Usucapião especial constitucional urbano: função social e sua utilização como forma de democratização da propriedade urbana no Brasil
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Este artigo possui o
objetivo de realizar uma síntese sobre o a forma de aquisição originaria
da propriedade que é o instituto da usucapião especial constitucional
urbano, prevista no art. 183 da Constituição da República Federativa do
Brasil – CRFB.
INTRODUÇÃO
Em
consequência da crescente demanda habitacional que surgi no seio da
sociedade urbana em nossa pátria e no mundo, e com déficit de moradia e a
falta de oferta de imóveis nas grandes cidades, aliado a necessidade de
regularização do processo de ocupação do solo no decorrer dos tempos em
nosso país. Além dos aspectos sociais e econômicos, outros devem ser
suscitados para explicar a criação do instituto da usucapião
constitucional especial urbana, caminharemos nesse contexto, através de
uma análise legal, doutrinária e jurisprudencial, procurando enfatizar
que este trabalho tem como objetivo realizar uma síntese sobre o
instituto da usucapião especial constitucional urbano, onde encontra
previsão no art. 183 da Constituição da República Federativa do Brasil –
CRFB, regulamentado pela Lei Federal nº 10.406/2002 (Código Civil
Brasileiro – CCB), e pela Lei Federal n.º 10.257 de 10 de julho de 2001
(Estatuto da Cidade) que tornaram necessários a criação de tais
mecanismos, enriquecendo ainda mais o tema proposto.
Incialmente
passaremos a abordar a propriedade atual como direito fundamental no
nosso ordenamento jurídico, além dos aspectos da sua função social,
dessa modalidade de usucapião denominada pro-morare.
Dedica-se o
próximo capítulo a bordar de forma mais profunda o Instituto da
Usucapião nas suas formas fazendo-se menções e citações expressão nas
Constituições pátrias passadas e de outros países até alcançar o atual
direito constitucional brasileiro, fazendo parte do Título I – Dos
Direitos e Garantias Fundamentais e do Título VII – Da Ordem econômica e
Financeira da nossa Magna Carta - “Constituição Cidadã” - consagrando-a
como forma de aquisição da propriedade, Claro abordar os aspectos
gerais da usucapião, sua apresentação como modalidade incluída no texto
constitucional em vigor, da usucapião especial constitucional urbana
individual, abordando o seu conceito, os seus requisitos e seus
impedimentos à concessão de uso especial para moradia e processuais da
ação respectiva, são alinhavados no Capítulo seguinte.
E finalmente
Neste Capítulo tem como escopo a conclusão e finalização do estudo com
as devidas considerações Finais, onde será destacada que esta forma de
aquisição da propriedade serve de instrumento para estabelecimento da
segurança jurídica do direito a propriedade.
CAPITULO 1: A PROPRIEDADE: DIREITO FUNDAMENTAL E SUA FUNÇÃO SOCIAL
1.1 - Propriedade como Direito Fundamental
A propriedade é encontrada em diversos
textos constitucionais como direito fundamental, porem este direito
sofreu diversas contestações, segundo o professor Roger Stiefelmann
Leal, doutor e professor em direito do Estado pela USP, em seu artigo “A
Propriedade Como Direito Fundamental – Breves notas introdutórias”,
publicada pela revista digital do Senado Federal Brasileiro.
Possivelmente, nenhum outro direito fundamental sofreu tamanha contestação. Afirmou-se que seu exercício constituía roubo e injustiça (PROUDHON,
2008, p. 252). Propôs-se firmemente sua abolição como solução para
todos os males e todas as alienações (ARON, 2003, p. 171 et seq.).
Outros, por sua vez, sustentaram sua plena subordinação ao interesse coletivo (BURDEAU, 1966, p. 375).[1]
Portanto, a propriedade, constitui um
direito real, conforme nosso ordenamento jurídico determina no artigo
1.228 do CCB, onde se coaduna os seus elementos principais com a
definição de ser a propriedade a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
Neste mesmo sentido, Maria Helena Diniz
(2008, p. 116), caracteriza a propriedade em quatro aspectos: a de
caráter absoluto, a de caráter exclusivo, a de caráter perpetuo. Porém
são características que poderão, de acordo com o interesse público
(desapropriação) ou conforme a sua destinação ou função (função social)
sofrer restrições ou até mesmo ser destituído desse direito, como por
exemplo a disposta no art. 182 § 4º da CRFB/88, onde normatiza a
possibilidade de uma série de restrições ou até mesmo desapropriação por
parte do Município, de imóvel que estiver incluso no plano diretor e
não estiver cumprindo o que determina o § 2º do citado artigo, vejamos
na integra:
Art. 182. A política de
desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme
diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de
seus habitantes.
