De origem modesta e pacata, singularismo próprio dos que não foram mimados em berço de ouro, porém, com a mente fértil e de uma inteligência esplêndida, brotou como um rio. Titã, como todos os vultos nacionais que respiraram os ares daquela terra, que nada tem a ver com os forasteiros que por ali passam, que por ali vivem a monopolizar, a escravizar, depois que saem da fome à mordomia. Creio que, Elion, como simplesmente era conhecido naquelas plagas, foi vítima de uns desses imigrantes gananciosos, pretensiosos burocratas que a nossa querida terra abriga, sacia a fome, engorda e enriquece. Elion era um jovem de bons presságios. A sua maior conquista seria tornar-se engenheiro civil. Mas como a muralha da universidade é de uma altura incalculável para a maioria - impossível de penetrar-se, Elion ficou de fora, privado do conhecimento, - privado do saber. Assim como muitos intelectuais são atirados ao leu da mediocridade e abstinência, não passara de um mero matemático, físico e biólogo escondido atrás das cortinas negras de um teatro cínico e invisível, - Santo Antônio de Jesus. Funcionário de uma instituição financeira por muito tempo, Banco do Brasil, laborando em sua terra natal, transfere-se para Valença. Um dia o infortúnio fê-lo retornar à cidade das Palmeiras Colonial. Aí começou a sua desgraça. Em visita ao antigo local de trabalho fora estupidamente agredido por guarda-costas que por pouco não lhe desferiu tiros momentos em que tentara convencer a uma mente mesquinha uma alternativa para solucionar determinado problema. Problema esse, criado pela severidade da mordomia e prolixidade burocrática. A surpresa e impacto emocional causados pelo desemprego injusto se lhe tornou um homem destruído e arrasado; perdido e só. Em um mundo que os amigos existem enquanto somos. Há muito tempo afastado de sua terra natal, Santo Antônio de Jesus, fugia não das faces dos calhordas, - alicerces da sua destruição. Mas sim, para transparecer a sua querida mãe, D. Helena, o sofrimento e dor que feriam-lhe o coração. Entretanto como a vida nos impele, às vezes, de agir quando não queremos, Elion retorna a terra natal. Morre D. Helena. Passa o tempo. A luta para conseguir provar a sua integridade moral, a dor do desemprego, a orfandade e a solidão transformaram-lhe de um homem alegre e sorridente, em um homem deprimido e só. Dois de novembro de 1979. Dia de finados. A natureza abraça-se ao homem chorando profundamente. O ceu da baía é triste. É noite nos mares. A balsa que transporta passageiros Salvador a Bom Despacho está cheia. O som grave e estridente em mi bemol ecoa no infinito saindo das trombetas do ferryboat. É dada a partida. Em pleno mar, - travessia, um baque! Caíra um corpo. Foi um homem. Muitos viram. Até mesmo um seu conhecido. Foi Jorge Elion. Seus documentos provam o seu desaparecimento. Pois, sobraram para justificar a sua ausência dos postos do INSS, e dos Palácios da Justiça. Com o canto triste da natureza e soar dos atabaques, os peixes fazem a festa alimentando-se de carne humana. Depois desse jantar tardio esses mesmos peixes serão pescados. E certamente alimentarão os gananciosos do Recôncavo, - da Baía de Todos os Santos. Até mesmo os antropófagos forasteiros da cidade de Santo Antônio de Jesus.
*Raimundo José Evangelista da Silva é filho da cidade de Santo Antônio de Jesus-BA, Prof. de Língua Portuguesa e Literaturas de Língua Portuguesa pela UCSal, com Especialização em Linguística Textual pelo Instituto Anísio Teixeira e Instituto de Letras da UFBa. É Bacharel em Direito pela Faculdade Baiana de Ciências, com Especialização em Advocacia Criminal pela Faculdade Verbo Jurídico - Porto Alegre. É Poeta e Cronista, tendo 5 livros publicados. Publicou em vários jornais. É ativista e tem um blog intitulado: Blogger Raimundo Evangelista.
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