terça-feira, 23 de junho de 2015

Filosofia e Política

Filosofia política 
Platão - o primeiro filósofo a sistematizar uma ideia política
Entre as diversas questões que a filosofia visa investigar, pode-se perguntar sobre como é e como deveria ser o convívio em sociedade. Se for investigada a palavra política, que vem do grego, será compreendido que politika refere-se aos assuntos da cidade (pólis). É neste sentido que, em filosofia política, pergunta-se sobre a natureza das leis, a natureza do governo, a origem da organização social e sobre qual seria a melhor forma de convívio entre os indivíduos. Todos estes temas nos levam a pensar sobre o espaço público, que é o espaço da política.
O primeiro filósofo a sistematizar uma ideia política foi Platão (428-7 – 348-7 a.C.). Ele escreveu sobre o assunto principalmente em dois livros, A república e As leis. Nestes livros, apresenta a ideia de que uma sociedade bem ordenada é aquela onde cada indivíduo desempenha a função na qual é mais habilidoso. Os hábeis com as mãos deveriam ser artesãos, os fortes devem proteger a cidade e os sábios devem governá-la. Platão pensa também sobre como deve ser a educação nesta cidade ideal, para conseguir desenvolver em cada criança o seu potencial a fim de que possa executar melhor a sua função. Cada indivíduo, para ele, será livre enquanto estiver cumprindo as leis, criadas com o intuito de melhor conduzir a cidade.
Ainda no mundo grego, Aristóteles (384 – 322 a.C.) vai discordar de Platão. Em Política, Aristóteles pensa que a cidade ideal de Platão, onde há prioridade daquilo que é público sobre aquilo que é privado, não funcionaria muito bem. Para ele, as pessoas dão mais valor ao que pertence a si mesmo, do que ao que pertence a todos. Aristóteles se preocupou menos com hipóteses de uma sociedade perfeita e mais em compreender a realidade política de seu tempo, estudando as leis de diferentes cidades e as formas de governo existentes. A melhor forma de organização política, defendida por ele, é um sistema misto de democracia e aristocracia, chamado politia, para evitar os conflitos de interesses entre os ricos e pobres. É dele também a ideia de que o homem é um animal político, isto é, que faz parte da natureza humana se organizar politicamente.
A ideia de que é natural se organizar politicamente perdurou até o séc. XVII. Thomas Hobbes (1588 – 1679), conhecido por ter escrito Leviatã, propôs a ideia de que a sociedade se organiza a partir de um contrato social. Pensou assim, pois é possível imaginar uma hipótese sobre o convívio humano antes da formação das sociedades. Hobbes via esse momento como uma guerra de todos contra todos, onde, em liberdade, cada indivíduo iria apenas pensar em sua conservação. Deste momento, no qual o homem é o lobo do homem, a racionalidade faz o homem perceber que a melhor forma de conservar a sua vida é perdendo um pouco de liberdade. É neste instante que os homens assinam um contrato fictício de convívio social. A partir desta origem da sociedade, Hobbes pensa no melhor governo para evitar o retorno para um estado de natureza caótico. Com isto, vê a garantia da vida como função vital do Estado, que deve defendê-la mesmo que use de seu poder para coagir a liberdade dos cidadãos.
Pensando na ideia de um contrato social, John Locke (1632 – 1704), em seus dois tratados políticos, escreveu que antes da formação das sociedades os indivíduos não viviam em guerra, pois estavam debaixo de leis naturais. Para ele, é natural a garantia da vida e os homens racionais respeitariam esta lei. A formação das sociedades ocorre pela necessidade da garantia da propriedade. O melhor governo, para Locke, é aquele que garanta os direitos à vida, liberdade, propriedade e de se revoltar contra governos injustos e leis injustas.
Ainda pensando sobre a noção de contrato, Jean-Jacques Rousseau (1712 – 1778) via o homem vivendo antes da formação das sociedades de forma bem otimista. Para Rousseau, havia terra e alimento para todos e não haveria motivos para que guerreassem entre si. Via no surgimento da propriedade o surgimento da desigualdade, de onde resultam diversos males sociais, como os roubos e os assassinatos. Neste sentido, sendo impossível retornar a um estado de natureza, o melhor governo é aquele que esteja de acordo com a vontade da maioria.
A forma de pensar dos contratualistas (Hobbes, Locke e Rousseau) foi retomada no século XX por John Rawls (1921 – 2002). Para ele, a sociedade deve basear-se em princípios de justiça escolhidos na fundação da sociedade. Em igualdade, ele pensa, os indivíduos escolheriam dois princípios de justiça, o de liberdades iguais para todos e o de que as desigualdades devem trazer maior benefício para os menos favorecidos e serem acessíveis a todos por igualdade de oportunidade.
Filipe Rangel Celeti 
Colaborador Mundo Educação 
Bacharel em Filosofia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie – SP 
Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie - SP

quarta-feira, 17 de junho de 2015

A minha depressão não é frescura

A minha depressão não é frescura

“Levante aí da cama, dê um jeito”. “Seja forte”. “Não dá pra viver desse jeito, acorda pra vida”.
Eu
sei
disso.
Eu sei que preciso levantar cedo, sentir o amargo do café na boca, arrumar a cama e tomar um banho. Mas se você realmente soubesse como eu me sinto, saberia que essas tarefas se tornam trinta vezes mais difíceis de se realizar quando as sombras invadem a minha história. Eu já não consigo sair de casa como ultimamente e tenho ouvido bastante que não é pra tanto, já que tenho a faca e o queijo na mão. Eu bem queria ser feliz com pouca coisa, rir por bobagens, falar por horas sobre as coisas mais mirabolantes do mundo… mas eu simplesmente não consigo. Não consigo sorrir nem pra foto nem pra quem está comigo. Não consigo sair da cama sem sentir que estou levando um elefante comigo. Eu queria, na verdade, ficar 24h por dia na minha cama, já levanto pensando na hora de voltar pra lá.
Se soubessem que eu sei a essência de cada uma das frases que usam pra me colocar pra cima… eu sei que preciso ser forte, eu sei que preciso levantar, eu sei que preciso tomar banho. Eu sei. Eu só não consigo realizar essas tarefas como se fossem simples, porque pra mim não são. Eu gasto toda a minha energia fazendo o básico, eu não consigo me sentir bem por ter esse tipo de dificuldade. Dói ver a vida passando, as pessoas evoluindo e eu aqui sem conseguir criar coragem para fazer o básico do básico.
Quando me pedem pra ser mais forte, eu tenho vontade de dizer que se eu assim fosse, não estaria nessa. Em alguns momentos fica impossível ser forte. Em alguns momentos as pessoas precisam desabar até mesmo pra crescer (e é uma pena que algumas pessoas precisem disso).
Quando me pedem pra fazer mais uma forcinha, eu tenho vontade de chorar alto, gritar por socorro e esperar que alguma ajuda caia do céu, porque é minha única esperança.
Quando me pedem para acordar pra vida eu tenho vontade de descrever como eu a enxergo e tudo que ela me ensinou na marra. Eu não quero acordar para uma vida como a minha, é tão simples.
As pessoas não entendem que é difícil demais viver uma vida com a sombra da depressão e seus outros transtornos. Tem momentos em que é difícil respirar, se mexer e até mesmo pensar – porque dói. E dói muito, dói em todas as partes do corpo. E é uma dor sobre a qual não temos controle, assim como uma dor de cabeça ou uma dor de estômago. Só que essa é muito mais persistente e geralmente não é tratada com a seriedade que devia ser tratada.
Eu quero melhorar, sabe. Eu não quero ficar no fundo do poço nem viver o resto dos meus dias tirando forças de onde nem sei só pra tomar um banho, comer um prato de comida ou até mesmo sair de casa. Eu não quero conviver com essa doença pra sempre, mas no momento eu preciso de um pouco de compreensão. Um pouco de carinho e de atenção também seriam bem vindos. Quando eu me sinto vulnerável, eu só preciso de um abraço. Quando eu me estresso, só quero alguém pra ouvir minhas preocupações. Quando ninguém me ouve, eu só queria um mega fone pra poder desabafar. Quando eu me sinto mal, eu só preciso de um ombro amigo. E não tô pedindo nada demais, porque eu quero o respeito a minha atual condição. Eu preciso de um pouco de paciência, por tempo indeterminado, pelo menos enquanto eu exercito a minha.
Médicos, terapias, espiritualidade… tudo isso pouco adianta se as pessoas ao redor não entenderem que o que aparenta frescura é dor, é exaurimento de forças, é sofrimento.
Reprodução autorizada pela autora. Para mais artigos da autora visite Superela.
Alba Soler Fotografia
Alba Soler Fotografia