§ 1º O plano diretor,
aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de
vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de
desenvolvimento e de expansão urbana.
§ 2º A propriedade urbana
cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de
ordenação da cidade expressas no plano diretor.
§ 3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.
§ 4º É facultado ao Poder
Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano
diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo
urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu
adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I - Parcelamento ou edificação compulsórios;
II - Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;
III - desapropriação com
pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente
aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em
parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da
indenização e os juros legais.[2]
Portanto, esse direito é basilar para o
convívio social pacífico, pois a privação do direito a propriedade
culminou em diversos conflitos, políticos, sociais e até religiosos, na
história da humanidade.
1.2 – Propriedade Como Função Social
Partindo de
que a função social é um princípio, passa-se a conceituar que a
propriedade não mais subsista desassociada desta função, onde esta
associação do direito de propriedade lhe deu a condição de princípio,
onde o texto constitucional brasileiro lhe confere no art. 5º, XXIII " a
propriedade atenderá a sua função social", onde o art. 186 estabelece
critérios para a sua efetivação, ou seja, no caso da propriedade rural:
Art. 186. A função social
é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo
critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes
requisitos:
I - Aproveitamento racional e adequado;
II - Utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - Exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.[3]
A nossa carta Magna nos concebe
implicitamente e nos traz a concepção desta consistência do que é a
função social urbana, quando nos diz que o solo urbano não edificado,
subutilizado ou não utilizado, e que não promova seu adequado
aproveitamento, constituem o não cumprimento da função social da
propriedade, e passível de sanções, inclusive a desapropriação
(art. 182 §4º). Portanto, compreende-se que a função social da
propriedade urbana se transpassa no seu pleno aproveitamento econômico.
Com o
advento da CRFB/88, esta caracterização da função social da propriedade
foi modificada e ampliada, o aspecto econômico continuou, entretanto,
outras características também foram incluídas para determinar a sua
condição de funcionalidade social.
CAPÍTULO 2 – ASPECTOS GERAIS DA USUCAPIÃO: CONCEITO, ORIGEM HISTÓRICA, FUNDAMENTOS E FUNDAMENTOS LEGAIS
2.1 - Conceito
A origem do termo usucapião vem do latim, onde sua formação provém de dos verbetes: usu, que significa "pelo uso" e capere que se traduz como "tomar", sintetizando, portanto, na expressão "tomar pelo uso"[4].
De acordo
com NEGUETE, a usucapião se coaduna no direito romano, onde das muitas
conceituações do instituto, parece a mais remota ser de ULPIANO, que no
frag. 19, § 8 "Usucapio est domini adeptio per continuationem possessionis anni vel biennii", ou seja, onde seu discipulo MODESTINO, baseou-se e aprimorou a definição: "Usucapio est adectio dominii per continuationem possessionis temporis lege definiti"
Portanto, a partir desta última definição o instituto do usucapir é a
forma de aquisição da propriedade pelo domínio e pela posse continuada, e
o tempo determinada pela lei. Todas as definições posteriores coadunam
com esta de MODESTINO, ou seja, firmou esta última como conceito básico
da definição da usucapião na doutrina até a atualidade. Como exemplo
podemos citar a de BIAGIO BRUGI, "Um modo de adquirir a
propriedade das coisas no comércio mediante a posse atuada pelo tempo e
nas condições requeridas pela lei" [5] segundo este em preceitos gerais seguindo a definição de MODESTINO, onde resume: "Podemos,
pois, conceituar o usucapião como aquisição do domínio ou de um direto
real sobre coisa alheia, mediante posse mansa e pacífica, durante o
tempo estabelecido em lei"[6]
A relativa controvérsia quanto ao gênero
da palavra usucapião, no contexto da discursão gramatical do termo, onde
no Livro II, Título II, Capitulo II, Seção IV código civil de 1916 o
termo usucapião esta designado no masculino: Do Usucapião, corroboram
alguns doutrinadores com este gênero em suas obras como Tubinambá Miguel
Castro do Nascimento[7], José Carlos de Moraes Salles[8], Humberto Theodoro Junior[9], entretanto para Maria Helena Diniz[10], Luiz Edson Fachin[11] e Lenine Neguete[12]
entre outros, o termo é do gênero feminino, como é utilizado no Livro
III, Título III, Capitulo II, Seção I: Da usucapião, do novo CCB de
2002.
