Países mundo afora vivem em guerras civis, com sangrentas disputas pelo poder em regimes autoritários, em que a democracia ainda não deu o ar de sua graça. É o caso da Síria. Mas quando se trata da taxa de homicídios, a sensação que fica é que a Síria é aqui mesmo. O Brasil registrou em 2012 a maior quantidade de assassinatos, tanto em termos absolutos como relativos, desde 1980:
Nada menos do que 56.337 pessoas foram mortas naquele ano, num acréscimo de 7,9% frente a 2011. A taxa de homicídios, que leva em conta o crescimento da população, também aumentou 7%, totalizando 29 vítimas fatais para cada 100 mil habitantes. É o que revela a mais nova versão do Mapa da Violência, que será lançada nas próximas semanas com dados que vão até 2012.
O levantamento é baseado no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, que tem como fonte os atestados de óbito emitidos em todo o país. O autor do mapa, o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, diz que o sistema do Ministério da Saúde foi criado em 1979 e que produz dados confiáveis desde 1980. As estatísticas referentes a homicídios em 2012, portanto, são recordes dentro da série histórica do SIM.
— Nossas taxas são 50 a 100 vezes maiores do que a de países como o Japão. Isso marca o quanto ainda temos que percorrer para chegar a uma taxa minimamente civilizada — destaca o sociólogo.
O país do “homem cordial” é um tanto violento, como podemos ver. São quase 60 mil homicídios anuais, um número assustador, digno de uma guerra civil. Ou seja, vivemos uma guerra civil, só que oculta, velada, disfarçada. Há um forte poder paralelo que não teme as punições legais, que não reconhece e não respeita a autoridade estatal, a polícia.
São fortalezas do crime sustentadas pelo tráfico de drogas e protegidas por armas ilegais de alto calibre, que entram por nossas fronteiras que se parecem queijos suíços, de tantos buracos evidentes. Aliás, o aumento da taxa de homicídios coloca em xeque os defensores do desarmamento civil, que como sempre vão se fingir de bobos para não negar o retumbante fracasso de sua bandeira.
O aumento na taxa de homicídios ocorreu em uma época de forte crescimento de renda, com o advento da “nova classe média”, tão propalada pelo governo. Isso coloca em xeque outra bandeira “progressista”: a de que a culpa da violência e da criminalidade é da pobreza, não da impunidade.
Os bandidos são cada vez mais ousados, e matam por motivos banais, à luz do dia, pois contam com a impunidade e porque acham que a vida não vale nada. Fazem isso com armas ilegais, ou seja, de nada adianta desarmar a população de bem, aquela que poderia eventualmente se defender desses criminosos.
Some-se a isso a quantidade de óbitos por acidentes no trânsito, em boa parte causados pelo péssimo estado de nossas estradas e também pela irresponsabilidade dos motoristas, e temos um quadro realmente sombrio, com mais de 100 mil mortes por ano. Deixa eu repetir o número por extenso para ver se cai a ficha: cem mil mortes por ano causadas por assassinatos ou acidentes de trânsito.
Que país é esse? Como podemos sentir orgulho do Brasil desse jeito? Vamos continuarenaltecendo nossa “malandragem”, nosso jeitinho, nossa “cordialidade”, nossa “alegria”, nosso povo “pacífico”? O brasileiro vende por aí a imagem de um povo hedonista e bonachão como os bonobos, mas, na prática, está bem mais perto da realidade dos violentos e agressivos chimpanzés.
Nada disso é imutável, claro. Não está inscrito em nossos genes, nem é resultado de nosso clima. É fruto de nossa cultura atrasada e de nossas instituições precárias. E ambas podem mudar, podem evoluir. Mas é preciso muito esforço, e começar já, pois como podemos ver, estamos caminhando para trás.
Rodrigo Constantino
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