segunda-feira, 1 de junho de 2015

Orixás da Nação Ijexá

Orixás da Nação Ijexá

Origens

No período da escravidão, os escravistas eram interessados exclusivamente na força de trabalho do africano, mas nos porões dos navios negreiros, além de músculos, vinham ideias, sentimentos, tradições, mentalidades, hábitos alimentares, rituais, canções, crenças religiosas, formas de ver a vida, e o que é mais incrível, o africano levava tudo dentro de sua alma, pois não lhe era permitido carregar seus pertences.
Da Nigéria e do Benin vieram as principais raízes dos cultos afro-brasileiros, o Candomblé da Bahia, o Xangô de Pernambuco, o Tambor de Mina do Maranhão e o Batuque do Rio Grande do Sul, os quais possuem fortes vínculos de origem com as crenças religiosas dos povos de língua iorubá e fon.
Em Ouida, onde ficava um dos grandes portos de embarque de escravos, os negros percorriam um caminho de cinco quilômetros da cidade até o porto. Neste percurso todo escravo que era embarcado, eram obrigados a dar voltas em torno de uma árvore. A árvore do esquecimento.
Os escravos homens deviam dar nove voltas em torno dela. As mulheres sete voltas. Depois disso supunha-se que os escravos perdiam a memória e esqueciam seu passado, suas origens e sua identidade cultural, para se tornarem seres sem nenhuma vontade de reagir ou se rebelar.
Mas, o escravo não esquecia nada, porque quando chegou aqui recriou suas divindades. Conseguiu refazer tudo aquilo que ficou para traz. Hoje, nos diversos estados brasileiros se tem verdadeiras ilhas de África, pois se mantém muito vivas as tradições religiosas iorubá e jêje. Devido à multiplicidade nas origens, a estruturação e a prática dos rituais tomaram formas diferentes em cada região do país.
No Batuque do Rio Grande do Sul, também, os religiosos pertencem a nações diversas, portanto, possuem tradições diferentes. Todavia, a influência da nação Ijexá é grande no conjunto dos rituais africanos executados nos terreiros de origem Jêje, Oyó e Cabinda.

Orixás
Orixás, regentes do mundo terrestre com várias definições a seu respeito, mas em princípio os Orixás são divindades intermediárias entre o Deus Supremo, Olorum, e o mundo terrestre. Foram encarregados de administrar a criação e a continuidade da vida na terra.
Os Orixás se comunicam com os seres humanos através de vistosos e complexos rituais. As estórias de cada um são conhecidas através das rezas (cânticos), suas comidas, no ritmo de seus toques, nas suas cores e seu domínio em determinadas forças da natureza.
Os Orixás estão subordinados a um Deus Supremo chamado Olorum ou Olodumare, mas não há nenhum culto ou altar dirigido diretamente à ele, o contato é feito através dos Orixás, seus intermediários.
Nossa tradição guarda o axé (força) de cada Orixá em um Okutá (pedra) que é colocada em uma vasilha junto a outras “ferramentas”, que ficam sob a guarda do babalorixá ou Yalorixá; mas a força maior está solta na natureza, apenas parte dela, simbolicamente fica no Okutá.
Nas cerimônias para convocar os Orixás, tradicionalmente, é através de cantos acompanhados com o toque dos tambores, com ritmos identificados para cada divindade.
As cerimônias são diversas, são ofertados presentes, comidas diferentes para cada um e sacrifícios que envolvem animais de quatro pés e aves; tirando a parte dos Orixás toda carne é consumida pelos participantes e membros da comunidade. Aos orixás rogam-se proteção, saúde, paz, em fim, pedidos específicos às necessidades de cada um em particular.
Os Orixás intercedem de acordo com o domínio que cada um exerce sua influência no aspecto da vida, como por exemplo, Bará para abrir os caminhos, Xangô para justiça, Oxum para fertilidade e assim por diante.
É magnífico poder escrever sobre a religião africana, mas há rituais muito particulares, nos quais alguns praticantes, não estão se preocupando em guardar o segredo, alguns estão colocando em público, rituais que os antigos levariam anos, até passarem para aqueles que mostravam sigilo absoluto, e que guardariam para confidenciar apenas aos seguidores de merecimento. Todas as religiões importantes do mundo doutrinam e ensinam, mas os maiores segredos um mestre só passa para outro mestre.
Existem aspectos cerimoniais que regulam o relacionamento dos serem humanos com as divindades. As regras são muitas, numa espécie de quebra cabeças, com começo, meio e fim, montado com interpretações simbólicas dos mitos que envolvem os orixás, e constituem uma grande rede interligada de deveres e direitos, obrigações e possibilidades, extremamente complexa e cheia de nuanças, inclusive possibilitando diversas variações que só quem é do meio pode saber e executar. A forma organizada na África deve ser perpetuada. Não temos o direito de mudar algo estabelecido a séculos, mesmo que queiram rotular nossos rituais de primitivos e ultrapassados, temos que procurar manter a força espiritual que envolve nossa religião, esta poderosa raiz deixada por nossos ancestrais.
Um caminho que nos faz ter contato com os orixás é através da incorporação; este é o processo pelo qual a entidade se manifesta em seu filho(a) que passou pelos mais diversos rituais de iniciação. Contudo há casos de incorporação de não iniciados. É possível uma pessoa estar assistindo um ritual pela primeira vez e se identificar com as forças espirituais energéticas referentes ao seu orixá, e ter esta manifestação espontânea.
Na maior parte, a manifestação dos orixás acontece em dias de festas. No batuque, nestas ocasiões, podemos falar; pedir auxílio, consultar, abraçar e ser abraçado por eles; em fim pode-se ter um contato direto com os orixás. Uma característica específica que diferencia o batuque das demais religiões afro-brasileiras é o fato do iniciado não saber, em hipótese alguma, que é incorporado pelo orixá. Esta peculiaridade provém de longínquas aldeias do interior da África, e faz parte dos rituais desde o início da estruturação da religião no Estado do Rio Grande do Sul a mais de duzentos anos.
Outro caminho que nos leva aos Orixás são os Búzios. A cerimônia do jogo dos Búzios é o instrumento usado no dia a dia para consulta aos Orixás. Através dele podemos receber orientações, conselhos e advertências.
Os Orixás cultuados no Batuque do Rio Grande do Sul são: Bará, Ogum, Oyá ou Iansã, Xangô, Ibêji, Odé, Otim, Obá, Ossãe, Xapanã, Oxum, Yemanjá e Oxalá.

BARÁ

Mensageiro divino, guardião dos templos, casas e cidades. É o dono de todas as portas, de todas as chaves e de todos os caminhos. É reverenciado em primeiro lugar em todos os terreiros de nação africana. Recebe suas oferendas nas encruzilhadas.
Se estiver atrapalhado, sem emprego, sem rumo, ou deseja realizar qualquer tipo de negócio se apegue com este Orixá, o Bará pode te dar a solução.
Não existe nenhum terreiro de tradição africana que não tenha o assentamento do Bará. Ele é o princípio e o fim de tudo, até após a morte de um iniciado na religião, o primeiro a receber ritual é o Bará.
Bará em Yorubá quer dizer força; se for bem tratado reage favoravelmente em prol de quem lhe oferendou. Olorum concedeu ao Bará o privilégio de receber as oferendas em primeiro lugar. Sem ele nossas orações não seriam ouvidas por nenhum outro Orixá, nem mesmo no orum.
O dia da semana consagrado ao Bará é a segunda-feira, sua cor principal é o vermelho.
Os Barás cultuados no Batuque do Rio Grande do Sul são:
BARÁ LODÊ: Exu Lodê tem seu assentamento feito do lado de fora do templo. Divide sua morada com Ogum Avagãn. É o Orixá que mantém a estrutura do templo; a sustentação dos terreiros depende do Bará Lodê.
BARÁ ADAGUE: Recebe suas oferendas nas encruzilhadas; seu assentamento é feito dentro do templo; é um dos mais requisitados, pois faz a frente de Ogum, Oyá, Xangô, Odé, Otim, Obá, Ossãe e Xapanã.
BARÁ LANÃ: Trabalha nos cruzeiros (encruzilhadas). Tem as mesmas atribuições do Bará Adague. Responde também nos cruzeiros de mato.
BARÁ AJELÚ: Este é o exu que faz a frente dos Orixás de água, Oxum, Yemanjá e Oxalá.
Além do epô (azeite de dendê) usa-se mel nas suas oferendas.
Orixá







Ogum

Ogum é uma antiga divindade yorubá, senhor da guerra e do ferro; privilegiado com o dom de dominar os metais. Foi um dos primeiros Orixás a descer para a terra e encontrar habitação adequada para os humanos no futuro. Trabalhava dia e noite em sua forja para servir todos os humanos. Suas mãos hábeis transformaram tudo que foi colocado diante dele. Sua capacidade de criar surpreendeu os outros Orixás. Ogum também é ligado à agricultura, mas no Brasil é mais conhecido com deus dos guerreiros.
Ogum é a figura que se repete em quase todas as formas conhecidas de mitologia universal; é um dos mais cultuados especialmente por ser associado à luta, à conquista; assim como Bará é a figura mais próxima dos seres humanos que o invocam para vencer a constante luta cotidiana na terra.
Ogum, além de ser deus da metalurgia e da tecnologia, é o patrono da força produtiva que retrabalha a natureza, que transforma através do calor e das repetidas batidas um mineral bruto (ferro) no aço laminado e suas manifestações práticas (lança, escudo etc.), aplicadas por extensão, a qualquer transformação que o homem provoca na natureza para deixá-la, produtivamente, à sua disposição.
Ogum é considerado protetor de todos os guerreiros, e sua relação com os militares tanto vem do sincretismo realizado com São Jorge, o santo guerreiro católico, associado às forças armadas, como da sua figura de comandante supremo yorubá.
Enquanto Xangô julga o certo e o errado depois do fato consumado, Ogum é empreendedor e decidido, é o que faz justiça com as próprias mãos, jamais deixando para outro o que julga ser um problema seu. Quando irado, é implacável, apaixonadamente destruidor e vingativo. Quando apaixonado, sua sexualidade é devastadora, que não se contenta em esperar e nem aceita rejeição.
Fora da guerra, é um Orixá da alegria, da diversão, da delícia de viver, especialmente do contato com os amigos e camaradas etc.
No Rio Grande do Sul cultuamos várias qualidades de Ogum, entre eles estão o Ogum Avagãn, que tem seu assentamento junto com o Bará Lodê, e seus otás ficam do lado de fora do templo em uma casa individual; Ogum Onira ou onirê, que seria o rei da cidade de Irê; e Ogum Adiolà, que faz companhia aos Orixás de água, Oxum, Yemanjá e Oxalá.
Todos Babalorixás e Yalorixás têm que ter o assentamento de Ogum em seu terreiro, pois sem ele não poderiam fazer uso do axé de obé (faca) em seus rituais. Suas cores são o vermelho e verde, porém, alguns sacerdotes da antiguidade usavam também o azul marinho em seus fios de contas. O dia de Ogum é quinta-feira, e o sincretismo é com São Jorge.
Orixá