Resolvi, portanto, seguir a segunda turma e
adotar neste artigo, e acompanhar o nosso Código Civil, utilizaremos o
gênero feminino para designar o instituto em tela.
2.2 - Fundamentos
A usucapião é sem dúvida fundamental para o
fomento da paz social, estabilização e a destinação racional da
propriedade, cuja a orientação da sua função social, norteada após a
Constituição de Weimar (1919), nesse sentido expõe Lenine Neguete:
Assim como a prescrição
extintiva, é a aquisitiva um instituto de ordem e estabilidade social.
Numa palavra, o fundamento básico e elementar da prescrição é o bem
comum - o interesse social - que é o fundamento mesmo do direito
enquanto norma de convívio informada pela justiça, isto é, capaz de
propiciar a cada um, em particular, e a sociedade, em geral, a
realização de seus fins"[13]
Não seria possível de fato, atingirmos a
estabilidade social, caso as relações perdurassem sem determinação de
tempo e solução definitiva dos conflitos de interesses, neste sentido
coaduna Maria Helena Diniz:
"o fundamento deste
instituto é garantir a estabilidade e a segurança da propriedade,
fixando um prazo, além do qual não se podem mais levantar dúvidas as
contestações a respeito e sanar a ausência de título do possuidor, bem
como vícios intrínsecos do título que esse mesmo possuidor, porventura,
tiver.[14]
No entanto, a obtenção do domínio por
intermédio da prescrição, ocorre em perda do direito do proprietário,
apesar de não estar em conformidade com os fundamentos dos direitos,
esta é exercida por motivos de interesse público: é relevante dizer que o
domínio por diversas oportunidades oscila quanto a vícios do próprio
título aquisitivo ou até mesmo demonstrar o direito. Por este angulo é
esclarecedora a visão de Lafayette Rodrigues Pereira:
No interesse, pois de
tirar à propriedade o caráter provisório e de dar-lhe estabilidade e
segurança, cumpria circunscrever aquelas incertezas dentro de um certo
período de tempo; daí a necessidade que o direito de propriedade,
exercido fracamente dentro de um prazo prefixado e mediante certas
condições se considerasse peremptoriamente consolidado e garantido
contra as reivindicações fundadas em causas anteriores à posse.[15]
Portanto, é preponderante que a
consolidação e a estabilização do direito da propriedade, constitui
fator determinante para a paz social, com a apropriada destinação desse
bem imóvel, promovendo utilidade para toda a coletividade.
Por fim, a usucapião foi permeada do novo
constitucionalismo, pela inércia do proprietário, método característico
do liberalismo, sobrevindo a luz a função social da propriedade,
diminuindo os prazos prescricional e criando novas formas de usucapião,
tais como o especial no formato urbano (pró-moradia) e rural
(pró-labore).
2.3 - Fundamentos Legais
O nosso código Civil instituto três formas
especificas de aquisição da propriedade imóvel, são elas: Usucapião -
artigos 1.238 ao 1.244; Registro do título translativo -- artigos 1.245
ao 1.247; Acessão - artigos 1248 ao 1.259, todos no seu Livro III,
Título III, Capitulo II do código de 2002.
São permitidas três formas de modalidades
da usucapião em nosso sistema, a saber: a usucapião ordinária, a
usucapião extraordinária, ambas provisionadas em nosso Código civil nos
seus artigos 1.242 e 1.238. Já a terceira modalidade, chamadas de
usucapiões constitucionais, apesar de estar constando no texto do código
civil nos artigos 1.239 e 1.240 e no Estatuto das Cidades (Lei nº
10.257/2001), previstas do artigo 9º ao 14, teve inicialmente, sua
normatização primeiro na seara constitucional.
A primeira forma de usucapião especial,
foi a pró-labore ou rural, teve sua primeira normatização, ainda nos
primórdios da república brasileira, sendo inserida no texto
constitucional pela primeira vez na Constituição de 1934 no artigo 125,
ainda na era Vargas.
A segunda forma, a usucapião especial
constitucional urbana ou pró-morare, é uma inovação da lei, suscitada
originariamente no texto constitucional pátrio de 1988, onde o esforço
do constituinte em favorecer uma nova política e instrumentos efetivos
para o desenvolvimento urbano, das funções sociais das cidades,
garantindo a todos os seus habitantes o bem-estar social, matéria
descrita no artigo 182.
Inicialmente, faremos uma rápida retrospectiva, indicando os elementos necessários à usucapião, vejamos:
2.4 - Animus Domini
Foi introduzido em nosso ordenamento
jurídico através da expressão "possuir como sua", descritos tanto nos
artigos 183 e 191 da CRFB/88, quanto nos artigos 1.238, 1.239 e 1.240 do
CCB/2002, ou seja, o autor da ação da usucapião, para ter sucesso
intento, deverá ter o animus domini, isto é, possuir como se
proprietário fosse, porem este animus não se reduz ao desejo íntimo do
autor no comportamento como proprietário, essa vontade deve estar
exteriorizada, deve pois agir para a aquisição do domínio no usucapião,
provar a posse, com ânimo de dono, neste sentido NEGUETE, traz as
diferenças entre as teorias do animus domini de Savigny e Ihering:
É verdade que, por definição, é o animus domini
a vontade (ainda que de má fé) de possuir como se fosse dono, donde o
dizer-se que existe mesmo no ladrão, que sabe que a coisa não lhe
pertence. mas, vencida a teoria subjetiva de Savigny pela objetiva de
Ihering, entende-se que para caracteriza-lo não basta aquela vontade: é
preciso que ela resulte da causa possessionis, isto é, do
título em virtude do qual se exerce a posse: de modo que se esta iniciou
em virtude de um contrato, como o de locação,por exemplo, que implica
no reconhecimento do direito dominial de outrem, aí não haverá falar
nele.[16]
Em nosso ordenamento, segue a aceitação
teoria objetiva de Hering por parte da jurisprudência, onde o
doutrinador alemão nos ensinou que a vontade por si só não basta, por
que ninguém pode transformar uma relação de posse existente, face a causa possessionis. A
vontade do possuidor não tem valor face ao preceito objetivo do
direito. A esse respeito veremos o julgado do recurso de apelação civil
nº 7420042 do Egrégio TJ do PR, a manifestação do Desembargador e
Relator Exmo. Sr. Lauri Caetano da Silva:
Tem legitimidade para
usucapir em nome próprio, aquele que exerça a posse por si mesmo, ou
seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião,
bem como exerça posse exclusiva com efetivo animus domini pelo prazo
determinado em lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários.[17]
2.5 - Tempo
O tempo para a aquisição da usucapião
deverá ser ininterrupto e sem oposição, de acordo com o artigo 1.238 do
CCB, sendo cabível o possuidor atual somar o seu tempo de posse ao dos
seus antecessores.
Em relação tempo ininterrupto, admite-se,
no caso de turbação ou esbulho, o possuidor poderá interpor as ações
possessórias previstas no artigo 926 e seguintes do CPC. Logrando êxito
em seu intento o possuidor turbado ou esbulhado, agindo por conta
própria ou vitorioso nas ações de manutenção ou reintegração de posse,
esse tempo fora da posse não será considerado interrompido, veja
explicação de SALLES:
Se o possuidor logrou
sair vitorioso, seja no desforço próprio, seja no apelo ao poder
Judiciário, o caráter de sua posse não foi afetado, porque a conduta
ilícita de outrem não pode prejudicar o possuidor. Mesmo que o turbador
seja proprietário, é ineficaz a tentativa violenta de retomada da posse,
eis que omisso em relação ao emprego do petitório, único remédio útil
de que se poderia servir ou pelo menos, do protesto formal em juízo,
para interromper o curso do prazo.[18]
2.6 - Justo Título e Boa Fé
Estes elementos, justo título e boa-fé,
são fundamentais para a aquisição prescritiva da usucapião ordinária,
sendo dispensável, portanto nas usucapiões extraordinária e especial
urbano e especial rural.
