O Direito Penal do Inimigo
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Resumo: O inimigo representa aquele que rompeu seus
vínculos com a sociedade, retornando a um estado de natureza. Estando
neste estado qualquer medida que venha a ser tomada contra ele, a fim de
neutralizá-lo é aceitável. As leis que aplicam-se aos cidadãos e ao
Estado, estão dispensadas em relação ao inimigo. Gunther Jakobs
desenvolve este conceito, apresentado aqui e o confrontamos com a
prevenção geral positiva da pena, apresentando então exposição do
pensamento deste autor.
Palavras-Chave: Direito Penal; Inimigo; Cidadão; Prevenção Geral Positiva; Pena.
Resumen: El enemigo es el que rompió sus lazos con la
sociedad, volviendo a un estado de naturaleza. Estando en este estado,
cualquier acción que pueda tomarse en su contra con el fin de
neutralizar es aceptable. Las leyes que se aplican a los ciudadanos y el
Estado, están exentos en relación con el enemigo. Gunther Jakobs se
desarrolla este concepto, y que aquí se presenta ante una prevención
general positiva de la pena, ofreciendo así la exposición pensamiento de
este autor.
Palabras: Derecho Penal; Ciudadano; Enemy; Prevención General Positiva, Pena.
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Sumário: 1. O inimigo; 2. O Direito Penal do Inimigo
Segundo Jakobs; 3. A Prevenção Geral Positiva da Pena e o Direito Penal
do Inimigo; 4. Referências Bibliográficas.
1 O inimigo
O conceito de inimigo, fundamento do direito penal do inimigo
defendido por Günther Jakobs, não é recente, há muito filósofos trataram
de conceituá-los. Para Kant “o estado de natureza é estado de guerra”[1],
sendo a paz possível apenas a partir do Estado civil. No estado natural
os homens representam entre si ameaças mútuas. Em um Estado civil
espera-se, a partir do controle social, que não haverá, por parte de
outros homens, hostilidades. Espera-se que não haverá riscos à segurança
nas relações entre os homens. Um homem entenderá o outro como seu
inimigo por não assegurar-lhe segurança em razão da ausência de
participação do estado legal comum.
“O estado de paz entre homens que vivem juntos não é um Estado
Natural (status naturalis), que é mais um estado de guerra, ou seja, um
estado no qual ainda que as hostilidades não estejam declaradas, nota-se
uma constante ameaça. O estado de paz deve, portanto, ser instaurado,
pois a omissão de hostilidade não é ainda garantia de paz e, se um
vizinho não dá segurança ao outro (o que somente pode acontecer em um
estado legal), cada um pode considerar como inimigo o que lhe exigiu
esta segurança.”[2]
Nas palavras de Kant “eu posso obrigá-lo a entrar em um estado social-legal ou afastar-se do meu lado”[3].
Então, se um homem permanece em estado de natureza é considerada
legítima qualquer ação que seja hostil em relação à ele, mesmo que não
tenha cometido nenhum delito, pois ao estar fora do Estado civil,
considera-se como constante ameaça à paz, a sua presença.
Hobbes entende que é inimigo aquele que quebra seus vínculos com a
sociedade civil e retorna à vida em estado de natureza, entendendo
estado de natureza como “a liberdade que cada homem possui de usar seu
próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de sua própria
natureza, ou seja, de sua vida”.
Para Hobbes, portanto, o estado natural é um estado de guerra
permanente onde os homens são inimigos entre si, podendo, como inimigos
tudo contra todos, pois em estado de guerra não há leis, não há justo ou
injusto e sequer bem ou mal.
Com intuito de abandonar este estado, os homens reuniram-se e
fundaram o Estado (a partir do contrato social), desejosos de uma vida
mais segura mesmo que implicando em uma redução de sua liberdade,
tornando-se assim cidadãos.
Assim, as leis civis, feitas para os cidadãos, que pactuaram em favor
da constituição do Estado, são dirigidas apenas aos cidadãos, enquanto
que os inimigos, que negaram a autoridade do Estado, podem ser tratados
como os representantes do Estado o desejarem.
O inimigo, que não esteve sujeito, ou se esteve, renunciou às leis da
sociedade, pratica atos de agressividade que tornam legítimos qualquer
reação por parte do Estado, pois se em estado natural permanecem, serão
tratados segundo preceitos naturais e não sob as leis civis.
Um ato a um homem que não é cidadão, se em nome do bem dos que o são,
é perfeitamente legítimo, tratando-se de um ato contra um inimigo,
perfeitamente aceito quando representar um benefício ao Estado. Segundo
Hobbes “é legítimo fazer guerra, em virtude do direito de natureza
original no qual a espada não julga […] nem tem outro respeito ou
clemência senão o que contribui para o bem do seu povo”.
