"Estamos em uma guerra ideológica para matar pobre", diz policial perseguido por criticar PM
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“Somos
treinados com o mantra bandido bom é bandido morto, mas nunca vi
policial executar deputado bandido, juiz que vende sentença, senador
chefe de tráfico” – confira o relato do policial militar
Aviso de Gatilho (Trigger Warning): depressão e suicídio*
Por Martel Alexandre del Colle
Eu
voltei para a polícia militar em 2016. O motivo e as circunstâncias são
longos demais para se narrar aqui. Depois de todas as experiências que
eu havia passado dentro da polícia eu havia voltado mais forte e
determinado a fazer o que era certo. Fui colocado em um batalhão que
cuidava da região metropolitana de Curitiba. Fiquei empolgado. Eu adoro
ser policial, cuidar da sociedade, ajudar a fazer deste país um local
mais justo. Certas partes de mim parecem terem sido feitas para isso. Eu
fico calmo nas ocorrências de vulto, eu gero soluções rápidas e nunca
tive uma ocorrência na qual se possa dizer que o procedimento adotado
foi errado.
Chegando
ao batalhão, eu assumi uma companhia. Algo novo para mim. Estaria no
comando de muitos policiais. Considerei uma grande oportunidade. Comecei
a realizar algumas mudanças: treinamento para todos os policiais, banco
de horas, mudança na forma da escala. Havia conversado com um professor
de jiu-jítsu e uma academia de musculação que ficava a poucos metros da
companhia para que os policiais pudessem treinar no local com um preço
diferente devido ao número de possíveis inscritos.
Isso
durou menos de um mês. Fui enviado para a escala de coordenação de
policiamento. Fiquei um pouco chateado, mas sem problemas. Policial
militar é policial em qualquer lugar e função. Na função de coordenador
percebi vários defeitos. Sempre fui assim, eu encontro as falhas com
facilidade. A parte boa é que eu também encontro as soluções. Comecei a
dizer alguns problemas que eu encontrava para a execução de um bom
serviço aos meus chefes, juntamente com uma proposta para solucionar a
demanda. Fui ouvido em partes e outras foram ignoradas. Quanto a alguns
problemas eu sequer poderia tocar no assunto. Eram pesados demais e eu
poderia sofrer represálias.
O
tempo que fiquei na unidade, estagnado, vendo muitas coisas erradas,
começou a me estressar. E quando eu digo “coisas erradas” não estou
dizendo que eles não faziam meus gostos. Estou me referindo a
distribuição de efetivo pela malha feita de maneira irresponsável, o que
no final gera mortes e assaltos; refiro-me ao uso político das forças
de segurança, realizando operações que aparecem muito, mas que não
solucionam nada; refiro-me a vistas grossas para a corrupção policial,
condenando os policiais novatos a experiências terríveis dentro da
viatura; refiro-me a vistas grossas para execuções e torturas; refiro-me
a métodos de fiscalização obsoletos e ineficientes; dentre outras
coisas. Todos problemas sérios, que condenam vidas e que são de fácil
solução. Tão fácil que eu apresentei uma solução para praticamente
todos.
Meu
estresse e desapontamento chegou a tal ponto que eu fui até a diretoria
de pessoal da polícia e fiz uma proposta ao chefe: gostaria de ajuda
para ir para outra unidade, caso isso não fosse possível, eu queria
ajuda para solicitar minha saída da polícia. Eu não esperava nenhuma
ajuda, estava certo que aquele seria meu último dia na polícia, mas eu
me enganei. O oficial que me recebeu me ouviu. Contei todas as minhas
frustrações para ele e ele entendeu. Resolveu então me mandar para um
batalhão que fosse mais apegado a técnica e ao estudo. Enviou-me para
uma unidade de policiamento escolar. Confesso que as circunstâncias da
transferência me deixaram animado. Sempre sonhei com uma unidade
policial voltada para a técnica, para o estudo e para o resultado de
maneira humanizada.
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