Portanto, a usucapião é o meio capaz onde a
possibilidade de resolver vícios de aquisição, por parte do possuidor,
que prove título justo e boa-fé, e que tenha possuído o bem imóvel no
prazo prescricional de dez anos ou cinco anos, de acordo respectivamente
com o caput do artigo 1242 e seu parágrafo único do CCB de 2002,
podendo ter seus vícios sanados, sendo esses vícios não constituírem
nulidades absolutas.
2.7 - Objeto Hábil
Tem-se por objeto hábil todos os bens
corpóreos possíveis de prescrição e de direitos reais, como a enfiteuse,
servidões aparentes domínio útil, habitação e usufruto.
Segundo NEGUETE[19],
os imóveis que não possam perfeitamente serem individualizados, pois
não se pode determinar a posse de coisa indeterminada, por não se
precisar os limites dos atos possessórios, não podem ser usucapidos.
2.8 - Usucapião de Bens Públicos
A regra é a imprescritibilidade dos bens
públicos, conforme tem firmado a jurisprudência do STF em seus julgados,
onde restringe a possibilidade de usucapião desses bens, porem de forma
restritiva, os artigos 183 e 191 da CRFB, onde afirmar que a vedação constitucional em usucapir bem público se refere à nua-propriedade, ao domínio direto e não ao domínio útil.[20]
É mister observar que a esta forma
originaria de aquisição da propriedade, da usucapião, surgi como
instituo privado, portanto, a regra é a imprescritibilidade desses bens,
devemos apenas lembrar, que em relação as terras devolutas, por força
da irretroatividade do instituto pró-labore, ainda a possibilidade para
as situações consumadas antes da validação do parágrafo único do artigo
191 da CRFB/88, conforme nos ensina RIZZARDO.[21]
CAPÍTULO 3 – A USACAPIÃO ESPECIAL CONSTITUCIONAL URBANA
A atenção especial que será dada a esta
modalidade de usucapir, prevista em nossa Lei maior, no art. 183, §§1ª a
3º, recepcionada pelo CCB no seu art. 1.240, §§1º e 2º, veja:
Art. 183. Aquele que
possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros
quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição,
utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o
domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou
rural.
§ 1º - O título de
domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a
ambos, independentemente do estado civil.
§ 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
§ 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.
Art. 1.240. Aquele que
possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros
quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a
para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que
não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1o O título de domínio e
a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos,
independentemente do estado civil.
§ 2o O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. [22]
Esta
modalidade de aquisição prescritiva, ganhou contornos constitucional no
Brasil, com a promulgação da Constituição Cidadã de 1988, sendo a
primeira das nossas constituições a trazer a luz a preocupação da
questão urbana. Ao atribuir tal importância ao instituto, o legislador
constituinte dimensionou a problemática fundiária e a organização e
planejamento urbano e suas consequências para toda a sociedade.
3.1 - Requisitos Para a Usucapião Constitucional Especial Urbana
Este formato
de usucapião é muito similar com a extraordinária (artigo 1.238 do
CCB), porem a diferença básica é o tempo de posse, que no primeiro é de
no mínimo cinco anos e o segundo, previsto no artigo é de 15, porem
tanto a usucapião especial quanto a extraordinária não exige o título de
boa-fé.
3.1.1 - Do Limite Constitucional de até 250m² quadrados de Área e prazo prescricional
Conforme já
explicitado no início do capítulo, esta forma de usucapir, descrita no
artigo 183 da carta magna e no CCB no artigo 1240, sabemos que estão
sujeitos a prescrição aquisitiva.