2 O Direito Penal do Inimigo segundo Jakobs
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Para Jakobs deve haver dois tipos de direito. Um que é dirigido ao
cidadão, que, mesmo violando uma norma recebe a oportunidade de
“reestabelecer” a vigência desta norma através de uma pena – mas ainda
assim, mesmo sendo punido, é punido como um cidadão – mantendo, pelo
Estado, o seu status de pessoa e o papel de cidadão reconhecido pelo
Direito[4].
Há porém um outro tipo de Direito, o Direito Penal do Inimigo, que é
reservado àqueles indivíduos que pelo seu comportamento, ocupação ou
práticas, segundo Jakobs, “se tem afastado, de maneira duradoura, ao
menos de modo decidido, do Direito, isto é, que não proporciona a
garantia cognitiva mínima necessária a um tratamento como pessoa”[5], devendo serem tratados como inimigos.
Jakobs faz distinção entre o que é uma pessoa e o que é um indivíduo,
para ele pessoa é aquele que está envolvido com a sociedade, sendo um
sujeito de direitos e obrigações frente aos outros membros da sociedade
da qual participa. Indivíduo, é um ser sensorial, pertencente à ordem
natural, movendo-se inteligentemente, por suas satisfações e
insatisfações de acordo com suas preferências e interesses,
descuidando-se, ignorando o mundo em que os outros homens participam[6].
Em cometendo um delito, o cidadão participa de um processo legal que
observa suas garantias fundamentais, recebendo uma pena como coação pelo
ato ilícito cometido. O inimigo é um perigo que deve ser combatido,
devendo o Direito antever ao efetivo cometimento de um crime,
considerando desde início sua periculosidade. Nas palavras de Jakobs “o
Direito penal do inimigo é daqueles que o constituem contra o inimigo:
frente ao inimigo é só coação física, até chegar à guerra”[7].
Para Jakobs a periculosidade do agente serve à caracterização do
inimigo, que contrapõe-se ao cidadão (cujo ato, apesar de contra o
direito, tem uma personalidade voltada ao ordenamento jurídico devendo
ser punido segundo sua culpabilidade), enquanto que o inimigo deve ser
combatido segundo sua periculosidade. Não há vistas há uma conduta
realizada, ou tentada, mas pressupõe-se o âmbito interno do indivíduo, o
perigo de dano futuro à vigência da norma[8].
3 A Prevenção Geral Positiva da Pena e o Direito Penal do Inimigo
Para Jakobs a pena tem como função um reforço na confiança do
Direito, infundindo na coletividade a necessidade de fidelidade ao
direito, promovendo uma integração social. A norma penal serve para
estabilizar as expectativas sociais frente às frustrações que ocorrem
quando há uma violação das normas. Serve pois para assegurar a vigência
de uma norma.
“A pena tem pois a missão preventiva de manter a norma como esquema
de orientação, no sentido de que quem confia em uma norma deve ser
confirmado como pessoa”.
Os indivíduos criam expectativas decorrentes das interações e do
viver em sociedade, que muitas vezes redundam em frustrações e decepções
que poderiam levar à desconfiança e quebra da fidelidade às interações
sociais, sendo a pena, pois, um meio de se restabelecer a confiança,
reparando ou prevenindo os efeitos negativos que a violação da norma
produziu.
Para Jakobs “a pena é uma demonstração da vigência da norma à custa de um responsável”[9],
tendo por função afirmar sua validade. “Missão da pena é a manutenção
da norma como modelo de orientação para os contatos sociais. Conteúdo de
uma pena é uma réplica, que tem lugar à custa do infrator, frente ao
questionamento da norma”[10].
Ainda de acordo com Jakobs “os destinatários da norma não são
primariamente algumas pessoas enquanto autoras potenciais, senão todos,
vez que ninguém pode passar sem interações sociais e dado que por isso
todos devem saber o que delas podem esperar”[11].
O que Jakobs propõe, resumidamente, com a teoria da prevenção geral
positiva é que, é uma “prevenção geral para que produza efeito em todos
os membros da sociedade, e positiva, para que o efeito gerado não seja o
medo frente à pena, mas sim a certeza da vigência da norma, que foi
agredida pela infração e tornou a ser fortalecida pela pena”[12].