Oya / Iansã

Oyá é a primeira entidade feminina a surgir nas cerimônias. Esposa de Ogum, largou-o quando se deixou fascinar pelo magnetismo de Xangô. Nesse ponto as lendas se dividem. Algumas atribuem à Iansã uma imensa e terrível paixão por Xangô, sentimento este que se manifesta através de sua eterna presença ao lado dele. Dado o seu caráter extrovertido, Iansã permanecia ao lado de Xangô não só no dia-a-dia cotidiano, mas também nas guerras, nas caçadas e qualquer outra situação. Há diversas lendas a respeito deste triangulo amoroso mais conhecido do batuque, de qualquer forma, a paixão de Ogum por Iansã sobreviveu à separação. De acordo com as diferentes interpretações, tornaram-se inimigos de morte por causa disso. Os duelos entre Ogum e Oyá constituem uma das cerimônias coreográficas mais bonitas dos terreiros brasileiros.
Além de Xangô, Oyá é o único orixá que não teme os Eguns, é a guardiã do reino entre a vida e a morte, é ela quem dá assistência na transição final; ela pode reter o espírito da morte ou chamá-lo adiante, ela é o último suspiro. Oyá rege os cemitérios e os mortos.
Ninguém quer enfrentar Iansã numa batalha por que ela é tão feroz e astuta como qualquer homem, nem um outro Orixá quer lidar com a ira de Oyá. Não há receios à Oyá, exceto Xangô.
Ela é conhecida por sua inteligência, independência, coragem, graça, sensualidade, poder e paixão intensa.
É dito e conhecido que Oyá é muito leal aos seus filhos e perigosa para seus inimigos. Ela pode vir tão suave e fresca como uma brisa de verão ou violenta e cruel como um furacão e causar devastação total em seu mundo.
Olorum deu à Oyá a responsabilidade a responsabilidade de limpar a atmosfera ao redor do planeta e proporcionar o equilíbrio de gases para sustentar toda forma de vida.
Embora Oyá seja forte e guerreira brilhante, ela também é bonita e elegante. Ela gosta do calor da batalha, tanto como Xangô, mas nunca perde sua feminilidade. Seu sincretismo é com Santa Bárbara; seus dias da semana são terça e quinta-feira e suas cores são o vermelho e o branco.


Xangô

Xangô é um dos Orixás mais populares no Brasil e na África. Divindade do fogo, do raio e do trovão. Representa a lei e a justiça.
Na mitologia, é atribuído a Xangô o reinado sobre a cidade de Oyó, na Nigéria. A imagem de poder está sempre associada à sua figura; não apenas o poder real, mas também o poder merecido, cujas determinações não podem ser questionadas, não apenas por seu autoritarismo, mas principalmente por sua credibilidade, sendo suas decisões consideradas tradicionalmente acertadas e sábias.
Xangô decide sobre o bem e o mal, possui a capacidade de inspirar a aceitação inconteste de suas decisões, tanto pelo seu poder repressivo como pela sua retidão e honestidade quase que inquebrantáveis.
Miticamente, o raio é uma de suas armas, que ele envia como castigo, nunca impensado ou arrebatado, mas após um processo onde todos os prós e contras foram pesados. Toda essa imagem faz com que Xangô seja associado, na natureza, à firmeza da rocha; duro e estável.
A popularidade de Xangô é tão grande que, em algumas regiões como Pernambuco, seu nome é utilizado para a designação de todo um culto.
Toda a gravidade e firmeza atribuídas a Xangô não o afastam das características humanizadoras que possuem outros orixás. Xangô teria como seu “ponto fraco” a sensualidade e o prazer. É apontado como uma figura vaidosa em muitas lendas e cantigas, tendo três esposas: Iansã, Oxum e Obá.
Uma lenda conta que Xangô era freguês do ferreiro Ogum. Ia frequentemente à sua casa, muito arrumado, lançando olhares sobre Iansã, que finalmente abandonou a casa de Ogum para ficar com seu conquistador. Mais tarde ele ficou fascinado pela beleza de Oxum e passou a persegui-la incessantemente. Algumas estórias contam que Xangô só não a violentou porque Exu o impediu. Outras versões dizem que Xangô, cavalheirescamente, se postou aos pés de Oxum, em prova do respeito que lhe despertava. Ainda existem versões que responsabilizam a Oxum por ter dominado a situação, ao impor a Xangô que dormisse a seus pés, evitando com sua determinação, a violência.
Qualquer das versões apresentadas atesta o caráter arrebatador de Xangô no amor, oposto à sua postura mais sólida nas demais questões.
O prato predileto de Xangô é o Amalá; suas cores são o vermelho e o branco, e o dia consagrado à Xangô no RS é a terça-feira. Seu sincretismo é com São Jerônimo e São Miguel Arcanjo.
Orixá


Ibêje - Ìbeji

Divindades ligadas ao culto de Xangô e Oxum.
Ibêji são entidades cultuadas no batuque do Rio Grande do Sul, como entidades gêmeas que formam um único orixá, permanentemente duplo, formado por entidades distintas, que coexistem, representando o princípio básico da dualidade. São orixás crianças. Seu assentamento é feito em imagens esculpidas em madeira.
São orixás de grande prestígio em todos os cultos afro-brasileiros. A maior homenagem aos Ibêji consiste em uma mesa (toalha arreada no chão), na qual se serve somente crianças com até sete anos de idade. A à elas são servidos uma canja feita com as aves sacrificadas aos orixás Ibêji, doces, frutas, balas, pirulitos, em fim todas guloseimas que as crianças adoram.
As cores dos Ibêji são variadas, menos o preto; seu sincretismo é com São Cosme e São Damião.
Orixá


Odé

Odé, Rei de Keto, o deus da caça, excelente pescador. Também conhecido pelo nome de Oxóssi, ao contrario dos Orixás que lutam contra outros exércitos, seu combate é mais cotidiano, nas matas, pelos animais que vão garantir a alimentação de sua família.
O conceito de liberdade e de independência em Odé é muito claro em sua personalidade básica.
Odé, jovem guerreiro, tem o temperamento forte, determinado, estratégico e empreendedor.
Como Orixá, sua responsabilidade principal em relação ao mundo é a garantia da vida dos animais, para que eles possam ser caçados e a alimentação dos seres humanos esteja assegurada.
Uma das lendas sobre Odé diz que em uma de suas caçadas ele foi enfeitiçado por Ossãe, apesar dos avisos de Yemanjá para que tomasse cuidado. Ficando, então sob o controle de Ossãe, ele afastou-se da família até que este encantamento fosse quebrado. Retornado para a mãe, Odé foi recebido por uma Yemanjá intransigente, irritada por não ter sido ouvida pelo filho. Rejeitado por ela, Odé voltou à floresta, para a influência de Ossãe, o que levou Ogum a se rebelar contra Yemanjá, censurando-lhe o comportamento para com seu irmão. Essa crise familiar foi responsável pelo descontrole de Yemanjá, que chorando desesperada, desmanchou-se em suas próprias lágrimas e transformou-se num rio que corre para o mar.
Como não poderia deixar de ser, o símbolo de Odé é um arco e flecha; usa também o bodoque e lança; sua cor é o azul marinho e seu sincretismo no Rio Grande do Sul é com São Sebastião.
Orixá



Otim

Otim é um Orixá feminino, cultuado no Brasil, principalmente no Rio Grande do Sul. É o nome de um rio que corre entre Ilorim e Ibadã, na Nigéria.
Otim é a companheira inseparável de Odé, assim como este, usa arco e flecha para acertar sua caça e a lança para pescaria. Carrega na cabeça um Cântaro cheio de água utilizada em suas lidas cotidianas. Come toda espécie de caça, mas seu prato predileto é a carne de porco.
Otim faz parte do erumalé de quase todos os sacerdotes aqui no Rio Grande do Sul. Quem faz o assentamento de Odé é obrigado a fazer junto às obrigações de Otim.

