terça-feira, 4 de agosto de 2020

Transtorno histriônico: quando ser o centro das atenções é uma necessidade

Transtorno histriônico: quando ser o centro das atenções é uma necessidade

Mais do que buscar pelos holofotes: o histriônico precisa ter atenção para estar feliz - iStock
Mais do que buscar pelos holofotes: o histriônico precisa ter atenção para estar feliz Imagem: iStock

Sibele Oliveira

Colaboração para o VivaBem

30/07/2020 04h00

Resumo da notícia

  • O histriônico precisa ser visto e valorizado o tempo todo para se sentir bem
  • Uma de suas características mais marcantes é o jeito de falar teatral e a dramaticidade de suas emoções
  • É extremamente sedutor, tem um comportamento sexual ousado e vive à procura de excitação
  • As frustrações que o histriônico coleciona ao longo da vida podem levá-lo à depressão, ansiedade, bipolaridade e transtornos alimentares
  • Não tem cura, mas o tratamento psicoterápico o ajuda a se sentir melhor e a conviver de maneira mais harmônica com os outros

Sabe aquelas pessoas que fazem tudo para ser o centro das atenções? Para elas, não há limites quando o que está em jogo é atrair todos os olhares para si, receber elogios e ser um destaque absoluto. Quem tem o transtorno de personalidade histriônica é assim o tempo todo. Age como se a vida fosse uma eterna noite de estreia de um espetáculo de sucesso, onde espera aplausos calorosos. Para consegui-los vale chorar, desmaiar, vestir-se de forma extravagante, abusar da sedução e derramar as emoções como nos grandes dramalhões

[ x ]

O transtorno, classificado no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5ª Edição (DSM-5) faz parte do grupo B, que também inclui o narcisista, o antissocial e o borderline. Bruno Netto Reys, psiquiatra, psicanalista e professor do departamento de psiquiatria da faculdade de medicina da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), afirma que os histriônicos representam aproximadamente 3% da população -ou seja, cerca de 3 a cada 100 pessoas. Sua causa ainda é desconhecida, mas especialistas acreditam que pode haver uma suscetibilidade genética e influência do meio externo.

À primeira vista, o exagero emocional do histriônico parece algo feito de propósito. Como uma estratégia que ele usa para ser mais visto e reconhecido do que os outros. Mas isso não verdade. Ser o centro das atenções não é um capricho dele, mas uma necessidade vital como respirar. Quando fica em segundo plano, seu mundo desaba e ele sente que falta um chão para pisar. Por isso, não mede esforços para manter-se sempre em evidência.

"Os histriônicos ficam seguros quando são o centro das atenções. Quando não são, ficam extremamente incomodados, sentem um desconforto muito grande, quase que um aniquilamento", resume Erlei Sassi, coordenador do Ambulatório de Transtornos de Personalidade do IPq da HC-FMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo). Isso acontece no trabalho, nos relacionamentos amorosos, entre familiares e amigos e até mesmo no meio de estranhos.

Pessoas com esse transtorno têm uma baixa tolerância à frustração. Ficam entediadas facilmente, não lidam bem com a rotina e vivem à procura de excitação. O sofrimento no qual elas mergulham quando não são notadas faz com que tenham um humor instável e reativo, de acordo com o especialista. Para evitar que alguém brilhe mais do que ele, o histriônico aposta suas fichas na aparência física. Não raro recorre a vários procedimentos estéticos, segue dietas rigorosas, fica obcecado por exercícios físicos e usa roupas provocantes.

Como reconhecer uma pessoa histriônica?

Personalidade histriônica - iStock - iStock
Já conheceu aquela pessoa que adora estar nos centros das atenções, não importa como?
Imagem: iStock

Além do exibicionismo visual, ele fala de forma vigorosa, gesticula muito e expõe suas emoções de um jeito dramático, teatral, beirando o caricato. Também é conquistador, desinibido e tem a sexualidade à flor da pele, demonstrada inclusive em lugares inadequados, como o ambiente de trabalho. Ainda que pareça muito intenso, costuma ser emocionalmente superficial e percebe a realidade de uma maneira particular. É comum, por exemplo, o histriônico acabar de conhecer uma pessoa, já considerá-la íntima e exigir que ela se comporte como tal.

Quando isso não acontece, é um balde de água fria e ele se decepciona, até porque é dependente de provas de amor. Como o histriônico tem baixa tolerância à frustração, seus relacionamentos acabam não sendo muito tranquilos. Apesar de toda essa cobrança, ele muda de emoção como quem troca de roupa. Geralmente coleciona vários parceiros amorosos e não permanece muito tempo com nenhum deles, porque é movido à excitação. A paixão profunda que sente no início acaba de repente, pois deixa de ser novidade.

Com esse perfil, pode parecer lógico deduzir que pessoas com esse transtorno não ligam para o que as outras pensam a seu respeito. Mas é exatamente ao contrário. Elas se importam com a opinião alheia. E muito. Apesar de parecerem seguras de si, no fundo são bastante sugestionáveis, vivem em busca de apoio e aprovação e têm medo de ser abandonadas. Por outro lado são impulsivas, têm aversão a críticas e seus discursos são vagos e difusos.

Não começa da noite para o dia

Antes de entrar no mundo do histriônico, é importante entender o que é um transtorno de personalidade. "É uma forma de perceber, sentir e se relacionar, que traz sofrimento para a pessoa quem tem o transtorno e para as que a cercam", define Sassi. Ele salienta que a personalidade é formada pelo temperamento e caráter, que vamos desenvolvendo ao longo da vida.

"Especificamente o caráter pode ter traços que trazem sofrimento para a pessoa por conta da adaptação, que é fora da média".
Ou seja, essas pessoas têm um comportamento inflexível, que raramente muda. "Uma pessoa que não tem um transtorno vai se moldando de acordo com a experiência, se adaptando a uma realidade. A dificuldade no transtorno de personalidade é justamente a moderação, aprender com a experiência. A pessoa mantém esse padrão rígido", diferencia Reys.

Esse padrão se estende aos pensamentos, emoções e comportamentos. E afeta a maneira como a pessoa vê o mundo e se relaciona com quem está ao seu redor. Geralmente os primeiros sinais dos transtornos de personalidade começam cedo, ainda na infância, e vão se tornando mais nítidos no decorrer do tempo. Mas o diagnóstico só é feito entre o final da adolescência e o início da vida adulta.

No caso dos histriônicos, o transtorno foi baseado na histeria, um distúrbio comum entre as mulheres do século 19. Antigamente acreditava-se que a energia vital do útero se deslocava para outras partes do corpo provocando ataques histéricos. Mais tarde, Jean-Martin Charcot, o "pai" da neurologia, descobriu que a histeria tinha uma origem psíquica, e seu aluno Sigmund Freud demonstrou que ela era causada por traumas sexuais.

O termo histriônico é derivado da palavra histrião. Um de seus significados é "palhaço" e ela se refere aos comediantes que representavam fábulas e farsas na Roma Antiga. Pessoas com esse transtorno são assim. Capricham na "atuação" para ganhar a admiração das pessoas. Por sua alta carga de dramaticidade, muitas vezes não são levadas a sério. E em vez de atrair as atenções, acabam repelindo. Outras vezes o afastamento se dá porque elas são consideradas grudentas, chatas ou dão vexame. Isso lhes causa um sofrimento profundo.

Personalidade histriônica - iStock - iStock
Quando a atenção não é obtida, eles podem ficar bastante chateados, e até violentos
Imagem: iStock

Para evitar a indiferença, elas podem lançar mão de recursos como mentir, difamar, distorcer os fatos e fazer com que o outro sinta culpa e remorso. Esse mecanismo de manipulação emocional vem da necessidade de ser o centro das atenções, e nem sempre é consciente. Em casos mais graves, o histriônico pode ameaçar ou tentar o suicídio para alcançar seu objetivo.

"Tem a ver com as relações que a pessoa estabeleceu ao longo da vida, a partir da infância. Um comportamento que se estrutura até o final da adolescência, início da vida adulta. O relacionamento dela com os pais, com as pessoas que foram importantes na infância e na adolescência acabam gerando essa forma de se comportar", explica Reys. É bom ficar atento às crianças que se tornam muito dependentes de gratificação, pois elas podem se tornar adultos histriônicos.

Consequências sérias

  • Depressão: as frustrações que o histriônico vai acumulando na vida podem levá-lo ao esgotamento e à depressão, que pode ser profunda, pois se agrava com o tempo.
  • Ansiedade: quando não consegue a atenção que tanto deseja, ele vai ficando cada vez mais ansioso
  • Bipolaridade: por viver uma gangorra de emoções, o histriônico pode desenvolver a bipolaridade. Ou seja, viver alternando os estados de euforia e depressão.
  • Transtornos alimentares: A obsessão pela aparência perfeita pode levar o histriônico a ter distúrbios como anorexia e bulimia.

Diante do espelho

Personalidade histriônica - iStock - iStock
Pode até parece autoestima demais, mas não se engane! Normalmente eles precisam da aprovação do outro para se sentir bem
Imagem: iStock

Ao mesmo tempo em que sentem orgulho de sua personalidade e imagem, pessoas com esse transtorno não têm uma autoestima sólida como parece. Precisam da valorização dos outros para mantê-la intacta, caso contrário, ela pode ruir como um castelo de cartas. "É algo muito oscilante porque o histriônico é influenciado pelo que ouve das pessoas. Ele não tem uma instabilidade tão grande da imagem quanto o borderline, mas também não tem uma estabilidade tão grande quanto o narcisista. Nesse sentido, fica no meio do caminho", compara Sassi.

A atenção que ele recebe dos outros funciona como um termômetro que determina se ele se acha o máximo ou a pior das criaturas. Diferente do que acontece com quem não tem o transtorno. "A pessoa que é consciente de suas qualidades, que tem uma autoestima preservada, não precisa ficar buscando a atenção do outro todo o tempo. Geralmente o histriônico tem uma autoimagem prejudicada e tenta, de alguma forma, estabelecer laços carregados com um afeto que não tem tanto a ver com a situação que ela está vivendo naquele momento, com aquela pessoa", distingue Reys.

O histriônico pode até ter explosões de raiva se não conseguir atrair o olhar do outro, embora essa não seja uma característica marcante do transtorno. "Quando ele não está no centro das atenções, pode ficar violento. Para chamar a atenção, pode fazer algo ilegal, perigoso, até machucar outras pessoas", afirma Sassi. Ou ele mesmo. "É possível ter automutilação, bem menor do que o borderline, para chamar a atenção", completa o especialista. Mas não costuma chegar a esses extremos.

Embora faça parte do grupo B dos transtornos de personalidade, caracterizado pela presença de problemas de regulação emocional e de controle de impulsos, o histriônico é considerado o "mais leve" de todos, o que representa menos perigo para si mesmo e para os outros. Ele é movido pela atenção alheia. Quando a conseguem, fica tudo bem. Alguns histriônicos, inclusive, são artistas de sucesso. É um caminho que encontram para usar sua habilidade natural e conseguir a visibilidade que tanto precisam.

O desafio do tratamento

Todos nós queremos ser o centro das atenções em alguns momentos e isso é normal. Afinal, qual noiva não quer os holofotes todos voltados para ela no dia do seu casamento? Ou que profissional não espera o reconhecimento de seu chefe e colegas quando faz um trabalho excepcional na empresa? Um pouco de dramaticidade, idem. Algumas situações da vida pedem que a gente imprima um pouco mais de emoção.

O problema do histriônico é querer ser prestigiado o tempo inteiro, em qualquer situação. Mas ele nunca vai admitir que se comporta assim, nem reconhece que precisa de ajuda. Isso só acontece quando o sofrimento aperta. "Ele costuma procurar ajuda mais pela comorbidade, porque está deprimido e tem a ideia de que o mundo não gosta dele. Um histriônico procura tratamento pela insatisfação, pela tristeza, pelos transtornos alimentares, pelo alcoolismo, uso de drogas e descontentamento com o corpo", resume Sassi. E aí que ele recebe o diagnóstico.

Quando chega a esse estado, precisa de remédios. "A parte psiquiátrica pode ajudar no controle da ansiedade, da depressão, até de forma resolutiva, com medicamentos. Mas para a pessoa perceber seus exageros, o caráter repetitivo e pouco modulável desse comportamento, é necessária uma terapia em longo prazo", ressalta Reys. O tratamento do transtorno em si é feito com psicoterapia.

Uma possibilidade é a psicoterapia dinâmica (que trabalha os problemas psíquicos a partir dos conflitos inconscientes originados na infância, ajudando a pessoa a diminuir sua reatividade emocional). E outra é a cognitivo-comportamental (que ajuda o histriônico a reduzir pensamentos disfuncionais, através da identificação e compreensão dos sentimentos, além de treinamentos). Ele passa a dosar melhor os exageros, aprender um pouco mais com as experiências, ser mais tolerante e menos escravo da aparência e da busca de atenção. Não há cura, mas o tratamento aumenta a qualidade de vida dele e de quem está ao redor.

segunda-feira, 3 de agosto de 2020

Vade In Pace Portugal - A Vida, Infelizmente, Me Obriga A Dizer-lhe Adeus!



(Arisson Marinho/Arquivo CORREIO) 

Luto na Bahia: morre o professor Jorge Portugal, ex-secretário da Cultura

Ele foi admitido 'em estado crítico' no início da tarde e teve falência cardíaca aguda


O ex-secretário estadual da Cultura, professor Jorge Portugal, 63 anos, que estava internado em estado grave no Hospital Geral Roberto Santos (HGRS), em Salvador, morreu na noite desta segunda-feira (03), às 20h15, por falência cardíaca aguda, conforme informado pela assessoria do hospital.

"O Hospital Geral Roberto Santos (HGRS) comunica, com pesar, o falecimento de Jorge Portugal, por volta das 20h15 (horário de Brasília), de falência cardíaca aguda. O professor e ex-secretário de Cultura da Bahia estava internado na unidade de terapia intensiva (UTI) cardiovascular da instituição. A diretoria do HGRS apresenta sua solidariedade aos familiares e amigos ao tempo que se coloca em oração", diz a nota da unidade.

Ele, que completaria 64 anos na próxima quarta-feira (5), foi levado ao local no início da tarde desta segunda-feira (3), pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Só durante o trajeto, ele sofreu quatro paradas cardíacas.

Segundo a assessoria da unidade, Portugal foi admitido “em estado crítico” e estava em coma induzido até o início da noite. Assim que foi admitido no hospital, foi colhido material para teste RT-PCR, exame que identifica o novo coronavírus, o que tem sido uma medida protocolar.

Jorge Portugal era também compositor, poeta e apresentador. Natural de Santo Amaro, no Recôncavo, Portugal era um compositor e letrista aclamado, com parcerias de sucesso com Roberto Mendes, em ‘Só Se Vê Na Bahia’, e com Raimundo Sodré, em ‘A Massa’.
Deixou a Secretaria da Cultura da Bahia em 2017, alegando questões pessoais e profissionais. Na TV, foi o idealizador e apresentador do programa “Aprovado”, exibido na TV Bahia. 
Emotiva ao atender a ligação, sua esposa Rita Portugal, não pode falar com a reportagem por estar na sala de espera da UTI (Unidade de Terapia Intensiva), onde aguardava mais notícias do marido. “Tô aqui orando”, disse Rita, às 19h50. Menos de 30 minutos depois, veio a notícia de sua morte. 
“Portugal era um dos maiores letristas da música popular brasileira de todos os tempos. Era uma pessoa apaixonada pela Bahia, por Santo Amaro.”, definiu o cantor e compositor J. Velloso, amigo do músico. “Me tornei compositor muito mais pela convivência com Roberto [Mendes] e Portugal do que por ter nascido em uma família de artista. 
“Presenciei pela primeira vez o que era a criação de uma música através do trabalho dele com Roberto. Foi ali que entendi”, relembra Velloso. “A influência dele em minha música sempre permeia, até quando eu não tenho consciência. Ele tinha uma precisão poética e a Bahia era bem pintada pelas palavras de Portugal. A Bahia vai se empobrecer”, reflete o compositor. 
Depois de ter recebido a notícia que ele tinha sido internado, Velloso diz que a música que mais o lembrava de Portugal no momento era “Assim como ela é”, que foi gravada com Roberto Mendes.
O prefeito de Salvador, ACM Neto, lamentou a perda de Portugal em seu Twitter. "A Bahia perde hoje um grande professor, poeta e compositor que trouxe valorosas contribuições para a educação e cultura da nossa terra. Que Deus conforte os familiares e amigos de Jorge Portugal neste momento de profunda dor", escreveu o gestor municipal.
O governador da Bahia, Rui Costa (PT), decretou luto no estado nesta terça-feira (4). “Imensamente entristecidos, lamentamos a morte do ex-secretário de Cultura do Estado Jorge Portugal. Educador, poeta, compositor, Jorge era um homem de múltiplos talentos, exercidos com a energia e a simpatia que inspirava todos à sua volta. Era, antes de tudo, um homem apaixonado pela Bahia e pelo seu povo que estiveram sempre no centro do seu trabalho, fosse como administrador público, professor e artista. Como diz um dos seus versos: “Uma nação diferente, toda prosa e poesia, tudo isso finalmente, só se vê, só se vê na Bahia”. Nossos sentimentos para seus amigos e familiares por essa grande perda”.
O diretor teatral Fernando Guerreiro, presidente da Fundação Gregório de Mattos (FGM), também lamentou a morte do amigo e lembrou que ele é "um cidadão brasileiro, baiano e Santamarense de responsa, esse sempre foi Jorge Portugal. Impossível falar dele sem um sorriso nos lábios, uma leveza na alma e muita poesia no coração. Portugal ressignificou o ensino com sua excepcional  verve comunicativa e valorizou, como ninguém, nosso jeito de ver o mundo e se relacionar com ele. Com sua partida, as palavras perdem seu brilho e a nossa língua perde um de seus melhores tradutores. Vá em paz grande mestre!".