O prazo
prescricional e de grande importância nesta questão da área, pois se
esta for de 250m², este prazo é de 5 anos, no entanto se a área for
maior que 250m² será enquadrado no instituto da usucapião
extraordinária, que neste caso deverá ser de 15 anos. Percebe-se assim,
que os prazos geram direitos subjetivos, ou seja, o proprietário ciente
da invasão de seu imóvel, sendo ele com área maior que 250m², terá um
prazo prescricional de 15 anos, podendo neste prazo, de acordo com sua
conveniência, agir em ação a seu direito no tempo a maior, que neste
caso a lei lhe resguarda.
3.1.2 - Da Restrição à finalidade como proteção à moradia
A partir da
Constituição Cidadã de 1988, ficou consagrada a na ordem interna,
suscitar o direito à moradia, decorrente do artigo 5º, parágrafo 2º,
referendado posteriormente na carta magna pela EC/26[23]. Mesmo antes da emenda 26[24],
O capítulo destinado a política urbana, já previa a promoção e a
proteção do acesso a moradia, onde a regulamentação do artigo 183, pela
lei 10.257/2001 (Estatuto das Cidades), elenca nesta lei o instituto da
usucapião especial urbana, instrumento para a implementação da política
urbana de desenvolvimento das funções sociais das cidades, da
propriedade urbana e garantir do acesso democrático a moradia.
Portanto, o
requisito de estar morando ou utilizando para moradia, é imperativo para
requerer este tipo aquisição prescritiva de propriedade, sem ele ficará
inviabilizada a ação de usucapião especial urbana.
3.1.3 - Restrição de Não Possuir Outra Propriedade
Caso as
limitações imposta ao imóvel, relativos as restrições, referente a área
máxima de 250 m² e utilização para moradia, sejam respeitadas,
avaliaremos o próximo critério a ser cumprido pelo requerente da
usucapião especial urbana, ou seja, o de não possuir outro imóvel, seja
urbano ou rural, ou ainda não ter sido beneficiado pelo instituto
prescricional comentado. Conforme determina o caput do artigo 183,
parágrafo 2º da CRFB/88.
3.1.4 - Legitimidade do possuidor
Ou seja, a
usucapião especial urbana, só poderá ser requerida e utilizada, por
pessoa natural, afastando utilização deste instituto por parte de pessoa
jurídica, no entanto não há nenhuma restrição quanto ao estrangeiro
poder utilizar desta forma de aquisição prescritiva da propriedade, pois
o artigo 5º da CRFB/88, garante o direito elencado a brasileiros e
estrangeiros residentes no Brasil. Assim nos instrui Ronnie Herbert
Barros Soares (2004, p 23 e 24), ou seja, ensina que a finalidade social
própria da usucapião especial urbana é justamente a garantia de moradia
ao possuidor e sua família.
A
habilitação civil que o possuidor deva ter para requerer o instituto, é a
do artigo 1º do CCB: "Toda pessoa é capaz de diretos e deveres na ordem
civil".
É autorizada
a co-possuidores, requerer a aquisição deste instituo, podendo ser
outorgado o título do domínio à mulher ou ao homem, ou a ambos, ou ainda
ao conjunto de familiares, que neste caso, fosse herdeiros de possuidor
falecido.
3.1.5 - A Ação de Usucapião
O nosso CPC,
regula a ação de usucapião nos seus artigos 941 a 945, sendo competente
ao possuidor a ação, para a declaração do domínio do imóvel, de acordo
com a lei, onde este deverá anexar a inicial do processo a planta do
imóvel, requisitar a citação do proprietário.
Importante
salientar que todos os atos estarão sujeitos a intervenção do Ministério
Público, de acordo com o artigo 944 do referido código: "Intervirá
obrigatoriamente em todos os atos do processo o Ministério Público."
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O instituto
da usucapião especial constitucional urbana tem como premissa
oportunizar o acesso a propriedade urbana, em consequência garantir o
direito a moradia, a camada mais vulnerável e desfavorecida das grandes
metrópoles, onde na maioria das vezes se mantém na clandestinidade,
ilegalidade e a margem do direito habitacional.