Orixá



Obá

Orixá feminino de origem nagô cultuada no Brasil, conhecida principalmente pelo fato de fazer parte nas lendas referentes a Xangô e suas três mulheres – Iansã, Oxum e Obá.
O conceito básico ligado à Obá é o da paixão, mas não na perspectiva controlada de Oxum nem na proposta feliz e libertária de Iansã, a deusa dos amores arrebatados e absolutos. Para Obá, paixão é razão de sofrimento, de disputa e de submissão mal-aceita.
Conta uma das lendas mais conhecidas a seu respeito que Xangô mantinha um relacionamento cheio de altos e baixos com Iansã, e que sua esposa favorita era Oxum. Obá era a terceira neste casamento polígamo, e nunca podia rivalizar com as outras duas antagonistas, mais cheias de brilho e força (Iansã) ou beleza e inteligência (Oxum).
Obá era insegura em relação a tudo que se relacionava com seu marido, pois era uma figura sem muitos atrativos físicos e um pouco seca e ríspida no seu comportamento diário. Era, porém, extremamente crédula, e, sabendo que Xangô apreciava muito as constantes receitas de culinária que Oxum lhe preparava, mostrou-se disposta a aprendê-las. Esta, contudo, dona de um caráter exclusivista, não estava disposta a ensinar à concorrente como agradar a Xangô, e resolveu enganar sua rival: marcou um horário para que Obá fosse à sua casa aprender a receita que teria poderes mágicos sobre a sexualidade de Xangô.
Quando Obá surgiu, Oxum cozinhava uma sopa que continha dois grandes cogumelos. Usava um pano amarrado à cabeça, escondendo as orelhas, e disse à Obá que estava preparando um caldo com suas próprias orelhas, pois essa era a receita favorita de Xangô. Obá, então, preparou uma sopa onde cortou e incluiu uma de suas próprias orelhas, e a serviu feliz para o marido.
Como era de se esperar, a reação de Xangô perante a imagem da esposa com uma orelha cortada foi tremendamente negativa; e piorou ainda mais quando ele viu o prato de comida que o esperava. Além de ser repreendida por Xangô, Obá ainda teve que suportar a troça de Oxum, que, descobrindo suas orelhas, revelou à rival que tudo tinha sido apenas um truque. Elas, então se engalfinharam numa terrível luta física, que só terminou com uma explosão de cólera da parte de Xangô; o que fez as duas fugirem apavoradas, cada uma para uma lado, transformando-as nos rios que atualmente levam seus nomes.
Obá responde pelos amores com perturbações, ciúme, desonra e falsidade. O corte, a navalha, a roda, a direção, as máquinas, agulha de costura, tesoura são de seu domínio. Come cabra mocha; sua cor é o marrom e o rosa, seu dia da semana é segunda-feira e seu sincretismo no batuque é com Santa Catarina.


Orixá


Ossãe

Orixá masculino de origem ioruba, cultuado no Brasil. Ligado às florestas como Odé, Ossãe possui, entretanto, atribuições bem diferentes: cabe a ele cuidar das ervas medicinais e sagradas e, por correlação, de todo e qualquer conhecimento técnico mais aprofundado. Apresentado costumeiramente como uma figura reservada e misteriosa, transmite a seus filhos um grande equilíbrio nas decisões e certo distanciamento quanto aos amigos, além de notável eficiência no trabalho, onde atende tudo e todos com perfeição.
Sua ligação primordial é com a vegetação, com as plantas, mas não obrigatoriamente com os vegetais destinados à alimentação. Sua especialidade são as plantas medicinais, destinadas à cura e as cerimônias da religião, sendo sua presença indispensável para a realização de qualquer procedimento de iniciação ou de curas nos rituais africanos.
Segundo as lendas cada orixá tem suas ervas e folhas particulares, circunscritas a seu campo específico de ação, mas tal poder é restrito perto do controle total que Ossãe tem sobre esse tipo de conhecimento. Toda atividade de Ossãe é cercada de cuidados quase que ritualísticos. Ossãe é orixá extremamente poderoso, pois detém o saber que permite a realização da maior parte dos rituais.
Da mesma maneira que sua especialidade, apesar de muito importante, não faz parte das atividades cotidianas como a luta, a conquista, a comunicação ou a caça, constituindo-se mais uma técnica, um ramo do conhecimento que é empregado quando necessário – o uso ritualístico das plantas para qualquer cerimônia litúrgica como forma condutora da busca do equilíbrio energético. Também não faz parte do conjunto de lendas de Ossãe um número de relações familiares e amorosas de destaque. Geralmente é apresentado como um ser solitário, vagando nebulosamente pela floresta e não habitando nenhum lar específico.
No batuque do Rio Grande do Sul, sua imagem é representada por um ser sem uma das pernas. Faz uso de muleta para se deslocar, seu sincretismo em alguns terreiros é com São Roque, sua cor é o verde claro, e seu dia da semana é segunda-feira.
O


Xapanã

Xapanã é o orixá que detém o poder sobre a doença, tanto para causá-la como para curá-la. É uma entidade sombria, tida entre os iorubanos como ameaçadora e temível caso não seja devidamente cultuada.
Também é conhecido como omulu e Obaluaiê, cujos mitos e a própria figura são cercados de algum mistério. Em termos gerais Xapanã controla todas as doenças, especialmente as epidêmicas. É o “deus da varíola”, mas este conceito é uma evidente limitação, já que a varíola era uma das epidemias mais comuns e devastadoras da comunidade original africana onde ele surgiu, o Daomé.
Orixá de origem Jêje, posteriormente assimilada pelos iorubás, o que marca bem a diferença de comportamento básica: enquanto os orixás iorubanos são mais extrovertidos e passionais, alegres e humanos, as figuras daomeanas estão mais associadas ao conceito de castigo e punição, sendo sempre mais austeras no comportamento mitológico, mais graves e conseqüentes em suas ameaças; todas têm um potencial de repressão em relação aos seres humanos, muito mais explicito que as divindades iorubás, estas mais tolerantes.
Xapanã é orixá que se for bem cultuado pode levar seus seguidores a terem um padrão de vida muito elevado. No entanto, se os rituais realizados não estarem de acordo com os fundamentos, poderá levá-los a mais completa miséria.
Um feitiço ou um pó de Xapanã bem executado pode arrasar uma comunidade inteira. É o dono da ferida, da lepra e da miséria. Trabalha nos matos e cemitérios, é associado à morte e a terra. É o dono da vassoura e do espanador, é o orixá solicitado para fazer todo tipo de limpezas e levar embora as cargas negativas.
As cores de Xapanã são o vermelho, preto, lilás e o roxo. Seu dia da semana é quarta-feira e seu sincretismo em alguns terreiros é com Nosso Senhor dos Passos.
Orixá


Oxum

Oxum é a Rainha da nação Ijexá. Sincretizada com diversas Nossas Senhoras ao longo do Brasil, Oxum manifesta uma delicadeza e juventude rara em outros orixás femininos. Responsável pela fertilidade e pelos recém-nascidos é, sobretudo conhecida por sua beleza, a qual as lendas adornam com ricas vestes e objetos de uso pessoal. Domina os rios e cachoeiras, imagens cristalinas de sua influência: atrás de uma superfície aparentemente calma podem existir fortes correntes e cavernas profundas.
Oxum é um orixá feminino bastante conhecido e cultuado no Brasil, onde sua imagem é quase sempre associada à maternidade, sendo comum ser invocada através de carinhosa expressão Mamãe Oxum.
Até mesmo em dias de festas, no batuque do RS, é nas rezas de Oxum que a maioria dos Orixás se manifestam. Principalmente da Oxum Docô, que auxiliou na criação da maioria dos filhos de Yemanjá.
Oxum é o nome de um rio em Oxogbo, província de Ibadã, na Nigéria. É também a morada da deusa que lhe dá o nome, sendo ela conhecida como a dona da água doce. Portanto, seu elemento natural é o leito dos rios e, especialmente, as cachoeiras, onde costumam ser-lhe entregues as comidas e os presentes.
Tem a seu cargo o dom da fertilidade, assim como Yemanjá. É a ela que dirige as mulheres que querem engravidar, sendo responsabilidade de Oxum também zelar pelas crianças que estão em gestação e pelas recém-nascidas.
Além dessas legações, Oxum é considerada a deusa da beleza,do ouro, do dinheiro, da riqueza, do amor, da aliança, do casamento, da felicidade, do perfume, da vaidade, do mel e tudo que é doce. Oxum é considerada uma das mais belas figuras físicas do panteão mítico iurobá.
Pela sua beleza, Oxum teria despertado muitos amores. Mas seu relacionamento mais importante foi com Xangô.
A cor que lhe pertence é o amarelo-ouro, seu dia da semana é o sábado e, é sincretizada com diversas Nossas Senhoras. Cultuamos no batuque do RS várias qualidades de Oxum entre elas a Pandá, Demum e Docô. No altar de Oxum, além das quartinhas, pratos, vasilhas com água e axés, costuma haver flores, perfumes, leques e até bonecas. É a figura da juventude eterna. Com seu jeito de criança inconseqüente que julga naturalmente merecer todos os cuidados e mimos.
Orixá


Iemanjá

A Rainha das Águas é famosa em todo o Brasil pelos cerimoniais a ela dedicados nas praias por ocasião da passagem do ano. Boa parte dos brasileiros lembra-se de Yemanjá quando acontece a passagem do ano: é uma tradição ofertar presentes ao mar, a morada da deusa, e desse ritual participam pessoas que inclusive não têm maior ligação com a religião afro-brasileira.
Orixá feminino de origem iorubá. É uma das figuras mais conhecidas nos cultos brasileiros, já que suas festas anuais sempre movimentam um grande número de iniciados e simpatizantes tanto no batuque, candomblé e umbanda.
Na África, a origem de Yemanjá é um rio que vai desembocar no mar e que o formaria. É a mãe de quase todos os orixás criados originalmente na cultura iorubá.
Apesar de os preceitos tradicionais relacionarem tanto Oxum como Yemanjá à função da maternidade, pode estabelecer-se uma distinção nesses conceitos. Oxum é a mãe no sentido de fecundação, gestação e criação do bebê, enquanto este não aprende nenhuma língua, enquanto seus mecanismos de personalidade não estão definidos; Yemanjá, por sua vez, é mãe daí por diante, é a função de maternidade enquanto educação. É a mãe do jovem e do adulto, a figura materna que acompanha um ser humano toda a vida. Em todas as lendas Yemanjá nunca surge lidando com crianças, e sim com adultos, com os quais não hesita usar os típicos truques associados ás mães possessivas para manter os filhos consigo.
A cor de Yemanjá é o azul, o dia dedicado a ela no batuque é a sexta-feira, é sincretizada com Nossa senhora dos Navegantes. Ela é padroeira tradicional dos marinheiros, estendo-se essa proteção a praticamente todos os seres viventes, já que é a grande mãe do astral.
Orixá


Oxalá

É o orixá mais querido e respeitado do panteão afro-brasileiro. O branco, símbolo tradicional da pureza é a cor de tudo que esteja ligado a Oxalá, o responsável, segundo a mitologia iorubana, pela criação e administração do mundo. Rege os demais orixás e, por conseguinte, os homens. Acima dele só Olorum, o deus supremo iorubá.
Oxalá é a figura paternal, calmo e sereno nos momentos mais difíceis; uma dignidade distante e certa tendência à centralização também fazem parte de sua imagem típica.
Segundo a maior parte dos ítans, ele é pai de todos os orixás. Filho direto de Olorum ou Olodumare, Oxalá representa o céu, princípio de tudo que, ao tocar o mar, na representação simbólica de um ato sexual, teria criado todos os outros orixás para que cuidassem dos seres da terra, os homens, cercados pelos céus e pelo mar de todos os lados.
Vários nomes são ligados a Oxalá. Na Nigéria prevalece o nome Obatalá. Em Oko, Orixaakô; em Ejigbo, recebe o nome de Oguinhã. Em todos estes locais, porém, é inquestionável seu posto de supremacia.
Existem diversos tipos de Oxalá, como acontece com todos orixás africanos, mas neste caso há um certo destaque para duas de suas formas, justamente Oxalá mais novo e o Oxalá mais velho.
Oxalá sempre é o último a ser reverenciado em todas cerimônias dedicadas aos orixás. Sua cor é o branco, seu dia da semana no batuque é o domingo. Oxalá velho é sincretizado com Divino Espírito Santo e Nosso Senhor do Bom Fim, e o novo com Menino Jesus de Praga.
Orixá

sábado, 30 de maio de 2015

O Trenzinho do Caipira/Heitor Villa Lobos




Física Quântica

  • Quando uma criatura humana desperta para um grande sonho e sobre ele lança toda a força de sua alma, todo o universo conspira a seu favor”.
- Goethe
Quem nunca passou por uma situação na qual parecia que o universo estava tentando falar alguma coisa? Você pensa em alguém e essa pessoa te liga. Você sonha com alguém e depois esbarra com ela na rua. Na mesma semana te falam de uma música, filme ou livro e parece que ele está em todos os lugares. E aquela ligação estranha entre irmãos gêmeos, exploradas pelo cinema, em que um sofre um acidente e o outro sente dor? Esse tipo de situação normalmente é chamada de coincidência. Mas será que é só isso, um evento arbitrário?
Esse tipo de fenômeno está sendo cada vez mais estudado dentro dos campos da parapsicologia e afins, e parece que agora a ciência começa a entender um pouco melhor isso e explicar essas coisas de forma ‘científica’. Mas se voltarmos um pouco na história, essas situações já eram vividas e entendidas pelos místicos.
No hermetismo, um antigo sistema filosófico e mágico atribuído ao misterioso Hermes Trismegisto, autor da famosa “Tábua de Esmeralda” entre outros textos, existem algumas concepções que explicam o funcionamento do Universo. Segundo o livro Caibalion, um clássico da literatura hermética, a primeira dessas concepções é a lei do mentalismo: “O todo é mente, e o Universo é mental”. Se considerarmos essa concepção da natureza, tudo esta interligado, como se fosse uma grande mente universal.
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Representação de Hermes Trismegisto de Viridarium chymicum, D. Stolcius von Stolcenbeerg, 1624
O psiquiatra suíço Carl Jung desenvolveu, em sua teoria Analítica, um conceito que pode ajudar a explicar esses tipos de fenômenos e essa realidade de interconectividade: o “Inconsciente Coletivo”. Grosso modo, para Jung, além do nosso consciente, subconsciente e inconsciente (postulado por Freud), existe uma camada ainda mais profunda compartilhada por todos os indivíduos, portanto coletiva, a qual todos estamos sujeitos. É como se fosse uma grande rede, que está presente em cada um de nós, e em todos nós.
Uma camada mais ou menos superficial do inconsciente é indubitavelmente pessoal. Nós a denominamos inconsciente pessoal. Este porém repousa sobre uma camada mais profunda, que já não tem sua origem em experiências ou aquisições pessoais, sendo inata. Esta camada mais profunda é o que chamamos inconsciente coletivo. Eu optei pelo termo “coletivo” pelo fato de o inconsciente não ser de natureza individual, mas universal; isto é, contrariamente à psique pessoal ele possui conteúdos e modos de comportamento, os quais são ‘cum grano salis’ os mesmos em toda parte e em todos os indivíduos. Em outras palavras, são idênticos em todos os seres humanos, constituindo portanto um substrato psíquico comum de natureza psíquica suprapessoal que existe em cada indivíduo. (JUNG, 2000, p.15)
Considerando este conceito, podemos entender o fenômeno das coincidências como algo que o próprio Jung denominou sincronicidade, que seria a “simultaneidade de um estado psíquico com um ou vários acontecimentos que aparecem como paralelos significativos de um estado subjetivo momentâneo e, em certas circunstâncias, também vice-versa” (JUNG, 1991, par. 818). Em outras palavras, é a percepção de um fenômeno que contém geralmente um significado simbólico, através de situações que não compartilham nenhum tipo de relação aparente, ou seja, acausais, e exprimem um estado psíquico interno compartilhado com um evento objetivo e externo.
O interesse de Jung por esse tipo fenômeno sempre causou certo desconforto para a comunidade científica, no entanto, as novas concepções de realidade apresentadas pela moderna física quântica começam a explicar essa interligação de forma científica, corroborando com as concepções Junguianas destes fenômenos. Vale a pena dizer que Jung era amigo de Wolfgang Pauli, um dos primeiros estudiosos da física quântica*.
spirituality and science
Em resumo, a física quântica trabalha com partículas atômicas e sub-atomicas, ou seja, átomos, moléculas, elétrons, prótons, nêutrons, etc, e estuda as dinâmicas interações destas partículas. Dentre essas partículas, podemos citar os fótons, que são as menores partículas envolvidas numa radiação eletromagnética. Aparentemente, fugimos um pouco do tema, mas cientistas contemporâneos já realizaram experimentos nos quais, apesar de separados por grandes distâncias, dois fótons interagem entre si, mesmo sem apresentar uma conexão causal, ou seja, é como se houvesse algo que os conecta, que vai além da realidade física e observável.
Se utilizarmos o exemplo de dois fótons correlacionados, onde é possível alterar o estado de um deles, alterando-se o estado do outro e de modo instantâneo, então seria possível haver uma correlação não-local entre os inconscientes de todos os seres humanos, o que resultaria no Inconsciente Coletivo de Jung e na sua Psicologia Analítica. (NUNES, 2009, p.8)
Toda essa interconexão da consciência já não é mais teórica e esta sendo comprovada. Existe um experimento, realizado em entre os anos de 1993 e 1994 por Jacobo Grinberg, um neurofisiologista da Universidade do México que consistiu em colocar duas pessoas para meditar juntas, com a intenção de se comunicarem diretamente, sem troca de sinais ou conversa. Essas pessoas eram isoladas uma da outra em “gaiolas Faraday”, câmaras eletromagneticamente impermeáveis, e seus respectivos cérebros conectados a máquinas de eletroencefalograma.
Após um breve tempo de meditação, foram mostrados flashes de luz para apenas um dos sujeitos, cuja atividade elétrica cerebral era alterada em resposta aos flashes. É ai que a coisa fica interessante. No eletroencefalograma do outro sujeito que não recebeu nenhum flash de luz, foi constatado que seu cérebro recebeu um potencial, virtualmente igual em intensidade e força, variando em atividades elétricas de 65% a 75%. Esse é um valor muito substancial e a conclusão do experimento é que a atividade elétrica de um cérebro se transfere para outro cérebro, sem conexão ou contato elétrico nenhum. Este experimento foi replicado por Peter Fenwick em Londres e Leanna Standish e seu grupo na universidade de Bastyr, em Seattle. Todos concluíram a mesma coisa: existe uma transferência de informação de cérebro a cérebro, sem nenhuma conexão eletromagnética.
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Essas conclusões são muito interessantes e significativas, e acabam por explicar, mesmo que parcialmente, os fenômenos de sincronicidades. No entanto, apesar de explicarem uma comunicação não-local entre sujeitos, pouco se sabe sobre o motivo destas manifestações acontecerem em determinados momentos, ou com determinadas pessoas. No romance best seller americano “A Profecia Celestina”, James Redfield conta a história de um manuscrito encontrado no Peru que contém nove visões, ou nove etapas, que os seres humanos precisam desenvolver afim de evoluir individualmente como sujeitos e coletivamente como espécie. A primeira etapa deste processo é descrita como a tomada de consciência das “coincidências” que nos cercam. É defendido, que para evoluirmos, o primeiro passo a ser dado é perceber essas sincronicidades e não considerá-las como mero acaso, mas uma forma intuitiva de buscar informações no dia-a-dia que nos impulsionam a melhorar e expandir a consciência.
Acho pertinente, por tanto, encerrar dizendo que devemos prestar atenção a nossa volta e analisar essas coincidências, entender o que elas nos dizem e para onde elas apontam. Quando fazemos isso, cada vez mais essas situações acontecem e nos indicam que estamos no caminho certo. Aos poucos, vamos integrando destino e livre arbítrio, expandindo nossa consciência e nos aproximando dos horizontes da jornada da alma.
* Para saber mais sobre essa amizade, leia “A permuta dos sábios: um estudo sobre as correspondências entre Carl Gustav Jung e Wolfgang Pauli” de Cesar Rey Xavier
Bibliografia:
CAMAYSAR, R. O Caibalion. São Paulo, Pensamento. 2000.
JUNG, C. G. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. Petrópolis, Vozes. 2000.
JUNG, C. G. Sincronicidade. Petrópolis, Vozes. 1991.
NUNES, A. L. Física e Psicologia: Um diálogo interdisciplinar. XVIII Simpósio nacional de ensino de Física. 2009.
*Esta coluna foi publicada originalmente no dia 24/05/2015, no site www.redepsicoterapias.com.br, no qual quinzenalmente são publicadas colunas com o tema de psicologia analítica, simbologia, mitologia e espiritualidade.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

BioSaúde



Núcleo BioSaúde em Belo Horizonte

     A Bio - Núcleo de Vida e Saúde Integral é uma associação sem fins lucrativos (reconhecida como sendo de Utilidade Pública Municipal) desenvolve atividades e projetos de abrangência estadual, nacional e internacional desde 1996, empregando os princípios da Bio Saúde.

    Atende pessoas, grupos, organizações e comunidades que buscam impulsos de crescimento por meio de práticas naturais para a conquista e manutenção da saúde integral. Seu principal diferencial é o de não ser um espaço clínico voltado para cura de doenças, mas de educar para a saúde cuidando da vida e do meio ambiente. Práticas alimentares, exercícios físicos, limpeza intestinal, práticas de meditação, resgate do saber popular em saúde (uso terapêutico de ervas, da argila e da água), fazem parte das atividades que promove, visando despertar as potencialidades das pessoas para cuidarem de sua saúde promovendo mudanças simples e possíveis, no seu cotidiano.



Filosofia e História

    O conceito de Bio saúde origina-se do que foi inicialmente denominado Medicina Natural Agradável ou “kai igaku” na língua de seu criador, o médico japonês Ryosuke Uriu. Ao conhecer os seus fundamentos e práticas, Atom Inoue aprofundou seus estudos e se deparou com limitações da mesma, por carecer de fundamentos compatíveis com uma medicina sistemática e científica.

    Assim, seus estudos foram direcionados para esta sistematização que culminaram em três idéias básicas e norteadoras de seus fundamentos:
1. deve ser natural e não ser agressiva, sempre considerando o modo de vida das pessoas;
2. deve objetivar não só a cura de doenças, mas principalmente orientar as pessoas na busca de melhorias na sua qualidade de vida
3. deve ser popular, com idéias e métodos simples e aplicáveis, sem riscos e econômicos, desencadeadores de solidariedade e de independência de recursos caros e especializados.

    Embasado na concepção holística da saúde e na existência de níveis energéticos que influenciam a vida e a saúde das pessoas, o médico da Medicina Tradicional Chinesa, Atom Inoue radicado na Nicarágua, aprofundou os estudos da Medicina Natural Agradável, iniciados pelo seu colega Ryosuke Uriu. O contexto em que Inoue conheceu os fundamentos desta medicina, foi o da Revolução Sandinista na década de oitenta, em que o povo estava em busca de sua identidade cultural.

    A partir de seus estudos, Inoue passa a denominar a Medicina Natural Agradável como Bioenergia ligando sua teoria e práticas à mobilização da energia vital, desvencilhando-as do caráter alopático com que as mesmas vinham sendo empregadas. Processualmente, seus estudos e escritos passaram a denominá-la como Bio Saúde (a partir do 1º Congresso latinoamericano de Bio Saúde realizado no Equador, em 2000), considerando que a saúde integral é uma conquista obtida no cotidiano, com práticas que tenham a ver com a vida, sem partir do referencial da doença a que a palavra medicina se liga, simbolicamente.

    A Bio saúde chegou ao Brasil nos anos noventa, quando o Doutor Atom Inoue veio dar cursos em São Paulo, Minas Gerais e Pernambuco, tendo sensibilizado inicialmente, vários missionários religiosos, engajados em movimentos populares de saúde. Em 1996, a médica brasileira Fátima Pimenta, atual Coordenadora da Bio - Núcleo de Vida e Saúde Integral - foi à Nicarágua onde estagiou com o Doutor Inoue. De volta ao Brasil, deu início ao trabalho de organização e divulgação do movimento da Bio Saúde em Minas Gerais, que logo encontrou parceiros em diversos pontos do país. Seu trabalho culminou com a fundação da Bio - Núcleo de Vida e Saúde Integral, em Belo Horizonte - MG.



A Mandala

    Atom Inoue resumiu o modelo conceitual da Biosaúde no desenho de uma mandala, dividida em cinco setores que representam os cinco principais alvos da Biosaúde:
1) DESINTOXICAÇÃO;
2) RENOVAÇAO DA ENERGIA;
3) REJUVENESCIMENTO;
4) CONTROLE DA DOR E MAL-ESTAR;
5) ESTÍMULO IMUNOLÓGICO

    Cada um destes tem a indicação de procedimentos que são empregados em favor dos mesmos. São eles:
1) Fitoelementos na forma de chás, alimentos, banhos;
2) Urinoterapia: reforço imunológico; influências sutis;
3) Exercícios: respiração, movimento;
4) Terapias Caseiras: argila, hidroterapia, meditação;
5) Nutrição: alimentos integrais, limpeza intestinal, jejum.

    No centro da mandala um desenho representa os dedos das mãos de examinadores para a realização do Exame Bioenergético (“Bi- Digital O-Ring Test”). Assim, o desenho da mandala mostra a sistematização da Biosaúde como método fundamentado com teorias e práticas condizentes com sua filosofia.



O que é Bio Saúde?

    Mais do que um conjunto de práticas em busca da saúde integral, a Bio Saúde representa uma atitude e um desejo de mudança em direção a um novo modo de vida, formado por novos hábitos, mais sadios, naturais e agradáveis. Adaptando-se a esta nova vida, restabelecemos e fortalecemos a habilidade natural de cura de nosso organismo.

    A Biosaúde é um conceito de vida que agrega variadas práticas de medicina natural praticadas tradicional e popularmente em diversas partes do mundo e conhecidas por civilizações antigas e diversos povos na atualidade. O princípio da Bio Saúde é o de que o normal é ser saudável e que a causa das doenças está em alguma distorção ou desvio ocorrido em algum momento ou em algum ponto de nossa vida. Cuidando da vida corrigimos o desvio em sua origem, tratando da causa que originou a doença. Assim, curamos não apenas a doença, mas também nossa vida.
   
    A saúde verdadeira consiste em viver alegremente, de maneira livre, e morrer com graça, de forma saudável. Considerando que a natureza humana é a de ser saudável, a Biosaúde rejeita a idéia da luta contra a doença, preferindo a promoção da saúde integral por meio de caminhos de aprendizagem que levam a uma mudança de vida. O foco é a re-humanização do ser humano.

    A mudança de atitude frente à vida leva a uma harmonia que se reflete na relação de compreensão e respeito pela Natureza. Esta integração é que nos leva de volta ao nosso estado natural de ser saudável. A BioSaúde valoriza a alimentação vegetariana e integral, o jejum, a prática de exercícios físicos e as técnicas de terapia natural, como base para a construção de uma saúde verdadeira e de uma vida harmoniosa, alegre e serena.



Textos Publicados

Afinal, o que é e para que serve a "Biosaúde"?

    A construção de uma saúde verdadeira e a adoção de uma vivência harmoniosa, depende, antes de tudo, da postura de cada um, da nossa própria atitude. A situação da saúde no mundo é péssima, não apenas pela falta de apoio e de política dos governos e dos sistemas de saúde, mas também pelos maus hábitos e a falta de informações corretas da população sobre o assunto. A situação está cada dia pior. Surgem mais doenças graves e complicadas e cada vez mais doentes.

    Paradas cardíacas, artrose, osteoporose, doenças infecciosas, transtornos da menstruação e muitas outras, são doenças com as quais já convivemos quase que com naturalidade. Agora aparecem casos de câncer nas meninas; câncer uterino em recém nascidas; incapacidade de aprender e hiper atividade nos adolescentes.  Hoje, já encontramos, com certa freqüência, até Alzheimer e demência entre os jovens.
   
    Segundo estudos recentes, aos 40 anos de idade, todas as pessoas já podem ter desenvolvido 10 cânceres no organismo, o chamado micro carcinoma. Sabemos que a metade da população mundial sofre de câncer e um terço morre disso. Antes, não havia tanta incidência de câncer. Ele não aparece de repente, nem por casualidade; ele parece muito bem preparado e programado, adaptado à maneira de viver de cada indivíduo. Outro estudo, agora sobre a diabete, mostra que a doença já afeta mais de 70 % da população, muitas vezes acompanhada por obesidade, insuficiência renal, cegueira e depressão profunda. Vivemos em uma época crítica, decorrente da diminuição da qualidade da vida.

    Diante desta situação, as pessoas buscam ansiosamente uma solução imediata ou um remédio mágico para escapar do sofrimento e da dor, sem pensar em suas verdadeiras causas. A medicina oferece medicamentos como analgésicos, antibióticos, cortisona, insulina...para quem pode pagar. E em muitos casos oferece até exames e até cirurgias desnecessárias. A medicina alternativa também tem os seus recursos, como a homeopatia, a acupuntura e outras, às vezes caras. Estas terapias, em moda no mundo inteiro, competem com a medicina acadêmica. Ambos oferecem variedades terapêuticas. Mesmo assim, uma grande maioria dos doentes não está satisfeita com os recursos oferecidos. Às vezes há um alívio momentâneo, mas no dia seguinte tudo se repete e com o tempo, o mal piora. Tudo acompanhado de sofrimento e despesas enormes.
       
    Receber tratamento de médico ou de terapeutas é fácil e muito cômodo, quando se tem dinheiro e tempo. Mas, muito cuidado, eles tratam somente dos sintomas e doenças, e se esquecem das causas. Por isso nunca acontece a cura efetiva.

    É importante refletir e aprender com sua própria experiência de dor. Caso contrário, os doentes perdem a oportunidade de aprender sobre si mesmos, com a sua própria experiência e vivência. Sem esta busca, a pessoa repete a vida inteira os mesmos erros, até a morte.

Mudar para ser saudável

    As medicinas cometem muitos erros. Através da medicina, pode-se alcançar uma saúde "controlada ou administrada", mas jamais se chegará a uma saúde verdadeira. Isto porque as doenças estão localizadas em nossa própria vida. É o nosso modo de vida que está doente. Se alguém quer se curar das doenças, deve primeiro curar-se das doenças de sua própria postura diante da vida. As doenças podem desaparecer "sozinhas", sem tratamento.

    A vida alimentar moderna está muito doente. Comemos e bebemos mal, em excesso, abusando da carne, frango, açúcar e doces. Consumimos alimentos refinados, industrializados, bebidas engarrafadas, muitos aditivos químicos, agrotóxicos e fast foods. Muitos usam o forno de microondas, que supostamente, é uma das maiores causas do enfraquecimento do sistema imunológico e do desenvolvimento de problemas cerebrais. É preciso adequar a alimentação para melhorar nossa saúde e qualidade de vida.

    Mas isso não é tudo. Também é preciso praticar exercícios físicos. Na vida moderna, pouco se caminha, dependentes que somos dos veículos. Passa-se muito tempo sentado, diante a TV, do computador e no serviço. Isso é fatal! Sem exercícios físicos regulares, os músculos se atrofiam e sem se perceber, todo nosso organismo vai se paralisando, inclusive o sistema imunológico.

    Além disso, este tipo de vida traz mais stress, conflitos e insegurança. Este estado, chamamos "doenças da vida". Câncer, diabetes, osteoporose, cólica menstrual e outros são resultado do modo de viver. Se mudarmos os hábitos destrutivos por hábitos saudáveis, as doenças desaparecem sozinhas, sem medicamentos nem terapias. Chamamos esta transformação da vida de "Biosaúde", o vigor e a alegria da vida.

Uma bússola para a vida

    A Biosaúde pretende promover, de modo ativo e consciente, o processo da mudança da vida. Visa formar novos costumes, sadios, naturais e agradáveis. Especial atenção merece a importância da alimentação vegetariana, sem açúcar e a prática de exercícios físicos como caminhadas, suaysyo, chicum, danças. Destacamos também o uso interno da urina - o que chamamos de "Urosaúde", já que pensamos que "Uroterapia" não expressa bem o que pretendemos ensinar.

    Sabemos pela experiência que tomar a própria urina significa "acordar", tomar consciência de si mesmo. Muito mais do que uma terapia, ajuda imensamente a dinamizar o processo de mudança: mudança da alimentação, fazer exercícios, tomar urina, cuidar da natureza e do meio ambiente, são os principais métodos da Biosaúde.

    É simples, não é ? Adotando esta forma de viver, desaparecem todos os tipos de doença; inclusive o egoísmo e mau caráter. E passamos a desfrutar da saúde verdadeira, com alegria e serenidade. É através desta energia adquirida que pretendemos ajudar ao povo das comunidades. Isto é nosso maior objetivo.

    Bem-vindos ao mundo da BioSaúde !!

sábado, 23 de maio de 2015

O lado sombrio da Polícia Judiciária

O lado sombrio da Polícia Judiciária

Trata-se de artigo que analisa as deficiências na estrutura da polícia judiciária brasileira cujas implicações levam a ineficácia policial.

Todo trabalho da polícia com o objetivo de esclarecer o ato criminoso firma-se unicamente no chamado "inquérito policial", que nada mais é senão uma mera investigação. Trata-se simplesmente de uma peça informativa com o objetivo de cientificar à justiça quanto aos pormenores de um crime.  A total atividade da polícia "judiciária" assenta-se na produção desse instrumento de persecução penal que, por suas características excessivamente burocráticas, é demasiadamente moroso, ineficaz e fundado no princípio da inquisição cujas formalidades obstruem a celeridade processual. É um método mal desenvolvido e extremamente caro aos cofres públicos em função de sua própria ineficácia, do seu apego excessivo às formalidades, da utilização de um número alto de recursos humanos voltado para o seu cerimonial, constituindo um aglomerado de inquisições e despachos dos quais muitos são repetitivos e protelatórios, resultando em um elevado custo de produção. Por outro lado, a autoridade policial "investiga" sem sequer sair de sua sala, representando um método investigativo que só poderíamos aceitar com ofensa à lógica e à boa técnica policial. Portanto, o delegado de polícia não lida diretamente com a investigação pois trabalha tão-somente com um amontoado de papeis de onde extrai a sua conclusão quanto a autoria do crime. Alem disso, não raramente, um único delegado é responsável por mais de mil inquéritos simultaneamente, ultrapassando os limites físicos e psicológicos do ser humano. Essa sobrecarga de serviço fundamenta-se no desacerto da regra legal que atribui, no âmbito policial, apenas ao delegado a faculdade de investigar o crime através do inquérito policial. Dessa forma, milhares de policiais, que poderiam estar buscando o esclarecimento da ilicitude penal, ficam ociosos, de mão atadas, em detrimento da repressão ao ato ilícito. Não resta dúvida que a maneira pela qual se manipula a investigação no Brasil embaraça a elucidação da ilicitude penal por ser, afora a burocracia exagerada, um meio eminentemente dissociado das modernas técnicas investigativas, isto é, a "autoridade policial" está mais voltada para as divagações jurídicas, em lugar de atentar para o seu próprio ofício, causando uma atrofia na especialização, qualificação e aprimoramento profissional, trazendo como consequência o aniquilamento da eficácia policial.
Cabe à polícia judiciária unicamente identificar a autoria do crime e os respectivos meios empregados, tal qual toda polícia do planeta. A análise jurídica é alçada tão-somente de advogados, juízes e promotores de justiça, entretanto no Brasil há uma clara inversão de valores onde os delegados, em lugar de priorizarem o esclarecimento do crime, abstêm-se de investigar para analisar o ato criminoso em si, invadindo a área jurídica, alheia às suas atribuições, a divagar por caminhos que nada tem a ver com assunto de polícia. Portanto, enquanto as autoridades policiais deleitam-se em devaneios jurídicos, a criminalidade agradece o afastamento do foco das investigações que, na maioria das vezes, fica em segundo plano. Desse modo, todas as atividades do inquérito policial são executadas em cartórios, consequentemente desagregada da experimentação e habilidade policial.  O consectário dessa inversão de valores é um número significantemente alto de inquéritos policiais inúteis, ou seja, arquivados sem ao menos identificar-se o autor do crime, razão pela qual uma expressiva parcela de bandidos perigosos estão às soltas nas ruas, livres para assaltar e matar o cidadão de bem. Segundo o jornalista Bob Fernandes, "os números dos assassinatos no Brasil nos últimos 30 anos são superiores aos de cinco guerras" (1). A questão repousa em três erros sistemáticos na segurança pública, quais sejam: a) a metodologia empregada na qual se prioriza os conceitos jurídicos em detrimento das modernas técnicas de investigação policial; b) a ritualística investigativa impõe uma excessiva burocracia desnecessária; c) a centralização da investigação policial, a cada dia mais restritiva, nas mãos apenas do delegado de polícia.
Quanto à ineficácia da polícia judiciária, temos como exemplo prático o estado de São Paulo, a Unidade da Federação mais rica, onde os recursos humanos, financeiros e tecnológicos são maiores do que nos demais estados. Vejamos dados da criminalidade no mencionado estado:
"noventa e cinco por cento dos crimes ficam impunes. Uma pessoa que cometa um crime na capital paulista tem uma chance em vinte de responder na Justiça, ou seja 5,2%. E mais de 50% dos processos só são abertos porque o autor do crime foi preso em flagrante delito. Se isso não ocorrer, a chance de a investigação policial descobrir o criminoso é de apenas 1 em 40, isto é, 2,5%"  (2).
Bem se vê o percentual de acerto da chamada "polícia judiciária", no que se refere a investigação identificar o criminoso, isto é, dentre 40 criminosos 39 ficam impunes e sequer são identificados. Essa inabilidade policial lesa o cidadão de bem. É evidente que um erro grave paira sobre o arcabouço da polícia investigativa brasileira. A óbvia ineficácia da polícia judiciária, sob o prisma da relação de custo-benefício, revela que o método empregado na persecução penal no âmbito policial, impõe um preço por demais elevado à sociedade, um verdadeiro castigo à população brasileira que paga caro por um serviço estéril, infrutífero. Essa estimativa econômica tem lastro à medição dos efeitos diretos relativos à depreciação do bem-estar da própria sociedade, resultante da deficiência policial. Restando claro e indiscutível a inabilidade da polícia judiciária exposta em sua incapacidade de determinar a autoria de 39 crimes dentre 40 ocorrências de ilicitudes, infere-se que a sociedade está à mercê da marginalidade, dada a falta de destreza policial em coibir a criminalidade. Em hipótese comparativa, suponhamos trabalhadores rurais que ao ordenhar 40 litros de leite, derramassem 39, desse modo um litro de leite teria o seu valor majorado a um preço equivalente ao de quarenta litros. Entretanto, o desleixo na extração do leite refletiria apenas na elevação dos preços dos laticínios e derivados, diferentemente do que acontece diante da criminalidade, isto é, a impunidade oriunda da inaptidão policial causa a falsa impressão de que o crime compensa, acarretando mais e mais crimes. É a bola de neve. Eis uma das principais causas do aumento assustador da criminalidade e a consequente insegurança da população.
Em 18 de Junho de 2013, o deputado federal Gonzaga Patriota (PSB) ocupou a tribuna da Câmara para revelar dados alarmantes:
“Nos anos de 2010, 2011 e 2012, a Polícia Federal remeteu ao Ministério Público Federal 211.834 inquéritos criminais. Desse total apenas 17.744 (8,3%) resultaram em denúncias encaminhadas ao Judiciário por procuradores da República contra os investigados. Por falta de provas ou inconsistências variadas, desceram ao arquivo 41.530 (19,6%) inquéritos. Outros 1.449 (0,68%) converteram-se em propostas de acordo, chamadas tecnicamente de ‘transações penais’.” (3)
Tais informações constam de planilhas extraídas de um banco de dados da Procuradoria da República, o chamado Sistema Único onde se registra o vaivém das investigações criminais.
"Entre janeiro de 2010 e dezembro de 2012, tiveram seus prazos esticados 301.360 inquéritos. O número é praticamente o dobro dos 151.111 inquéritos que não resultaram em denúncia nem foram arquivados. Supera até mesmo a soma total dos 211.834 processos enviados pela PF à Procuradoria. Por quê? Simples: alguns dos inquéritos foram prorrogados mais de uma vez." 
são os chamados inquéritos pingue-pongues que nada concluem e consomem tempo e muito dinheiro dos cofres públicos  -.  (4) Portanto, o acerto da Polícia Federal no tocante aos seus inquéritos é de apenas 8,3%, ou em sentido oposto, a Polícia Federal trabalha mal ou é ineficiente em 91,7% dos seus inquéritos policiais. São dados assustadores. Esse descompasso entre o trabalho da polícia judiciária federal e a efetiva repressão à criminalidade é uma agressão aos direitos humanos fundamentais à medida em que a Polícia Federal não resguarda a sociedade do convívio e trato diário com os criminosos e violadores da lei penal, ficando o povo ao arbítrio dos delinquentes. Como se vê, os bens jurídicos da comunidade e do cidadão afiguram-se, a cada dia, menos protegidos ou em condições precárias de garantia. Atividade particular detentora de análoga ineficácia estaria fadada à falência. Por que, então, aceita-se essa metodologia investigativa falida? Incompreensível? Inexplicável? Não, há razões bastante lógicas.
Não é à-toa que temos um número significativo de delegados de polícia exercendo mandatos de deputados federais, entretanto promotores de justiça, procuradores da República e juízes de direito são legalmente impedidos de desempenharem atividade política. Mas os delegados podem transformarem-se em políticos e efetivamente ocuparam várias cadeiras na Câmara dos Deputados, muitas vezes legislando em causa própria.
"O direito, no transcorrer da história, manifesta-se como um fenômeno oriundo de minorias. Minorias que detêm o poder econômico, político, religioso, aditiva ou disjuntivamente. Podemos dizer, sem medo de errar, que nesse aspecto, o direito sempre foi antidemocrático". (5)
De fato, a partir  da Constituição Federal de 1988 teve início mudanças categóricas na espinha dorsal da polícia brasileira, a começar pelo o termo "polícia judiciária", inexistente nas Constituições anteriores. Termo esse inadequado, até porque o vocábulo "judiciária" é relativo ao Poder Judiciário e não à polícia que nada tem a ver com a justiça. Antes da Carta Magna de 1988 a Polícia Militar instaurava inquérito policial, somando-se assim aos investigantes da criminalidade, com grande contribuição à sociedade. Hoje, a referida Polícia Militar está proibida de esclarecer o crime, isto é, a nossa Carta Magna de 1988 vetou procedimentos pertinentes à investigação criminal praticado por parte da Polícia Militar,  isso não faz o menor sentido. Portanto a persecução penal, em lugar de melhorar ou evoluir, ficou apertada, afunilou e regrediu. A repressão à criminalidade sofreu uma drástica redução de recursos humanos à medida em que se proibiu a Polícia Militar de efetuar investigações criminais. Historicamente percebe-se, há um longo tempo, os delegados articulando-se à procura de introduzirem vultosas mudanças no sistema de investigação policial, trata-se, ao que parece, da busca incessante pelo poder, fato transparente ao longo dos acontecimentos. Em 2008, a Ordem dos Advogados do Brasil da Bahia publicou:*
"PEC PRETENDE TRANSFORMAR DELEGADOS EM JURISTAS - As polícias brasileiras estão vivendo uma situação surrealista. Os delegados de polícia estão lutando para implantar algo difícil de ser imaginado até mesmo pelos novelistas mais consagrados do horário nobre. Tal qual os autores televisivos, eles estão escrevendo um folhetim em que o enredo está sendo tramado somente por eles." (6)
O alerta divulgado pela OAB foi inócuo, em 20 de junho de 2013 despontou no recinto das normas brasileira a lei 12.830, publicada no D.O.U. de 21/06/2013, p. 1, que em seu art. 2o considera a atividade de delegado de polícia como de natureza jurídica. Um autêntico disparate, trata-se de lei desarrazoada que confere atributo inexistente às atividades de polícia. Entretanto vários estados da Federação, pressionados por delegados, inseriram em suas constituições dispositivos similares. Esse ordenamento provoca uma desproporção entre o real papel da polícia, que é o de sustar a ação do bandido, e a utopia na qual o delegado cai em desvario tentando decompor o espírito do crime que de nada interessa à contenção da ação do fora-da-lei. A polícia deve ater-se, repito, tão-somente à prevenção e repressão da criminalidade, as suas verdadeiras atribuições, em lugar de desviar de suas funções para elaborar análise ou pareceres inócuos acerca de questões jurídicas. Esse afastamento do ofício policial relega o esclarecimento da ilicitude a um plano secundário, trazendo como consequência  uma clara distorção da atividade-fim e forte efeito no incremento da marginalidade. Essa lei equiparando o delegado de polícia aos juristas é amoral e desfigura os fundamentos do direito, da razão e da própria legitimidade.
Acontecimento inexplicável é o fato de o Departamento de Polícia Federal ter em seu organograma a figura do "assistente parlamentar", ASPAR, DAS-101.2 (7), cujas atribuições, até mesmo para os policiais federais, são obscuras e enigmáticas. Trata-se de delegado da Polícia Federal plantado no Congresso Nacional, com expediente integral no Poder Legislativo, tendo à disposição sala cedida pelo Senado Federal, conforme contrato de cessão número 20110004 (8). Incompreensível. Por que o DPF necessitaria de um delegado de polícia enraizado permanentemente dentre os parlamentares? Essa atividade não seria diversa da prevista para o cargo que assumiu? Não configuraria desvio de função? Segundo o Superior Tribunal de Justiça, "apenas em circunstâncias excepcionais previstas em lei poderá o servidor público desempenhar atividade diversa daquela pertinente ao seu cargo" - RMS 37248 SP 2012/0039300-1 STJ. Não faz sentido a Polícia Federal dispor de assistente parlamentar. O trabalho policial está dissociado da atividade legislativa. Não há uma mínima relação entre a faina  de polícia e o processo legislatório, exceto se os interesses forem outros. Será que a Polícia Federal mantém um "lobby" no Congresso Nacional pago com o dinheiro dos contribuintes? Quais seriam, então, esses interesses? Uma incógnita, questão obscura que dá margem à imaginação. Portanto, fato sombrio que é necessário ser esclarecido à sociedade.
Episódio inesquecível é a funesta PEC 37, a Proposta de Emenda Constitucional 37, apresentada em 2011 cuja emenda pretendia tornar a investigação criminal privativa das Polícias Civil e Federal, isto é, pleiteava proibir que o Ministério Público e demais instituições governamentais esclarecessem o crime, a exemplo da proibição impingida à Polícia Militar de investigar a criminalidade. Entre as investigações que sairiam da alçada do MP estão as que se referem ao crime de desvio de verbas praticado por políticos, o crime organizado, os abusos cometidos por agentes dos Estados e as violações de direitos humanos. Portanto, a chamada "polícia judiciária", tão combalida em seus atributos e que não tem eficácia em sua incumbência, ficaria ainda mais incapacitada de atuar porque todos os outros órgãos públicos estariam proibidos de levar a efeito investigações  criminais, ou seja, a referida PEC, em lugar de oferecer uma evolução ou melhoria e aprimoramento nas investigações, propunha um decréscimo nos recursos voltados para a repressão à criminalidade. Tratava-se de proposta corporativista cujo único objetivo era aumentar os poderes dos delegados de polícia em detrimento da Nação Brasileira que ficaria a mercê da criminalidade. Quanto a origem dessa distorção legislativa, a referida PEC 37 não poderia ter outra autoria senão um delegado de polícia exercendo mandato de deputado federal, ou seja, o delegado\deputado Lourival Mendes (PTdoB-MA). Entretanto, diante dessa disparatada Proposta de Emenda Constitucional, a reação não se fez esperar, a população de norte a sul saiu às ruas em protesto contra a rotulada PEC da IMPUNIDADE e outros desmandos políticos, dissuadindo os parlamentares a aprová-la. Por pouco a persecução penal em nossa Pátria não retrogradou para o caos.  Desse modo, restam poucas dúvidas que tais delegados estão mais interessados no corporativismo em lugar de centralizar o foco no aperfeiçoamento do combate ao elevado índice criminal no Brasil. Enquanto nos EUA, por exemplo, existem dezenas de diferentes agências encarregadas de investigações criminais, onde se trabalha sob o princípio segundo o qual a união faz a força. Aqui no Brasil os delegados, na contramão da evolução, almejam exclusividade, querem ser os únicos a deterem o "poder" da investigação criminal e, para atingir esse objetivo, adotam procedimentos dos mais variados para destruir ou desacreditar instituições de reconhecido respeito, tal qual o Ministério Público que executa papel fundamental à sociedade.  Se essa PEC fosse aprovada a propagação da impunidade seria significativa com o consequente aumento da criminalidade, especialmente os chamados crimes de colarinho branco.
Essa marcha à ré na eficácia policial, esse claro retrocesso evidenciado pela estatística, também tem lastro no desvio de finalidade da própria investigação policial cujas normas impostas dão-lhe conotação jurídica. "Mas é bom lembrar que à autoridade policial cumpre apenas apurar, reunir e enviar os elementos ou indícios, sendo-lhe defeso decidir se tais resultados são positivos ou negativos. O convencimento da culpa é atribuição judicial, nunca policial"(9). Entretanto, essa asserção foge dos objetivos, interesses e conceitos corporativistas oriundos de delegados que querem para si as atribuições, vantagens e prerrogativas de magistrados. A referida ilação advém não apenas de notícias veiculadas por jornalistas (10), mas também através de ações provenientes de associações e entidades representativas de classe. Por exemplo, a Associação dos Delegados da Polícia Civil de Minas Gerais tornou público um manifesto segundo o qual juízes de direito estão impedidos de intimar delegados para depor porque os magistrados, segundo os delegados, terão que "consultar os Delegados de Polícia previamente sobre o dia, hora e local em que poderão ser ouvidos" (11). Ora pois, trata-se de uma inusitada inversão de valores em que delegados de polícia consideram-se mais meritórios do que a autoridade judicial, isto é, pretendem que o juiz de direito fique à disposição do delegado. O disparate não para por ai, no mês de abril de 2014 os delegados de Polícia Federal reuniram-se no Espírito Santo, dentre os temas a serem discutidos nesse congresso consta o tópico pertinente ao título honorífico para delegado, isto é, eles querem ser tratados por "Vossa Excelência" (12), como se vê no caderno temático do evento. Também no aludido caderno, em seu item 2.1.6, "Suas Excelências" cobiçam o poder de apreciar segundo a sua "livre convicção jurídica motivada", ultrapassando os limites da coerência, invadindo o campo do Poder Judiciário. Trata-se de um dos princípios gerais do direito processual, também conhecido pelo "Princípio do Livre Convencimento Motivado" segundo o qual o juiz tem liberdade para dar a determinado litígio a solução que lhe pareça mais adequada, conforme o seu convencimento. Esse princípio emana dos artigos 131 do Código de Processo Civil e 155 do Código de Processo Penal cujos preceitos, repito, são atributos exclusivos de juiz de direito. Portanto, salta à vista a pretensão dos delegados em reivindicarem para si o poder inerente aos juízes. Essa absoluta falta de referência por parte da "autoridade policial", esse fisiologismo onde a razão não intervém, está levando a polícia ao caos.
Afora a imperfeição na apuração dos crimes, os constantes erros policiais representam um perigo para a população. Em 24/05/2007, a Folha de São Paulo, referindo-se ao ministro do Supremo Tribunal Federal, publicou:
"Gilmar Mendes acusa Polícia Federal de canalhice... O desabafo de Mendes foi motivado pela informação de que seu nome teria aparecido em uma suposta lista da PF entre os acusados de receber 'mimos e brindes' da empresa Gautama apontada como a coordenadora do esquema de fraudes em licitações públicas... A assessoria do STF divulgou documento para comprovar que o Gilmar Mendes mencionado na suposta lista é um homônimo do ministro que se chama Gilmar de Melo Mendes e seria engenheiro civil em Sergipe".
O agravante é que o referido processo tramitava na Polícia Federal em segredo de justiça. Outro exemplo é o recente caso do ator da Rede Globo, Vinícius Romão de Souza, que foi preso após ser acusado por uma mulher de tê-la assaltado, ficando dezesseis dias trancafiado na Cadeia Pública Patrícia Acioli, em São Gonçalo, Região Metropolitana do Rio, em uma cela com quinze outros presos. Posteriormente provou-se que o Vinícius é inocente. Nesse caso, o delegado não efetuou qualquer procedimento de investigação complementar para confirmar, ou não, a alegação da referida mulher, tratando-se portanto de omissão intolerável. Pior ainda, nenhum pertence da vítima foi encontrado com o Vinícius, logo não havia a chamada prova material. Como bem se vê, os conceitos de garantias individuais estão sendo desvirtuados pela polícia judiciária, onde sequer ministros do STF escapam.
Algo há de se fazer para corrigir essa imperfeição policial, é necessária uma urgente mudança no arcabouço da polícia judiciária para tirá-la da sombria zona da ineficácia. Há de se desburocratizar o inquérito policial dando-lhe uma nova estrutura e atribuindo-lhe feições modernas no sentido de otimizar o atual serviço entravado pelo corporativismo dos delegados de polícia.