OAB - Uma autarquia que foi extinta em 1991

OAB - Uma autarquia que foi extinta em 1991


Itacir Amauri Flores
Publicado por Itacir Amauri Flores
há 2 anos
9.581 visualizações
O povo brasileiro tem sido tratado como criança pelos diversos governos que se sucederam ao antigo regime militar que teve fim no ano de 1985, embora esta prática não seja uma novidade em nossa história, nos dias atuais esta prática atingiu o seu ápice. O governo socialista emprega táticas de convencimento que insuflam nas pessoas mais esclarecidas um surto de indignação. Como pode nossos próprios governantes terem a convicção de que somos completamente desprovidos de inteligência? As leis de um país para que sejam válidas precisam obrigatoriamente estar escritas no idioma pátrio e de modo que até o mais simples dos homens possa entendê-la, ou como seria possível admitir-se que todos têm ciência dela e devam cumpri-la?
Para que se compreenda a lei, basta que o cidadão seja alfabetizado e, dotado de uma inteligência normal. A compreensão de um texto legal não requer que o cidadão seja provido de dons mediúnicos e metafísicos tal que somente uma minoria de escolhidos saiba interpretar tais “escrituras”. Uma lei que assim fosse não teria a menor validade em uma sociedade Republicana e Democrática.
Isto posto: Podemos afirmar sem medo de errar que quando uma lei assegura que um determinado decreto fica extinto com a publicação desta lei nova, nada há a ser interpretado. O decreto antigo deixa de existir e junto com ele tudo aquilo que dele dependia. Foi o que ocorreu quando o DECRETO No 11, DE 18 DE JANEIRO DE 1991 determinou que ficava definitivamente extinta a ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL.
No entanto, o Congresso Nacional, o Poder Executivo, a OAB, o Ministério Público, a Polícia Federal e lamentavelmente também o Poder Judiciário decidiram tratar os brasileiros como pessoas sem a menor capacidade intelectual e nos fazer crer que nada aconteceu. E que a OAB continua de uma maneira “sui generis” existindo. Ela passou desta vida para uma outra, mas continua habitando entre nós. Este tipo de argumentação é uma afronta à inteligência da população brasileira.
Da Extinta Ordem dos Advogados
A Ordem dos Advogados do Brasil, autarquia vinculada ao judiciário, responsável por fiscalizar o exercício da profissão de advogado no Brasil foi extinta pelo DECRETO No 11, DE 18 DE JANEIRO DE 1991 que revogou o DECRETO No 19.408, DE 18 DE NOVEMBRO DE 1930 criador da Ordem dos Advogados do Brasil.
O reconhecimento deste fato não requer do cidadão nenhum conhecimento específico além da alfabetização, basta ler os referidos decretos.
Repristinação
Quando uma lei é extinta, os efeitos que ela provocava só voltam a valer se houver repristinação. Consequentemente, a autarquia OAB somente poderia ser ressuscitada pela repristinação.
A repristinação ocorre quando a lei que revoga a norma revogadora deixa de forma nítida e expressa em seu texto que está restabelecendo os efeitos da norma outrora revogada, como se depreende da leitura da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
O DECRETO-LEI Nº 4.657, DE 4 DE SETEMBRO DE 1942 é específico ao afirmar que salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.
Temos então, de forma transparente e clara, que o DECRETO No 761, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1993, ao revogar o decreto de 1991, acima mencionado, não fez qualquer menção quanto a restabelecer o artigo 17 do Decreto nº 19.408, de 18 de novembro de 1930 que criou a OAB.
Assim, temos por certo que: por repristinação a OAB não renasceu quando o DECRETO No 11, DE 18 DE JANEIRO DE 1991 foi revogado no ano de 1993.
Conclui-se do que foi exposto; que ficou definitivamente extinta a autarquia responsável por regulamentar o exercício da profissão de advogado no Brasil a partir de 18 de janeiro de 1991.
Falácias
São técnicas empregadas para induzir a mente humana a erro e tomar um pensamento falso como verdadeiro. Em algumas circunstâncias podemos aceitar quando se induz uma criança a acreditar em um ser inexistente, porém, quando se engana um adulto, geralmente há nisto uma má-fé inaceitável.
A Ordem dos Advogados do Brasil, embora tenha sido oficialmente extinta, continuou atuando como se nada tivesse acontecido. E com a complacência de todos os poderes da República, o que agrava ainda mais nossa crise de credibilidade nas instituições do país.
Quando uma autarquia é extinta deve-se dar baixa em todos os seus registros oficiais, como o CNPJ, por exemplo. Todo o seu patrimônio deve ser devolvido à União e uma prestação de contas deve ser apresentada. Nada disto foi feito! E isto viola diversas leis, inclusive as leis penais, mas nenhuma providência foi tomada pela Receita Federal ou pelo Ministério Público.
O Supremo Tribunal Federal deste país, que tem a missão de guardar a Constituição, foi dos primeiros a sair em socorro desta entidade que sequer podia ser chamada de moribunda, pois há muito estava falecida.
E desenvolveu um argumento totalmente falacioso para compactuar com as violações das leis de nosso país. O STF desenvolveu a proposição de que a OAB seria uma pessoa fictícia de “natureza sui generis” e que, portanto, ora era uma entidade pública, ora era uma entidade privada, usufruindo assim de privilégios e eximindo-se dos deveres comuns às demais pessoas jurídicas.
Como ser constituída conforme a lei, por exemplo. Uma pessoa jurídica ou é criada por lei, ou é criada por um estatuto registrado em cartório com as demais formalidades que a lei impõe.
Ainda que esta nova entidade adotasse o mesmo nome, não seria mais a mesma pessoa jurídica, seria uma nova pessoa com o mesmo nome, mas com distinto CNPJ. Portanto, carecedora de nova formalidade para sua criação, carecedora de novo registro e nova documentação conforme requisitos da lei para a criação de pessoas jurídicas. Seja ela pública ou privada.
Assim como ocorre com os cidadãos, para cada João que nasce um novo registro deve ser feito, não se admite que um João recém-nascido se utilize dos documentos de um João falecido, a regra também se aplica para as pessoas jurídicas. E o uso de documento alheio, pelos dirigentes da extinta autarquia, é um crime que foi ignorado pelo Ministério Público Federal. E continua sendo!
Não há como negar que no período entre 18 de janeiro de 1991 e 4 de julho de 1994, e a partir desta data inclusive, houve um vácuo onde nenhuma entidade existia com a aptidão jurídica necessária para regulamentar ou fiscalizar o exercício da profissão de advogado, aplicar o Exame de Ordem, ou mesmo cobrar anuidades dos profissionais da Advocacia.
Nenhuma pessoa jurídica de direito público ou privado foi criada por lei ou em conformidade com a lei para assumir o lugar da extinta autarquia.
Por esta razão, temos como líquido e certo que:
· Todos os atos praticados pelos ex-dirigentes desta extinta autarquia, naquele período e a partir dele, foram à revelia da lei, houve uma manifesta usurpação do poder público jamais questionada pelas autoridades.
· . Com a extinção da autarquia, todos os registros de advogados também foram automaticamente extintos.
· Ocorreu a obrigatoriedade de prestação de contas dos antigos dirigentes da autarquia e a devolução de bens e valores ao poder público e isto não foi feito.
· A revogação do decreto de criação da OAB extinguiu o vínculo entre os bacharéis e o órgão fiscalizador da profissão. É sabido que, naquilo que couber, a pessoa jurídica se equipara à natural, temos então que a regra: “Actio personalis moritur cum persona” também se aplica à pessoa jurídica extinta. O direito de agir que seja personalíssimo morre com a pessoa, seja ela jurídica ou natural.
· Fica evidente que não existe relação jurídica entre o bacharel em direito e o extinto órgão fiscalizador da profissão de advogado.
· Nenhuma providência foi tomada pelas autoridades competentes, pelo contrário, aceitaram que um grupo, que deveriam ser os liquidantes da extinta instituição continuasse a operá-la como se ativa estivesse.
Pessoa jurídica: Tipos admitidos
A lei brasileira, no artigo 40 do Código Civil, admite apenas os seguintes tipos de pessoas jurídicas: pessoa jurídica de direito público interno, pessoa jurídica de direito público externo e pessoa jurídica de direito privado.
E o artigo 44 do Código Civil dispõe que são pessoas jurídicas de direito privado: as associações; as sociedades; as fundações; as organizações religiosas; os partidos políticos; e as empresas individuais de responsabilidade limitada.
O Artigo 41 do Código Civil esclarece que são pessoas jurídicas de direito público interno: a União; os Estados, o Distrito Federal e os Territórios; os Municípios; as autarquias, inclusive as associações públicas e as demais entidades de caráter público criadas por lei.
O artigo 42 do Código Civil que são pessoas jurídicas de direito público externo os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional público e a OAB não se enquadra em nenhuma destas situações acima.
ADIN 3026: A NATUREZA “SUI GENERIS”
Difundiu-se a falsa idéia de que o STF na ADIN 3026 teria definido que a OAB é uma pessoa jurídica sui generis. Esta afirmação não procede, pois, a natureza jurídica da OAB não era o objeto da questão em debate.
Alguns Ministros, nem todos, incluíram este conceito bizarro em suas dissertações para eximir a OAB de submeter seus empregados a concursos públicos, uma vez que ela é uma entidade privada. Mas a natureza jurídica da OAB sequer foi tema do debate, mas ainda assim, esta mera suposição foi contestada por outros ministros.
Deste debate nasceu a falsa idéia de que o Poder Judiciário brasileiro teria atribuído à nova Ordem dos Advogados esta qualificação, sem previsão legal, de “sui generis” com os argumentos acima citados para que ela fosse aceita pela sociedade como existente.
Ainda que este debate nunca tenha acontecido de fato no STF, circula entre os operadores do direito, o conceito de que a OAB seja de fato uma entidade sui generis. Este é mais um engodo, outra falácia para iludir a população, por isto vale a pena discorrer sobre este tema.
A Incompetência do Poder Judiciário para criar pessoas jurídicas
Ao poder judiciário compete julgar em consonância com as leis do país. As pessoas jurídicas previstas pela legislação brasileira ou são públicas ou são privadas. Uma pessoa jurídica só existe se tiver cumprido todas as formalidades legais para a sua criação. Sem isto ela é inexistente.
Definição de Pessoa Jurídica Impar, Sui Generis.
O direito brasileiro não consagrou em nenhuma lei a existência de uma pessoa jurídica do tipo camaleão que se adapta ao ambiente de acordo com as conveniências. A Pessoa Jurídica IMPAR ou de Natureza Jurídica Sui Generis postulada pela OAB e defendida pelo Poder Judiciário não existe no direito brasileiro.
A base desta argumentação engendrada pela OAB e pelo Poder Judiciário, especialmente o STF, está na alegação de que o advogado presta serviço público, exerce função social e seus atos constituem múnus público.
Múnus é o encargo, o emprego, a função que o indivíduo tem que exercer, por esta ótica cada um de nós tem um múnus a cumprir. Múnus Público é a obrigação que o Estado tem que executar, aquilo que é dever do Estado para com o cidadão, serviço, obrigação, dever, trabalho típico do Estado.
A OAB alega que a lei ao determinar que o advogado é indispensável à administração da justiça, atribuiu a ele um múnus público. Então como pessoa jurídica ou física de caráter privado passa a exercer uma função típica do estado, vem daí a razão de ser da sua natureza jurídica “sui generis”.
“Sui Generis” pode ser traduzido por único de sua espécie ou gênero, singular, sem igual, impar. O termo é empregado na biologia quando se encontra um espécime novo, e completamente distinto dos demais e que pode dar origem a uma nova classificação, um novo gênero, uma nova espécie. Na arte, o termo sui generis, pode ser atribuído a um determinado pintor como meio para destacar sua técnica única e exclusiva. No direito pode ser usado para descrever o sistema único e exclusivo de aplicação da justiça de uma determinada tribo.
Sob esta justificativa a Ordem dos Advogados não é única, impar ou “sui generis”, pois, também o médico, o bombeiro, o professor e o policial exercem um múnus público, uma função típica do Estado brasileiro, de modo que cai por terra a exclusividade, deixa de ser a única, deixa de ser “sui generis”.
Para que algo possa ser classificado como “sui generis” precisa ser exclusivo, sem igual, impar, único em sua espécie.
Porém, a exclusividade inconstitucional que caracteriza a OAB foi a transformação de uma simples autarquia em um Poder da República através de uma simples lei infraconstitucional.
A única característica IMPAR e Sui Generis e exclusiva da OAB é ter a pretensão de ser um Poder da República sem que se tenha feito uma nova Constituição, e sem que se tenha notificado o povo brasileiro de que ele tem um novo Senhor, faltou a publicidade para a validade do ato. Houve a criação ilícita de uma instituição privada, constituída por pessoas não eleitas pelo povo, sem mandato, mas que se julgam no mesmo patamar de Governo que o Presidente da República, os Senadores e os Ministros do STF, constituindo-se num falso poder autônomo e paralelo. Trata-se de um estelionato intelectual, nada mais que isto.
A Constituição promulgada em 1988 diz em seu artigo segundo: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.
Isto basta para que se verifique que a LEI Nº 8.906, DE 4 DE JULHO DE 1994, que cria um estatuto para uma autarquia extinta, ao caracterizar a OAB, entidade privada, como um ente federativo que não se submete ao controle da nação brasileira, nem de qualquer outro poder da República é completamente inconstitucional por qualquer ângulo que se veja a questão. O estatuto de uma entidade privada deve ser feito por seus associados, nunca pelo estado, portanto, a atual OAB, apropria-se ilegalmente, de algo que não foi feito para ela, mas para uma entidade extinta. Isto configura usurpação de poder.
Finalizando: não é competência do judiciário estabelecer a natureza jurídica das pessoas fictícias: Existe um órgão competente para isto.
A Comissão Nacional de Classificação, (CONCLA), órgão do IBGE, criado por lei, e que inclui na sua composição todos os ministérios, inclusive o Ministério da Fazenda, é o responsável dentre outras atividades, pela classificação da natureza jurídica das pessoas fictícias atribuindo a elas códigos que as definem e que são usados pela Receita Federal ao se cadastrar uma pessoa jurídica, inclusive as de personalidade pública como as autarquias. E dentre os seus códigos não existe um código atribuído e definido para classificar pessoa jurídica “sui generis”, portanto, pessoa jurídica “sui generis” não existe.
Ordem dos Advogados do Brasil: Sociedade Não Personificada.
A única pessoa jurídica que nasce a partir da publicação da lei que a criou é a pessoa jurídica de direito público, as demais só têm existência após o registro no órgão competente: Cartório e Receita Federal.
Compete-nos agora averiguar a situação jurídica do Grupo de Pessoas que se intitula a nova Ordem dos Advogados do Brasil e assumiu sem permissão legal as funções do Estado brasileiro.
Podemos começar constatando aquilo que ela não é. Ela não é uma pessoa jurídica de direito público, pois não houve lei especial, lei específica que a criasse conforme requer o artigo 37, inciso XIX, da Constituição brasileira.
Deste artigo, depreende-se que criação de uma pessoa jurídica de direito público não pode ser através de lei genérica e vaga. Não pode ser um “jabuti”.
Este grupo de pessoas ou unidade de pessoas que se intitula a nova OAB, para que fosse legalmente reconhecido como uma pessoa jurídica de direito privado e possuísse capacidade jurídica precisaria cumprir as exigências do artigo 45 do Código Civil.
Como o registro dos atos constitutivos no registro competente e a necessária autorização do poder executivo para fiscalizar o exercício da profissão de advogado de seus associados, fato que também não ocorreu.
E mesmo que tivesse ocorrido, não lhe daria legitimidade para atribuir a si mesma as prerrogativas da LEI Nº 8.906, DE 4 DE JULHO DE 1994 que foi criada para atender a uma pessoa jurídica de direito público, uma vez que não compete ao poder público estabelecer o estatuto de uma associação privada.
Temos então que esta unidade de pessoas que se intitula Ordem dos Advogados, quanto à classificação de sua “personalidade jurídica”, ou é uma Sociedade de Fato, pois não possui atos constitutivos, ou é uma Sociedade Irregular, pois não os registrou e, rege-se pelo artigo 986 do Código Civil por ser uma sociedade não personificada. Disto decorre que as suas normas internas não se aplicam a terceiros, mas tão somente aos seus associados.
Da Capacidade da Pessoa Jurídica
A capacidade da pessoa jurídica decorre da personalidade que a ordem jurídica lhe reconhece por ocasião de seu registro. Não se tem conhecimento de que esta unidade de pessoas que se intitula a nova OAB tenha registrado seus atos constitutivos, quando da extinção da autarquia OAB, consequentemente:
a) Não tem direito à personalidade, a identificar-se como a nova Ordem dos Advogados ou à própria existência.
b) Caso tenha dado continuidade às operações da antiga OAB na condição de administrador do espólio, é nada mais que uma pessoa jurídica sem personalidade jurídica.
Licitude de propósitos e fins lícitos
A partir da data de publicação do decreto que extinguiu a Ordem dos Advogados, seus dirigentes deveriam ter tomado as providências necessárias para a completa dissolução da pessoa jurídica, assumiram nesta ocasião uma condição equivalente à de administradores de um espólio, administradores de uma massa falida, assumiram a posição equivalente à dos responsáveis pelo encerramento de uma empresa.
E deveriam ter tomado as providências necessárias para a efetivação desta medida de encerramento das atividades da OAB, como o cancelamento de registros públicos, como CNPJ, dentre outras, além da elaboração de uma prestação de contas à União com a devolução de bens e valores pertencentes à antiga autarquia.
Mas em vez disto, deram continuidade às atividades de uma entidade extinta pela lei. Apropriaram-se dos bens e funções da extinta autarquia, sem permissão legal, o que nos leva a questionar a licitude de seus propósitos, condição necessária para a constituição de uma nova pessoa jurídica.
Da ilicitude
A lei não admite que uma unidade de pessoas reunidas para a prática de atos ilícitos adquira personalidade jurídica, o que põe por terra a validade de todos os atos praticados por este grupo de pessoas em nome desta nova OAB, inclusive a capacidade para fiscalizar o exercício de qualquer tipo de profissão.
Das considerações acima decorre naturalmente que não há vínculo normatizado que crie uma relação jurídica entre os bacharéis em direito e esta sociedade não personificada que se intitula a nova OAB.
Nesta condição o bacharel em direito é o sujeito ativo titular do direito subjetivo de fazer o que a norma jurídica não proíbe.
E a nova OAB é o sujeito passivo que tem o dever jurídico de respeitar o direito do sujeito ativo de exercer livremente a sua profissão.
Nunca é demais lembrar que no Brasil temos outras entidades que existem a margem da lei. No entanto estes grupos, por força de lei, não podem ser considerados pessoas jurídicas de espécie alguma. E o mesmo se dá com um grupo que se reúna para usurpar o Poder Público da nação.


