Friedrich Nietzsche, o filósofo da afirmação da vida
Em lugar de utilitarismo e uniformização, ele propunha cultura e aprimoramento pessoal
Rebelde e provocador, o alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) se propôs a desmascarar as fundações da cultura ocidental, mostrando que há interesses e motivações ocultas, e não valores absolutos, em conceitos como verdade, bem e mal. Com isso, Nietzsche aplicou um golpe nos sistemas filosóficos, morais e religiosos. Sua frase mais conhecida ("Deus está morto") não trata apenas de ateísmo, mas da necessidade de romper a "moral de rebanho" - as verdades tidas como inquestionáveis e o que é aceito por imposição - para viver as potencialidades humanas em sua plenitude.
Nietzsche foi professor universitário (leia biografia acima) e escreveu textos específicos sobre Educação. "A máxima ?tornar-se aquilo que se é? orienta seu pensamento nessa área", diz Rosa Maria Dias, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. "Com essa frase, ele indica a tarefa do educador de levar seus alunos a pensar por si mesmos."
O filósofo criticava o sistema escolar por ser um reforço da moral de rebanho: ao uniformizar o conhecimento e os próprios alunos, a instituição se curva às exigências externas do mercado e do Estado. Na Educação de seu país, ele via o avanço do ensino técnico sobre todos os níveis escolares com a finalidade de preparar profissionais e servidores competentes. Em lugar da massificação e do utilitarismo, Nietzsche propunha o aprimoramento individual e uma "Educação para a cultura" (leia o quadro na página 28). Entenda-se por cultura a criação de "personalidades harmoniosamente desenvolvidas", segundo Rosa Dias.
Nietzsche foi professor universitário (leia biografia acima) e escreveu textos específicos sobre Educação. "A máxima ?tornar-se aquilo que se é? orienta seu pensamento nessa área", diz Rosa Maria Dias, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. "Com essa frase, ele indica a tarefa do educador de levar seus alunos a pensar por si mesmos."
O filósofo criticava o sistema escolar por ser um reforço da moral de rebanho: ao uniformizar o conhecimento e os próprios alunos, a instituição se curva às exigências externas do mercado e do Estado. Na Educação de seu país, ele via o avanço do ensino técnico sobre todos os níveis escolares com a finalidade de preparar profissionais e servidores competentes. Em lugar da massificação e do utilitarismo, Nietzsche propunha o aprimoramento individual e uma "Educação para a cultura" (leia o quadro na página 28). Entenda-se por cultura a criação de "personalidades harmoniosamente desenvolvidas", segundo Rosa Dias.
A habilidade de transformar
Se Nietzsche combatia a vulgarização dos conteúdos escolares, também criticava o saber voltado para a erudição. Para ele, havia em sua época um excesso de cultura histórica, que gerava uma reverência paralisante ao passado. Com isso, sufocava-se a força do agora e impedia-se o surgimento do novo. Mais ainda: a tendência histórico-cientificista impossibilitava a presença efetiva da Arte e da Filosofia no ensino, por se tratarem de campos de conhecimento instáveis e desafiadores, que estimulam a crítica.
Sem ser contra o ensino de História nem subestimar o sentido histórico dos fatos, o filósofo via no sistema engessado um entrave para a percepção da "força plástica" do ser humano - isto é, sua habilidade de transformar. "Para não agir como coveiro do presente, é necessário conhecer a capacidade de crescer por si mesmo, assimilar o passado, cicatrizar feridas, preparar perdas, reconstruir as formas destruídas - tudo isso é força plástica", diz Rosa Dias.
Nietzsche lamentava que uma espécie de ditadura da praticidade tivesse causado a perda da importância da leitura e do estudo de língua nas escolas, levando à degeneração da cultura. Naquele momento, dizia ele, ou se via o idioma como um organismo morto a ser dissecado, ou se encaminhavam a escrita e a leitura para os usos meramente comunicativos, reduzindo os textos a um padrão simplificado, supostamente ágil e moderno.
Um dos primeiros pensadores a conceber a leitura como uma atividade que não se limita à assimilação passiva de informações, Nietzsche achava que ler era uma experiência transformadora, inclusive no sentido físico. Isso porque, para se formar leitor, é necessário educar a postura, treinar a concentração e perseverar.
Vontade de potência
Como grande admirador da Antigüidade, principalmente da cultura clássica grega, o filósofo não aceitava a separação entre o corpo e o espírito. Tampouco dissociava, em seus textos, pensamento e vida. Segundo o filósofo Gilles Deleuze (1925-1995), no ideal de Educação de Nietzsche, "os modos de vida inspiram as maneiras de pensar e os modos de pensar criam maneiras de viver".