Apesar da
dificuldade de que o possuidor por ora tem em conseguir a assistência
técnica necessária para garantir o direito de acesso a este Instituto, o
Estado deveria criar mecanismos para suprir esta situação de
hipossuficiência, como por exemplo, flexibilizando algumas incumbências
impostas ao possuidor, como a juntada de documentos técnicos, que podem
ser fornecidos pelo proprietário legal do imóvel com mais facilidade,
cabendo ao possuidor provar somente que preenche os requisitos
necessários à usucapião, estabelecidos constitucionalmente.
Diante de
tudo que foi dito, é evidente que a usucapião especial urbana é uma
valiosa ferramenta de justiça social, que carece de melhorias para
cumprir a devida eficácia, porém, esta forma originária de aquisição da
propriedade, por si só, hoje mostra a possibilidade de se vislumbrar um
futuro melhor para a sociedade brasileira, com uma distribuição de renda
e moradia igualitária, seja mais um instrumento da democratização deste
direito fundamental.
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em 03/11/2015;
[1] LEAL, Roger Stiefelmann, A propriedade como direito fundamental, Breves
notas introdutórias, Revista de Informação Legislativa p. 53, pesquisa
no site em
http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/496577/000952682.pdf?sequence=1em
03/11/2015
[2] Pesquisa no site: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm, acesso em 03/11/2015
[3] Pesquisa no site: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm, acesso em 03/11/2015
[4] RIZZARDO, Arnaldo, Direito das Coisas, 3ª ed. revista e atualizada,Rj: ed. Forense, 2007, p. 247
[5] NEGUETE, Lenine, Da Prescrição Aquisitiva (Usucapião), 2ª ed. rev. e ampl., Porto Alegre: Ed. Livraria Sulina, 1954, p. 13
[6] SALLES, José Carlos de Moraes, Usucapião de Bens móveis e imóveis, 5ª ed. rev. ampl. SP: Ed. Revista dos Tribunas
[7] NASCIMENTO, Tubinambá Miguel Castro do, Usucapião (comum e especial), 5ª ed. RJ: Ed AIDE, 1986 p. 18
[8] SALLES, José Carlos de Moraes, obra citada, p. 39
[9] THEODORO Junior, Humberto, Pose e Usucapião (Direitos Reais I, Doutrina e Jurisprudência), 1ª ed. Aide, 1991, p. 100
[10]
DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil brasileiro, 4º volume:
direito das coisas, ed. 22, rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC
- SP ed. Saraiva, 2007 p. 154
[11]
FACHIN, Luiz Edson, A Função social da posse e a propriedade
contemporânea (uma perspectiva da usucapião rural), Porto Alegre, Ed.
Fabris, 1988, p.13
[12] NEGUETE, Lenine. Obra citada p. 13
[13] NEGUETE, Lenine, obra citada, p. 29
[14] DINIZ, Maria Helena, obra citada, p. 156
[15] PEREIRA, Lafayette Rodrigues, Direito das Coisas, Vol. I Fac-similar, Brasília, Ed. SEEP, Senado Federal, 2004. p. 218
[16] NEGUETE, Lenine, Obra citada, p. 94
[17]
Tribunal de Justiça do Paraná, Apelação Civil nº 7420042, Rel. Desemb.
Lauri Caetano Silva, julgado em 29/06/2011, pesquisa n site:
http://tj-pr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/20048930/apelacao-civel-ac-7420042-pr-0742004-2
em 06/11/2015
[18] SALLES, José Carlos de Moraes, obra citada, p. 49
[19] NEGUETE, Lenine, Obra citada, p. 122
[20] STF, Agravo Regimental em Recurso Extraordinário nº 218.324/PE, 2ª Turma relator Min. Joaquim Barbosa, 24/10/2010
[21] RIZZARDO, Arnaldo, Obra citada, p. 250
[22] Pesquisa no site: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm, acesso em 03/11/2015
[23]
Emenda Constitucional nº 26, Art. 1º. "O artigo 6º da Constituição
federal passa a vigorar com a seguinte redação: "São direitos sociais a
educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a
previdência social, a proteção a maternidade e a infância, a assistência
aos desamparados, na forma desta Constituição.
[24]
Emenda nº 26, art. 1º, "O art. 6º da Constituição Federal passa a
vigorar com a seguinte redação: "São direitos sociais, a educação, a
saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e a infância, a assistência ao
desamparados, na forma desta Constituição
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