* Agradecimento especial ao Dr. Robson Ramos.
Itacir Amauri Flores. Cidadão Porto-Alegrense, conforme a Lei Municipal n.º 12.214, de 31 de janeiro de 2017. É Bacharel em Ciências Jurídicas, Bacharel em Segurança Pública, Jornalista, Vice-presidente e Vogal da Junta Comercial, Industrial e Serviços do Rio Grande do Sul, Oficial Superior da Brigada Militar, atuou na Casa Militar e Defesa Civil do Rio Grande do Sul. É Jornalista sócio efetivo da Associação Riograndense de Imprensa, Pós-graduado em Direito Comercial, MBA em Executivo em Segurança Privada – Safety & Security, escritor com diversos artigos publicados. Foi diretor na Câmara de Vereadores de Porto Alegre. Condecorado com as medalhas da Defesa Civil do RS e a Medalhas de 10 e 20 anos de relevantes serviços prestados ao estado do Rio Grande do Sul

NOVA CÂMARA MUNICIPAL DA CIDADE DE SANTO ANTÔNIO DE JESUS - O POVO QUER MUDANÇA!







ESSES VEREADORES QUE AÍ ESTÃO NÃO NOS RECONHECE COMO GENTE, COMO IRMÃO; É HORA DE MUDANÇA.
 
 
 
"Todos os dias Deus nos dá um momento em que é possível mudar tudo que nos deixa infelizes. O instante mágico é o momento em que um 'sim' ou um 'não' pode mudar toda a nossa existência."

(Paulo Coelho)


domingo, 2 de agosto de 2020

O que é o psicólogo?


O psicólogo é um sujeito social. Cresce em um contexto sócio-histórico específico, recebe variadas influências culturais e políticas entre as instituições que o forma.
Aqui, este sujeito social torna-se um profissional, algo que o coloca numa dinâmica societária específica inserindo-o numa divisão, numa clivagem que o absorve em suas estruturas através de uma instância comum a todas as profissões: o mercado de trabalho.
Constitui-se, então, sua subjetividade em uma relação mediada pela concretude histórica e que gera o movimento viabilizador de seu desenvolvimento profissional. Seus vínculos e círculos sociais vão agregar a sua imagem e atuações os vieses de legitimidade onde o título se funde a suas possibilidades de intervir e trabalhar. Seu contexto objetivo e concreto o coloca diante de relações sociais e econômicas que cooptam sua atenção, suas tendências ideológicas e políticas e, em consequência, seu trabalho.
Esse por menor do desenvolvimento profissional deve sempre levar em consideração o lugar específico de onde se fala. Se pudéssemos supor que todos os municípios do Brasil abrigam pelo menos um psicólogo, cada um destes seria diferente, assim como em vários momentos poderiam ser semelhantes.
O fato é que estou em Alagoas e por aqui existem vários outros fatos que constituem uma realidade histórico social com dificuldades seculares, onde foi criado um esquema de sociabilidade que se fundamenta na exclusão, na expropriação e na utilização das funções do Estado, a partir de uma lógica de classes, para legitimar uma opressão diária.
Sob as sombras dos latifundiários e donos das agroindústrias açucareiras as terras de Alagoas são divididas secularmente. As condições históricas favorecem a estes poucos o controle absoluto dos meios de trabalho e de reprodução da vida da maioria das pessoas no Estado. A cana não toma apenas a paisagem do litoral e dos municípios circunvizinhos da capital Maceió, mas à medida que envolve o sujeito humano em relações de trabalho ela cria o homem que aqui mora e se sustenta materialmente, pois é onde flui o trabalho popular, pouco qualificado e precário.
Se houve desenvolvimento industrial na capital foi de relevância insuficiente para garantir modernização, infraestrutura básica e atestado de “progresso”. O que temos, de fato, são pequenas felicidades quando as eleições obrigam prefeitos a construir viadutos e tapar buracos para a agraciar pobre com indulgência e “boas intenções”. A maioria de sua população vive em situações difíceis, mas aqui a ideia não é apenas ignorar a existência das pessoas simples, é, no entanto, torna-las dóceis e prontas para vender sua força de trabalho sob o preço que for viável ao máximo de lucratividade.
Nesta sociedade que comporta elementos arcaicos que remontam as colônias do XVII e a elegância dos donos das usinas e grandes fazendas do final do século XIX os elementos da “questão social” se colocam fortes e imponentes. Quem é o psicólogo nestas estruturas? Suas intenções renovadoras se colocam diante desta conjuntura recheada de uma lógica de um tipo de capitalismo das dores e das sangrias, o do tipo dependente.
Logo, o que temos como desafio não é apenas como trabalhar ou onde, mas de aferir o que temos feito e quais são nossas possibilidades dentro desta realidade concreta. Isto envolve reconhecer o tipo de contrato, relações de trabalho e o próprio tipo de trabalho que se desenvolve, pois ele está intimamente ligado à nossa capacidade de descortinar as estruturas ideológicas que sustentam o sistema como ele é ou agir a favor dele. Na ordem burguesa, que agora se coloca de maneira autocrática com um teor conservador e moralista, quem deveremos ser para respeitar nosso código de ética e nosso “compromisso social”?
Adentrando mais a fundo na compreensão do que é o psicólogo veremos que, enquanto profissão que carrega especificidades mas um campo de estudo e trabalho difusos, o que houve no processo de profissionalização da Psicologia foi a tentativa de estabelecer o seu lugar profissional formal, mas que, no entanto, ainda é cercado de controvérsias pois onde há pessoas em atividade há Psicologia e há também a intersecção com outras áreas e disciplinas. Isto traz questões que mexem tanto em questões técnicas como teóricas e reveste de um devir complexo e multifacetado o entendimento do que é e o que pode a ciência psicológica.
Apesar das controvérsias os psicólogos avançaram em muitas questões, como a expansão da participação na construção de políticas públicas e na composição do SUS e do SUAS, mas atualmente que ocorre é que as formas emergentes de fazer Psicologia encontram-se em crise, visto que as práticas alternativas que configuraram a luta por trabalhos desvinculados do tradicional se desenvolveram em uma época em que era possível produzir políticas públicas como medidas práticas que levaram o psicólogo para próximo da classe trabalhadora. Neste momento histórico havia a legitimidade, dentro da concepção democrática burguesa formal, de uma ampliação da participação de movimentos sociais e profissionais no que viria a ser a nova república.
Entre os trancos e barrancos da democracia de caráter restritivo à brasileira os tempos de ouro, onde a conciliação de classes foi possível e os rumos para a expansão de direitos cidadãos foram levemente abertos, acabou de maneira sumariamente trágica deixando um rastro de destruição das conquistas sociais que vinham ocorrendo ao longo de preciosas décadas.
Se a conjuntura muda para a classe trabalhadora ela muda para nós, pois ao contrário do que se pode imaginar alguns colegas estamos envoltos em uma engrenagem que envolve um sistema que é baseado na exploração e que muitas vezes envolve a sutileza de pintar de carreira empreendedora o que é alienação e degradação humana.
Se nada parece fácil para o psicólogo e se tudo isso foge dos seus pressupostos políticos e de organização profissional para manter ou melhorar suas atuações e possibilidades de trabalho, estamos diante de uma crise. Se esta crise não se configura como urgente ou como um alerta para as contradições entre realidade material e política e os gracejos liberais e empreendedores da categoria, nada a fazer a não ser esperar que aos nossos pés outros abismos se construam e nele caiam nosso ânimo e nossa vontade de exercer a profissão.
Em quem encontraremos fortalecimento se não for com os nossos? Em que luta nos engajaremos se não for a dos trabalhadores?

Quem foi Platão?

                                                                              
Platão: quem foi, biografia, ideias e mais!


Discípulo de Sócrates e professor de Aristóteles, Platão foi o intelectual precursor da filosofia ocidental, influenciando inclusive o surgimento do cristianismo. Figura importantíssima na história da Grécia Antiga, é um autor que sempre cai nas provas do Enem e demais vestibulares. Afinal, quem nunca ouviu falar na expressão amor platônico?
Para que você conheça mais sobre Platão, suas ideias e história, então continue lendo esse post completo para você entender tudo!

Quem foi Platão?

Platão viveu na Grécia Antiga e se dedicou à Filosofia e à Matemática, sendo considerado um dos principais pensadores da sua época. No período antropológico, que começou por meio das ideias de Sócrates, Platão teve uma participação preponderante em razão da teoria idealista, além de ter sido um biógrafo de excelência de Sócrates. O filósofo foi o responsável pela criação do chamado mundo das ideias e das formas, fundando o pensamento metafísico.
Escreveu diversos diálogos filosóficos e fundou a Academia em Atenas, ou seja, é considerado o precursor do ensino superior no mundo ocidental. Santo Agostinho foi amplamente influenciado pelas ideias do filósofo grego. Assim, Platão também contribuiu com a formulação dos fundamentos da ciência e da religião.
Racionalista, realista, dualista e idealista, Platão é o pai das formas dialéticas da filosofia, ou seja, seus escritos foram fundamentais na história da humanidade.

Biografia de Platão

Platão (em grego, “ombros largos”) nasceu em Atenas no ano de 428 a.C e morreu em 348 a.C. Era conhecido pelo apelido, pois chamava-se Arístocles. Filho de uma família que tinha fortes influências na política da Grécia, o filósofo foi descendente de Sólon, legislador e estadista de destaque na política de Atenas. Privilegiado financeiramente, conseguiu dedicar seus estudos à filosofia e chegou até mesmo a lutar na Guerra do Peloponeso entre Atenas e Esparta.
Platão também criou os debates filosóficos sob forte influência de Sócrates. Fundou a Academia de Atenas com o objetivo de reunir jovens que buscavam o conhecimento e ainda utilizavam o local como meio para prática de atividades físicas.

Filosofia de Platão

Extremamente importante para o pensamento ocidental, Platão criava personagens em seus diálogos que abordavam temas relacionados à vida, à política, à arte, à religião, à justiça, à medicina, vício e virtude, crime e castigo, sofrimento e prazer etc.

Filósofo de grande consistência, Platão conseguiu direcionar a filosofia para temas pertinentes, como assuntos éticos, políticos, metafísicos e epistemológicos.
Outra marca nas obras de Platão é o idealismo, o qual trata-se da busca pelo conhecimento como uma única maneira de encontrar a verdade. Para Platão, a verdade está no mundo das ideias sob a influência do intelecto. Como o amor ideal é aquele que nunca se concretiza, eis que surge a expressão “amor platônico“, tendo como base os ideais defendidos pelo filósofo.
Outra linha do pensador foi a dialética, com inspiração parmenidiana (criada por Parmênides, que defendia várias ideias, como o ser é idêntico a si mesmo). Assim, surgiu a técnica de obter uma conclusão ou síntese (fechamento de um texto) tendo como meio de elaboração do conteúdo, as ideias opostas.

Teoria de Platão

Várias teorias são atribuídas a Platão, mas a maioria dos seus escritos se concentrava na política e no comportamento humano. Para ele, os caráteres moldam o espírito das pessoas e cada tipo de indivíduo deveria ocupar um cargo na sociedade, objetivando uma organização da pólis ou cidade.
Assim, o filósofo dividiu o caráter em três grupos, como veremos a seguir:
  • Caráter concupiscível: sintonizado com as vontades e desejos. Deveria ser ocupado por pessoas que tinham mais familiaridade nos trabalhos braçais.
  • Caráter irascível: é o tipo de quem era dominado por atitudes impulsivas ou ataques de raiva. Platão defendia que essas pessoas deveriam sempre se dedicar ao serviço militar.
  • Caráter racional: segundo Platão, esse caráter era marcante nos intelectuais e pessoas mais racionalistas, que deveriam ocupar as funções na política e de justiça.
As teorias de Platão também são marcas em seus diálogos, como a Apologia de Sócrates, em que descreve a trajetória de seu precursor, como por exemplo, o momento da condenação em um tribunal quando o mestre de Platão foi condenado à morte ao ser acusado de injúria contra os deuses.

Frases de Platão

Inúmeras frases do filósofo são utilizadas em citações e em momentos de reflexão. Conheça algumas delas:
  • “Não espere por uma crise para descobrir o que é importante em sua vida.”
  • “Não há ninguém, mesmo sem cultura, que não se torne poeta quando o amor toma conta dele.”
  • “Podemos facilmente perdoar uma criança que tem medo do escuro; a real tragédia da vida é quando os homens têm medo da luz.”
  • “Tente mover o mundo — o primeiro passo será mover a si mesmo.”
  • “Quem comete uma injustiça é sempre mais infeliz que o injustiçado.”
  • “Quem ama extremamente deixa de viver em si e vive no que ama.”
  • “O livro é um mestre que fala, mas que não responde.”