NOTAS

(1)- http://www.metro1.com.br/os-numeros-dos-assassinatos-no-brasil-nos-ultimos-30-anos-sao-superiores-aos-de-cinco-guerras-alerta-bob-fernandes-3-35343,noticia.html
(2)- O Estadão edição digital de 16 de julho de 2010. http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,em-sp-95-dos-crimes-ficam-impunes,581914,0.htm
(3)- http://www.gazzeta.com.br/apenas-8-dos-inqueritos-criminais-da-pf-viram-denuncias-no-ministerio-publico/
(4)- http://caldeirao-politico.jusbrasil.com.br/politica/104165324/apenas-8-dos-inqueritos-criminais-da-policia-federal-viram-denuncias-do-ministerio-publico
(5)- AGUIAR, Roberto A.R - Direito, Poder e Opressão. São Paulo: Alfa-Omega 1984, pg. 136
(6)- http://oab-ba.jusbrasil.com.br/noticias/38460/pec-pretende-transformar-delegados-em-juristas
(7)- http://www.dpf.gov.br/institucional/Organograma_unidades_centrais_01.2012/
(8)-http://www.senado.gov.br/transparencia/liccontr/contratos/contrato.asp?nc=20110004&cc=2137
(9)- MEHMERI, Adilson - Inquérito Policial - Dinâmica. São Paulo: Saraiva 1992, pg. 299
(10)-http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2014/02/17/interna_politica,498999/delegados-da-policia-federal-podem-ser-chamados-de-vossa-execelencia.shtml#.UwIBrdYQEJ4.twitter
(11)- http://www.delegados.org.br/index.php/articles/2013-01-22-12-34-51/600-lei-n-12-830-2013-as-garantias-do-delegado-de-policia
(12)- http://www.adpf.org.br/congresso/files/Caderno_Tematico_VICNDPF.pdf
(13)- http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u92789.shtml


Leia mais: http://jus.com.br/artigos/30346/o-lado-sombrio-da-policia-judiciaria#ixzz3b12Bklsi

IMPOSSIBILIDADE DE REABERTURA DE INQUÉRITO POLICIAL TENDO HAVIDO DECISÃO EXTINTIVA DE PUNIBILIDADE TRANSITADA EM JULGADO: OFENSA À COISA JULGADA1

IMPOSSIBILIDADE DE REABERTURA DE INQUÉRITO POLICIAL TENDO HAVIDO DECISÃO EXTINTIVA DE PUNIBILIDADE TRANSITADA EM JULGADO: OFENSA À COISA JULGADA1


A ação penal, quando pública e incondicionada, especialmente, torna dever da autoridade policial investigá-la, levando o resultado de seus atos investigatórios ao Ministério Público, titular da ação penal pública. Tem base legal a partir do art. 5º do CPP, e se caracteriza por ser escrito, oficioso (ex-officio), oficial (compete aos agentes públicos), discricionário (busca de provas), inquisitorial (reunião de atividades e faculdade de indeferir provas requeridas) e indisponível.
Tão logo tenha conhecimento da prática de uma infração penal, a autoridade policial deverá dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais, e também apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais e colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias, como ouvir o ofendido, o indiciado, testemunhas, e proceder a reconhecimento de pessoas e coisas, determinar acareações e se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias.
Tudo isso para buscar a elucidação do suposto fato criminoso, o que talvez não seja possível, dependendo de cada caso concreto.
Mas, ainda que os resultados da investigação tenham sido inexitosos, ainda assim, necessária a remessa ao Judiciário, não podendo a autoridade policial arquivá-lo, o que só compete ao magistrado, observando-se, outrossim, a regra do art.28 do CPP.
1 Autor: MÁRIO LUÍS LÍRIO CIPRIANI. Advogado Criminalista. Sócio da empresa Bruno Menezes & Mário Cipriani Advocacia Criminal. Professor de Direito Processual Penal - Ulbra e Fadisma. Professor convidado da Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal da Fundação do Ministério Público. Especialista em Direito Penal Econômico e Europeu e Mestre em Ciências Criminais pela Universidade de Coimbra. Doutorando em Problemas Actuales de Derecho Penal y de la Criminologia pela Universidad Pablo de Olavide, em Sevilla, Espanha. Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.
Nessa senda, prevalece a Súmula nº 524 do Superior Tribunal de Justiça, a qual refere que “arquivado o inquérito policial por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada sem novas provas”.
A questão que se coloca é a seguinte: a decisão judicial que recebe ação penal derivada de reabertura de inquérito policial ante a existência de novas provas, não fere a coisa julgada? Depende do conteúdo da decisão judicial que determinara o arquivamento.
Em tese, não fere a coisa julgada, pois a decisão de arquivamento de inquérito policial somente faz coisa julgada formal, significando dizer que o surgimento de provas que alterem o panorama probatório dentro do qual foi acolhido o arquivamento autoriza o oferecimento de denúncia.
Mas se a decisão judicial tiver determinado o arquivamento do inquérito em razão de extinção da punibilidade (transcurso de prazo decadencial, atipicidade ou mesmo requerimento do MP, por exemplo), as normas processuais previstas no Código Penal e Processual Penal, impedem a reabertura de inquérito policial, pois esta decisão, se transita em julgado, faz coisa julgada material, impedindo qualquer responsabilização do acusado.
Nessa linha, caso haja o prosseguimento de inquérito policial arquivado em razão da extinção da punibilidade transitada em julgado, o acusado poderá valer-se da medida autônoma de Habeas Corpus, não impedindo que o juiz reconheça a extinção da punibilidade - independentemente de sua causa - como hipótese de absolvição sumária, pois deve haver prevalência do direito à liberdade com esteio em coisa julgada sobre o dever estatal de acusar.
Mesmo entendimento se pode ter em relação ao termo circunstanciado, que uma vez arquivado por ordem por magistrado competente, a pedido do Ministério Público, por ausência de tipicidade ou extinção da punibilidade, impossibilita a reabertura do procedimento fundada em alegação de existência de novas provas, pois se trata da eficácia preclusiva da decisão e obstativa de ulterior instauração da persecutio criminis, mesmo que a peça acusatória busque apoiar-se em novos elementos probatórios, sendo inaplicáveis, em tais casos, o art. 18 do CPP e a Súmula 524 do STF.