terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Cônjuge que furta cônjuge não responde por crime.

Cônjuge que furta cônjuge não responde por crime.

Para o bem das relações conjugais, a imunidade.


Trindade Coelho, Advogado
Publicado por Trindade Coelho



 
O caso é frequente, quem nunca se apropriou de alguns trocados do cônjuge que atire a primeira pedra.
Agora, imagine se tal conduta fosse incriminada sem qualquer possibilidade de imunização???
Ponto para o legislador.
Por isso mesmo é bom ressaltar que a imunidade (absoluta) que ora é tratada somente se aplica aos crimes patrimoniais. E alguns deles apenas, pois não haverá aplicabilidade nos crimes praticados com emprego de violência e grave ameaça.
E no que se refere às imunidades o Código Penal estabelece duas espécies: a relativa e a absoluta. Trataremos da absoluta.
Por outro lado, o rol dos crimes patrimoniais é extenso, dentre os mais populares temos o Furto (Art. 155), o Furto de Coisa Comum (Art. 156), o Roubo (Art. 157), a Extorsão (Art. 158), a Extorsão Mediante Sequestro (Art. 159), o Estelionato (Art. 171), o Dano (Art. 163) e a Receptação (Art. 180).
Desta feita, nos restringiremos à imunidade absoluta no crime de Furto Simples, sem nos ater às formas privilegiadas e qualificadas (Art. 155 do Código Penal).
Pois bem.
A imunidade absoluta, a qual faz excluir a punibilidade do crime de Furto está prevista no artigo 181 do Código Penal, que assim dispõe        
Art. 181 – É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo:
I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;
II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.
Sucintamente, essa previsão objetiva manter a harmonia no seio familiar, fazendo prevalecer os interesses familiares sobre os patrimoniais.
Nesse sentido, o tipo penal em análise, inciso I, dispõe ser isento de pena o cônjuge que comete o crime patrimonial, o furto, na constância da sociedade conjugal.
É importante definirmos que a sociedade conjugal surge com o casamento e se estende até: a morte de um dos cônjuges, a nulidade ou a anulação do casamento e a separação ou o divórcio, conforme dispõem os artigos 1.514 e 1.571, ambos do Código Civil.
Portanto, enquanto viger o matrimônio aplicar-se-á a imunidade ao cônjuge salteador, não importando se o casal estava separado de fato no momento do crime, ou se, por exemplo, houve a subtração e posteriormente a separação.
Há que se considerar o tempo do crime. É no momento da consumação que deverá ser analisado a existência da sociedade conjugal.
E nos casos da União Estável, aplica-se a imunidade aos companheiros?
Essa pergunta, hoje, é inapropriada.
O artigo 226, parágrafo 3 da CF, aliado ao entendimento do STF que julgou inconstitucional o artigo 1.790 do Código Civil, faz incidir a imunidade aos companheiros.
E nas relações homoafetivas???
Também se aplica. Após o reconhecimento pelo STF da união estável para casais homoafetivos, torna-se absolutamente possível estender a imunidade a esses casais (STF: ADI 4277 e ADPF 132).
Outro ponto importante é que essa imunidade não se estende a terceiro que eventualmente cometer o crime em concurso com o cônjuge ou quando o terceiro for sujeito passivo.
Temos então que, a conduta do cônjuge que surrupia valores da carteira do outro cônjuge não é punida, o agente será isento de pena ainda que não haja a coabitação, desde que presente, lógico, a sociedade conjugal.
Obs: Tecnicamente, há crime. A conduta não deixa de ser típica, ilícita e culpável, no entanto, ela não será punida. "A imunidade consiste numa causa pessoal de exclusão da pena." (NUCCI, p. 650, 2017)



Trindade Coelho, Advogado

Trindade Coelho, Advogado.
Advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo. Atuação na área Cível. Leitor e cristão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário