempenhando satisfatoriamente seus papéis (a) de geração da reincidência, algo em torno de 75% (lamenta-se a falta de comprovação empírica desse dado, mas é bem provável) e (b) de fornecimento de jovens (“soldados”) para a criminalidade organizada, que recebem nestes estabelecimentos de ensino um intenso aprimoramento na carreira criminal.
A Universidade do crime, ademais, cumpre outras funções sociais muito “relevantes”: (a) é pretexto para o discurso demagógico e ilusionista que elege ou reelege muitos políticos, (b) constitui a base de reprodução da fábrica de delinquência, (c) é o espaço privilegiado das discriminações, (d) a garantia da impunidade das outras ilegalidades praticadas pelas classes sociais superiores (dominantes), (e) o reforço do estereótipo midiático do criminoso perigoso, (f) o palco das humilhantes degradações demandadas pelo populismo penal midiático, (g) a alavanca da política criminal de extermínio, (h) o instrumento superlativo de controle social das classes marginalizadas e excluídas etc.
A Comissão de Reforma do CP (instituída pelo Senado), da qual faço parte, se de um lado teve a preocupação de buscar a proporcionalidade entre as penas, de outro, veio reforçar referida Universidade, visto que acabou não resistindo aos apelos do populismo penal midiático, que se fundamenta em pensamentos mágicos, como a crença equivocada de que mais prisões significariam (para além de vingança) menos crimes. O Brasil é campeão mundial na taxa de encarceramento (de 1990 a 2011, 472% de aumento) e, ao mesmo tempo, experimenta um dos maiores incrementos nos índices de homicídio (9,9 mortes para cada 100 mil habitantes em 1979, contra 27,3, em 2011). Prende muito (com frequência desnecessariamente), e a violência não diminui.
Fundada em causalidades mágicas, a Comissão aprovou, por maioria de votos, o endurecimento da progressão de regime: (a) 1/6 da pena como regra geral; (b) 1/3 da pena nos casos de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa ou que revele especial danosidade social; (c) 1/2 de pena quando se trata de réu primário em crime hediondo e (d) 3/5 da pena quando se trata de réu reincidente neste tipo de crime. Todos esses porcentuais, importa sublinhar, são contados sobre a pena total, não sobre o limite de 30 anos.
Na prática, o que vai representar o novo desenho da progressão de regime, caso venha a ser aprovada pelo Congresso Nacional? Ela vai contribuir substancialmente para o incremento da explosão carcerária (de gente não violenta que não deveria nela ingressar), explosão essa que não tem nada a ver com o mito de que mais presos significa menos criminalidade.
Considerando a absoluta ausência de políticas preventivas da criminalidade tradicional ou convencional, a nova explosão carcerária que se avizinha tende a contribuir para a inviabilização da convivência no Brasil, tendo em vista seus efeitos criminógenos amplamente conhecidos: geração de intensa reincidência, recrudescimento do estereótipo criminoso forjado pela mídia, incremento da criminalidade organizada, aumento da violência etc.
*LFG – Jurista e cientista criminal. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes e co-diretor da LivroeNet. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Siga-me no facebook.com/professorLFG, no blogdolfg.com.br, no twitter: @professorLFG e no YouTube.com/professorLFG.

O que se entende por causas repetitivas? - Denise Cristina Mantovani Cera

O que se entende por causas repetitivas? - Denise Cristina Mantovani Cera

5/1/2011 15:30:33

Conhecidas como “causas de massa”, as causas repetitivas são aquelas em que os autores poderiam ter sido litisconsortes por afinidade, mas, por variadas razões, optaram por demandar isoladamente. Nas causas repetitivas há discussão de uma mesma tese jurídica ou um mesmo ponto de fato. Exemplos: correção dos expurgos inflacionários causados pelos planos econômicos governamentais de 1989 e 1990 nas contas de FGTS; questionamento de tributos; reajuste de vencimentos dos servidores.
De acordo com os artigos 103 e 104 do CPC (modelo tradicional de conexão), essas causas não poderiam ser consideradas conexas, pois não há coincidência de pedido nem causa de pedir. Também não há entre elas relação de prejudicialidade ou preliminaridade. Trata-se de causas que se relacionam pela afinidade de algumas questões de fato ou de direito.
São institutos para o processamento de causas repetitivas:
a) Súmula vinculante.
CRFB/99, Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
b) Julgamento liminar de causas repetitivas.
CPC, Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.
c) Ação coletiva para direitos individuais homogêneos.
CDC, Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:
(...)
III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.
CDC, Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
(...)
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.
d) Julgamento de recursos extraordinários por amostragem.
CPC, Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo.
CPC, Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.
Fonte:
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do processo e processo de conhecimento. Vol. 1. Salvador: editora juspodivm, 11ª ed., 2009.

Crimes contra o patrimônio justificam 71,6% das prisões tipificadas no Código Penal


Crimes contra o patrimônio justificam 71,6% das prisões tipificadas no Código Penal

LUIZ FLÁVIO GOMES (@professorLFG)*
Pesquisadora: Mariana Cury Bunduky**
Os últimos levantamentos realizados pelo Instituto de Pesquisa e de Cultura Luiz Flávio Gomes, fundados nos novos números do DEPEN – Departamento Penitencáirio Nacional, de dezembro de 2011 apontaram a existência de 514.582 presos no país, ou 270 presos a cada 100 mil habitantes.
Desse total, 335.696 aprisionamentos (ou 68%) fundamentam-se em delitos tipificados no Código Penal (são os chamados crimes comuns), enquanto os 157.988 (ou 32%) restantes tratam-se de crimes previstos em leis especiais.

Das prisões por crimes comuns (que constituem a maioria), 71,6% (ou 240.642) tratam-se encarceramentos de que envolvem crimes contra o patrimônio, como roubo, furto, apropriação, estelionato, etc.
Assim, os crimes tipificados no Código Penal são responsáveis pela maioria das prisões do país e, nesse montante, os crimes contra o patrimônio, aqueles relacionados a bens materiais, a condições financeiras, são os responsáveis pela maior parte dos aprisionamentos.
Uma evidência de que as diferenças sócio-econômicas e a desigualdade de oportunidades são fatores que ainda influenciam sobremaneira a marginalização, o ingresso na criminalidade e o apriosionamento, sobretudo das classes mais baixas, já que os crimes financeiros e tributários, praticados por classes mais altas, raramente convertem-se em prisão no país (Veja: 42% dos presos não concluíram o ensino fundamental).
Nesse sentido, maiores investimentos em segmentos econômicos e sociais da população seriam mais eficazes para combater a criminalidade do que gastos constantes em aprisionamentos e punição, que só contribuem para alimentá-la.
*LFG – Jurista e cientista criminal. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes e co-diretor da LivroeNet. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Siga-me no facebook.com/professorLFG, no blogdolfg.com.br, no twitter: @professorLFG e no YouTube.com/professorLFG.
**Advogada e Pesquisadora do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes.