quinta-feira, 27 de agosto de 2020
A psicologia de massas do fascismo ontem e hoje: por que as massas caminham sob a direção de seus algozes?
A psicologia de massas do fascismo ontem e hoje: por que as massas caminham sob a direção de seus algozes?
Mauro Iasi revisita as teses de Wilhelm Reich sobre a psicologia de massas do fascismo para compreender os impasses políticos do presente.
Publicado em 04/06/2018 // 14 comentários
Por Mauro Luis Iasi.
“o fascismo, na sua forma mais pura, é o somatório
de todas as reações irracionais do caráter do homem médio”
W. Reich
de todas as reações irracionais do caráter do homem médio”
W. Reich
“queriam que eu falasse do agora
mas, o presente que procuro
está preso em um passado
que insiste em ser futuro”
M. Iasi
mas, o presente que procuro
está preso em um passado
que insiste em ser futuro”
M. Iasi
O psicólogo marxista Wilhelm Reich (1897-1957) escreveu o livro Psicologia de massas do fascismo
em 1933 (o estudo se estendeu de 1930 até 1933), no contexto da
ascensão do nazismo na Alemanha. O autor se refugiou em Viena, depois
Copenhagen e Oslo, onde iniciou seus estudos sobre as couraças e depois
do que denominou de “energia vital”, levando-o a teoria do “orgon”.
Desde 1926 acumulava divergências com Freud, com o qual trabalhou como
assistente clínico, e em 1934 seria expulso da Sociedade Freudiana e da
Associação Psicanalítica Internacional, sairia da Noruega em direção aos
EUA, onde seria também perseguido com a acusação de “subversão”. Acabou
preso em 1957 e morreu no mesmo ano na prisão. Toda sua obra, incluindo
livros e material de pesquisa, foram queimados por ordem judicial nos
EUA em 1960.
Ainda que possamos questionar as teorias reichianas fundadas na teoria do “orgon”
e a relação que esperava estabelecer entre “soma e psiquismo”, temos
que ter muito cuidado ao tratar as considerações que esse importante
autor tece sobre o fascismo e o caráter das massas analisados na obra
citada. Em vários aspectos, considero que as reflexões de Reich sobre o
tema podem ser extremamente úteis em nossos tumultuados dias,
principalmente pelas questões que levanta, mais do que pelas respostas
que encontra.
O autor coloca da seguinte maneira o
problema. Se assumirmos que a compreensão da sociedade realizada por
Marx esteja correta – isto é, que o desenvolvimento da sociedade
capitalista e suas contradições leva à possibilidade de sua superação
revolucionária (o que implica a conformação do proletariado como um
sujeito consciente de sua tarefa histórica) –, a questão que se coloca é
como compreender o comportamento político de amplos setores da classe
trabalhadora que efetivamente estão servindo de base para a reação
política que emergia com o fascismo.
Chamar atenção aos efeitos da exploração
capitalista, como a miséria, a fome e o conjunto das injustiças próprias
do sistema capitalista para ativar o “ímpeto revolucionário”, dizia
Reich, já não era suficiente. Tampouco acusar o comportamento
conservador das massas de “irracional”, de constituir uma “psicose de
massas” ou uma “histeria coletiva” – algo que em nada contribui para
jogar luz sobre a raiz do problema, a saber, compreender a razão pela
qual a classe trabalhadora respaldava o discurso fascista que em última
instância atacava exatamente seus próprios interesses.
Na base dessa incompreensão se encontrava
um sentimento de espanto. Os marxistas acreditavam que a crise
econômica de 1923-1933 era de tal forma brutal que produziria
“necessariamente uma orientação ideológica de esquerda nas massas por
ela atingidas”. Entretanto o que se presenciou foi, nas palavras do
autor, uma “clivagem entre a base econômica, que pendeu para a esquerda,
e a ideologia de largas camadas da sociedade que pendeu para a
direita”. O autor conclui com a constatação de que a “situação econômica
e a situação ideológica das massas não coincidem necessariamente”.
(Wilhelm Reich, Psicologia de massas do fascismo, São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 7).
Nesse ponto, Reich afirmará que – e a
observação dele aqui me parece profundamente pertinente hoje – essa não
correspondência não deveria surpreender aos marxistas, uma vez que o
materialismo dialético de Marx não compreende a relação entre a situação
econômica e a consciência de classe como sendo algo mecânico, ou seja,
como se a situação material determinasse esquematicamente sua expressão
ideal na consciência dos membros de uma classe social. Somente um
“marxismo vulgar” concebe uma antítese na relação entre economia e
ideologia, assim como entre a “estrutura” e a “superestrutura”, uma
perspectiva precária que não leva em conta o chamado “efeito de volta”
da ideologia, isto é, as formas pelas quais a ideologia incide sobre a
própria base material que a determina. Presa a essa visão esquemática e
pouco dialética, resta a essa modalidade de marxismo vulgar apenas
recorrer ao chamamento moral para que os trabalhadores correspondam em
sua ação às condições objetivas em que se inserem, clamando pela
“consciência revolucionária”, às “necessidades das massas” ou ao
“impulso natural” para as greves e a luta (p. 14). Melancolicamente,
Reich conclui então que essa versão esquemática do marxismo:
“Tentará, por exemplo,
explicar uma situação histórica com base na ‘psicose hitleriana’ ou
tentará consolar as massas, persuadindo-as a não perder a fé no
marxismo, assegurando-lhes que, apesar de tudo, o processo avança, que a
revolução não pode ser esmagada, etc. O marxista comum acaba por descer
ao ponto de incutir no povo uma coragem ilusória, sem, no entanto,
analisar objetivamente a situação em sem compreender sequer o que se
passou. Jamais compreenderá que uma situação difícil nunca é
desesperadora para a reação política ou que uma grave crise econômica
tanto pode conduzir à barbárie como a liberdade social. Em vez de
deixar seus pensamentos e atos partirem da realidade, ele transporta
essa realidade para a sua fantasia de modo que ela corresponda aos seus
desejos.” (pp. 14-5)
A miséria econômica causada pela crise
atualiza a disjuntiva “socialismo ou barbárie”, mas o que faria com que
os trabalhadores optem pela alternativa socialista? Reich está
convencido de que em uma situação como essas os trabalhadores escolhem
em primeiro lugar a barbárie. O marxismo vulgar compreende a ideologia
como um conjunto de ideias que se impõe à sociedade e, portanto, aos
trabalhadores. Dessa maneira, os partidários desse tipo de perspectiva
acreditam que as ideais marxistas ganham força na crise porque desmentem
na prática as ideias conservadoras. O que foge à compreensão dessa
análise é exatamente o modo de operação da ideologia, muito mais do que a
definição escolástica do “que é” ideologia.
Assim, o psicólogo comunista fará a
pergunta decisiva: se uma ideologia se transforma em força material
quando se apodera das massas, como afirmava Marx, a pergunta é “como é
possível que um fator ideológico produza resultado material”, seja na
direção de uma política revolucionária ou na direção de uma “psicologia
de massas reacionária”? (p. 17)
Se compreendermos a ideologia na chave de
ideias dominantes em uma sociedade – isto é, as ideias das classes
dominantes que expressam as relações sociais que fazem de uma classe a
classe dominante (Marx e Engels, A ideologia alemã,
Boitempo, p. 47) –, a pergunta se formula da seguinte maneira: como é
que relações sociais se convertem em expressões ideais, valores, juízos e
representações interiorizadas pelas pessoas que constituem uma
determinada sociedade? A resposta é que isto se dá na vivência de
instituições no interior das quais as pessoas formam seu próprio
psiquismo, neste caso, fundamentalmente, na família.
É aqui que as relações sociais dadas são
apresentadas pela pessoa em formação como “realidade”, onde se
desenvolve a transição do “princípio do prazer” para o “princípio da
realidade” e se produz um complexo processo de identificação com aquele
que representa o limite, a ordem e a norma social a ser imposta, mas, o
que é essencial ao nosso tema, que é incorporada pela pessoa como se
fosse sua (autocontrole) e não uma imposição oriunda de uma ordem
social. O fundamento desse processo de interiorização, na formação
daquilo que Freud denominou de “superego”, está a repressão à
sexualidade infantil, o seu recalque e a volta como sintoma nos termos
de Reich (Materialismo Dialético e Psicanálise. Lisboa: Presença/São Paulo: Martins Fontes, 1977).
É mister lembrar neste momento que o
resultado desse processo de interiorização das relações sociais na forma
de valores e normas de comportamento implica na identidade com o agende
da imposição das normas externas, no caso do complexo de Édipo descrito
por Freud na formação de uma identidade com o pai.
Dessa maneira, Reich localizará a base de
uma determinada expressão de uma psicologia de massas (a do fascismo)
em dois pilares: uma certa forma de família tendo no centro a repressão à
sexualidade infantil; e o caráter da “classe média baixa”. Para ele, a
repressão à satisfação das necessidades materiais difere da repressão
aos impulsos sexuais pelo fato que a primeira leva à revolta enquanto a
segunda impede a rebelião, uma vez que o retira do domínio consciente
“fixando-o como defesa moral”, fazendo com que o próprio recalque do
impulso seja inconsciente, seja visto pela pessoa como uma
característica de seu caráter. O resultado disso, segundo Reich, “é o
conservadorismo, o medo a liberdade, em resumo, a mentalidade
reacionária” (Psicologia de Massas do Fascismo, p. 29).
Os setores médios não são os únicos a
viverem esse processo (que é de fato universal para nossa sociedade) mas
o vivem de maneira singular. Trata-se de uma classe ou segmento de
classe espremido entre o antagonismo das classes fundamentais da
sociabilidade burguesa (a burguesia e o proletariado), desenvolvendo o
curioso senso de que estão acima das classes e representam a nação. Seus
impulsos jogam os setores médios ora para a radicalidade proletária (a
luta contra as barreiras da realidade que se levantam contra os
impulsos), ora para o apelo à ordem da reação burguesa (a defesa das
barreiras sociais impostas como garantia da sobrevivência). Como o
indivíduo teme seus impulsos e clama por controle, os segmentos médios
temem a quebra da ordem na qual se equilibram precariamente e pedem
controle e repressão.
Não é acidente ou casualidade que no
campo dos valores reacionários vejamos alinhados à defesa abstrata da
“nação” características como o “moralismo” quanto aos costumes (que vem
inseparavelmente ligado a preconceitos, a homofobia, etc.) e a defesa da
“família”, assim como o chamado “irracionalismo”, a “violência”, o mito
da xenofobia e do racismo como constituintes da nação, e o clamor pela
“ordem”. A recente cena dantesca de “manifestantes” enrolados na
bandeira do Brasil, de joelhos e mãos na cabeça, pedindo uma intervenção
militar é a imagem que condensa todos esses elementos. Por incrível que
pareça, essa não é uma sociedade “doente”, mas a sociedade “normal”
exposta sem os filtros que rotineiramente a oculta.
Os argumentos de Reich estão longe de dar
conta da totalidade do fenômeno do fascismo. Ainda que justificada, sua
crítica aos marxistas oficiais (em 1931 Reich criou a Sexpol Verlag que
aglutina mais de 40 mil membros discutindo uma política sexual e suas
relações com a luta revolucionária, o que causou preocupações no Partido
Comunista austríaco e redundou na sua expulsão do partido em 1933) não
pode dar conta de todos os elementos históricos, políticos, sociais e
culturais do tema que foram abordados em inúmeras obras de competentes
marxistas (de Gramsci a Adorno e Benjamin, passando por Togliatti,
Polantzas e tantos outros). Ele apenas aponta para um aspecto que
normalmente é desconsiderado. O que nos parece pertinente é que o
comportamento fascista não pode ser reduzido a manipulação e engodo, mas
encontra profunda raízes na consciência imediata das massas e seus
fundamentos afetivos, seja nos segmentos médios, seja na classe
trabalhadora.
O fascismo é, na sua essência, uma
expressão política da crise capitalismo em sua fase imperialista e na
etapa do domínio dos monopólios, como define Leandro Konder (Introdução ao fascismo,
São Paulo, Expressão Popular, 2009). Ele disfarça sob uma máscara
modernizadora seu conteúdo conservador, sendo antiliberal,
antissocialista, antioperário e, principalmente, antidemocrático. A
dificuldade do fascismo reside exatamente em juntar esses dois aspectos
contrários em sua síntese – isto é, uma intencionalidade à serviço do
grande capital (imperialista, monopolista e financeiro) e uma base de
massas que permita apresentar seu programa reacionário como alternativa
para a “nação”. Creio que o estudo de Reich nos dá aqui uma pista
valiosa. A ideologia fascista conclama à revolta dos impulsos reprimidos
(seja das necessidades materiais, seja aqueles relativos à repressão da
sexualidade) e depois oferece a ordem como alternativa, dialogando
assim diretamente com o fundamental da estrutura do caráter
universalizado pela sociabilidade burguesa, principalmente das chamadas
classes médias. É, portanto, uma política da pequena burguesia que
mobiliza massas trabalhadoras para defender os interesses do grande
capital monopolista. Acreditem, realizou-se esta façanha com eficiência e
sucesso naquilo que conhecemos por nazifascismo.
Na luta contra o fascismo, a burguesia
democrática é sempre a primeira derrotada e junto a ela a pequena
burguesia que acredita no seu próprio mito de um Estado acima dos
interesses de classe. A única força social capaz de enfrentar o fascismo
é a revolução proletária, por isso são os trabalhadores o alvo duplo do
fascismo, seja no sentido da cooptação, seja na repressão brutal e
direta. Quando a luta de classes se acirra e qualquer conciliação é
impossível, a burguesia se inquieta, os segmentos médios entram em
pânico e os fascistas vendem seu remédio amargo para a doença que
ajudaram a criar. Se nesse momento os trabalhadores se movimentarem com
autonomia em direção ao seu projeto societário – o socialismo –,
impelidos inicialmente pelos impulsos mais elementares e ainda não
conscientes, eles podem colocar toda a sociedade em torno de sua luta e
se constituir como alternativa à barbárie do capitalismo em crise. Se,
por razões várias, esse segmento não se movimentar com a força
necessária, uma longa noite de terror se impõe com seus cadáveres e
cortejos fúnebres.
Ainda que tenham particularidades em seu
processo de consciência, os trabalhadores não podem escapar ao fato de
que são socializados nas instituições de uma ordem burguesa, portanto,
que os valores, princípios, representações ideais desta ordem constituam
o fundamento de sua consciência imediata. Diante do caos que emerge da
crise do capital vive uma contradição entre os impulsos materiais que os
impulsionam à luta e à identidade com os opressores que os mantêm
presos às correntes da ideologia. Na ausência de uma política
revolucionária se somam às “classes médias” conclamando pela ordem e se
prestam a ser a base de massas para as aventuras fascistas.
Toda a esperança da psicanálise é tornar
possível que o inconsciente emerja, em parte, para que seja compreendido
o sintoma. Guardadas as mediações necessárias, a luta de classes torna
possível que as determinações ocultas pelos mecanismos da ordem se façam
visíveis e que o sintoma se torne exposto. No primeiro assim como no
segundo caso isto não significa a resolução do sintoma, mas o início de
uma longa luta para enfrentá-lo. O novo que pulsa vigoroso nas entranhas
do cadáver moribundo do velho mundo, não pode ser detido a não ser pela
violência. Não pode se libertar sem quebrar violentamente a ordem que o
aprisiona.
“Veintiuno veintiuno
firmamento del dos mil
en el cielo la paloma
va en la mira del fusil”
Silvio Rodriguez
firmamento del dos mil
en el cielo la paloma
va en la mira del fusil”
Silvio Rodriguez
***
Mauro Iasi é
professor adjunto da Escola de Serviço Social da UFRJ, pesquisador do
NEPEM (Núcleo de Estudos e Pesquisas Marxistas), do NEP 13 de Maio e
membro do Comitê Central do PCB. É autor do livro O dilema de Hamlet: o ser e o não ser da consciência (Boitempo, 2002) e colabora com os livros Cidades rebeldes: Passe Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil e György Lukács e a emancipação humana (Boitempo, 2013), organizado por Marcos Del Roio. Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às quartas.
domingo, 23 de agosto de 2020
Covid-19: governo impede Médicos sem Fronteiras de atender indígenas no MS
Covid-19: governo impede Médicos sem Fronteiras de atender indígenas no MS
O
governo brasileiro não autorizou a organização Médicos sem Fronteiras a
prestar atendimento em sete comunidades indígenas no Mato Grosso do
Sul. Os Terenas pediram ajuda à ONG francesa em julho para combater o
avanço do coronavírus nas aldeias.
Em
um comunicado, a Médicos sem Fronteiras afirmou ter apresentado um
projeto de ação nas sete comunidades sul-matogrossenses. A Secretaria
Especial de Saúde Indígena (Sesai), no entanto, negou a autorização ao
grupo, dizendo que o plano apresentado pelos médicos não trazia
precisões sobre os locais de atendimento, datas e meios a serem
empregados.
O
órgão dedicado à saúde indígena afirmou ainda ter aceitado a ajuda de
um grupo de trabalho da entidade francesa, com um médico, três
enfermeiros e um psicólogo, na aldeia Aldeinha, no município de
Anastácio (MS). De acordo com o comunicado da Sesai, seria ali a maior
taxa de incidência de casos de covid-19.
A Médicos sem Fronteiras,
contudo, diz que a comunidade aceita, a menos de 5 km de um grande
município e com apenas 500 pessoas, não fazia parte da primeira proposta
do grupo.
A
ONG afirma já ter apresentado uma nova proposta de atendimento em ações
coordenadas com o distrito de saúde local para 11 comunidades indígenas
e cerca de 6.000 pessoas. O objetivo será detectar casos suspeitos de
covid-19 e prevenir o contágio.
Covid entre indígenas
A
pandemia do coronavírus tem atingido duramente as comunidades indígenas
brasileiras. De acordo com a contagem feita pela Apib (Articulação dos
Povos Indígenas do Brasil), já são 26.615 casos de indígenas
contaminados pelo coronavírus e 70 mortos até esta sexta-feira (21).
Para
a Apib, a proibição da entrada do grupo da Médico sem Fronteiras nas
comunidades Terena do Mato Grosso do Sul "pode agravar os casos de
contaminação na região".
O grupo indígena fez o pedido de
autorização para entrada dos médicos voluntários no dia 24 de julho,
quando seis indígenas do povo Terena haviam morrido pela covid-19. No
dia 19 de agosto, quando saiu a resposta do órgão do Ministério da
Saúde, a comunidade já contava 41 mortos pela doença, além de 1.239
contaminados, segundo levantamento feito pelo Conselho Terena e pela
Apib.
70% das terras indígenas estão fora do plano federal
Desde
o início da pandemia, o governo brasileiro tem sido acusado pelos
grupos indígenas de não tomar medidas para proteger essa população mais
vulnerável em questão de imunidade. Em julho, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) chegou a vetar partes de uma lei que previa medidas de emergência para o cuidado das comunidades indígenas.
A decisão foi alterada mais tarde pelo STF
(Supremo Tribunal Federal), que obrigou o governo a criar barreiras
sanitárias e um plano de enfrentamento para a doença aos indígenas.
No
entanto, o plano de instalação de barreiras sanitárias para proteger as
aldeias feito pelo governo federal deixou de fora 70 % das terras
indígenas, de acordo com um documento de grupo de trabalho do Ministério
da Mulher, Família e Direitos Humanos publicado nesta semana pelo
jornal O Globo.
De acordo com o relatório, os indígenas instalaram
metade das 274 barreiras sanitárias por conta própria, sem participação
do órgão federal responsável pela proteção dessas comunidades, a Funai.
quarta-feira, 19 de agosto de 2020
PARA UM MUNDO MELHOR / FOR A BETTER WORLD (525)
PARA UM MUNDO MELHOR / FOR A BETTER WORLD (525)
Photo by Rami Al-zayat on unsplash.com |
FOR A BETTER WORLD (525)
10 apps to help you go greener
The
technology around us helps us get more information and get things done
faster than ever, so there's no excuse for not changing some old habits.
The importance of being environmentally friendly is becoming
increasingly crucial over the years, with some scientists predicting
that we only have a few more years to avoid long-term damage to our
planet.
Fortunately,
today's technology can help us a lot when it comes to being
environmentally friendly. Downloading some of the best sustainable apps
is a great way to keep our emissions low and live a more responsible
lifestyle.
Here
is a list of the best sustainable apps, some were made with respect for
the environment and others help users to adopt sustainable habits,
discouraging unnecessary travel and other activities that generate a lot
of carbon.
Think Dirty
There
are so many toxins that we don't know about in our personal care
products. This can be harmful to the environment and harmful to us as
well. With the Think Dirty app, you can scan a product and find out what
bad things are hidden in it, and then make more responsible choices by
purchasing items suggested by the app.
ThredUp
The
fast fashion industry is a big polluter for the environment, so buying
secondhand clothes is extremely beneficial - but it can sometimes be
quite difficult to find a used goods store. Then, type: ThredUp.
ThredUp
is a thrift store in an app - users can add their own clothes and look
for new trends. Everything is second-hand and users can earn money by
selling their used clothes or compose an entirely new and faultless
wardrobe.
HappyCow
Eating
vegetarian or vegan food is another great way to help the environment.
There are vegetarian restaurants all over the world, finding them is the
difficult part. HappyCow makes it easy, with lists of vegan and
vegetarian restaurants in cities around the world. It's user-generated
content, so not all vegetarian restaurants are there, but it's certainly
a great place to start looking for meatless options - and you can also
add suggestions!
Tap
Everyone
knows the benefits of using less plastic - and the importance of having
a reusable bottle instead of buying disposable plastic bottles.
However, it can be difficult to find places to fill a bottle of water,
which means that when people are away from home, they are more likely to
buy disposable water bottles.
This
is where Tap comes in. This free app helps users to find places where
they can fill their water bottles around the world. Their database shows
where they have drinking water sources and companies (like restaurants
or cafes) that have been happy to help by filling people's water
bottles, even if they don't make a purchase. Using the app, you can find
the nearest water station, filter your preferences and get directions
that you can follow on foot. You will never need to buy water bottles
again!
Forest
It
is an application that helps users to “maintain focus and presence”, it
turns off the rest of a user's phone for a certain period of time. If
you go all the time (usually half an hour to two hours) without turning
off the timer, you can “plant a tree”, but if you turn it off first, the
tree may die.
So,
how does it help the environment? Users can use coins that they earn in
the app to plant real trees. Forest works with an organization called
“Trees for the Future” to make this possible. So, by staying away from
your cell phone and becoming more focused and attentive, you can still
help Earth!
DoneGood
Want
to support small businesses, but don't know where to start? DoneGood
can help! Unfortunately, many famous brands have very dubious business
plans - from using factories to products that do nothing to minimize
carbon emissions. DoneGood, which was called “The Amazon of Good Brands”
by Forbes, facilitates the search for the best deals.
Just
search the app and they will recommend a small business that is
actively doing things to improve the world. In addition to the
application, there is a plug-in that recommends sustainable alternatives
to the items a user is looking for and the site offers some exclusive
discounts.
Apscape
Holidays
are great and everyone needs to take time out from time to time - but
taking short trips that we get used to, including flying and staying in a
hotel for a night or two, is very damaging to the environment. While
nothing can replicate a real holiday, Apscape is working to create
interesting experiences using virtual reality. They have great virtual
tours to destinations around the world - from Cuba to Botswana - and are
always increasing their offerings.
LeoVegas
Flying
to certain destinations just to play is incredibly popular - Las Vegas
alone received 42.52 million visitors in 2019. While some people are
there for a once-in-a-lifetime trip, which is completely understandable -
many people fly to Las Vegas often just to play.
Let's
be honest, it is better not to play, especially if you think you are at
risk of becoming addicted. But if it's just for fun, gambling apps are a
good, low-impact alternative.
As discussed,
the environmental impacts of flying are enormous - therefore, making
short trips should be avoided. Using casino apps like LeoVegas, or other
online casinos, are great alternatives for visiting a gaming place.
Olio
Olio
is an application for sharing items and food. The idea is that if you
have any food you don't need, either because you bought it wrong or
because you won't be using it before the expiration date, you can take a
photo, put it in the app and wait for people close to you to order the
product.
And it is the same procedure for
non-food items, if you are cleaning, just put what you no longer need in
the application and the people who want that item will send you a
message to arrange the withdrawal. No money is exchanged at Olio.
Bla Bla Car
It
is not surprising that vehicles cause a lot of emissions, on average it
produces 4.6 metric tons of carbon dioxide per year. Public transport
is a great sustainable alternative, but what about places where public
transport is not accessible or where destinations are really expensive?
Bla
Bla Car is a great solution. People who want to share a ride and make
money on fuel (note that this is not a taxi service and drivers do not
make a profit, but must have their gasoline covered by fees) can post
their trips on the app and others can request to join to them. An
evaluation system helps to reassure people when they connect with each
other.
Conclusion
Currently,
there are so many apps that can help us have a healthier lifestyle. From
apps that encourage the sharing and reuse of items, to sustainable
business professionals and apps that try to reduce unnecessary travel,
therefore, this can be very beneficial for creating a greener planet.
Published by EcoDebate on August 18, 2020
(Until next Wednesday, August 26, 2020)
PARA UM MUNDO MELHOR (525)
10 aplicativos para ajudar você a se tornar mais ecológico
A
tecnologia à nossa volta nos ajuda a obter mais informações e a fazer
as coisas mais rápido do que nunca, portanto, não tem desculpa para não
mudar alguns velhos hábitos. A importância de ser ecologicamente correto
está se tornando cada vez mais crucial com o passar dos anos, com
alguns cientistas prevendo que só temos mais alguns anos para evitar
danos a longo prazo em nosso planeta.
Felizmente,
a tecnologia de hoje pode nos ajudar muito quando se trata de ser
ecologicamente correto. Baixar alguns dos melhores aplicativos
sustentáveis é uma ótima maneira de manter nossas emissões baixas e
viver um estilo de vida mais responsável.
Aqui
está uma lista dos melhores aplicativos sustentáveis, alguns foram
feitos com o respeito pelo meio ambiente e outros ajudam os usuários a
adotar hábitos sustentáveis, desencorajando viagens desnecessárias e
outras atividades que geram grande quantidade de carbono.
Think Dirty
Existem
tantas toxinas que desconhecemos em nossos produtos de higiene pessoal.
Isso pode ser prejudicial ao meio ambiente e prejudicial para nós
também. Com o aplicativo Think Dirty, você pode digitalizar um produto e
descobrir quais coisas ruins estão escondidas nele e, em seguida, fazer
escolhas mais responsáveis comprando itens sugeridos pelo aplicativo.
ThredUp
A
indústria da moda rápida é um grande poluidor para o meio ambiente,
portanto, a compra de roupas de segunda mão é extremamente benéfica –
mas às vezes pode ser bem difícil encontrar uma loja de produtos usados.
Então, digite: ThredUp.
O
ThredUp é um brechó em um aplicativo – os usuários podem adicionar suas
próprias roupas e procurar novas tendências. Tudo é de segunda mão e os
usuários podem ganhar dinheiro vendendo suas roupas usadas ou compor um
guarda-roupa totalmente novo e sem culpa.
HappyCow
Comer
comida vegetariana ou vegana é outra ótima maneira de ajudar o meio
ambiente. Existem restaurantes vegetarianos em todo o mundo,
encontrá-los que é a parte difícil. O HappyCow facilita isso, com listas
de restaurantes veganos e vegetarianos em cidades do mundo todo. É um
conteúdo gerado por usuários, portanto, nem todos os restaurantes
vegetarianos estão lá, mas é certamente um ótimo lugar para começar a
procurar opções de comida sem carne – e você também pode adicionar
sugestões!
Tap
Todo
mundo sabe dos benefícios de usar menos plástico – e da importância de
ter uma garrafa reutilizável em vez de comprar garrafas de plástico
descartáveis. No entanto, pode ser difícil encontrar lugares para encher
uma garrafa de água, o que significa que, quando as pessoas estão fora
de casa, elas têm mais chances de comprar garrafas de água descartáveis.
É
aqui que entra a Tap. Este aplicativo gratuito ajuda os usuários a
encontrar lugares onde podem encher suas garrafas de água em todo o
mundo. Seu banco de dados mostra onde têm fontes de água potável e
empresas (como restaurantes ou cafés) que se mostraram felizes em poder
ajudar enchendo as garrafas de água das pessoas, mesmo que não façam uma
compra. Usando o aplicativo, você pode encontrar a estação de água mais
próxima, filtrar suas preferências e obter direções que você pode
seguir a pé. Você nunca precisará comprar garrafas de água novamente!
Forest
É
um aplicativo que ajuda os usuários a “manter o foco e a presença”, ele
desliga o restante do telefone de um usuário por um determinado período
de tempo. Se você passar o tempo todo (normalmente de meia hora a duas
horas) sem desligar o cronômetro, poderá “plantar uma árvore”, mas, se
você desligar antes, a árvore pode morrer.
Então,
como isso ajuda o meio ambiente? Os usuários podem usar moedas que
ganham no aplicativo para plantar árvores reais. A Forest trabalha com
uma organização chamada “Trees for the Future” para tornar isso
possível. Assim, ao ficar longe do celular e ficar mais concentrado e
atento, você ainda pode ajudar a Terra!
DoneGood
Deseja
apoiar pequenas empresas, mas não sabe por onde começar? O DoneGood
pode ajudar! Infelizmente, muitas marcas famosas têm planos de negócios
muito duvidosos – desde o uso de fábricas a produtos que não fazem nada
para minimizar as emissões de carbono. DoneGood, que foi chamado de “A
Amazon das Boas Marcas” pela Forbes, facilita a busca dos melhores
negócios.
Basta
pesquisar no aplicativo e eles recomendarão uma pequena empresa que
está fazendo coisas ativamente para melhorar o mundo. Além do
aplicativo, existe um plug-in que recomenda alternativas sustentáveis
aos itens que um usuário está procurando e o site oferece alguns
descontos exclusivos.
Apscape
As
férias são ótimas e todo mundo precisa tirar um tempo de vez em quando –
mas fazer viagens curtas com as quais nos acostumamos, incluindo voar e
ficar em um hotel por uma ou duas noites, é muito prejudicial ao meio
ambiente. Embora nada possa replicar um feriado de verdade, o Apscape
está trabalhando para criar experiências interessantes usando a
realidade virtual. Eles têm ótimos passeios virtuais por destinos em
todo o mundo – de Cuba ao Botsuana – e estão sempre aumentando suas
ofertas.
LeoVegas
Voar para
determinados destinos apenas para jogar é incrivelmente popular –
somente Las Vegas recebeu 42,52 milhões de visitantes em 2019. Enquanto
algumas pessoas estão lá para uma viagem única na vida, o que é
completamente compreensível – muitas pessoas voam para Las Vegas
frequentemente apenas para jogar.
Vamos ser
honestos, é melhor não jogar, especialmente se você acha que corre o
risco de ficar viciado. Mas se for apenas por diversão, os aplicativos
de jogos de azar são uma boa alternativa e de baixo impacto.
Conforme
discutido, os impactos ambientais de voar são enormes – portanto, fazer
viagens de curta duração devem ser evitadas. O uso de aplicativos de
cassino como o LeoVegas, ou outros cassinos on-line, são ótimas
alternativas para visitar um lugar de jogos.
Olio
Olio
é um aplicativo de compartilhamento de itens e comida. A ideia é que,
se você tiver alguma comida que não precisa, seja porque comprou errado
ou porque não vai usar antes do prazo de validade, poderá tirar uma
foto, colocá-la no aplicativo e aguardar pessoas próximas a você
solicitarem o produto.
E é o mesmo procedimento
para itens não alimentares, se você estiver fazendo uma limpeza, basta
colocar o que você não precisa mais no aplicativo e as pessoas que
quiserem tal item enviarão uma mensagem para você combinando a retirada.
Nenhum dinheiro é trocado em Olio.
Bla Bla Car
Não
é de surpreender que os veículos causem muitas emissões, na média
produz 4,6 toneladas métricas de dióxido de carbono por ano. O
transporte público é uma ótima alternativa sustentável, mas e os lugares
em que o transporte público não acessa ou onde os destinos são
realmente caros?
Bla Bla Car é uma ótima
solução. As pessoas que desejam compartilhar uma carona e ganhar
dinheiro com combustível (observe que este não é um serviço de táxi e os
motoristas não lucram, mas devem ter sua gasolina coberta pelas taxas)
podem postar suas viagens no aplicativo e outros podem solicitar para se
juntar a eles. Um sistema de avaliação ajuda a tranquilizar as pessoas
ao se conectarem umas com as outras.
Conclusão
Atualmente,
existem tantos aplicativos que podem nos ajudar a ter um estilo de vida
mais saudável. Desde aplicativos que incentivam o compartilhamento e a
reutilização de itens, a profissionais de negócios sustentáveis e
aplicativos que tentam reduzir viagens desnecessárias, logo, isso pode
ser muito benéfico para a criação de um planeta mais ecológico.
Publicado por EcoDebate em 18 de Agosto, 2020
(Até a próxima Quarta-Feira, 26 de Agosto, 2020)
segunda-feira, 17 de agosto de 2020
O que pode ser feito nas redes sociais na pré-campanha?
O que pode ser feito nas redes sociais na pré-campanha?
A reforma eleitoral de 2015 regulamentou de forma mais detalhada as condutas dos pré-candidatos, em relação ao período que antecede a campanha eleitoral, e retirou da legislação alguns limites que restringiram a liberdade de expressão e de comunicação dos cidadãos que pretendem disputar a eleição.
Essas mudanças foram bem significativas no âmbito das redes sociais, onde ficou permitido aos pré-candidatos:
a) mencionar a pré-candidatura ao cargo desejado;
b) exaltar qualidades pessoais do pré-candidato;
c) postar textos, vídeos, fotos ou entrevistas informando a pré-candidatura, assim como o posicionamento do pré-candidato acerca de assuntos políticos (importante lembrar que política não está resumida à eleição, então é permitido discutir temas da administração pública, apresentar críticas, dizer as soluções pensadas e, inclusive, defender porquê o pré-candidato tem as condições pessoais de solucionar eventuais problemas); e
d) comunicar ações já desenvolvidas pelo pré-candidato, assim como as que se pretende desenvolver;
Na divulgação de pré-candidatura, de posição política pessoal e na exaltação das qualidades pessoais, o pré-candidato também poderá pedir apoio político da população ou de determinados setores da sociedade, mas, ressalte-se, continua vedado o pedido explícito de voto.
São exemplos de frases que podem ser usadas nas redes sociais:
a) FULANO DE TAL: pré-candidato a xxx pelo partido xxx;
b) FULANO DE TAL: a favor da construção da quadra (ou qualquer ação política) em xxx;
c) FULANO DE TAL defende a valorização do professor de xxxx;
d) FULANO DE TAL 2016;
e) FULANO DE TAL fez por xxxx (e expor ações políticas já desenvolvidas pelo pré-candidato);
f) FULANO DE TAL fará por xxxx (é permitido dizer o que se pretende fazer);
g) O melhor para xxx: FULANO DE TAL (com essa frase ou imagem é possível exaltar as qualidades pessoais do pré-candidato);
h) FULANO DE TAL quer o apoio político dos agentes de endemias de xxxx.
Em hipótese alguma, o material utilizado em redes sociais pode ser impresso para ser distribuído, muito menos propagado por carros de som, autofalantes e etc.
Também se recomenda evitar a divulgação do número do partido, pois pode ser encarado como uma forma de pedir voto.
O
Queiroz, Barbosa e Bezerra Advocacia, sediado em Natal – RN e Brasília –
DF, é um escritório que reúne advogados de elevada formação acadêmica,
capacitação técnica e experiência, com foco na prestação de serviços
jurídicos especializados, notadamente a empresários, agentes políticos,
entes e servidores públicos ativos ou inativos, bem como a outros
escritórios de advocacia em regime de parceria.
Artemisia Gentileschi, a biografia de uma pintora barroca
Artemisia Gentileschi, a biografia de uma pintora barroca
16 Junho, 2020
Artemisia Gentileschi foi uma grande artista que pintou durante o período Barroco. Filha de pai pintor e com uma relação estreita com Caravaggio, Gentileschi é uma das poucas mulheres das quais se tem registro na história da arte.
- As novas artes no mundo
- Planejamento urbano e psicologia: os espaços nos condicionam?
- Psicanálise e arte, um vínculo além do inconsciente
Artemisia Gentileschi foi uma pintora barroca do século XVI. Assim como aconteceu com muitas outras mulheres na história da arte, seu nome permaneceu oculto durante muitos anos.
Historiadores e colecionadores atribuíram as obras de Gentileschi a outros artistas homens. Assim, a vida e a obra de Artemisia Gentileschi ilustram o machismo do século XVI.
Na atualidade, Artemisia é reconhecida como uma pintora do início do barroco italiano. Suas obras mostram o caráter e as pinceladas características da época, além de uma profundidade única nos personagens.
Neste artigo, tentaremos nos aproximar dessa mulher esquecida pela história, mas que, sem dúvida, merece um espaço significativo nela.
Seu pai foi um dos principais seguidores do revolucionário pintor barroco Caravaggio. A artista foi uma importante defensora da segunda geração do dramático realismo de Caravaggio.
Artemisia mostrou rapidamente grandes dotes para a arte e começou a aprender com seu pai. Orazio era amigo de Caravaggio, o provocador e selvagem pintor à frente da cena artística de Roma.
Uma vez, Orazio e Caravaggio foram acusados de escrever um graffiti difamatório nas ruas de Roma sobre outro pintor. Durante o julgamento, Orazio contou história sobre a visita de Caravaggio à sua casa para pedir emprestadas algumas asas de anjo.
Graças a esses dados, sabemos que o grande artista deve ter mantido uma estreita relação com a família Gentileschi, e eles sugerem que a filha mais velha de Orazio, Artemisia, o teria conhecido.
Como era pupila de seu pai e do pintor de paisagens Agostino Tassi, os trabalhos de Artemisia são difíceis de distinguir desses pintores. No início, Artemisia Gentileschi pintou em um estilo que não se distingue da interpretação um tanto lírica de seu pai, seguindo Caravaggio.
Sua primeira obra conhecida é Susanna e i vecchioni (em português, Susana e os anciões, 1610), uma obra feita por ela que foi atribuída a seu pai. Também pintou duas versões de uma cena já ensaiada por Caravaggio (mas nunca tentada por seu pai), Judith decapitando a Holofernes (em português, Judith decapitando Holofernes , c. 1612-13; c. 1620).
Tassi teve contato individualmente com Artemisia e, durante uma de suas sessões de orientação, ele a estuprou. Após o estupro, Artemisia começou uma relação com Tassi pensando que ambos iam se casar.
No entanto, pouco depois Tassi se negou a casar com ela. Orazio tomou a incomum decisão de denunciá-lo pela violação, e o julgamento posterior se prolongou durante sete meses.
Artemisia era virgem até o momento do estupro que sofreu e o julgamento revelou outros detalhes escandalosos, como várias acusações de que Tassi havia assassinado sua esposa.
Como parte dos procedimentos judiciais, Artemisia teve que se submeter a exames ginecológicos para comprovar que tinha perdido a virgindade no momento do estupro. Além disso, ela foi obrigada a testemunhar sob tortura, com o objetivo de comprovar a veracidade do seu depoimento.
Para um artista, essa forma de tortura poderia ter sido devastadora, mas Artemisia, felizmente, evitou o dano permanente aos seus dedos.
Seu emocionante testemunho, no qual afirma que poderia ter matado Tassi depois do estupro, dá uma série de pistas sobre seu incomum caráter para a época e sua determinação.
Tassi, por fim, foi considerado culpado e exilado de Roma. A sentença nunca foi cumprida, já que Tassi recebeu proteção do Papa devido a sua habilidade artística.
Muitas das pinturas posteriores de Artemisia Gentileschi mostram cenas de mulheres atacadas por homens ou em posições de poder em busca de vingança.
Em Florença, Artemisia recebeu uma de suas primeiras comissões importantes, um afresco na Casa Buonarotti. O sobrinho do pintor havia transformado a casa de Michelangelo em um monumento e museu.
Em 1616, ela se uniu à Academia de Diseño de Florença, transformando-se na primeira mulher a fazer isso. Essa atitude lhe permitiu comprar seus materiais artísticos sem a permissão de seu esposo e assinar seus próprios contratos.
Ela também recebeu o apoio do Grande Duque da Toscana, Cosme II de Médici, de quem recebeu várias comissões lucrativas.
Em Florença, ela começou a desenvolver seu estilo característico. Diferentemente de muitas outras artistas do século XVII, Artemisia Gentileschi se especializou na pintura da história, em vez de natureza morta e retratos.
Em 1618, Artemisia e seu esposo tiveram uma filha, Prudentia, que recebeu o nome da falecida mãe de Artemisia. Aproximadamente nessa época, Artemisia começou um apaixonado romance com um nobre florentino chamado Francesco Maria di Niccolò Maringhi.
A história desse amor está documentada por uma série de cartas de Artemisia para Maringhi, que foram descobertas pelo acadêmico Francesco Solinas em 2011.
De modo pouco convencional, o marido de Artemisia chegou a saber sobre o assunto e usou as cartas de amor de sua esposa para obter dinheiro de Maringhi.
Na cidade, retomou contato com suas influências e as inovações de Caravaggio. Além disso, trabalhou com vários de seus seguidores, incluindo o pintor Simon Vouet.
Não teve tanto sucesso em Roma como havia esperado, e até o final da década passou algum tempo em Veneza, provavelmente em busca de novas comissões.
As cores de Artemisia Gentileschi eram mais brilhantes que as de seu pai. No entanto, continuou fazendo uso do sombrio popularizado por Caravaggio muito depois de seu pai já ter abandonado esse estilo.
Pai e filha colaboraram nas pinturas do teto do Grande Salão na Casa da Rainha Henrietta Maria, esposa do Rei Carlos I, em Greenwich. Depois da morte de seu pai em 1639, ela continuou em Londres por mais alguns anos.
Enquanto estava nessa cidade, Artemisia pintou algumas de suas obras mais famosas, incluindo seu Autoritratto come allegoria della Pittura (em português, Autorretrato como alegoria da pintura, 1638).
Segundo seu biógrafo, Baldinucci (que anexou a vida de Artemisia à biografia de seu pai), a artista pintou muitos retratos e superou rapidamente a fama de seu pai.
Mais tarde, por volta de 1640 ou 1641, ela se estabeleceu em Nápoles, onde pintou várias versões da história de David e Betsabé, mas pouco se sabe dos últimos anos de sua vida. A última correspondência data de 1650 e implica que ela ainda estava trabalhando ativamente.
A data de sua morte é incerta. Há algumas evidências que sugerem que ainda trabalhava em Nápoles em 1654. Assim, especulou-se que pode ter morrido como consequência da praga que devastou a cidade em 1656.
Isso se deve, em parte, ao fato de que seu estilo era frequentemente parecido ao de seu pai. Consequentemente, muitas de suas obras foram atribuídas a Orazio.
O trabalho de Artemisia foi redescoberto no início de 1900 e foi particularmente defendido por Roberto Longhi, estudioso de Caravaggio.
Nas décadas de 1970 e 1980, algumas historiadoras de arte feministas, como Mary Garrard e Linda Nochlin, defenderam a artista. As historiadoras se focaram em suas importantes conquistas artísticas e sua influência ao longo da história da arte, mais do que em sua biografia.
Historiadores e colecionadores atribuíram as obras de Gentileschi a outros artistas homens. Assim, a vida e a obra de Artemisia Gentileschi ilustram o machismo do século XVI.
Na atualidade, Artemisia é reconhecida como uma pintora do início do barroco italiano. Suas obras mostram o caráter e as pinceladas características da época, além de uma profundidade única nos personagens.
Neste artigo, tentaremos nos aproximar dessa mulher esquecida pela história, mas que, sem dúvida, merece um espaço significativo nela.
Infância e juventude de Artemisia Gentileschi
Artemisia Gentileschi nasceu em 8 de julho de 1593 em Roma, na região conhecida como Estados Papais, na Itália. Foi a talentosa primogênita de Prudentia Montone, que faleceu quando Artemisia tinha 12 anos, e Orazio Gentileschi, um conhecido pintor.Seu pai foi um dos principais seguidores do revolucionário pintor barroco Caravaggio. A artista foi uma importante defensora da segunda geração do dramático realismo de Caravaggio.
Artemisia mostrou rapidamente grandes dotes para a arte e começou a aprender com seu pai. Orazio era amigo de Caravaggio, o provocador e selvagem pintor à frente da cena artística de Roma.
Uma vez, Orazio e Caravaggio foram acusados de escrever um graffiti difamatório nas ruas de Roma sobre outro pintor. Durante o julgamento, Orazio contou história sobre a visita de Caravaggio à sua casa para pedir emprestadas algumas asas de anjo.
Graças a esses dados, sabemos que o grande artista deve ter mantido uma estreita relação com a família Gentileschi, e eles sugerem que a filha mais velha de Orazio, Artemisia, o teria conhecido.
Como era pupila de seu pai e do pintor de paisagens Agostino Tassi, os trabalhos de Artemisia são difíceis de distinguir desses pintores. No início, Artemisia Gentileschi pintou em um estilo que não se distingue da interpretação um tanto lírica de seu pai, seguindo Caravaggio.
Sua primeira obra conhecida é Susanna e i vecchioni (em português, Susana e os anciões, 1610), uma obra feita por ela que foi atribuída a seu pai. Também pintou duas versões de uma cena já ensaiada por Caravaggio (mas nunca tentada por seu pai), Judith decapitando a Holofernes (em português, Judith decapitando Holofernes , c. 1612-13; c. 1620).
Artemisia Gentileschi, uma vítima de abuso
Em 1611, Orazio foi contratado para decorar o Palazzo Pallavicini-Rospigliosi em Roma, juntamente com o pintor Agostino Tassi. Com a esperança de ajudar Artemisia, que à época tinha 17 anos, a aperfeiçoar sua técnica de pintura, Orazio contratou Tassi para que a ajudasse.Tassi teve contato individualmente com Artemisia e, durante uma de suas sessões de orientação, ele a estuprou. Após o estupro, Artemisia começou uma relação com Tassi pensando que ambos iam se casar.
No entanto, pouco depois Tassi se negou a casar com ela. Orazio tomou a incomum decisão de denunciá-lo pela violação, e o julgamento posterior se prolongou durante sete meses.
Artemisia era virgem até o momento do estupro que sofreu e o julgamento revelou outros detalhes escandalosos, como várias acusações de que Tassi havia assassinado sua esposa.
Como parte dos procedimentos judiciais, Artemisia teve que se submeter a exames ginecológicos para comprovar que tinha perdido a virgindade no momento do estupro. Além disso, ela foi obrigada a testemunhar sob tortura, com o objetivo de comprovar a veracidade do seu depoimento.
Para um artista, essa forma de tortura poderia ter sido devastadora, mas Artemisia, felizmente, evitou o dano permanente aos seus dedos.
Seu emocionante testemunho, no qual afirma que poderia ter matado Tassi depois do estupro, dá uma série de pistas sobre seu incomum caráter para a época e sua determinação.
Tassi, por fim, foi considerado culpado e exilado de Roma. A sentença nunca foi cumprida, já que Tassi recebeu proteção do Papa devido a sua habilidade artística.
Muitas das pinturas posteriores de Artemisia Gentileschi mostram cenas de mulheres atacadas por homens ou em posições de poder em busca de vingança.
Gentileschi em Florença sob a proteção dos Médici
Um mês depois de dar por concluído o julgamento, Orazio fez os acordos para que Artemisia se casasse com o artista Pierantonio Stiattesi. Posteriormente, o casal se mudou para a cidade natal de Stiattesi, Florença.Em Florença, Artemisia recebeu uma de suas primeiras comissões importantes, um afresco na Casa Buonarotti. O sobrinho do pintor havia transformado a casa de Michelangelo em um monumento e museu.
Em 1616, ela se uniu à Academia de Diseño de Florença, transformando-se na primeira mulher a fazer isso. Essa atitude lhe permitiu comprar seus materiais artísticos sem a permissão de seu esposo e assinar seus próprios contratos.
Ela também recebeu o apoio do Grande Duque da Toscana, Cosme II de Médici, de quem recebeu várias comissões lucrativas.
Em Florença, ela começou a desenvolver seu estilo característico. Diferentemente de muitas outras artistas do século XVII, Artemisia Gentileschi se especializou na pintura da história, em vez de natureza morta e retratos.
Em 1618, Artemisia e seu esposo tiveram uma filha, Prudentia, que recebeu o nome da falecida mãe de Artemisia. Aproximadamente nessa época, Artemisia começou um apaixonado romance com um nobre florentino chamado Francesco Maria di Niccolò Maringhi.
A história desse amor está documentada por uma série de cartas de Artemisia para Maringhi, que foram descobertas pelo acadêmico Francesco Solinas em 2011.
De modo pouco convencional, o marido de Artemisia chegou a saber sobre o assunto e usou as cartas de amor de sua esposa para obter dinheiro de Maringhi.
“Excelência, mostrarei o que uma mulher pode fazer”.O nobre Maringhi foi parcialmente responsável por sustentar o casal financeiramente. As finanças eram uma preocupação frequente para eles devido à má administração do dinheiro por parte de Stiattesi.
-Artemisia Gentileschi-
Retorno a Roma, retorno a Caravaggio
Os problemas financeiros, sem contar os rumores generalizados sobre o romance de Artemisia, provocaram desentendimentos entre o casal e, em 1621, Artemisia voltou à Roma sem seu marido.Na cidade, retomou contato com suas influências e as inovações de Caravaggio. Além disso, trabalhou com vários de seus seguidores, incluindo o pintor Simon Vouet.
Não teve tanto sucesso em Roma como havia esperado, e até o final da década passou algum tempo em Veneza, provavelmente em busca de novas comissões.
As cores de Artemisia Gentileschi eram mais brilhantes que as de seu pai. No entanto, continuou fazendo uso do sombrio popularizado por Caravaggio muito depois de seu pai já ter abandonado esse estilo.
Na corte inglesa: período tardio
Por volta de 1630, mudou-se para Nápoles, e em 1638 chegou a Londres, onde trabalhou com seu pai para o rei Carlos I.Pai e filha colaboraram nas pinturas do teto do Grande Salão na Casa da Rainha Henrietta Maria, esposa do Rei Carlos I, em Greenwich. Depois da morte de seu pai em 1639, ela continuou em Londres por mais alguns anos.
Enquanto estava nessa cidade, Artemisia pintou algumas de suas obras mais famosas, incluindo seu Autoritratto come allegoria della Pittura (em português, Autorretrato como alegoria da pintura, 1638).
Segundo seu biógrafo, Baldinucci (que anexou a vida de Artemisia à biografia de seu pai), a artista pintou muitos retratos e superou rapidamente a fama de seu pai.
Mais tarde, por volta de 1640 ou 1641, ela se estabeleceu em Nápoles, onde pintou várias versões da história de David e Betsabé, mas pouco se sabe dos últimos anos de sua vida. A última correspondência data de 1650 e implica que ela ainda estava trabalhando ativamente.
A data de sua morte é incerta. Há algumas evidências que sugerem que ainda trabalhava em Nápoles em 1654. Assim, especulou-se que pode ter morrido como consequência da praga que devastou a cidade em 1656.
O legado de Artemisia Gentileschi
O legado de Artemisia Gentileschi foi controverso e complexo. Embora tenha sido muito respeitada e conhecida durante sua vida, após usa morte foi omitida quase por completo dos relatos históricos da arte da época.Isso se deve, em parte, ao fato de que seu estilo era frequentemente parecido ao de seu pai. Consequentemente, muitas de suas obras foram atribuídas a Orazio.
O trabalho de Artemisia foi redescoberto no início de 1900 e foi particularmente defendido por Roberto Longhi, estudioso de Caravaggio.
“Enquanto viver, terei o controle sobre o meu ser”.Os relatos acadêmicos e populares de sua vida e pintura, no entanto, estão marcados por interpretações exageradas e muito sexualizadas. De certo modo, isso se deve à difusão de um romance sensacionalista sobre Artemisia, publicado pela esposa de Longhi, Anna Banti, em 1947.
-Artemisia Gentileschi-
Nas décadas de 1970 e 1980, algumas historiadoras de arte feministas, como Mary Garrard e Linda Nochlin, defenderam a artista. As historiadoras se focaram em suas importantes conquistas artísticas e sua influência ao longo da história da arte, mais do que em sua biografia.
domingo, 16 de agosto de 2020
Qual o país “mais sofrido do mundo”? E países em guerra conseguiram algum “cessar-fogo” durante a pandemia?
Qual o país “mais sofrido do mundo”? E países em guerra conseguiram algum “cessar-fogo” durante a pandemia?
Um dia desses de quarentena, tava eu perdida em 70.000 pensamentos (se bem que isso aí é todo dia
na quarentena, que tá dando mais tempo pra pensar), e me veio um
pensamento desses que fixam: será que a pandemia teria trazido um mínimo
“cessar-fogo” em algumas regiões em conflito no mundo?
Será que países que vivenciam guerras e conflitos brutais teriam ao menos reduzido um pouquinho
esses conflitos em razão da pandemia? Eu não fazia ideia (apesar da
notícia sobre o “reaquecimento” recente do conflito entre China e Índia
já nos dar alguma ideia) e fiquei curiosa num nível daqueles que você
pensa “se não souber isso não durmo hoje”, sabe como?
Fui perguntar pra quem sabia.
Sujeito sempre prestativo, que responde qualquer pergunta na mesma
hora – muito diferente de mim, desorganizada e desnaturada, que tô
levando em média 3 semanas pra ler as redes sociais. Se chama Google, me
amarro nele.
O dia em que ele falhou
Mas pela primeira vez na minha vida e talvez da vida do Google, em português, ele não soube me responder muito bem.
Encontrei poucas matérias sobre conflitos nesse momento específico
atual, a maioria sem detalhes, com não muito mais que 4 parágrafos.
Isso me fez pensar (“ih não, de novo“) como é
curioso que nós, brasileiros, gostamos bastante de apontar os EUA ou
países europeus como “etnocêntricos” e “autocentrados”. Reclamamos que
muitos por lá não sabem, por exemplo, que “brasileiros não falam espanhol”, ou que “a capital do Brasil não é Buenos Aires” (o Karnal faz uma reflexão muito boa sobre isso nesse livro, inclusive), mas a gente aqui sabe tão pouco sobre o resto do mundo.
E o oscar de “país mais sofrido” vai para…
E foi aí que, pesquisando mais um bocado sobre “houve algum
cessar-fogo – um ‘cessarzinho-de-foguinho’ que seja – na guerras civis
em curso durante a pandemia?”, eu descobri que a situação inclusive piorou em muitos.
Pra explicar como algo já horrível pode ficar pior, vou usar como
exemplo o Iêmen, que é considerado o país mais necessitado de ajuda
humanitária hoje.
Hoje, ninguém no Iêmen tá muito preocupado com a pandemia.
Fazendo um resumo porco e provavelmente impreciso da Guerra no Iêmen
(prometo bolar um maior depois): o conflito no país se dá, basicamente,
entre houthis (na maioria xiitas) VS sunitas. Pra engrossar o caldo da confusão: o Irã apoia os houthis (o Irã é xiita também) e a Arábia Saudita apoia os sunitas (a Arábia Saudita é sunita também).
Com a pandemia, a Arábia Saudita deu um “pause” nesse apoio aos sunitas, pra se dedicar às questões da pandemia no próprio país. E aí os houthis aproveitaram e tomaram mais as cidades.
Logo, nesse exato momento, não tem gente no Iêmen preocupada com o sobrecarregamento dos hospitais pela pandemia porque os hospitais do Iêmen já foram destruídos por bombas mesmo ou estão entubados de gente jogada nos chão dos corredores – obviamente não tem cama e alguns hospitais tem rombos nos seus tetos – por conta desses bombardeios, perseguições e conflitos violentos que perduram desde 2015.
Muitas pessoas do Iêmen seguem sem opção de “#ficaemcasa” porque, por
exemplo, um míssil caiu na casa de boa parte delas. E caiu
provavelmente arrancando algum membro, alguma vida ou levou mais um pai
de mais uma criança de 11 anos – que agora se tornou chefe de família
por ser a mais velha que restou viva entre os irmãos menores,
traumatizados e subnutridos.
E não são só eles que estão traumatizados e subnutridos: é 80% da população no Iêmen – infelizmente esse número tá certo, 80% – que depende de ajuda humanitária pra viver. SAP: é quase um país inteiro
sofrendo em níveis que eu não faço a menor ideia de como sejam. Há quem
diga que o Iêmen – um país que, inclusive, tem muita beleza e riqueza
cultural – está muito próximo de desaparecer.
Logo, a mortalidade do coronavírus no Iêmen
provavelmente seria de 80% mesmo, uma vez que pessoas subnutridas tem
menos chances de sobreviver até às infecções bem simples, algo causado
por “comer uma comida levemente azeda” – e muitos, na maioria dos dias,
não tem nem a azeda pra comer.
E vai ver o vírus nem se espalharia tanto lá por isso: além do fluxo de pessoas viajando pro Iêmen ser menor, claro, as pessoas morrem antes de transmitir.
E agora é a parte que nós, brasileiros (e pessoas de todas as
nacionalidades sem ser as iemenitas), ficamos pasmos: as pessoas no
Iêmen também tem glândula lacrimal, terminações nervosas e são
sencientes, logo, elas também choram, sentem dor e sofrem.
E pasmemos (2): elas também tem capacidade de fazer duas coisas ao mesmo tempo (às vezes até 12), logo, elas choram e sofrem enquanto
elas correm da casa desmoronando, sentem fome, tentam tirar os pais dos
escombros e carregam os filhos que perderam a perna com as poucas
forças que tem, porque não comem há dias e não recebem salários
(funcionários públicos e professores, por exemplo, estão sem receber
salário regular lá há anos), tudo ao mesmo tempo.
Devem ter mais de 7 milhões só lá chorando de soluçar agora, nesse exato minuto, por qualquer motivo que a gente não faz a menor ideia de como seja.
Enquanto acreditamos ser os únicos e maiores sofredores/perdedores do mundo com uma pandemia, ignorando o “pan” no
nome, muitos desses países que ignoramos, ou não compreendemos, ou não
fazemos um esforço pra compreender a história, não podem fazer campanha
de “lave sempre as mãos”, porque bombas destruíram encanamentos e agora
eles não tem acesso à água de forma tão simples (nunca tiveram, só piorou), como muitos de nós, que não só temos mais acesso à água, como às vezes podemos escolher se vamos lavar as mãos com sabonete líquido ou em barra (há ainda quem viva o profundo dilema entre escolher entre granado ou dove – “oh, céus, qual será mais cheiroso?”).
E a resposta pro país mais sofrido é: não faço a menor ideia, se você souber envia nos comentários. Só tenho a leve desconfiança que não somos nós.
[Se tiver interesse e condições de ajudar o Iêmen, esse é o link da WFP]
E o oscar de “país mais autocentrado” vai para…
Provavelmente somos tão concentrados em nossos umbigos quanto qualquer país:
não fazemos muita ideia do sofrimento imenso dos rohingyas no Myanmar
(eu sequer tenho certeza se escrevi os nomes “rohingya” e “Myanmar”
certo), da situação de mais de 30 milhões de curdos,
desse conflito no Iêmen e suas consequências brutais, e que dirá de
Mali, Burkina Faso, Líbia; em nossa maioria não compreendemos todos os
592.623.817 grupos que se combatem (e por que se combatem) na Síria e
arruínam (quando não tiram) a vida dos civis – e inclusive, por nem
sabermos quantos grupos são, arredondamos pra “592.623.817”; e, falando
em Síria, nem imaginamos que os ataques terroristas na Ucrânia superam os da própria Síria.
Escrevemos tranquilamente em nossos blogs enquanto blogueiros são presos por 10 anos e levam 1000 chibatadas até as costas sangrarem com uma plateia assistindo na Arábia Saudita por tecerem comentários que incomodaram o governo; não fazemos a menor ideia que homossexuais estão sendo fuzilados na Palestina agora mesmo, presos e condenados à morte no Irã; pessoas estão sendo presas por beber, meninas de 6 anos são sequestradas na China para casarem com filhos da família sequestradora no futuro, indianas são agredidas, mutiladas, deformadas ou assassinadas por terem filhas,
e não filhos. E nem precisaríamos ir tão longe: na nossa América do sul
mesmo (que inclusive amo bastante e vivo babando aqui), temos casos de
violações diárias de direitos humanos.
A explicação é meio simples: são oferecidas mais notícias do que se tem mais demanda. E você lembra a última vez que buscou “Iêmen” no google? Mas e “Estados Unidos”? E algum país da Europa? E notícias do seu país? E da sua cidade? E depois de fazer a conta de cada um: você ainda acha que o “defeito” (diria que tá mais pra “característica quase inevitável”) do “etnocentrismo” e “autocentrismo” é só de europeu e estadunidense?
E quando sabemos dessas coisas? Como agimos? Procuramos vilões, claro. Bora gastar a energia em procurar culpados ao invés de buscar soluções, vem comigo, “iupii”:
E o oscar de “país vilão” vai para…
Muitos acreditam que “o problema do mundo é a religião” (a alheia, claro, porque a nossa religião ou o nossa não-religião
ou absoluta descrença, julgamos como a única forma correta de ver o
mundo, afinal, somos os bonzões, os letrados, os sensatos, os sei lá,
somos o Goku da inteligência, os iluminados pelo esclarecimento
civilizatório ocidental, uhu, “como é bom ser superior, kamehameha”) –
que a religião é a culpada por todos os conflitos, e não que algumas pessoas – e não todas – interpretam as escrituras de sua religião de forma a gerarem esses conflitos.
E inclusive, uma minoria delas que faz isso. A maioria preferia
viver em paz, exatamente igual aos ateus, agnósticos ou pessoas sem
religião ou de qualquer outra religião que ainda não fizeram essa conta.
E, gênios civilizados que somos, quando tentamos combater o radicalismo, que parece ser o problema central em todos os maiores conflitos atuais, como agimos? Somos radicais em nossas generalizações, radicais em nossas exposições de ideias, e desmoralizamos a ponderação.
Também achamos que judeus são os vilões e árabes são os mocinhos – ou vice-versa – sem perceber que a história é muito mais complexa, que não fazemos ideia do que ambos os lados sentem e vivem, e que inclusive, essa percepção da posição de mocinho e vilão pode se alternar ao longo da história, não sendo tão clara e definitiva como muitos acreditam.
E claro, chamamos todos os descendentes de asiáticos de “japa”, até porque ignoramos a história de conflito (muitos deles que até hoje não foram plenamente resolvidos) entre países asiáticos, que torna essa equiparação ofensiva (e
nem precisaríamos saber da história: seria só lembrar que, como
brasileiros, não gostaríamos de ser confundidos com argentinos,
mexicanos, uruguaios, com a justificativa de que, afinal, “é tudo igual, tudo latino”).
E o oscar de “país mocinho” vai para…
Não enxergamos qualquer possível “brasileirocentrismo” atualmente,
porque estamos muito ocupados nos sentindo o centro do mundo – afinal, somos mesmo o centro do nosso mundo – estamos ocupados definindo outros países (e pessoas, como não?) como mocinhos ou vilões, chamando os outros de civilizados ou bárbaros, de acordo com nossa perspectiva.
Até porque, não teria como ser diferente. Se sou Zé das Couves, como terei a perspectiva de Zé do Alface? A única forma seria ouvindo
o Zé do Alface – e mesmo assim, eu não teria a visão dele, porque ainda
sou eu. E imagina se vou fazer um negócio desse? Zé do Alface é o
vilão. Zé da Rúcula que é o herói.
Em um mundo tão plural, tão gigante, tão absurdamente diferente a
cada km que se anda, de tantas visões possíveis, é estranho que a gente
tenha tanta certeza de tantas coisas. Que a gente não se questione “será
que tô certo?”, “será que só o outro é o vilão?”, “será que sou o
mocinho?”, “será que sou o monopolizador da bondade humana?” em momento
algum.
E a resposta pra “quem é o “mocinho” é: talvez ninguém e todo mundo.
Essas percepções se alternam ao longo da história. A gente pode ver,
em um único contexto, povos sendo subjugados e subjugando ao mesmo tempo. Sofrendo e fazendo sofrer. Fazendo o bem e o mal. Um exemplo que já escrevi sobre aqui
é o do Japão que sofreu com o expansionismo dos EUA e logo depois
invadiu países asiáticos de forma até mais grave – e mais tempo depois
já tava o Japão sofrendo de novo levando 2 bombas nucleares, olha que
surreal – e aí? Quem é mocinho? Quem é vilão? É rodízio? Alguém tá
medindo o sofrimento que determinados países infligem e são infligidos
com uma régua? Como que fica isso aí?
E o oscar de “o país mais polarizado” vai para…
De fato a gente parece que curte polarizar nosso mundo, criando uma
barreira entre o “bom” e “ruim”, “mocinho” e “vilão”, onde dificilmente a
gente admite que pode estar errado ou que, por mais certo que esteja,
poderia ponderar e tentar entender o outro lado – e aí sim, concluir
que realmente, o outro tá errado naquele momento (e cabe ressaltar o “naquele momento”, porque somos capazes de fazer coisas muito boas e muito ruins às vezes com um intervalo de tempo de só 5 minutos).
E a menos que você esteja presenciando alguém com uma bazuca matando
18 pessoas ou promovendo o genocídio com um cartaz, são raros os casos
em que a gente não tem condições de ouvir o outro. Só são muitos os momentos em que a gente só não quer.
Reclamamos do radicalismo e do extremismo, e seguimos, nós mesmos, eu
daqui, você daí, aplicando um olhar cada vez mais extremo pras
situações, potencializado pela pandemia estressante (ou o estresse
pandêmico). Das coisas pequenas às grandes: pessoas se julgam superiores
ou inferiores até por quem a outra votou no Big Brother (ou se a outra assistiu Big Brother, porque aí você acredita que é superior porque escolheu outra forma de entretenimento, tipo assistir série inglesa).
A pandemia tem nos mostrado bastante essa falta de paciência com as
diferenças, e às vezes nos bate aquele receio que, se as pessoas não
morrerem ou se matarem em razão de doença, fome ou desespero, vão acabar
se matando com cabos de panela em razão de discussões que escalam cada
vez mais rapidamente pra agressão verbal ou física.
E bora lembrar de um exemplo esdrúxulo e absolutamente exagerado aqui, de gente que provavelmente se achava muito certa e era indisposta a ceder: Hitler (sempre falta criatividade nesses exemplos de “grandes cometedores de erros da humanidade”, né, foi mal) amava a arte e os animais enquanto ironicamente destinava aos judeus um destino tão cruel quanto os de animais que viram vitela e foie gras; Stalin jurava que o seu regime era destinado à salvação da população sofrida e faminta enquanto promovia um genocídio famélico na Ucrânia e ainda mandava civis pra morrerem de fome na Sibéria. Ninguém avisou esses caras que eles tavam errados
– quem tentou avisar eles deram “unfollow” numa versão mais radical,
claro. Ninguém vai te avisar também – quem tentar avisar você dá
unfollow – na forma menos radical, espero – ou block.
Com o tempo a gente só se rodeia de gente (quanto “gente” nessa frase) pra bater palma pras nossas falas, e nem sabemos
mais quando elas são incoerentes, quando nossos discursos não batem
mais com nossas ações, quando nossa intenção é maculada pelo forma de
atingi-la, porque ninguém vai ter coragem de falar.
E novamente, isso não é um problema só dos brasileiros. Se acreditássemos que só brasileiros vivem um momento de polarização, de falta de vontade pra ouvir e radicalização de todos os lados, estaríamos incorrendo novamente no autocentrismo, de achar que só nós
lidamos com esses problemas – e também de ignorar que temos um mundo
quase inteiro vivendo uma onda de radicalismo de todos os lados
possíveis (tem bomba vindo da esquerda, da direita, de cima e de baixo –
em alguns locais literalmente). Se nós, “brasileiros”, não monopolizamos as virtudes, também não monopolizamos os defeitos e nem os problemas desse mundo.
Então talvez também já possamos parar de afirmar com tanta convicção
que “brasileiro é burro/ brasileiro é polarizado/ brasileiro é
irresponsável/ brasileiro é pior que o país X”. Feliz ou infelizmente,
defeitos (e qualidades) não são licitados em cota de exclusividade pro Brasil ou qualquer país específico.
Conclusão
O que concluo nesse texto gigante é que, na verdade, acho difícil concluir qualquer coisa, eu só queria escrever mesmo.
Se há algo que sei lá quantos anos de história da humanidade
nos mostra, novamente, é que na vida não há mocinhos e vilões de forma
tão clara e definitiva como nos filmes (e até o mocinho do filme deve
ter feito uma coisa pavorosa e o vilão fez algo maneiríssimo, isso só
não foi mostrado com ênfase).
É mais provável que todo mundo tenha muito a aprender com a história
do outro, e que todo sofrimento deva ser levado em consideração, pra que
a gente possa impedir a repetição. Que todo sucesso seja analisado, pra
que a gente possa compreender os caminhos até se chegar nele.
Além disso, a única certeza que defendo, no entanto, é que o Brasil tem os melhores memes
e a melhor culinária, e isso não tá pra discussão. Aqui tem paçoca,
brigadeiro, queijo com goiabada e pão de queijo. Além dos comerciais do
guaraná Dolly – o sabor brasileiro. A única coisa que nos falta é
ponderação – mas isso falta a todos nós, humanos, e não “nós, brasileiros“.
E é isso. Acabei de escrever umas 3000 palavras sobre tudo e nada ao
mesmo tempo. Até o próximo post em que pode ser que eu fale do Iêmen ou
de uma receita de pudim, ou do Curdistão ou de paçoca.
[Se sentir vontade de ajudar o Iêmen e tiver condições, doando ou divulgando, aqui tem o link da WFP pra fazer da forma mais rápida possível].
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