domingo, 9 de agosto de 2020

‘‘O Voto da Pobreza e a Pobreza do Voto – a Ética da Malandragem’’

 

AUTORA: Maria Lucia Victor Barbosa________________________________________________________


Em novembro de 1988, lancei meu primeiro livro, ‘‘O Voto da Pobreza e a Pobreza do Voto – a Ética da Malandragem’’, editado por Jorge Zahar. Neste trabalho analisei especialmente o voto da grande maioria da população brasileira, que como se sabe é pobre, e a influência sobre essa classe dos meios de comunicação e dos líderes populistas. Agora constato, que apesar de já terem se passado mais de onze anos, pouca coisa mudou em termos de comportamentos e atitudes dos menos desfavorecidos.
Isso se deve ao fato de que, à medida que falta a um indivíduo a capacidade de formular explicações mais racionais e científicas, ele tende a fazer sua leitura de mundo através apenas de emoções e sentimentos. Assim, a grande massa pobre é capaz de fermentar emoções de maneira mais intensa do que os indivíduos de outras classes sociais, que tendo recebido certos lustros de educação formal, reagem de maneira um pouco mais comedida diante dos fatos e acontecimentos.
Por conta disso, a clientela política composta pela pobreza constitui terreno fértil para a pregação que apela para sensibilidade. Compartilhando com as demais camadas sociais o gosto pela política no seu aspecto lúdico e de sonho, os pobres adaptam seu universo específico, composto de valores e aspirações, à imagem ideal do político. Apostam em candidatos como num jogo, procuram obter nas campanhas eleitorais o máximo de vantagens possíveis, escolhem aquele que ‘‘o coração mandar’’.
Por outro lado, entre os eleitores de classes mais elevadas vai aos poucos se formando uma consciência mais nítida e, assim, candidatos e governantes são julgados com mais rigor à luz de determinados critérios, entre os quais se incluem a honestidade, a competência e a postura ética.
Tudo isso que pode parecer apenas uma teoria está sucedendo na realidade, pois o que se vê hoje são vereadores, prefeitos, deputados estaduais, deputados federais e senadores sendo cassados e alguns presos, por envolvimento em atos ilícitos, enquanto ministros caem pelos mesmos motivos. Ora, tais coisas não acontecem sem a pressão da opinião pública.
Em Londrina não poderia ser diferente, sendo que nesta cidade as atenções estão concentradas na série de pesadas e graves acusações sobre o desvio de milhões de reais por parte do Poder Público. Segundo o estampado na imprensa, o gigantesco e estarrecedor esquema de corrupção teria sido feito para beneficiar a campanha do deputado estadual Antonio Carlos Belinati, filho do prefeito Antonio Belinati, e do governador Jaime Lerner, que se reelegeu tendo novamente como vice Emília Belinati, mulher do prefeito. (‘‘O Estado de S. Paulo’’, do dia 20).
No meio do fogo cerrado estão a Autarquia do Meio Ambiente (AMA) a Companhia Municipal de Urbanização (Comurb) e o Serviço de Telecomunicações de Londrina S/A (Sercomtel), sendo que a lama vai respingando no Poder Legislativo com acusações feitas também a deputados estaduais e a vereadores.
Nunca se viu em Londrina um escândalo de tamanha proporção, sendo que 87 entidades – entre elas a Associação Industrial e Comercial de Londrina (Acil), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Lojas Maçônicas, representantes da Igreja Católica etc. – têm levado a efeito manifestações em que exigem esclarecimento dos fatos e punições aos culpados. Tais atos culminaram com o pedido de cassação do prefeito Antonio Belinati, sendo que para isso deveria ser formada na Câmara de Vereadores uma Comissão Processante (CP) que, em última instância, poderia desfechar, depois de analisado o processo, a cassação do prefeito.
Na quinta-feira passada, os vereadores se reuniram para decidir se formavam ou não a CP. Presentes também na Câmara dois grandes grupos: o das entidades que exigem a cassação e é composto por pessoas da classe média; e o grupo contra a cassação, uma massa de pobreza que defende apaixonadamente o prefeito.
O clima era tenso, apesar de não ter havido embates corporais, ficando a platéia apenas nos vitupérios lançados a plenos pulmões. Também o pugilato entre o presidente da Câmara, vereador Renato Araújo (PPB), e um rapaz que o teria xingado, e sobre o qual o vereador arremessou um exemplar da Constituição, não aconteceu, pois Renato Araújo foi contido por seus pares. De todo modo, a sessão que contou com boatos sobre a ida do prefeito à Câmara e manobras de todo o tipo para ganhar tempo, foi encerrada pelo presidente sem a formação da CP.
O segundo round está marcado para terça-feira que vem, e não se pode prever o que vai acontecer, pois o prefeito Antonio Belinati, dono de uma carreira política de 30 anos, ainda está cheio de aspirações que incluem o governo do Estado do Paraná para si próprio, o Senado para sua esposa, a prefeitura para o filho, e, provavelmente, demais cargos para outros familiares. Naturalmente, portanto, ele vai continuar lutando com todas as suas forças.
Para se manter no cargo e tentar realizar seus sonhos, o prefeito conta com o fervoroso voto da pobreza, pois os mais pobres dizem coisas como a moradora de um dos conjuntos habitacionais de Londrina, Maria de Lourdes Barbosa, que afirmou: ‘‘Ele (Belinati), mesmo tirando dinheiro, como dizem, fez muita coisa por nós. Somos a favor dele, que foi na favela e se preocupou com a gente. Por isso a gente veio aqui’’. (Folha de ontem).
Do lado dos que exigem a cassação do prefeito, aparece o pensamento do corretor Israel Klein: ‘‘É preciso acabar com os maus políticos. Enquanto o povo estiver votando por uma lata de óleo, uma cesta básica e uma mentira, não vamos mudar esse País’’ (Folha de ontem).
Diante da gravidade do assunto é necessário que tudo seja esclarecido, e nesse sentido o Poder Judiciário não pode falhar. Afinal, as coisas estão mudando no Brasil, e Londrina não é exceção.

 

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