Encontra-se nesse processo contínuo a vontade de potência, que na filosofia nietzschiana é a força motriz do ser humano. "A vida é antes de tudo uma capacidade de acumular forças", explica Rosa Dias. "Ela é essencialmente o esforço por mais potência, e para isso precisamos ser instruídos." Portanto, para Nietzsche, a Educação deveria se especializar em formar personalidades fortes, não homens teóricos ou pessoas ilustradas.
Cabe à escola, de acordo com o filósofo, produzir nos alunos a capacidade de dar novos sentidos às coisas e aos valores. Nietzsche dizia que só os jovens poderiam entender suas contestações. É, então, de supor que a idade escolar seja a melhor para levar o ser humano a pensar criticamente a respeito do mundo a sua volta. Mas, para isso, a sala de aula precisa valorizar "uma cultura da exceção, da experimentação, do risco, do matiz", nas palavras do filósofo.
Finalmente, ao educador cabe o papel de modelo, alguém que demonstra como se educar com disciplina e paciência. "Educar-se para ser educador significa, basicamente, estar à altura daquilo que se ensina", diz Rosa Dias. "O professor precisa ser mestre e escultor de si mesmo."
Se Nietzsche combatia a vulgarização dos conteúdos escolares, também criticava o saber voltado para a erudição. Para ele, havia em sua época um excesso de cultura histórica, que gerava uma reverência paralisante ao passado. Com isso, sufocava-se a força do agora e impedia-se o surgimento do novo. Mais ainda: a tendência histórico-cientificista impossibilitava a presença efetiva da Arte e da Filosofia no ensino, por se tratarem de campos de conhecimento instáveis e desafiadores, que estimulam a crítica.
Sem ser contra o ensino de História nem subestimar o sentido histórico dos fatos, o filósofo via no sistema engessado um entrave para a percepção da "força plástica" do ser humano - isto é, sua habilidade de transformar. "Para não agir como coveiro do presente, é necessário conhecer a capacidade de crescer por si mesmo, assimilar o passado, cicatrizar feridas, preparar perdas, reconstruir as formas destruídas - tudo isso é força plástica", diz Rosa Dias.
Nietzsche lamentava que uma espécie de ditadura da praticidade tivesse causado a perda da importância da leitura e do estudo de língua nas escolas, levando à degeneração da cultura. Naquele momento, dizia ele, ou se via o idioma como um organismo morto a ser dissecado, ou se encaminhavam a escrita e a leitura para os usos meramente comunicativos, reduzindo os textos a um padrão simplificado, supostamente ágil e moderno.
Um dos primeiros pensadores a conceber a leitura como uma atividade que não se limita à assimilação passiva de informações, Nietzsche achava que ler era uma experiência transformadora, inclusive no sentido físico. Isso porque, para se formar leitor, é necessário educar a postura, treinar a concentração e perseverar.
Vontade de potência
Como grande admirador da Antigüidade, principalmente da cultura clássica grega, o filósofo não aceitava a separação entre o corpo e o espírito. Tampouco dissociava, em seus textos, pensamento e vida. Segundo o filósofo Gilles Deleuze (1925-1995), no ideal de Educação de Nietzsche, "os modos de vida inspiram as maneiras de pensar e os modos de pensar criam maneiras de viver".
Encontra-se nesse processo contínuo a vontade de potência, que na filosofia nietzschiana é a força motriz do ser humano. "A vida é antes de tudo uma capacidade de acumular forças", explica Rosa Dias. "Ela é essencialmente o esforço por mais potência, e para isso precisamos ser instruídos." Portanto, para Nietzsche, a Educação deveria se especializar em formar personalidades fortes, não homens teóricos ou pessoas ilustradas.
Cabe à escola, de acordo com o filósofo, produzir nos alunos a capacidade de dar novos sentidos às coisas e aos valores. Nietzsche dizia que só os jovens poderiam entender suas contestações. É, então, de supor que a idade escolar seja a melhor para levar o ser humano a pensar criticamente a respeito do mundo a sua volta. Mas, para isso, a sala de aula precisa valorizar "uma cultura da exceção, da experimentação, do risco, do matiz", nas palavras do filósofo.
Finalmente, ao educador cabe o papel de modelo, alguém que demonstra como se educar com disciplina e paciência. "Educar-se para ser educador significa, basicamente, estar à altura daquilo que se ensina", diz Rosa Dias. "O professor precisa ser mestre e escultor de si mesmo."
Biografia
Vida marcada por conhecimento e dor
Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu em 15 de outubro de 1844 em Röcken, Alemanha, filho e neto de protestantes. Nas universidades de Bonn e Leipzig, estudou Filologia, disciplina que lecionou na Universidade da Basiléia, na Suíça. Apaixonado por música, chegou a compor peças para piano. Sua carreira universitária começou a declinar com a publicação de sua primeira obra, O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música (1872). Em 1877, publicou Humano, Demasiado Humano, na forma de aforismos. Quase cego, com freqüentes crises de enxaqueca, se aposentou em 1879. Entre 1883 e 1888, publicou, entre outros livros, Assim Falou Zaratustra e dois títulos para explicá-lo (Além do Bem e do Mal e Genealogia da Moral). Passou os últimos 11 anos de vida mergulhado na loucura e morreu em 1900, de paralisia geral, na cidade alemã de Weimar.
