quinta-feira, 13 de setembro de 2012

ZONA DE PERIGO




ZONA DE PERIGO


O que e pressão arterial


Para que o sangue circule pelo organismo, o coração precisa exercer pressão ao bombeá-lo. Ao executar a tarefa, o órgão se contrai, num momento chamado sístole, e jogado uma grande quantidade de sangue para as artérias. Essa pressão e conhecida como pressão máxima ou sistólica.
Quando o coração relaxa (diastóli), a pressão no vaso sanguíneo diminui. Por isso, e conhecido como pressão diastólica ou mínima. Essas duas medidas quantificam a pressão arterial. Segundo a associação Brasileira de Hipertensão, a pressão ideal para pacientes saudáveis deve ser menor que 130mmHg milímetro de mercúrio (máxima) por 90 mmHg (mínima) ou 13 por 9.
Já quem tem diabetes, problemas renais ou obesidade, por exemplo, males que podem se agravar ainda mais com a hipertensão, devem reduzir bem os ponteiros da pressão. O índice recomendado e de 12 por 8.
CAUSAS CONHECIDAS:
  • Excesso de peso
  • Sedentarismo
  • Ingestão elevada de sal
  • Consumo excessivo de alcool
  • Tabagismo
  • Herança Genética
Sintomas:
  • Dor de cabeça
  • Dor na Nuca
  • Vermelhidão no pescoço e Tórax
  • Tontura
  • Fadiga
  • Náusea
  • Vista embaçada
  • Respiração Ofegante
  • Dor no Peito
  • Mãos e pés Frios
COM TEMPO, A CONDIÇÃO CAUSA DANOS A VARIOS ORGÃOS.
NARIZ
As paredes dos vasos podem romper e ocorrer sangramento pelas narinas.
CÉREBRO
Provoca lesão na camada interna que reveste os vasos sanguíneos, facilitando o acumulo de placas de gordura nesses locais. Isso aumenta o risco de entupimento dos vasos, aumentando os riscos de ocorrer um acindente vascular cerebral (AVC), conhecido como derrame. O problema pode ser divido em dois tipos. O primeiro é isquemia (há um entupimento do vaso, interrompendo a irrigação do sangue). O segundo é chamado de hemorrágico (há um entupimento de vasos, ocasionando o vazamento de sangue). O acidente pode matar ou deixar seqüelas graves, com paralisia total ou parcial.
OLHOS
A chance de ocorrerem lesões nos vasos da retina, o que pode causar alterações visuais e até cegueira.
CORAÇÃO
O mesmo mecanismo que lesa os vasos sanguíneos do cérebro prejudica as artérias do coração, aumentando os riscos de ocorrência de infarto ou angina (forte dor no peito). A pressão alta também pode exigir que o coração faça uma força extra para bombear o sangue, fenômeno que pode levar ao aumento do músculo cardíaco, maior risco de arritmia e morte súbitas.
RINS
Os rins são responsáveis por filtrar as impurezas do organismo. Mas a pressão arterial elevada prejudica o seu bom funcionamento do órgão e com tempo provoca falência renal. Se nada for feito, pode ser necessária a hemodiálese (método de filtragem artificial das toxinas). Há casos em que a única saída é o transplante.
LIGAÇÕES DIRETAS
A hipertensão esta relacionada também ao surgimento da chamada síndrome metabólica. Trata-se da explosiva combinação entre pressão arterial elevada, obesidade e diabetes tipo II. O portador da síndrome corre 2,5 vezes mais risco de sofrer problemas cardiovasculares.


GORDURA TRANS
Esse veneno esta à espreita em milhares de alimentos industrializados.
As empresas alimentícias não eram obrigadas a listá-las nos rótulos. Afinal pergunto eu qual o problema dessa gordura?
Ela é simplesmente um óleo vegetal com a adição de hidrogênio.
Esta em milhares de alimentos comuns e industrializados, de Waffles congelados a bolachas, batatas fritas e bolos.
O óleo vegetal parece ser bem inocente, até você aprender que o processo de hidrogenação o transforma em uma gordura difícil de digerir. Esse componente aumenta a quantidade do LDL(colesterol ruim) no sangue e pode elevar o risco de você ter doenças cardíacas.
Sabe-se que gorduras animais saturadas são maléficas à saúde, pois ficam depositadas nas paredes das artérias , prejudicando a circulação do sangue. Porém, a gordura trans é pior, por que enfraquece o seu sistema imunológico e causa diabetes.
Origem do veneno
Os óleos vegetais são combinados com hidrogênio e esquentados a temperaturas extremas. Com o aquecimento, as moléculas do óleo se unem ao hidrogênio, criando uma estrutura nova e inventada pelo homem, chamado ácido graxo trans. O resultado é a transformação do liquido em sólido.
De repente , o óleo hidrogênado se tornou sucesso imediato. Os restaurantes gostavam porque enchiam suas panelas de frituras com a novidade sem enfumaçar a cozinha. Gordura hidrogenada também era mais barata que manteiga e tinha a vida útil mais longa. Dessa forma, as lanchonetes não apenas usavam o mesmo óleo repetidas vezes em suas frituras como também compravam o produto no atacado, deixando-o na prateleira dos fundos sem se preocupar com a validade.
A gordura trans deixou as batatas fritas e os biscoitos tipo crackers mais crocantes e ainda deu aos fabricantes um meio de acrescentar o grande sabor da gordura a alimentos como as bolachas recheadas.
Os óleos vegetais normais aos poucos vazavam das bolachas e dos chips produzidos em massa, deixando rastro de sujeira gordurosa, mais a gordura trans era diferente. Como as suas moléculas se solidificavam à temperatura ambiente, os fabricantes passaram a poder reter a gordura em seus alimentos com a injeção dessa substancia que da sabor sem manter a aparência oleosa.
Reação no seu organismo
Como a gordura trans não é encontrada na natureza, o corpo humano tem dificuldades para processá-la, em comparação as outros gorduras.
Assim, ainda que talvez você nem se toque na quantidade de gordura trans existente no seu pão com manteiga matinal,ela fica muito tempo dentro do seu corpo. E adivinha qual e o seu primeiro alvo?Seu coração.
`Além de aumentar o número de partículas do colesterol ruim (LDL) e de triglicérides na corrente sanguínea, a gordura trans reduz o seu colesterol bom (HDL)`,ela também eleva o nível de lipoproteínas no sangue, fabricado pelo fígado.
As lipoprotéinas são responsáveis pelo transporte da gordura pelo organismo.Como naturalmente o fígado não esta programado para processar a gordura trans, esta se acumula nas células hepáticas.Com esse excesso, o fígado não responde ao hormônio insulina e, portanto, não interrompe a produção de glicose, que deveria acontecer logo depois de você comer um biscoito recheado.
Então os níveis de glicose no sangue aumenta e, consequentemente, o pâncreas passa a reduzir mais insulina, que, em maior quantidade, estimula a produção de tecido adiposo. E quem perde com isso ´é o seu abdomem, que ganha aquela cara de barriga de chope.
Pesquisadores de Harvard (EUA) descobriram que ingerir apenas 3% de suas calorias diárias em gordura trans aumenta o risco de doenças cardíacas em até 50%.
Pondo isso em perspectiva, 3% de suas calorias diárias totaliza cerca de 7 gramas de gordura trans - que equivale a mais ou menos uma porção de batatas fritas. Você não come batatas fritas?Mesmo assim esta correndo o risco. Mesmos os americanos saudáveis comem entre 3 a 10 gramas de gordura trans por dia.
Fique ligado que os estragos não são somente no coração, uma dieta rica em ácido graxos trans também é importante fator de risco para diabetes.
Resultados de pesquisas relatam que a gordura trans pode realmente promover perda muscular e aumentar seu risco de câncer, só reforçaram um passo radical dado em território americano:médicos daquele país recomendam que todos os que vivem ali reduzam drasticamente a ingestão de alimentos feitos com óleo.
De fato a gordura trans é tão prejudicial a saúde que não há limites seguro para seu consumo.
Ácido linoléico conjugado
(CLA)
Apesar de todas as evidências contra a gordura trans, existem dados recentes que mostram que pelo menos um parente distante dessa gordura pode realmente ser bom para você. O composto em questão é o ácido linoléico conjugado (CLA), gordura natural encontrada na carne do boi em laticínios, como leite, iogurte e queijo.
A estrutura das moléculas do (CLA) é semelhante à da gordura trans, de forma que os cientistas as classificaram na mesma categoria.
A pesquisa está na fase inicial, mas diversos estudos promissores sugerem que o CLA possa construir para que as pessoas percam peso, assim como ajudar no combate ao câncer, diabetes e doenças cardíacas, exatamente as doenças causadas pela gordura trans.