O direito penal do inimigo é então, resumidamente entendido como
aquele que a) determina ser o inimigo uma não-pessoa (se estabelecendo
com ele uma relação de coação, de guerra); b) visa a combater perigos;
c) atua por meio de medidas de segurança; d) trabalha com um direito
penal do autor; pune a periculosidade do agente; e) é essencialmente
preventivo; f) antecipa a tutela penal para punir atos preparatórios
(perigo) e por fim é um direito anti-garantista, g) não promove a
estabilização de normas (Prevenção Positiva) mas atribui a determinados
grupos o status de infratores e age entendendo-os como tal sendo
interceptados de pronto, em um estado inicial. É pois o Direito Penal do
Inimigo um direito penal do autor e não do fato.
A prevenção geral positiva (Teoria da Pena) insere-se pois em um
direito penal do cidadão, que, reconhece e tem expectativas em relação
ao direito, enquanto que ao inimigo, resta um direito penal que busca
apenas a neutralização, pois não há qualquer relação desse com o
ordenamento e nem quaisquer expectativas.
Não se está mais, então, reafirmando a vigência da norma, mas, com
relação ao direito penal do inimigo, se está garantindo que a sociedade
perdure, mantenha-se, em face desses indivíduos.
Referências Bibliográficas
BONHO, Luciana Tramontin. Noções Introdutórias sobre o Direito Penal do Inimigo. http://jus.com.br/revista/texto/8439.
GUARAGNI, Fábio André. As Teoria da Conduta em Direito Penal: um estudo da conduta humana do pré-causalismo ao funcionalismo pós-finalista – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
JAKOBS, Günther. MELIÁ, Manuel Cancio. Direito Penal do inimigo: noções e críticas. Org. e trad. André Luís Callegari, Nereu José Giacomolli. 2. Ed – Porto Alegre: Livraria do Advogado: 2007.
MORAES, Alexandre Rocha Almeida. A Terceira Velocidade do Direito Penal: o “Direito Penal do Inimigo”. Dissertação de Mestrado PUC-SP, São Paulo: 2006
PIM, Joám Evans, Para a paz perpétua /
Immanuel Kant. – Estudo introdutório. Tradução Bárbara Kristensen.–
Rianxo:Instituto Galego de Estudos de Segurança Internacional e da Paz,
2006. – (Ensaios sobre Paz e Conflitos; Vol. V).
Notas:
[1] BONHO, Luciana Tramontin. Noções Introdutórias sobre o Direito Penal do Inimigo. http://jus.com.br/revista/texto/8439.
[2] PIM, Joám Evans, Para a paz perpétua
/ Immanuel Kant. – Estudo introdutório. Tradução Bárbara Kristensen.–
Rianxo:Instituto Galego de Estudos de Segurança Internacional e da Paz,
2006. – (Ensaios sobre Paz e Conflitos; Vol. V).
[3] PIM, Joám Evans, Para a paz perpétua, p.65.
[4] CANCIO MELIÁ, Manuel, in JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Direito Penal do Inimigo Noções Críticas, Org e trad. André Luís Callegari, Nereu José Giacomolli. 2 ed – Porto Alegre: Livraria do Advogado. Ed, 2007,p. 33.
[5] CANCIO MELIÁ, Manuel, in JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Direito Penal do Inimigo Noções Críticas. p. 35.
[6] BONHO, Luciana Tramontin. Noções Introdutórias sobre o Direito Penal do Inimigo. http://jus.com.br/revista/texto/8439, p.5.
[7] CANCIO MELIÁ, Manuel, in JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Direito Penal do Inimigo Noções Críticas. p. 30.
[8] CANCIO MELIÁ, Manuel, in JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Direito Penal do Inimigo Noções Críticas. p. 33-34
[9] GUARAGNI, Fábio André. As teorias da conduta em direito penal: um estudo da conduta humana do pré-causalismo ao funcionalismo pós-finalista – 2. Ed ver e atual – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.293.
[10] GUARAGNI, Fábio André. As teorias da conduta em direito penal: um estudo da conduta humana do pré-causalismo ao funcionalismo pós-finalista, p. 292.
[11] MORAES, Alexandre Rocha Almeida de, A Terceira Velocidade do Direito Penal: o ‘Direito Penal do Inimigo’. Dissertação de Mestrado: PUC-SP, 2006, p. 134.
[12] MORAES, Alexandre Rocha Almeida de, A Terceira Velocidade do Direito Penal: o ‘Direito Penal do Inimigo’, p. 146.
Informações Sobre o Autor
Almério Vieira de Carvalho Júnior
Mestrando em Direito Empresarial e Cidadania pelo Centro
Universitário Curitiba (Unicuritiba). Bacharel em Direito pelo Centro
Universitário Curitiba. Bacharel em Ciências Econômicas pela
Universidade Salvador (Unifacs). Advogado
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