Os caminhos de Nietzsche
A experiência estética no início de tudo
As grandes influências de Nietzsche surgiram na época em que ele era estudante na Universidade de Leipzig. Lá ele descobriu a filosofia de Arthur Schopenhauer (1788-1860) e a música de Richard Wagner (1813-1883), de quem se tornou amigo mais tarde. Além da filosofia e da música, a Antigüidade clássica grega era seu terceiro interesse primordial. Nos três, se encontrava o papel central da experiência estética. Nietzsche via em Wagner o renascimento da grande arte grega. Mais tarde, o filósofo se distanciou do compositor, por considerar que ele se curvava ao gosto do público burguês, e da obra de Schopenhauer, por ver em seu pessimismo um sintoma de decadência cultural. Na maturidade, Nietzsche analisou a origem e a função dos valores na vida e na cultura, concluindo que uma "moral de escravos" se impôs à humanidade desde o predomínio da tradição judaico-cristã. Compaixão, humildade, ressentimento e ascetismo teriam, então, constrangido a vontade de potência, que seria o princípio de toda a vida. Nietzsche, que abominava o anti-semitismo e o nacionalismo, foi visto durante muito tempo como inspirador do nazismo por causa da edição forjada e mal-intencionada que sua irmã, Elizabeth, fez dos escritos deixados por ele.
Vida marcada por conhecimento e dor
Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu em 15 de outubro de 1844 em Röcken, Alemanha, filho e neto de protestantes. Nas universidades de Bonn e Leipzig, estudou Filologia, disciplina que lecionou na Universidade da Basiléia, na Suíça. Apaixonado por música, chegou a compor peças para piano. Sua carreira universitária começou a declinar com a publicação de sua primeira obra, O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música (1872). Em 1877, publicou Humano, Demasiado Humano, na forma de aforismos. Quase cego, com freqüentes crises de enxaqueca, se aposentou em 1879. Entre 1883 e 1888, publicou, entre outros livros, Assim Falou Zaratustra e dois títulos para explicá-lo (Além do Bem e do Mal e Genealogia da Moral). Passou os últimos 11 anos de vida mergulhado na loucura e morreu em 1900, de paralisia geral, na cidade alemã de Weimar.
Os caminhos de Nietzsche
A experiência estética no início de tudo
As grandes influências de Nietzsche surgiram na época em que ele era estudante na Universidade de Leipzig. Lá ele descobriu a filosofia de Arthur Schopenhauer (1788-1860) e a música de Richard Wagner (1813-1883), de quem se tornou amigo mais tarde. Além da filosofia e da música, a Antigüidade clássica grega era seu terceiro interesse primordial. Nos três, se encontrava o papel central da experiência estética. Nietzsche via em Wagner o renascimento da grande arte grega. Mais tarde, o filósofo se distanciou do compositor, por considerar que ele se curvava ao gosto do público burguês, e da obra de Schopenhauer, por ver em seu pessimismo um sintoma de decadência cultural. Na maturidade, Nietzsche analisou a origem e a função dos valores na vida e na cultura, concluindo que uma "moral de escravos" se impôs à humanidade desde o predomínio da tradição judaico-cristã. Compaixão, humildade, ressentimento e ascetismo teriam, então, constrangido a vontade de potência, que seria o princípio de toda a vida. Nietzsche, que abominava o anti-semitismo e o nacionalismo, foi visto durante muito tempo como inspirador do nazismo por causa da edição forjada e mal-intencionada que sua irmã, Elizabeth, fez dos escritos deixados por ele.
Quer saber mais?
BIBLIOGRAFIA
Escritos sobre Educação, Friedrich Nietzsche, 232 págs., Ed. Loyola/PUC-Rio, tel. (11) 6914-1922, 30,70 reais
Nietzsche e a Educação, Jorge Larrosa, 136 págs., Ed. Autêntica, tel. (31) 3423-3022, 18 reais
Nietzsche Educador, Rosa Maria Dias, 120 págs., Ed. Scipione, tel. (11) 3277-1788 (edição esgotada)
Escritos sobre Educação, Friedrich Nietzsche, 232 págs., Ed. Loyola/PUC-Rio, tel. (11) 6914-1922, 30,70 reais
Nietzsche e a Educação, Jorge Larrosa, 136 págs., Ed. Autêntica, tel. (31) 3423-3022, 18 reais
Nietzsche Educador, Rosa Maria Dias, 120 págs., Ed. Scipione, tel. (11) 3277-1788 (edição esgotada)