ESTATINAS E COLESTEROL



ESTATINAS E COLESTEROL




As estatinas são um grupo de substâncias afins, denominadas lipoproteinas, são empregadas em medicina para tratar os altos níveis de Colesterol, LDL-colesterol e VLDL-colesterol no sangue. As lipoproteinas são essenciais ao funcionamento do organismo humano, mas em níveis sangüíneos elevados podem ser prejudiciais.
O colesterol, que já foi considerado o inimigo maior do nosso sistema cardiovascular, é formado principalmente no nosso fígado. Do total de Colesterol do corpo humano, cerca do 60% é formado no fígado e o restante vem da alimentação. O colesterol e seus derivados são importantes para a produção dos hormônios, na formação das membranas celulares, na produção da vitamina D, essencial no metabolismo do cálcio, que por sua vez é importante na formação, conservação e regeneração de ossos. Sem colesterol a vida humana não é possível.
Observou-se que os elevados níveis sangüíneos de colesterol estão associados ao surgimento de doenças degenerativas. Tal fato levou os pesquisadores médicos a incrimar o colesterol elevado como sendo um dos fatores de risco mais importantes para o surgimento destas doenças.
O colesterol total é formado por três componentes principais, o LDL colesterol (lipoproteinas de baixa densidade), o VLDL colesterol (lipoproteinas de muito baixa densidade) e HDL Colesterol (Lipoproteinas de alta densidade). Os dois primeiros componentes, o LDL e VLDL, seriam os responsáveis pelos efeitos deletérios do colesterol, agrupados como sendo o mau colesterol. Já o HDL seria o bom colesterol, por remover tanto dos vasos como do fígado o mau colesterol. A partir deste conhecimento todas as medidas para reduzir os níveis de colesterol do sangue foram dirigidas para evitar a ingestão de alimentos que o contenham. Assim, principalmente alimentos ricos em gorduras animais, tais como carnes gordas, frituras, gorduras saturadas, gema de ovos, embutidos, vísceras, etc. Com as dietas os resultados nunca foram plenamente satisfatórios, principalmente pela desobediência e inconstância em obedecer às restrições alimentares.
Por outro lado elevar os níveis do bom colesterol, aquele que protege do mau, é uma outra direção para o tratamento. Para tanto recomenda-se dietas especiais, principalmente a do mediterrâneo, o ingestão de flavonóides, encontrados em frutas, vinhos, sucos de uvas, exercícios físicos regulares, são todas medidas que elevam o HDL colesterol.
Como somente 40% do nosso colesterol vem da alimentação, sempre existiram tentativas de reduzir a produção de colesterol.
Um dos primeiros medicamentos eficazes para reduzir a produção de colesterol foi o Clofibrate, muito usado de 1962 até 1980. Reduzia o níveis de colesterol em média 9%, contudo, por ter aumentado significativamente a produção de cálculos biliares, o medicamento foi banido do receituário médico. Por outro lado, nos que ingeriam o medicamento, houve um aumento na incidência de câncer de fígado. Além disso, o que mais levou ao abandono do uso deste medicamento foi que após 20 anos de observação conclui-se que o número de mortes por doenças atribuíveis aos altos níveis de colesterol não foram reduzidos com a administração do Clofibrate. Além de aumentar a mortalidade por outras causas, é uma droga ineficaz naquilo que se pretende. Este medicamento, no início, foi considerado milagroso.
Em 1971, um pesquisador japonês, Akira Endo, observou que alguns cogumelos produziam uma substância tóxica fatal para os animais que os ingeriam, verificaram que esta ação prejudicial era provocada por impedir a produção de colesterol nos animais intoxicados. A partir desta observação, Endo conseguiu isolar a substância tóxica, que foi avaliada e que no final serviu de base para a produção das estatinas. O primeiro produto a chegar ao mercado brasileiro foi a LOVASTATINA, entre os nomes comerciais temos o Mevacor, Lovaton, Lovast. Foi um medicamento de sucesso, porém com muitos efeitos colaterais indesejáveis. A partir deste sucesso terapêutico, outros laboratórios farmacêuticos se lançaram nas pesquisas e na produção de outras estatinas. Mudando radicais cada laboratório produtor de estatinas iniciaram campanhas procurando convencer a classe médica que a sua estatina é melhor, mais inócua, mais promissor, de melhores resultados e menores efeitos colaterais.
Atualmente estão a disposição dos médicos e pacientes produtos como a SINVASTATINA, no comércio como Zocor, a ATORVASTATINA, que leva o nome comercial Lipitor, a PROVASTATINA, comercializada sob o nome Mevalutin. Houve a CERVISTATINA, que foi retirada do mercado após dois anos de uso por ser hepatotóxica e ter provocado mortes por doenças renais. A ROSUVASTATINA, é a mais recente no mercado e sobre ela não temos informações maiores. Provavelmente virá com promessas de menos efeitos colaterais, de maiores benefícios e de preço mais elevado. O tempo dirá se estamos errados ou não.
A eficácia da Estatinas em reduzir os níveis do mau colesterol é significativa, são medicamentos muito eficazes neste objetivo. A longo prazo a redução dos níveis de colesterol significa uma redução na incidência de moléstias degenerativas, principalmente naquelas que as alterações vasculares decorrentes de altos níveis de colesterol no sangue levam à arteriosclerose, à obstrução das artérias do coração, rins, cérebro e circulação de pernas, intestinos e vasos genitais.
Observou-se que mesmo pessoas que não tem altos níveis de colesterol no sangue, ao fazerem uso de estatinas, terão menor incidência de obstruções arteriais. Por exemplo, observou-se que pessoas que foram submetidas a tratamento de obstrução de coronárias, seja por angioplastia, colocação de stents ou mesmo cirurgia sobre artérias cardíacas e que não tenham níveis elevados de colesterol no sangue, se forem tratadas com estatinas terão menor número de recidivas de acidentes vasculares do que aqueles que não receberem estes medicamentos. O porque deste benefício em pessoas não portadores de hipercolesterolemia não está esclarecido. Sugere-se que o benefício esteja relacionado a um efeito anti-inflamatório benéfico. Os níveis de proteina C-reativa ultra-sensível podem diminuir com o uso de estatinas. De objetivo já se sabe que a ingestão de estatinas reduz significativamente a incidência das complicações atribuídas ao Colesterol, um resultado bem diferente daquele observado com o Clofibrate.
Mesmo sendo as estatinas medicamentos eficazes não deixam de ser drogas cercadas de riscos, alguns até fatais. Por esta razão estes medicamentos só devem ser tomados sob orientação e acompanhamento de um médico, os pacientes devem ser mantidos sob severa vigilância.
Alguns dos riscos do uso das estatinas estão relacionados a seguir

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Insuficiência Renal Crônica


De WikiPETia Medica
Texto de Raimundo Luiz da Silveira Neto
Insuficiência Renal Crônica

Os rins desempenham uma série de funções no organismo: eliminam as toxinas advindas do metabolismo, regulam as concentrações dos eletrólitos, o volume extracelular, o pH sanguíneo e a pressão arterial. Os rins têm ainda importante função endócrina, sendo responsáveis pela síntese da eritropoietina e pela síntese da forma ativada da vitamina D. A insuficiência renal crônica (IRC) é a perda lenta, progressiva e irreversível dessas funções.

Tabela de conteúdo

[esconder]

Fisiopatologia

A IRC é insidiosa. Com uma perda de até 50% da função renal, os pacientes podem não exibir quaisquer sintomas. Isso ocorre porque os néfrons têm uma enorme reserva funcional, ou seja, os rins têm maior potencial de filtração que o mínimo necessário para a homeostase. Basta lembrar que é possível viver com um único rim. Não bastasse a grande reserva funcional, mais uma propriedade do néfron favorece a pobreza de sintomas no início da doença: a sua capacidade de adaptação. Os néfrons sobreviventes passam a exercer as atividades dos néfrons perdidos. Não é exagero dizer que, quando vários néfrons morrem, os remanescentes passam a “dar plantão” e “fazer hora extra” - uma alusão ao trabalho a mais que supre as funções dos néfrons perdidos.

Mecanismo de Adaptação dos Néfrons

Como ocorrem essas adaptações intra-renais?
Os néfrons sobreviventes passam a filtrar mais, pois se aumenta a pressão de filtração. Isso ocorre provavelmente porque ocorre uma vasodilatação da arteríola aferente decorrente da maior produção de prostaglandinas e vasoconstricção da arteríola eferente decorrente da ação da angiotensina II. Veja a figura:
FIGURA 01
O preço para se manter a homeostase é um demasiado trabalho extra aos néfrons remanescentes, e isso acaba sendo prejudicial. Para que esse néfron filtre mais ocorre aumento da pressão hidráulica intraglomerular. As delicadas paredes glomerulares não resistem a essas pressões de cisalhamento e vários fenômenos de natureza inflamatória passam a ocorrer. Outros mecanismos contribuem para maior estresse aos néfrons remanescentes: hipertrofia glomerular, formação de trombos intraglomerulares, proliferação exagerada de células glomerulares e matriz mesangial, deposição glomerular de lipídios, estiramento das células endoteliais e mesangiais, lesão dos podócitos, deposição de material protéico subendotelial, inflamação renal, dentre outros. Com isso, mais néfrons são destruídos e assim, ocorre maior sobrecarga hemodinâmica. Esse círculo vicioso agrava a perda do parênquima renal. Cada vez mais, sobra trabalho e falta néfron!
FIGURA 02
À medida que mais e mais néfrons são perdidos, pequenos sinais e sintomas podem sobrevir. Quando a função renal encontra-se em torno de 30% pode ocorrer edema de membros inferiores, hipertensão arterial, edema periorbitário, anemia, entre outros. Como a perda de função renal é irreversível e progressiva, inexoravelmente, mais néfrons serão perdidos e mesmo a “dupla jornada de trabalho” dos néfrons remanescentes não será suficiente para realizar uma adequada filtração. O paciente desenvolverá mais sinais que comporão a chamada síndrome urêmica. Os rins evoluirão para um estado de doença Renal em Fase Terminal (DRFT) com níveis de taxa de filtração glomerular (TFG) menores que 15% do normal. O estágio de DRFT é alcançado em um período variável de 3 a 20 anos em média, mas duas situações (a glomerulonefrite rapidamente progressiva e a necrose cortical aguda) podem levar a DRFT em curto período.

Estadiamento

Tab. 01 - Estadiamento da DRC
Estágio Filtração Glomerular (ml/min) Grau de Insuficiência Renal
0 >90 Grupos de risco para DRC* comAusência de Lesão Renal
1 >90 Lesão Renal com Função Renal Normal
2 60-89 Insuficiência Renal Leve ou Funcional'
3 30-59 Insuficiência Renal Laboratorial ou Moderada
4 15-29 Insuficiência Renal Severa ou Clínica
5 <15 Insuficiência Renal Terminal ou Dialítica
* Grupos de risco para DRC: HAS, DM, parentes de paciente com DM, HAS e DRC.

Etiologia

As mais importantes causas de IRC são hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus e glomerulonefrites. Nos EUA, a causa mais importante é a DM (43,7%), seguida pela HAS (26,3%) e glomerulonefrites (9,4%) – dados de 2002. No Brasil, a HAS parece ser a principal causa. Acompanhe na tabela a evolução das principais causas de IRC no Brasil ao longo dos anos.

Tab. 02 – Evolução das principais causas de IRC no Brasil
Diagnóstico 1987 1997 2005
Glomerulonefrite Crônica 36,5% 27,5% 13,0%
NIC/PNC 16,5% 11,0% 9,0%
Nefroesclerose 10,8% 16,8% 27,1%
Diabetes Mellitus 8,1% 13,0% 22,3%
D. Renal Policística 6,7% 3,0% 5,4%
Nefropatia lúpica 4,7% 1,3% 2,1%
Outros 1,7% 4,6% 12,1%
Indeterminado 15,0% 22,8% 9,0%
Fonte: Sabbaga E. 1987; Sec. Saúde SP, 1997; Romão Jr JE, 2004;

Síndrome Urêmica

A síndrome urêmica é o conjunto de sinais e sintomas que começam a surgir quando a FG está < 30 ml/min. Ela decorre de dois eventos:
a) acúmulo de várias toxinas que deixam de ser excretadas
b) perda da função endócrina renal (diminuição da síntese de eritropoietina e de calcitriol).
Dos produtos do catabolismo protéico acumulados, surgem várias manifestações clínicas. Entre as escórias nitrogenadas destacam-se uréia, guanidinas, ácido guanidinosuccínico, sulfato de inoxidil, miosinositol, β-2-microglobulina, aminas alifáticas e poliaminas. Apesar de muitas vezes ser imputada como responsável pela maioria dos sintomas urêmicos, somente acima de 250mg/dL, a uréia isoladamente é capaz de gerar sintomas. Provavelmente nenhuma toxina isolada é capaz de gerar todos os sintomas da síndrome urêmica.

Distúrbios decorrente do acúmulo de toxinas



Hipervolemia e Hiponatremia

O rim normal consegue variar a excreção de água e eletrólitos de acordo com as necessidades corpóreas. Na DRC, como ocorre menor filtração, acumula-se sódio. Para tentar evitar esse processo, cada néfron remanescente adapta-se aumentando a sua fração excretória de sódio (FENa). Resumidamente, pode-se dizer que cada unidade filtradora excretará mais sódio que normalmente está habituado a excretar. De tal maneira é essa adaptação para livrar-se do excesso, que o rim perde sua capacidade de desadaptação. Os néfrons não conseguem mais voltar a excretar as antes habituais menores quantidades de sódio. Tampouco, com o progredir da perda de néfrons, a adaptação consegue ser suficiente para garantir uma adequada homeostase desse íon. Como resultado, nem os néfrons conseguem excretar o excesso de sódio, nem são capazes de retê-lo em situações em que seja necessário conservá-lo. Veja a figura:
FIGURA 03
Dessa maneira, se o paciente ingere uma quantidade maior de sal, ocorre retenção, levando à hipervolemia e suas conseqüências: edema em face, membros inferiores, ascite, derrame pleural e pericárdio, HAS, EAP e etc. Caso ele ingira pouco, a adaptação que proporcionou aumentar a FENa faz com que boa parte do sódio seja perdida na urina e o paciente apresente hipovolemia. Apesar de ocorrer uma tendência a retenção de sódio, na verdade ocorre hiponatremia e não hipernatremia na DRC. Por quê? Isso ocorre porque, com a baixa filtração, o sódio é retido; mas, com o sódio, a água também é absorvida. Ela acaba diluindo o sódio, assim, ocorre hipervolemia com hiponatremia dilucional, apesar de estar ocorrendo retenção de ambos.

Outros distúrbios eletrolíticos

Apesar de aumentar a fração de excreção dos outros eletrólitos que estejam sendo retidos, como já redundantemente explanado, com o progredir da DRC, a adaptação torna-se insuficiente e eles terminam por acumular-se. Sendo assim, ocorre hipercalemia, hipermagnesemia e hiperfosfatemia. Com o cálcio, entretanto, ocorre o oposto – hipocalcemia. Esse mecanismo será discutido adiante, na área destinada à Osteodistrofia Renal (OR). Adianta-se apenas o fato de o cálcio permanecer predominantemente ligado à albumina, que obviamente, não é filtrada. Apenas uma pequena quantidade de cálcio permanece na forma livre, podendo então sofrer influência direta do controle eletrolítico exercido pelos rins.

Acidose

A maior parte dos íons hidrogênio (2/3) é excretada ligada à amônia produzida no túbulo renal. Para cada H+ excretado, um íon bicarbonato é absorvido. Na IRC, o rim produz menos amônia e o H+ deixa de ser excretado e conseqüentemente o bicarbonato deixa de ser absorvido. Na falta de bicarbonato, o rim passa a aumentar a absorção de cloretos para compensar a carência de cargas negativas. Nesse momento instala-se uma acidose hiperclorêmica. Com o progredir da perda de função renal (FG ~ 5-10 ml/min), vários ânions deixam de ser excretados, como o sulfato (proveniente do metabolismo das proteínas), urato, fosfato, lactato, acetato e etc. Assim a acidose passa a ser com anion gap elevado.

Distúrbios decorrente da perda de função endócrina



Anemia da Doença Renal Crônica


A anemia é um dos principais manifestações da doença renal e é responsável por uma série de sintomas como fadigabilidade, alterações neuro-psiquiáticas, astenia, indisposição física e mental, cefaléia, déficit cognitivo, anorexia, insônia, tendência a sangramento, está associada à maior mortalidade cardiovascular, hipertrofia ventricular esquerda, insuficiência cardíaca e má qualidade de vida. Ela instala-se à medida que a filtração glomerular cai abaixo de 20-30 ml/min/1,73m2.
Por que o nefropata tem anemia?
1. Deficiência relativa de Eritropoietina
2. Deficiência de Ferro2.1 Má absorção
2.2 Sangramentos
2.3 Pouca ingestão
2.4 Deficiência funcional
3. Diminuição da Meia-vida das Hemácias (pelo PTH e outras toxinas)
4. Fibrose óssea
5. Outros: baixo folato, intoxicação pelo alumínio
Fisiopatologia da Anemia da Doença Renal Crônica
1.Deficiência relativa de Eritropoietina
Sob estímulo hipóxico, no rim, mais especificamente nos capilares peritubulares e em fibroblastos presentes no interstício renal, é produzida a maior parte da eritropoietina. Esse hormônio promove maior síntese de hemoglobina na medula óssea, por inibir a apoptose de células progenitoras da linhagem eritróide. A progressão da insuficiência concorre para a menor síntese de eritropoietina e assim, a medula produz menos eritrócitos. Veja na figura o esquema da participação do rim na síntese de hemoglobina.
Figura 04
2.Deficiência de ferro
A elaboração do heme depende ainda de outros fatores. A adequada síntese requer:
a) estoques adequados de ferro,
b) mobilização do ferro dos estoques, presentes no sistema reticuloendotelial, e transporte adequado do mesmo à medula pela transferrina.
Não bastasse o precário estímulo para a síntese de hemoglobina, decorrente da eritropoietinopenia relativa, o paciente urêmico dispõem de poucas reservas para a já tão prejudicada síntese. Por quê?
A) Estoque inadequados
1 - A anorexia comum desses pacientes leva a menor ingestão alimentar, e daí, a diminuição das reservas de ferro. Outro problema: o trato gastrointestinal desses pacientes pode ainda ter uma menor capacidade de absorver ferro.
2 - As toxinas urêmicas podem ainda lesar a mucosa gastrointestinal. Além disso, as toxinas urêmicas promovem inibição plaquetária. Essa combinação nociva (disfunção plaquetária + lesão da mucosa) predispõe ao sangramento, notadamente no trato gastrointestinal, levando a perda crônica de ferro. O resultado é um desastroso balanço negativo: pouco ferro é absorvido e muito ferro é perdido.
B) Má mobilização e transporte inadequado
1- Em doenças inflamatórias como o LES, por exemplo, ainda ocorre uma “dificuldade” para mobilizar as reservas – o que é chamado de anemia da doença crônica. Nessa situação, por causa da inflamação crônica, o organismo pode até dispor de bons estoques de ferro (ferritina elevada), mas este não chega à medula (a saturação de transferrina é baixa). O ferro fica “aprisionado” na ferritina e não fica disponível à medula. Há uma deficiência funcional de ferro.
A anemia da doença crônica decorre de outros mecanismos: redução da meia-vida das hemácias, redução da produção renal de eritropoietina e menor resposta dos precursores eritróides à ação da eritropoietina. No nefropata, o paratormônio (PTH) está aumentado devido ao hiperparatireoidismo secundário (esse tema será mais bem dissecado no item OR.
Por três mecanismos principais o PTH é considerado um dos principais vilões no desequilíbrio da homeostase hematológica.
3.Fibrose Óssea
1) Ele promove fibrose óssea: a fibrose dos ossos, principalmente dos ossos chatos, terá como conseqüência a diminuição do compartimento onde as células vermelhas seriam produzidas.
2) Inibe o efeito da eritropoietina na medula óssea.
4.Diminuição da meia-vida das hemácias
3) Diminui a meia-vida das hemácias, a qual cai de aproximadamente 120 dias para cerca de 65-70 dias (outras toxinas também participam desse processo)
5.Outros
Normalmente, a resposta medular a uma anemia é o aumento do seu poder de síntese, levando a riqueza celular no mielograma. Entretanto, isso não ocorre na anemia do renal crônico. A medula óssea costuma ser hipoproliferativa, pois não há eritropoietina para promover este estímulo compensatório. A anemia é normalmente normocítica normocrômica, mas pode ser também microcítica, ocasionada por deficiência de ferro. Os pacientes que realizam hemodiálise podem ter anemia microcítica por intoxicação por alumínio (presente na água da diálise), ou megaloblástica, ocasionada por carência de folato - perdido na diálise.
Conclusão da fisiopatologia
O mau funcionamento renal com a conseqüente anemia pode ser comparado a um mau funcionamento de uma indústria. Imagine o calamitoso estado de uma indústria onde: 1) falte um patrão para orientar a produção (falta eritropoietina); 2) faltem matérias-primas (faltam estoques de ferro); 3) as máquinas sejam pouco produtivas (no nefropata ocorre intensa fibrose óssea, diminuindo a área destinada à síntese); 4) os funcionários não realizem suas obrigações (o estoque de ferro não é conduzido pela transferrina ao sítio de produção); 5) os produtos sejam de má qualidade (hemácias urêmicas duram apenas 70 dias).
Tratamento da anemia
O tratamento da anemia da IRC é à base de eritropoietina que tem como efeito colateral o aumento da pressão arterial. A reposição de eritropoietina evita sobrecarga ventricular esquerda, diminui a mortalidade cardiovascular e posterga a entrada do paciente na diálise. O controle do hiperparatireoidismo contribui para a melhora da anemia. A reposição de eritropoietina só deve ser feita quando houver estoques adequados ferro e folato, por isso é comum repor também esses nutrientes. O objetivo do tratamento é atingir hemoglobina maior ou igual a 11mg/dl.

Osteodistrofia Renal (OR)


Fisiopatologia
O rim é o maestro da homeostase corpórea e um verdadeiro caos metabólico instala-se progressivamente, à medida que a função renal deteriora. Dessa maneira, até mesmo “pequenos” desequilíbrios na excreção de certas substâncias acarretam conseqüências, que em cascata, levam a grande morbidade ao doente.

A homeostase do cálcio e do fósforo é seriamente afligida com a progressiva diminuição da taxa de filtração. No rim, mais especificamente no túbulo proximal, existe uma enzima chamada alfa-1-hidroxilase. Essa enzima transforma o metabólito inativo da vitamina D produzido no fígado, na forma ativa da vitamina D, o 1,25-dihidroxicalciferol ou simplesmente calciferol. Esse hormônio atua em dois órgãos principais (intestino e paratireóides) para o adequado balanço de cálcio e fósforo. No intestino, a vitamina D ativa promove estímulo para a absorção de cálcio para o sangue. Nas paratireóides, juntamente com o cálcio, são os principais inibidores da liberação do paratormônio, através de feed back negativo. Veja na figura o mecanismo fisiológico da atuação do 1,25-dihidroxicalciferol.
FIGURA

Como é sintetizado no rim, na IRC a produção do 1,25-dihidroxicalciferol é inibida. Logo, a carência de vitamina D ativa acarreta:
1) na paratireóide, alta liberação de PTH (hiperparatireoidismo secundário);
2) no intestino, baixa reabsorção de cálcio.
Por que ocorre inibição da síntese de vitamina D ativa?
Para responder a essa pergunta precisamos entender o metabolismo do fósforo.
O fósforo provém do metabolismo das proteínas e é excretado diariamente pelos rins. Mas com a perda de função renal, esse metabólito começa a se acumular no organismo. Para tentar evitar esse problema, os néfrons remanescentes tentam exercer as atividades dos néfrons perdidos, “sobrecarregando-se”, hiperfiltrando e aumentando a sua fração de excreção. O resultado dessa “jornada extra de trabalho” é calamitosa. Os néfrons passam a lidar com cargas elevadas de fósforo na sua luz, as quais, em grande quantidade inibem a alfa-1-hidroxilase. A enzima inibida deixa de converter o metabólito hepático em vitamina D ativa. Ou seja, a “boa vontade” do néfron em “fazer trabalho extra”, ao invés de benéfico, acarreta prejuízo! O fósforo permanece elevado na corrente sanguínea pela ineficiência do mecanismo excretor e, além disso, ocorre diminuição da síntese da calcitriol.
FIGURA
FIGURA
Com a deficiência de vitamina D, ocorre má absorção de cálcio no intestino, acarretando hipocalcemia. O fósforo em altas quantidades ainda liga-se ao cálcio sérico, quelando-o, agravando ainda mais os baixos níveis de cálcio. O fósforo ainda pode atuar nas paratireóides estimulando a liberação de PTH. A hipocalcemia também é um estímulo para a liberação do PTH. O trio - hipocalcemia, deficiência de Vitamina D e hiperfosfatemia – acarreta o hiperparatireoidismo secundário.
FIGURA
Como atua o rim na homeostase do cálcio?
O cálcio, por ser um cátion que circula predominantemente ligado a albumina, é pouco filtrado pelo rim e por isso, a sua homeostase é apenas indiretamente afetada pela insuficiência renal. Basicamente, a hipocalcemia na IRC decorre da má absorção intestinal pela carência de vitamina D e do efeito quelante do fósforo, como supracitado.
Porque o PTH não corrige a hipocalcemia?
Como ocorre hiperparatireoidismo secundário, teoricamente, o paratormônio (PTH) deveria descalcificar os ossos e corrigir a hipocalcemia, mas isso pode não ocorrer. A hiperfosfatemia acarreta mais um prejuízo: ela promove um fenômeno chamado de resistência óssea à ação do PTH. O PTH em altas quantidades agirá sobre o osso causando intensa fibrose, mas não conseguirá retirar cálcio dos mesmos em quantidades suficientes parar corrigir a hipocalcemia.
Conclusões da fisiopatologia
Em resumo, a perda da homeostase do cálcio e fósforo na insuficiência renal crônica trás graves conseqüências para o intestino, os ossos e para a glândula paratireóide. Essa perda de homeostase resume-se a duas alterações básicas metabólicas: diminuição da excreção de fósforo e diminuição da produção de vitamina D. O trio - hipocalcemia, deficiência de vitamina D e hiperfosfatemia - é responsável pela estimulação da glândula paratireóide, levando ao hiperparatireoidismo secundário, comum no nefropata. Veja na tabela como a hiperfosfatemia promove desregularização da homeostase do cálcio.
Hiperfosfatemia
1.Quela o Cálcio sérico2. Inibe a síntese de Vit. D
3. Promove liberação de PTH
4. Promove resistência óssea ao PTH
Alterações ósseas da OR
Como ocorrem as alterações ósseas na osteodistrofia renal?
Os níveis elevados de fósforo levam a baixa regulação dos receptores de PTH nos ossos, levando a um fenômeno de resistência óssea, ou seja, a liberação de cálcio pelo osso é baixa, desproporcional aos níveis de PTH. Esses altos níveis de PTH, entretanto, promovem reabsorção e neo-formação óssea – osteíte fibrosa. O osso perde a sua arquitetura lamelar e fica mais propenso a fraturas. É comum sobrevir ao paciente lombalgia, além de deformidades na coluna por alterações vertebrais, como a cifoescoliose. Diversos achados radiográficos podem ser observados, entre eles: reabsorção superiosteal das falanges da mão, crânio em sal e pimenta, dentre outras. O fosfato pode se combinar com o cálcio para formar o fosfato de cálcio, um sal inorgânico pouco solúvel que pode se depositar nos tecidos. Quando as concentrações séricas de fosfato estão elevadas e as de cálcio não estão tão baixas, o produto [Ca2+] x [P] (concentração de cálcio multiplicado pela concentração de fósforo) pode estar maior que 50, predispondo a precipitação de fosfato de cálcio nos tecidos. Isso leva a uma série de conseqüências: prurido por depósitos na derme, pneumopatia restritiva, disfunção miocárdica, calcificação obstrutiva das pequenas artérias periféricas levando à isquemia e necrose.

Tratamento da Osteodistrofia Renal
Sabemos que o grande vilão na osteodistrofia é o fosfato. Por isso, é fundamental diminuir o aporte desse ânion. O fosfato advém do metabolismo protéico. Assim, deve-se restringir a ingesta protéica (800mg/dia de fosfato). Esse balanço pode ser difícil, uma vez que restrições dietéticas podem levar a desnutrição do nefropata. Uma medida importante para evitar a absorção de fósforo para o corpo é o uso de carbonato de cálcio ou sevelamer. Quando ingerido durante as refeições, eles ligam-se ao fosfato presente nas proteínas, gerando fosfato de cálcio. O sal inorgânico é pouco solúvel e não é absorvido, sendo evacuado com as fezes Como na IRC ainda ocorre hipocalcemia – lembre-se que há pouco calcitriol para absorver cálcio do intestino – pode ser feita a suplementação de carbonato de cálcio entre as refeições, pois o objetivo não é quelá-lo com o fosfato ingerido, e sim favorecer a sua absorção. Lembre-se: o cálcio ligado ao fosfato no intestino não é absorvido. Caso os níveis de PTH mantenham-se elevados, apesar da suplementação de cálcio, pode-se tentar repor análogos da vitamina D ativa – o calcitriol, para tentar inibir a paratireóide e controlar os níveis de fósforo e cálcio. Ressalta-se que se deve ter muito cuidado nesse manejo, pois a administração de carbonato de cálcio e calcitriol pode levar a elevados valores de cálcio sérico. Se isso ocorrer, o produto cálcio x fósforo pode ser maior que 50, favorecendo a calcificações teciduais. É importante frisar que as preparações disponíveis mais comuns que tratam osteoporose têm em sua fórmula a forma inativa da vitamina D e carbonato de cálcio. Essas formulações não servem como estratégia para repor vitamina D no nefropata, uma vez que ele já dispõe de vitamina D inativa em adequados níveis (desde que não possua também uma hepatopatia).
Compreendida a fisiopatologia dos distúrbios endócrinos, hidroeletrolíticos e hematológicos podemos sumarizar os principais efeitos presentes na síndrome urêmica por sistemas.

Manifestações Clínicas

Manifestações Hematológicos

O ácido guanidinosuccínico inibe a atividade plaquetária induzida pelo ADP, predispondo a sangramentos em vários locais. A anemia contribuiu ainda mais para o distúrbio hemorrágico, uma vez que as hemácias favorecem a interação das plaquetas com o endotélio lesado. As toxinas ainda deprimem a função neutrofílica, favorecendo o surgimento de infecções bacterianas e fúngicas que potencialmente podem evoluir para sepse grave. Também ocorre discreta linfopenia e disfunção linfocitária. A imunidade humoral está deprimida, notadamente ao combate do HBV e ao vírus da influenza. A anemia, por ter mecanismo muito mais complexo foi tratada no tópico a parte.

Manifestações Gastrointestinais

As toxinas urêmicas não eliminadas causam inflamação da mucosa do trato gastrointestinal. Além disso, as toxinas podem agir sobre o sistema nervoso entérico, causando gastroparesia urêmica. Os distúrbios plaquetários podem ainda favorecer a sangramentos. Podem sobrevir assim várias manifestações como: náuseas, vômitos, melena, hematoquesia, falta de apetite, plenitude gástrica. A gastroduodenite inespecífica pode favorecer ainda o surgimento de diarréia urêmica. O íleo urêmico predispõem a distensão abdominal. A inflamação do cólon pode levar a supercrescimento bacteriano.

Manifestações Neurológicas

As escórias nitrogenadas têm efeito tóxico aos neurônios. Além disso, o PTH aumentado leva a entrada de cálcio no neurônio, promovendo disfunções no potencial de ação neuronal. Os efeitos deletérios ocorrem no sistema nervoso central, periférico e autonômico. Os efeitos crônicos da uremia em nível de SNC são disfunção cognitiva progressiva, dificuldade de concentração, sonolência, confabulação, apraxia motora, agnosias, alteração comportamental. Agudamente, a uremia pode levar a lassidão, desorientação, surto psicótico, sinal de Babinsk, convulsões tônico-clônico generalizadas, disartria, asterix, coma e edema cerebral. A nível periférico ocorre polineuropatia sensitivo-motora com predomínio distal, com parestesias e paresias. O descontrole autonômico leva a descontrole da pressão arterial, da freqüência cardíaca, com hipotensão postural e hipotensão não responsiva a volume, arritmias cardíacas, morte súbita, anidrose e como já citado, gastroparesia urêmica.

Manifestações Cardíacas

A uremia agrava a insuficiência cardíaca dos nefropatas. Aliás, a principal causa e óbito nesses pacientes é a falência cardíaca. A uremia acelera a aterosclerose intra-coronariana. Além disso, 80% dos pacientes têm hipertrofia ventricular esquerda (HVE) Esta pode inclusive reverter completamente com o transplante renal. Pode haver cardiomiopatia dilatada urêmica. A baixa filtração, relacionada a uma sobrecarga de volume compromete ainda mais o coração já doente desses pacientes. Os sintomas de ICC podem estar presentes. A uremia acarreta ainda derrame pericárdico, podendo inclusive levar ao tamponamento cardíaco. As toxinas urêmicas podem levar ainda a inflamação dos folhetos pericárdicos – pericardite urêmica.

Manifestações Pleuro-pulmonares

Por pelo menos 5 mecanismos ocorre alterações na fisiologia respiratória: 1) A ICC leva a edema pulmonar 2) As escórias nitrogenadas aumentam a permeabilidade dos vasos pulmonares, acarretando edema não-cardiogênico. 3) As toxinas causam miopatia urêmica diafragmática, dificultando a resposta compensatória à acidose metabólica. 4) O produto cálcio-fósforo elevado leva a depósitos de fosfato de cálcio no pulmão, calcificando o parênquima pulmonar. 5) Ocorre derrame pleural pela retenção de volume.

Manifestações dermatológicas

As alterações cutâneas relacionados à síndrome urêmica são: xerose urêmica, hiperpigmentação de áreas fotoexpostas, cabelos secos e quebradiços, prurido urêmico e descoloração da extremidade ungueal. A pele assume uma coloração amarelo-acinzentada e os compostos azotêmicos liberados pelo suor formam um pó branco, quando aquele se resseca, formando a chamada neve urêmica.

Manifestações Osteo-Articulares

Podem ocorrer monoartrite, oligoartrite, periarterite e tenossinovite. A monoartrite pode ser séptica, pela susceptibilidade a infecções pela deficiência imunológica da uremia ou por depósitos de cristais como urato, pirofosfato de cálcio, oxalato de cálcio ou fosfato de cálcio básico. O acúmulo de ácido úrico pode ser tratado com alupurinol com doses corrigidas e deve se ter cautela com o uso de AINES. Pode-se optar pela indometacina, que tem metabolismo hepático. O duplo produto Ca2+ X P favorece a depósitos de no tecido periarticular levando a periartrite e tenossinovite. O calcitriol é importante para um adequado funcionamento muscular, razão pelo qual, a sua deficiência no hiperparatireoidismo secundário leva a miopatia urêmica. Além disso, os altos níveis de PTH levam a proteólise muscular e disfunção por acúmulo de cálcio intracelular. O paciente exibe sintomas como fraqueza da musculatura proximal.

Manifestações Endócrinas

Na uremia ocorre resistência periférica à ação da insulina associada à disfunção da ilhota beta pancreática, relacionada ao aumento do influxo de cálcio na célula, decorrente do hiperparatireoidismo. Assim, pode ocorrer intolerância à glicose ou pseudo-diabetes. Como uma parte da insulina é depurada pelo rim pela enzima insulinase, a morte de vários néfrons leva a aumento da concentração do hormônio. Como resultado, os pacientes que fazem uso de insulina exógena ou de sulfoniluréias podem ser surpreendidos por episódios de hipoglicemia. As escórias nitrogenadas inibem várias enzimas do metabolismo do colesterol, sobrevindo hipertrigliceridemia e baixo HDL. O LDL, apesar de comumente não apresentar alterações quantitativas, apresenta alterações qualitativas. A estrutura do LDL na uremia favorece a maior acúmulo na parede dos vasos. Junto ao pseudo-diabetes é um dos contribuintes mais importantes na fisiopatologia da coronariopatia urêmica. O catabolismo protéico é bastante acentuado na síndrome urêmica, levando a desnutrição protéico-calórica, que por si só é um fator de mal prognóstico. É por isso que, mesmo que seja importante reduzir a ingesta de fosfato, presente nas proteínas, por conta do hiperparatireoidismo secundário, não se deve prescrever restrições exageradas. Alguns aminoácidos elevam-se com a síndrome urêmica, como a homocisteína, a qual em altas concentrações também é fator de risco isolado para aterosclerose.

Diferenças entre a IRA e a IRC

Na IRA não ocorre anemia. Na vigência de IRA, a presença de anemia denota outra causa subjacente para o distúrbio que não a deficiência de eritropoietina. A presença de OR (alterações radiológicas, hipocalcemia, hiperfosfatemia, dor óssea) só ocorre na IRC. Os pacientes crônicos toleram elevados níveis de escórias nitrogenados oligossintomáticos, o que não ocorre na IRA.
A USG renal é o exame mais importante para ajudar na diferenciação. Os rins normais têm as seguintes dimensões: altura de 10 a 13 cm, largura de 5 a 7 cm, profundidade de 2,5 a 3 cm. Entretanto, nas IRC os rins têm tamanho diminuído, contrastando com os rins na IRA que podem ter tamanho normais ou até aumentados. Apenas 6 causas de IRC são exceções, pois cursam com aumento do tamanho renal – nefromegalia.
Causas de IRC com rins de tamanho normal ou aumentado
1. Nefropatia Diabética2. Amiloidose Renal
3. Nefropatia Obstrutiva crônica
4. Rins policísticos
5. Nefropatia falciforme
6. Esclerodermia
À ultrassonografia, o parênquima renal aparece hipoecogênico (preto) e a pelve renal e o tecido gorduroso adjacente apresenta-se hiperecogêncio (branco). Na Nefropatia crônica, o parênquima aparece, entretanto, mais brilhante – hiperecogêncio. É a chamada dissociação córtico-medular que ocorre na nefropatia crônica.
Algumas situações podem levar a uma agudização da IRC.
Causas de agudização da IRC
1. Hipovolemia2. Aminoglicosídeos, AINEs, IECA (raro), contraste iodado
3. Pielonefrite aguda
4. Nefropatia obstrutiva

Tratamento da IRC

AVISO MÉDICO
Advertência: A WikiPETia não é um consultório médico.
Se necessita de ajuda, consulte um profissional de saúde.As informações aqui contidas não têm caráter de aconselhamento.


Nas fases mais precoces da IRC pode ocorrer HAS pela nefropatia, a qual é agravada pela retenção de sódio e água. O tratamento deve enfocar o rígido controle da HAS para níveis abaixo de 130x80mmHg. Pode-se usar iECA ou BRAs que por inibirem a síntese de Angiotensina II, diminuem o mecanismo de hiperfiltração compensatório. Em caso de proteinúria, o iECA e BRA ainda a diminuem. Além disso, deve-se tratar a doença de base. Com o progredir da IRC, quando os primeiros sinais e sintomas da síndrome urêmica aprecem, pode-se lançar mão do uso da eritropoietina, da restrição do fosfato da dieta, bem como o uso de quelantes como carbonato de cálcio e ainda a reposição de cálcio e até calcitriol. É importante ainda a restrição da ingesta de sódio (100mEq/dia), água (1000-1500 ml/dia), potássio (40mEq/dia) e proteínas (1,0g/Kg/dia), devendo-se ter o cuidado para não realizar restrições exageradas. Em casos mais avançados o paciente pode necessitar de terapia de substituição renal, seja por diálise ou por transplante renal. É importante frisar que a diálise não corrige vários distúrbios da síndrome urêmica como anemia, osteodistrofia renal, hipocalcemia, hiperfosfatemia, prurido urêmico, alterações articulares, aterosclerose, dislipidemia, estado hipercatabólico e depressão imunológica. Veja na tabela algumas causas de agudização da IRC.

Prevenção da IRC

A Doença Renal Crônica (DRC) é um sério problema de saúde pública. Em função do crescimento de doenças como HAS e DM, aliado a uma maior expectativa de vida da população, existem estimativas que prevêem que o número de pacientes que precisarão dialisar pode dobrar nos próximos 6 anos, acarretando custos elevadíssimos. Só para se ter uma idéia, o número de pacientes no Brasil em Terapia de Substituição Renal (TSR), que inclui diálise e transplante renal, saltou de pouco mais 20 mil em 1994, para quase 60 mil em 2004.
Pacientes com HAS, DM e história familiar de DRC têm risco elevado de DRC. Têm risco médio para desenvolvimento de DRC: enfermidades sistêmicas, ITU de repetição, litíase urinária repetida, uropatias, crianças com idade menos que 5 anos, idosos com mais de 60 anos e mulheres grávidas. A creatina sérica ajustada através da equação de Cockcroff-Gault pode ser utilizada para avaliação da função renal. Veja a fórmula.
FORMULA

O uso da fórmula fornece ajustes para variáveis que interferem na produção de creatinina como idade, sexo, superfície corporal. É fundamental o cálculo do clearence em todo paciente a quem se pede creatinina sérica, uma vez que muitos pacientes já podem ter algum grau de insuficiência renal, apesar dos níveis séricos de creatinina estarem normais. Para a avaliação da população pediátrica opta-se pela equação de Schwartz e a de Counaham-Barrat.
FORMULA
Como no processo de envelhecimento a filtração glomerular (FG) diminui, pode ser difícil diferenciar a diminuição da filtração no envelhecimento da DRC do idoso. Por isso, o diagnóstico não deve ser feito exclusivamente a partir da estimativa da FG, mas também na presença de outros marcadores de doença renal como alterações do sedimento urinário e de exame de imagem.
FORMULA
A DRC é em geral sub-diagnosticada e sub-tratada. Boa parte desse problema ocorre porque muitos médicos não têm o costume de calcular o clearence de creatinina e estadiar o paciente, limitando-se a averiguar se o valor absoluto de creatina encontra-se abaixo do valor de corte do laboratório. A intervenção precoce no tratamento da IRC é uma boa estratégia para evitar que mais pacientes cheguem à diálise. Uma medida simples, mas muitas vezes esquecida é a inclusão de uma medicação anti-hipertensiva no tratamento do paciente diabético. Veja no gráfico abaixo o efeito do tratamento anti-hipertensivo sobre a evolução da nefropatia diabética, uma causa crescente de DRC no nosso meio
GRÁFICO

domingo, 2 de setembro de 2012

Mídia e garantias penais: barbárie ou civilização?

Mídia e garantias penais: barbárie ou civilização?

                       


Em um caso em que um suspeito não quis falar nada para uma CPI, um aloprado editorial do Correio Braziliense afirmou: “A cidadania levou ontem um tapa no rosto e se descobriu impotente, abandonada”

29 de Agosto de 2012 às 19:22


Luiz Flávio Gomes

A justiça midiática, consoante parte da doutrina, seria regida por uma peculiar forma de interpretação do direito, chamada de interpretação ingênua (eu diria não tão ingênua), que se caracteriza (conforme Monzón, La violencia, los medios y la valoración jurídica, 2005, p. 25 e ss.) pelo seguinte: (a) reducionismo e vaguidade do que é noticiado, (b) atribuição à ineficiência da Justiça como causa do aumento da insegurança e da corrupção, (c) processos e julgamentos paralelos com base em estereótipos, (d) ausência de neutralidade ou objetividade, (e) imposição de sanções morais (para satisfazer o instinto da vingança), (f) duras críticas contra o sistema legal de justiça (ou seja: deslegitimação contínua da Justiça oficial) e (g) pela difusão de uma cultura jurídica peculiar (externa), que constitui a base de uma construção da realidade fundada em princípios e valores (sobre o crime, o processo, a justiça etc.) muitas vezes completamente antagônicos com o modelo oficial.
O valor das garantias do devido processo legal, por exemplo, é frequentemente contestado pelo populismo penal midiático. São duas visões opostas: para os juristas elas são de aplicação universal; já para o jornalismo populista elas são de aplicação restrita e particular. O populismo penal midiático concorda e, às vezes, até defende impressionantes retrocessos na concepção do direito penal a etapas primitivas da civilização, tal como o exercício da vingança privada ou aplicação de penas desproporcionais ou ainda a inobservância das garantias fundamentais.
O populismo midiático, nesse sentido, é bastante pródigo em sugerir ou afirmar coisas (do ponto de vista jurídico) totalmente disparatadas. Em um caso em que um suspeito não quis falar nada para uma CPI (direito ao silêncio) um aloprado editorial do Correio Braziliense (23.05.12, p. 14) afirmou: "A cidadania levou ontem (frente ao exercício do direito ao silêncio pelo acusado) um tapa no rosto e se descobriu impotente, abandonada".
A linguagem é terrorífica. Coloca toda população na posição de vítima. O exercício do direito constitucional ao silêncio constitui (para esse populismo midiático) uma grave "ofensa", um "mal" que deve ser extirpado do ordenamento jurídico brasileiro. Coisa do diabo e não de Deus (consoante Maffesoli). Aliás, a proposta final do editorial foi a seguinte: "É hora de colocar uma vírgula no direito que garante o silêncio: se o crime é contra o bem público, o acusado não pode se calar impunemente ante a autoridade. Elementar". Extirpação, pura e simples, da garantia, para alguns casos, embora constitua cláusula pétrea no nosso sistema constitucional. Do ponto de vista jurídico, aberração maior é impossível.
Todos nós queremos a proteção do Estado (essa é a postulação do populismo midiático), que esquece que também não podemos nunca desprezar a proteção contra o Estado, que constitui fonte de muitos abusos e arbitrariedades. Em nome do eficientismo penal (defendido pelo populismo midiático) não podemos abandonar as garantias constitucionais que configuram termômetros de civilidade. As duas coisas, aliás, não são incompatíveis. O Estado conta com mil maneiras racionais e válidas de provar os delitos organizados dos poderosos econômicos, que não podem mesmo ficar impunes. Mas não podemos abandonar o velho e bom discurso formulado por Beccaria de que o direito penal constitui também garantia do réu contra os abusos do Estado.
O populismo midiático se equivoca redondamente quando, para reivindicar mais eficiência da persecução penal, sugere o corte dos direitos constitucionais. Não se pode cobrir um corpo descobrindo outro, quando há cobertor para os dois. A proteção do Estado (punindo os criminosos) é fundamental, tanto quanto a proteção contra o Estado. O populismo penal midiático comete o mesmo erro dos nazistas assim como de alguns criminólogos críticos que ignoraram a função protetiva (e civilizatória) dos direitos e das garantias. O populismo penal midiático deve resolver, de uma vez por todas, seu dilema entre a barbárie e a civilização.
Luiz Flávio Gomes é jurista, cientista criminal e fundador da Rede de Ensino LFG, além de codiretor do Instituto Avante Brasil e do atualidadesdodireito.com.br

Noam Chomsky: se queremos mudar o mundo, vamos entendê-lo


Noam Chomsky: se queremos mudar o mundo, vamos entendê-lo

Noam Chomsky: se queremos mudar o mundo, vamos entendê-lo

[Noam Chomsky - La Jornada]
O aspecto mais digno de entusiasmo do movimento Ocupa Wall Street é a construção de vínculos que estão se formando em toda parte. Karl Marx disse: a tarefa não é somente entender o mundo, mas transformá-lo. Uma variante que convém ter em conta é que, se queremos com mais força mudar o mundo, vamos entendê-lo. Isso não significa escutar uma palestra ou ler um livro, embora essas coisas às vezes ajudem. Aprende-se a participar. Aprende-se com os demais. Aprende-se com as pessoas com quem se quer organizar. O artigo é de Noam Chomsky.