Mito da Caverna de Platão

Na obra A República, Platão estabelece uma comparação entre o mundo real e as crenças humanas, conhecido como mito da caverna de Platão. Nessa metáfora, o filósofo defende a ideia de que as pessoas vivem presas na ignorância.
Na narrativa, as pessoas vivem presas em uma caverna e conseguem enxergar apenas sombras do que acontecia do lado de fora. Entretanto, como elas não tinham acesso ao mundo verdadeiro, acreditavam que as sombras eram a própria realidade. A partir daí, a alegoria da caverna, também conhecida como parábola da caverna, discute muitas teorias sobre conhecimento, linguagem e educação com foco na construção de um Estado Ideal.
No texto, Platão explica o conceito de senso comum em oposição ao senso crítico. Para o autor, o mundo sensível, o obtido por meio dos sentidos, é uma falsa percepção da realidade. Segundo o filósofo, somente a razão pode trazer um fiel retrato da realidade.
Por isso, defende o mundo inteligível como uma maneira de o indivíduo entender o mundo ao redor, sempre com a valorização da crítica e da racionalidade.
Escrito em 380 a.C., o Mito da Caverna continua fazendo sentido em vários aspectos, como na falta de reflexão diante dos inúmeros fatos que acontecem diariamente.

Principais obras de Platão

Selecionamos algumas obras de Platão que foram destaque na sua trajetória:
  • A República;
  • O Banquete;
  • Apologia de Sócrates;
  • Fédon;
  • Láques;
  • Hípias Maior.

A República: Platão

Dividida em dez livros, a obra é o principal escrito de Platão, e foi produzida por volta de 380 a.C. Tudo está na forma de diálogo, tendo Sócrates como protagonista. Assim, o autor mostra a busca de Sócrates por uma forma de governar que seja justa, com a divisão de poderes e os tipos de caráter indicados para cada função.
É considerada a primeira utopia política do Ocidente e também traz a alegoria da Caverna sobre a superioridade do conhecimento vindo do mundo das ideias e da reflexão.

Curiosidades

  • O apelido foi dado por seu treinador de luta, Aristão de Argos, em razão do porte físico de Arístocles.
  • Platão viveu até os 80 anos em uma época marcada por epidemias e falta de higiene.
  • Após a morte de Sócrates, Platão entrou em uma caminhada em busca do autoconhecimento e ficou 12 anos viajando em dedicação à filosofia.
  • A Academia criada por Platão durou por nove séculos após a sua morte, e seu principal discípulo, Aristóteles, teve o privilégio de conviver ao longo de 20 anos ao lado do intelectual.

Versos Íntimos (Augusto dos Anjos)

Versos Íntimos



Augusto dos Anjos 


Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!


Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.


Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.


Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

sábado, 1 de agosto de 2020

Heráclito e o Rio












João Bugalho

A busca do saber e a forma como se pretende integrar os diferentes conhecimentos, na procura de uma mais global compreensão das coisas, tem muitos pontos surpreendentemente (?) comuns entre pensadores distantes milhares de anos entre si.
Heráclito, filósofo pré-socrático originário de Éfeso, viveu - aproximadamente – entre 540 e 480 anos A.C.. É curioso notar que parte do que se encontra hoje em diversas vertentes do pensamento científico já, na essência, se espelhava no centro do pensamento de Heráclito.

O pensador grego considerou pela primeira vez que a mais típica característica da Natureza era a constante mudança, que tudo flui e nada dura infinitamente.
É dele a famosa frase “ninguém pode tomar banho duas vezes nas águas do mesmo rio”, porque o rio está em constante mudança, mas mais ainda, porque também o está quem nele mergulha.
Heráclito entrosou com esta uma outra ideia então original: a de que a diversidade no mundo resulta do conflito dos contrários e da permanente presença destes. Sem guerra não haveria paz, sem saúde não existiria a doença, sem a fome não teríamos prazer em comer.
Assim, a harmonia do Universo resultaria das dissemelhanças, o nascimento e a conservação dos seres dever-se-ia a um conflito de contrários.
Desse conflito, porém, resultaria a unidade, uma razão universal para as coisas, como que uma divindade. O filósofo porém recusou-se a chamar-lhe Deus, mas chamou-lhe antes: “logos”- a razão. A razão universal, uma razão espiritual imanente a tudo, dando aos seres a harmonia nas suas diferenças e regendo o mundo segundo uma ordem. É porém bem evidente que é muito difícil para nós compreender plenamente e justificar o que foram estes conceitos para aqueles pensadores tão distantes, enquadrados num meio bem diferente do nosso, se bem que, numa outra escala, dois milénios sejam um período de tempo tão curto.

Para Heráclito a verdadeira sabedoria, a qual conduzirá à ligação inteligível de todos os fenómenos, consiste em fundir o pensamento individual num pensamento universal.
É interessante reconhecer que Hegel (1770-1831), que defendeu que o desenvolvimento histórico derivava da tensão entre os opostos, procurou a existência de um saber absoluto, de uma realidade global em que natureza e espírito, pensar e ser, Deus e o Homem, constituissem um sistema grandioso reconciliando para sempre a Realidade com a Ideia, visão esta que veio a ser contestada e demolida pelos seus discípulos ou seguidores.
Entre estes, Marx (1818-1883) veio substituir a teoria pela praxis afirmando que: “Até agora a filosofia não fez mais do que interpretar o mundo; o que importa é transformá-lo” e assim Marx colocou a matéria e o trabalho onde Hegel colocara a idea e o espírito.

Em Engels (1820-1895) cuja raíz filosófica é considerada por muitos como mais profunda que a de Marx, vamos encontrar um sistema dialéctico para a natureza que contém as três leis da dialéctica materialista. A segunda lei designou-a por lei da compenetração dos contrários, segundo a qual a contradição é a origem do movimento.
É precisamente baseado em Engels que Stalin (1879-1953) - segundo Klimke-Colomer em Historia da Filosofia – esboça as seguintes teses:
“O cosmos não pode ser considerado como uma acumulação de casos e acontecimentos, independentes entre si, mas sim como uma totalidade unitária em que as coisas e os acontecimentos estão orgânicamente enlaçados, dependendo e condicionando-se uns aos outros; a natureza não deve entender-se num estado de repouso ou imobilidade mas sim num movimento incessante e numa mudança constante de renovação e evolução; a dialéctica considera o processo evolutivo como um desenvolvimento que passa de mudanças quantitativas insignificantes e ocultas a mudanças visíveis, fundamentais, qualitativos e isto como que em saltos repentinos e não graduais; este processo evolutivo é determinado pela lei da unidade e da luta dos opostos segundo a qual a luta entre o velho e o novo, o que perece e o que nasce, constitui o núcleo interno da evolução e do seu salto de quantitativo a qualitativo; a natureza do cosmos é material , os diversos fenómenos que nele se dão representam somente diferentes formas de matéria e o desenvolvimento inteiro do cosmos rege-se por leis do movimento da matéria sem que seja necessário recorrer à hipótese de um Espírito Cósmico; a matéria, a natureza e o ser constituem a realidade objectiva que existe fora da consciência e independente dela; o pensamento é um produto da matéria, mais em concreto, um produto do cérebro e não pode separar-se dela sem que se caia num erro crasso; o universo e as suas leis são cognoscíveis, no cosmos não se dão coisas incognoscíveis mas apenas coisas que ainda não são conhecidas e que o serão pelo esforço da ciência e da praxis.”
Recentemente, num polo quase diametralmente oposto, bem diferente destes na sua essência e nalguns aspectos específicos, nomeadamente na compreensão das teorias evolucionistas, deparamos com as teorias bem recentes de Edward O. Wilson – seguramente um dos mais importantes pensadores e cientistas actuais e pioneiro dos mais modernos e profundos estudos sobre a biodiversidade, bem no cerne do pensamento científico contemporâneo.
Wilson intitulou o seu último livro de Conscilience. Esta palavra, que construiu repescando da etimologia e buscando nos significados mais antigos, pretende significar a fusão, a integração dos conhecimentos parciais num todo, a fusão das ciências, a fusão mesmo das artes e da ciências para o conhecimento integrado, sem a qual não será possível a mais profunda e mais global compreensão de todas as coisas!
Parece que dois mil e quinhentos anos depois, a corrente do rio em que mergulhou Heráclito chegou assim, fresca, torrencial, aos nosso tempo...
Talvez que, apesar de tudo, o que tenha mudado menos, tenha sido a incessante sede de descoberta como uma das mais profundas preocupações dos pensadores de todos os tempos.

