AUTORA: Maria Lucia Victor Barbosa________________________________________________________
Em novembro de 1988, lancei meu
primeiro livro, ‘‘O Voto da Pobreza e a Pobreza do Voto – a Ética da
Malandragem’’, editado por Jorge Zahar. Neste trabalho analisei
especialmente o voto da grande maioria da população brasileira, que como
se sabe é pobre, e a influência sobre essa classe dos meios de
comunicação e dos líderes populistas. Agora constato, que apesar de já
terem se passado mais de onze anos, pouca coisa mudou em termos de
comportamentos e atitudes dos menos desfavorecidos.
Isso se deve ao
fato de que, à medida que falta a um indivíduo a capacidade de formular
explicações mais racionais e científicas, ele tende a fazer sua leitura
de mundo através apenas de emoções e sentimentos. Assim, a grande massa
pobre é capaz de fermentar emoções de maneira mais intensa do que os
indivíduos de outras classes sociais, que tendo recebido certos lustros
de educação formal, reagem de maneira um pouco mais comedida diante dos
fatos e acontecimentos.
Por conta disso, a clientela política
composta pela pobreza constitui terreno fértil para a pregação que apela
para sensibilidade. Compartilhando com as demais camadas sociais o
gosto pela política no seu aspecto lúdico e de sonho, os pobres adaptam
seu universo específico, composto de valores e aspirações, à imagem
ideal do político. Apostam em candidatos como num jogo, procuram obter
nas campanhas eleitorais o máximo de vantagens possíveis, escolhem
aquele que ‘‘o coração mandar’’.
Por outro lado, entre os eleitores
de classes mais elevadas vai aos poucos se formando uma consciência mais
nítida e, assim, candidatos e governantes são julgados com mais rigor à
luz de determinados critérios, entre os quais se incluem a honestidade,
a competência e a postura ética.
Tudo isso que pode parecer apenas
uma teoria está sucedendo na realidade, pois o que se vê hoje são
vereadores, prefeitos, deputados estaduais, deputados federais e
senadores sendo cassados e alguns presos, por envolvimento em atos
ilícitos, enquanto ministros caem pelos mesmos motivos. Ora, tais coisas
não acontecem sem a pressão da opinião pública.
Em Londrina não
poderia ser diferente, sendo que nesta cidade as atenções estão
concentradas na série de pesadas e graves acusações sobre o desvio de
milhões de reais por parte do Poder Público. Segundo o estampado na
imprensa, o gigantesco e estarrecedor esquema de corrupção teria sido
feito para beneficiar a campanha do deputado estadual Antonio Carlos
Belinati, filho do prefeito Antonio Belinati, e do governador Jaime
Lerner, que se reelegeu tendo novamente como vice Emília Belinati,
mulher do prefeito. (‘‘O Estado de S. Paulo’’, do dia 20).
No meio do
fogo cerrado estão a Autarquia do Meio Ambiente (AMA) a Companhia
Municipal de Urbanização (Comurb) e o Serviço de Telecomunicações de
Londrina S/A (Sercomtel), sendo que a lama vai respingando no Poder
Legislativo com acusações feitas também a deputados estaduais e a
vereadores.
Nunca se viu em Londrina um escândalo de tamanha
proporção, sendo que 87 entidades – entre elas a Associação Industrial e
Comercial de Londrina (Acil), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
Lojas Maçônicas, representantes da Igreja Católica etc. – têm levado a
efeito manifestações em que exigem esclarecimento dos fatos e punições
aos culpados. Tais atos culminaram com o pedido de cassação do prefeito
Antonio Belinati, sendo que para isso deveria ser formada na Câmara de
Vereadores uma Comissão Processante (CP) que, em última instância,
poderia desfechar, depois de analisado o processo, a cassação do
prefeito.
Na quinta-feira passada, os vereadores se reuniram para
decidir se formavam ou não a CP. Presentes também na Câmara dois grandes
grupos: o das entidades que exigem a cassação e é composto por pessoas
da classe média; e o grupo contra a cassação, uma massa de pobreza que
defende apaixonadamente o prefeito.
O clima era tenso, apesar de não
ter havido embates corporais, ficando a platéia apenas nos vitupérios
lançados a plenos pulmões. Também o pugilato entre o presidente da
Câmara, vereador Renato Araújo (PPB), e um rapaz que o teria xingado, e
sobre o qual o vereador arremessou um exemplar da Constituição, não
aconteceu, pois Renato Araújo foi contido por seus pares. De todo modo, a
sessão que contou com boatos sobre a ida do prefeito à Câmara e
manobras de todo o tipo para ganhar tempo, foi encerrada pelo presidente
sem a formação da CP.
O segundo round está marcado para terça-feira
que vem, e não se pode prever o que vai acontecer, pois o prefeito
Antonio Belinati, dono de uma carreira política de 30 anos, ainda está
cheio de aspirações que incluem o governo do Estado do Paraná para si
próprio, o Senado para sua esposa, a prefeitura para o filho, e,
provavelmente, demais cargos para outros familiares. Naturalmente,
portanto, ele vai continuar lutando com todas as suas forças.
Para se
manter no cargo e tentar realizar seus sonhos, o prefeito conta com o
fervoroso voto da pobreza, pois os mais pobres dizem coisas como a
moradora de um dos conjuntos habitacionais de Londrina, Maria de Lourdes
Barbosa, que afirmou: ‘‘Ele (Belinati), mesmo tirando dinheiro, como
dizem, fez muita coisa por nós. Somos a favor dele, que foi na favela e
se preocupou com a gente. Por isso a gente veio aqui’’. (Folha de
ontem).
Do lado dos que exigem a cassação do prefeito, aparece o
pensamento do corretor Israel Klein: ‘‘É preciso acabar com os maus
políticos. Enquanto o povo estiver votando por uma lata de óleo, uma
cesta básica e uma mentira, não vamos mudar esse País’’ (Folha de
ontem).
Diante da gravidade do assunto é necessário que tudo seja
esclarecido, e nesse sentido o Poder Judiciário não pode falhar. Afinal,
as coisas estão mudando no Brasil, e Londrina não é exceção.
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