Dar uma conferência Howard Zinn é uma experiência agridoce para mim. Lamento que ele não esteja aqui para tomar parte e revigorar um movimento que foi o sonho de sua vida. Com efeito, ele pôs boa parte de seus ensinamentos nisso.

Se os laços e associações que se estão estabelecendo nesses acontecimentos notáveis puderem se sustentar durante o longo e difícil período que os espera – a vitória nunca chega logo -, os protestos do Ocupar Wall Street poderão representar um momento significativo na história estadunidense.

Nunca tinha se visto nada como o movimento Ocupa Wall Street, nem em tamanho nem em caráter. Nem aqui nem em parte alguma do mundo. As vanguardas do movimento estão tratando de criar comunidades cooperativas que bem poderiam ser a base de organizações permanentes, de que se necessita para superar os obstáculos vindouros e a reação contra o que já está se produzindo.

Que o movimento Ocupem não tenha precedentes é algo que parece apropriado, pois esta é uma era sem precedentes, não só nestes momentos, mas desde os anos 70.

Os anos 70 foram uma época decisiva para os Estados Unidos. Desde a sua origem este país teve uma sociedade em desenvolvimento, não sempre no melhor sentido, mas com um avanço geral em direção da industrialização e da riqueza.

Mesmo em períodos mais sombrios, a expectativa era que o progresso teria de continuar. Eu tenho idade o suficiente para recordar da Grande Depressão. De meados dos anos 30, quando a situação objetivamente era muito mais dura que hoje, e o espírito bastante diferente.

Estava-se organizando um movimento de trabalhadores militantes – com o Congresso de Organizações Industriais (CIO) e outros – e os trabalhadores organizavam greves e operações padrão a ponto de quase tomarem as fábricas e as comandarem por si mesmos.

Devido às pressões populares foi aprovada a legislação do New Deal. A sensação que prevalecia era que sairíamos daqueles tempos difíceis.

Agora há uma sensação de desesperança e às vezes desespero. Isto é algo bastante novo em nossa história. Nos anos 30, os trabalhadores poderiam prever que os empregos iriam voltar. Agora, os trabalhadores da indústria, com um desemprego praticamente no mesmo nível que durante a Grande Depressão, sabem que, se as políticas atuais persistirem, esses empregos terão desaparecido para sempre.

Essa mudança na perspectiva estadunidense evoluiu a partir dos anos 70. Numa mudança de direção, vários séculos de industrialização converteram-se numa desindustrialização. Claro, a manufatura seguiu, mas no exterior; algo muito lucrativo para as empresas mas nocivo para a força de trabalho.

A economia centrou-se nas finanças. As instituições financeiras se expandiram enormemente. Acelerou-se o círculo vicioso entre finanças e política. A riqueza passou a se concentrar cada vez mais no setor financeiro.

Os políticos, confrontados com os altos custos das campanhas eleitorais, afundaram profundamente nos bolsos de quem os apoia com dinheiro.

E, por sua vez, os políticos os favoreciam, com políticas favoráveis a Wall Street: desregulação, transferências fiscais, relaxamento das regras da administração corporativas, o que intensificou o círculo vicioso. O colapso era inevitável. Em 2008, o governo mais uma vez resgatou as empresas de Wall Street que eram supostamente grande demais para quebrarem, com dirigentes grandes demais para serem encarcerados.

Agora, para 10% de 1% da população que mais se beneficiou das políticas recentes ao longo de todos esses anos de cobiça e enganação, tudo vai muito bem.

Em 2005, o Citigroup – que certamente foi objeto em ocasiões repetidas de resgates do governo – viu o luxo como uma oportunidade de crescimento. O banco distribuiu um folheto para investidores no qual os convidava a investirem seu dinheiro em algo chamado de índice de plutonomia, que identificava as ações das companhias que atendessem ao mercado de luxo.

Líderes religiosos, principalmente da comunidade de negros, cruzaram a ponte do Brooklyn no último domingo com lonas e tendas para entregá-las aos membros do movimento Ocupar Wall Street que estão acampados no coração econômico da cidade de Nova York.

O mundo está dividido em dois blocos: a plutocracia e o resto, resumiu. Estados Unidos, Grã Bretanha e Canadá são as plutocracias-chave: as economias impulsionadas pelo luxo.

Quanto aos não ricos, às vezes se lhe chamam de precariado: o proletariado que leva uma existência precária na periferia da sociedade. Essa periferia, no entanto, converteu-se numa proporção substancial da população dos Estados Unidos e de outros países.

Assim, temos a plutocracia e o precariado: o 1% e os 99%, como se vê no movimento Ocupem. Não são cifras literais mas sim, é a imagem exata.

A mudança história na confiança popular no futuro é um reflexo de tendências que poderão ser irreversíveis. Os protestos do movimento Ocupem são a primeira reação popular importante que poderão mudar essa dinâmica.

Eu me detive nos assuntos internos. Mas há dois acontecimentos perigosos na arena internacional que ofuscam todos os demais.

Pela primeira vez na história há ameaças reais à sobrevivência da espécie humana. Desde 1945 temos armas nucleares e parece um milagre que tenhamos sobrevivido. Mas as políticas do governo Barack Obama estão fomentando uma escalada.

A outra ameaça, claro, é a catástrofe ambiental. Por fim, praticamente todos os países do mundo estão tomando medidas para fazer algo a respeito. Mas os Estados Unidos estão regredindo.

Um sistema de propaganda reconhecido abertamente pela comunidade empresarial declara que a mudança climática é um engano dos setores liberais. Por que teríamos de dar atenção a esses cientistas?
Se essa intransigência no país mais rico do mundo continuar, não poderemos evitar a catástrofe.

Deve fazer-se algo, de uma maneira disciplinada e sustentável. E logo. Não será fácil avançar. É inevitável que haja dificuldades e fracassos. Mas a menos que o processo estão ocorrendo aqui e em outras partes do país e de todo o mundo continue crescendo e se converta numa força importante da sociedade e da política, as possibilidades de um futuro decente são exíguas.

Não se pode lançar iniciativas significativas sem uma ampla e ativa base popular. É necessário sair por todo o país e fazer as pessoas entenderem do que se trata o movimento Ocupar Wall Street, o que cada um pode fazer e que consequências teria não fazer nada.

Organizar uma base assim implica educação e ativismo. Educar as pessoas não significa dizer em que acreditar; significa aprender dela e com ela.

Karl Marx disse: a tarefa não é somente entender o mundo, mas transformá-lo. Uma variante que convém ter em conta é que, se queremos com mais força mudar o mundo, vamos entendê-lo. Isso não significa escutar uma palestra ou ler um livro, embora essas coisas às vezes ajudem. Aprende-se a participar. Aprende-se com os demais. Aprende-se com as pessoas com quem se quer organizar. Todos temos de alcançar conhecimentos e experiências para formular e implementar ideias.

O aspecto mais digno de entusiasmo do movimento Ocupar Wall Street é a construção de vínculos que estão se formando em toda parte. Esses laços podem se manter e expandir, e o movimento poderá dedicar-se a campanhas destinadas a porem a sociedade numa trajetória mais humana.

Fonte: Carta Maior 

(*) Este artigo é uma adaptação de uma fala de Noam Chomsky no acampamento Occupy Boston, na praça Dewey, em 22 de outubro. Ele falou numa atividade de uma série de Conferências em Memória de Howard Zinn, celebrada pela Universidade Livre do Ocupar Boston. Zinn foi historiador, ativista e autor de A People’s History of the United States.)

Noam Chomsky é professor emérito de Linguística e Filosofia do Instituto Tecnológico de Massachusetts, em Cambridge, Massachusetts. É o maior linguista do século e um dos últimos anarquistas sérios do planeta.

Tradução: Katarina Peixoto