Charles Aznavour - À ma femme

La Mamma - Charles Aznavour

Schubert: Ave Maria - Elisabeth Kulman

ANDREA BOCELLI (HQ) AVE MARIA (SCHUBERT)

Edgar Allan Poe: O CORVO (tradução de Machado de Assis)



Edgar Allan Poe: O CORVO (tradução de Machado de Assis)


Em certo dia, à hora
Da meia-noite que apavora,
Eu, caindo de sono e exausto de fadiga,
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina agora morta,
Ia pensando, quando ouvi à porta
Do meu quarto um soar devagarinho,
E disse estas palavras tais:
"É alguém que me bate à porta de mansinho;
Há de ser isso e nada mais".
Ah! bem me lembro! bem me lembro!
Era no glacial dezembro;
Cada brasa do lar sobre o colchão refletia
A sua última agonia.
Eu ansioso pelo Sol, buscava
Sacar daqueles livros que estudava
Repouso (em vão!) à dor esmagadora
Destas saudades imortais
Pela que ora nos céus anjos chamam Lenora,
E que ninguém chamará mais.
E o rumor triste, vago, brando
Das cortinas ia acordando
Dentro em meu coração um rumor não sabido,
Nunca por ele padecido.
Enfim, por aplacá-lo aqui, no peito,
Levantei-me de pronto, e "Com efeito,
(Disse), é visita amiga e retardada
"Que bate a estas horas tais.
"É visita que pede à minha porta entrada:
"Há de ser isso e nada mais".
Minh'alma então sentiu-se forte;
Não mais vacilo, e desta sorte
Falo: "Imploro de vós - ou senhor ou senhora,
Me desculpeis tanta demora.
"Mas como eu, precisando de descanso
"Já cochilava, e tão de manso e manso,
"Batestes, não fui logo, prestemente,
"Certificar-me que aí estais".
Disse; a porta escancar, acho a noite somente,
somente a noite, e nada mais.
Com longo olhar escruto a sombra
Que me amedronta, que me assombra.
E sonho o que nenhum mortal há já sonhado,
Mas o silêncio amplo e calado,
Calado fica; a quietação quieta;
Só tu, palavra única e dileta,
Lenora, tu, com um suspiro escasso,
Da minha triste boca sais;
E o eco, que te ouviu, murmurou-te no espaço;
Foi isso apenas, nada mais.
Entro co'a alma incendiada.
Logo depois outra pancada
Soa um pouco mais forte; eu, voltando-me a ela:
"Seguramente, há na janela
Älguma coisa que sussurra. Abramos,
"Eia, fora o temor, eia, vejamos
"A explicação do caso misterioso
Dessas duas pancadas tais,
"Devolvamos a paz ao coração medroso,
"Obra do vento, e nada mais".
Abro a janela, e de repente,
Vejo tumultuosamente
Um nobre corvo entrar, digno de antigos dias.
Não despendeu em cortesias
Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
de um lord ou de uma lady. E pronto e reto,
Movendo no ar as suas negras alas,
Acima voa dos portais,
Trepa, no alto da porta em um busto de Palas:
Trepado fica, e nada mais.
Diante da ave feia e escura,
Naquela rígida postura,
Com o gosto severo, - o triste pensamento
Sorriu-me ali por um momento,
E eu disse: "Ó tu que das noturnas plagas
"Vens, embora a cabeça nua tragas,
"Sem topete, não és ave medrosa,
"Dize os teus nomes senhoriais;
"Como te chamas tu na grande noite umbrosa?"
E o corvo disse: "Nunca mais".
Vendo que o pássaro entendia
A pergunta que eu lhe fazia,
Fico atônito, embora a resposta que dera
Dificilmente lha entendera.
Na verdade, jamais homem há visto
Coisa na terra semelhante a isto:
Uma ave negra, friamente posta
Num busto, acima dos portais,
Ouvir uma pergunta a dizer em resposta
Que este é seu nome: "Nunca mais".
No entanto, o corvo solitário
Não teve outro vocabulário.
Como se essa palavra escassa que ali disse
Toda sua alma resumisse,
Nenhuma outra proferiu, nenhuma.
Não chegou a mecher uma só pluma,
Até que eu murmurei: "Perdi outrora
"Tantos amigos tão leais!
"Perderei também este em regressando a aurora".
E o corvo disse: "Nunca mais!"
Estremeço. A resposta ouvida
É tão exata! é tão cabida!
"Certamente, digo eu, essa é toda a ciência
"Que ele trouxe da convivência
"De algum mestre infeliz e acabrunhado
"Que o implacável destino há castigado
"Tão tenaz, tão sem pausa, nem fadiga,
"Que dos seus cantos usuais
"Só lhe ficou, na amarga e última cantiga,
"Esse estribilho: "Nunca mais".
Segunda vez nesse momento
Sorriu-me o triste pensamento;
Vou sentar-me defronte ao corvo magro e rudo;
E, mergulhando no veludo
Da poltrona que eu mesmo ali trouxera,
Achar procuro a lúgubre quimera,
A alma, o sentido, o pávido segredo
Daquelas sílabas fatais,
Entender o que quis dizer a ave do medo
Grasnando a frase: "Nunca mais".
Assim posto, devaneando,
Meditando, conjeturando,
Não lhe falava mais; mas, se lhe não falava,
Sentia o olhar que me abrasava.
Conjeturando fui, tranqüilo, a gosto,
Com a cabeça no macio encosto
Onde os raios da Lâmpada caíam,
Onde as tranças angelicais
De outra cabeça outrora ali se desparziam
E agora não se esparzem mais.
Supus então que o ar, mais denso,
Todo se enchia de um incenso,
Obra de serafins que, pelo chão roçando
Do quarto, estavam meneando
Um ligeiro turíbulo invisível:
E eu exclamei então: "Um Deus sensível
"Manda repouso à dor que te devora
"Destas saudades imortais.
"Eia, esquece, eia, olvida essa extinta Lenora".
E o corvo disse: "Nunca mais".
"Profeta, ou o que quer que sejas!
"Ave ou demônio que negrejas!
"Profeta sempre, escuta: Ou venhas tu do inferno
"Onde reside o mal eterno,
"Ou simplesmente náufrago escapado
"Venhas do temporal que te há lançado
"Nesta casa onde o Horror, o Horror profundo
"Tem os seus lares triunfais,
"Dize-me: existe acaso um bálsamo no mundo?"
E o corvo disse: "Nunca mais".
"Profeta, ou o que quer que sejas!
"Ave ou demônio que negrejas!
"Profeta sempre, escuta, atende, escuta, atende!
"Por esse céu que além se estende,
"Pelo Deus que ambos adoramos, fala,
"Dize a esta alma se é dado inda escutá-la
"No Éden celeste a virgem que ela chora
"Nestes retiros sepulcrais,
"Essa que ora nos céus anjos chamam Lenora!"
E o corvo disse: "Nunca mais!"
"Ave ou demônio que negrejas!
"Profeta, ou o que quer que sejas!
"Cessa, ai, cessa! (clamei, levantando-me) cessa!
"Regressando ao temporal, regressa
"À tua noite, deixa-me comigo...
"Vai-te, não fique no meu casto abrigo
"Pluma que lembre essa mentira tua.
"Tira-me ao peito essas fatais
"Garras que abrindo vão a minha dor já crua"
E o corvo disse: "Nunca mais".
                                                        E o corvo aí fica; ei-lo trepado
                                                          No branco mármore lavrado
                                                 Da antiga Palas; ei-lo imutável, ferrenho.
                                                       Parece, ao ver-lhe o duro cenho,
                                                   Um demônio sonhando. A luz caída
                                                    Do lampião sobre a ave aborrecida
                                                 No chão espraia a triste sombra; e fora
                                                           Daquelas linhas funerais
                                          Que flutuam no chão, a minha alma que chora
                                                      Não sai mais, nunca, nunca mais!

Las Cuatro Estaciones (Four Seasons) - Vivaldi

W. A. Mozart: Symphony nº 40 - Dima Slobodeniouk - Sinfónica de Galicia