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Leonardo Boff fala de Jung e Espiritualidade Parte 1

Padre viraliza ao se rebelar contra a corrupção e os serviços públicos n...

Tenho vergonha de ser juiz

Por João Batista Damasceno

Tenho vergonha de dizer que sou juiz. E não preciso dizê-lo. No fórum, o lugar que ocupo diz quem eu sou; fora dele seria exploração de prestígio. Tenho vergonha de dizer que sou juiz, porque não o sou. Apenas ocupo um cargo com este nome e busco desempenhar responsavelmente suas atribuições.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz, pois podem me perguntar sobre bolso nas togas.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz e demonstrar minha incompetência em melhorar o mundo no qual vivo, apesar de sempre ter batalhado pela justiça, de ter-me cercado de gente séria e de ter primado pela ética.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz e ter que confessar minha incompetência na luta pela democracia e ter que testemunhar a derrocada dos valores republicanos, a ascensão do carreirismo e do patrimonialismo que confunde o público com o privado e se apropria do que deveria ser comum.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz e ter que responder porque — apesar de ter sempre lutado pela liberdade — o fascismo bate à nossa porta, desdenha do Direito, da cidadania e da justiça e encarcera e mata livremente.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz, porque posso ser lembrado da ausência de sensatez nos julgamentos, da negligência com os direitos dos excluídos, na demasiada preocupação com os auxílios moradia, transporte, alimentação, aperfeiçoamento e educação, em prejuízo dos valores que poderiam reforçar os laços sociais.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz porque posso ser confrontado com a indiferença com os que clamam por justiça, com a falta de racionalidade que deveria orientar os julgamentos e com a vingança mesquinha e rasteira de quem usurpa a toga que veste sem merecimento.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz porque posso ser lembrado da passividade diante da injustiça, das desculpas para os descasos cotidianos, da falta de humanidade para reconhecer os erros que se cometem em nome da justiça e de todos os “floreios”, sinônimos e figuras de linguagem para justificar atos abomináveis.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz porque faço parte de um Poder do Estado que nem sempre reconheço como aquele que trilha pelos caminhos que idealizei quando iniciei o estudo do Direito.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz, porque tenho vergonha por ser fraco, por não conhecer os caminhos pelos quais poderia andar com meus companheiros para construir uma justiça substancial e não apenas formal.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz, mas não perco a garra, não abandono minhas ilusões e nem me dobro ao cansaço. Não me aparto da justiça que se encontra no horizonte, ainda que ela se distancie de mim a cada passo que dou em sua direção, porque eu a amo e vibro ao vê-la em cada despertar dos meus concidadãos para a labuta diária e porque o caminhar em direção a ela é que me põe em movimento.
Acredito na humanidade e na sua capacidade de se reinventar, assim como na transitoriedade do triunfo da injustiça. Apesar de testemunhar o triunfo das nulidades, de ver prosperar a mediocridade, de ver crescer a iniquidade e de agigantaram-se os poderes nas mãos dos inescrupulosos, não desanimo da virtude, não rio da honra e não tenho vergonha de ser honesto.
Tenho vergonha de ser juiz em razão das minhas fraquezas diante da grandeza dos que atravancam o caminho da justiça que eu gostaria de ver plena. Mas, eles passarão!

João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política e juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Membro da Associação Juízes para a Democracia (AJD).